O QUE É AMAR?
Prezado Tilleul, a paz de Nosso Senhor esteja em seu coração. Salve Maria!
Quero agradecer a sua última carta. Obrigado. Mas claro que não posso deixar de lhe esclarecer algumas coisas, pois talvez ainda não tenha entendido direito.
Primeiro, quero dizer que você erra quando diz que meus conhecimentos são extensos. Não é verdade. Eu apenas repito aquilo que a Igreja ensina. No livro de Efésios, capítulo três, versículo 10 está escrito:
“Desse modo, os principados e as autoridades no céu, podem conhecer, PELA IGREJA, a multiforme sabedoria de Deus, conforme o projeto eterno que Ele executou em Jesus Cristo nosso Senhor”.
E o que repito, acredite-me, todos os católicos eram obrigados a saber de cor e salteado para poder tomar a primeira comunhão. Antes do Vaticano II, quando ainda não havia a televisão, aparelho onde os católicos de hoje passam a maior parte do seu tempo, todos tinham que aprender o catecismo. Era o próprio padre, de batina, quem ministrava a aula e tomava as lições das crianças. Quem não sabia, não fazia a primeira comunhão.
Ah, bons tempos em que eu não vivi, de católicos valentes, anti ecumênicos, rezadores de terço e freqüentadores de missas. Ah, bons tempos......
E permita-lhe fazer outro comentário a respeito de suas palavras: eu não vejo a Igreja como um conjunto de regras, não da maneira que você está pensando. É claro que as regras existem, e precisam ser cumpridas. Foi Cristo quem disse isto. Quando perguntado pelo jovem qual seria o caminho para a vida eterna, respondeu: cumpra os mandamentos! E não é fácil cumprir os mandamentos, haja vista a nossa fraqueza humana.
E você me opõe aquelas pessoas que, segundo você, “preferem viver com a Igreja”, acreditando que “a Igreja se construi é fazendo parte e todos os dias tentar construir um bocadinho mais e melhor”, acreditando que “é vivendo que se aprende e vive a fé”.
Portanto, nesta frase, você se refere a dois tipos de católicos. No primeiro tipo estão estes que se enquadram nas palavras citadas acima por você. No segundo tipo, no qual eu me enquadro, estão as pessoas que vêem “a Igreja como um conjunto de regras”, crendo que “a Igreja já está feita e terminada”, destilando “ódio por tudo que esteja fora das tuas sebenta, dos teus catecismos e enciclicas”.
Que a Igreja já está feita, isto é certíssimo. Mas ela só terá sua consumação quando do retorno glorioso de Cristo. Santo Agostinho dizia que a Igreja “avança em sua peregrinação por meio das perseguições do mundo e das consolações de Deus”.
Ela avança, sem evoluir. Ela marcha, e não caminha. Ela é rocha, e não areia. Ela não muda jamais. Ela é eterna. Sempre! Atacada, não se acovarda! Rebaixada pelos inimigos, se agiganta! Escarnecida pelos maus, retribui com orações por suas conversões.
Que é a Igreja para mim? A Igreja para mim é a ponte que leva a humanidade para Deus. A única ponte que leva a humanidade para Deus. Não existe outra.
Cristo disse: “Assim como o pai me enviou, eu vos envio. Quem vos ouve, a mim ouve. Quem me rejeita, a mim rejeita. E quem rejeita, rejeita aquele que me enviou” (São lucas, 10, 26). Perceba, prezado: Deus enviou Cristo, e Cristo enviou a Igreja. Quem ouve a Igreja, ouve Cristo. E quem não ouve a Igreja, não ouve Cristo. “Sejam para ti pagãos e publicanos” (São Mateus 18, 17).
Você me diz que eu destilo “ódio por tudo que esteja fora das tuas sebenta, dos teus catecismos e encíclicas”. Ora, você não sabe a alegria que me deu lendo esta frase, porque ela é verdadeira: eu odeio com todo o meu coração, com toda a minha alma e com todas as minhas forças todas as mentiras e heresias que estão fora do Catecismo e dos documentos. A única ressalva é que eles são da Igreja Católica, e de todos os católicos que dela fazem parte.
Pergunto-lhe: estes documentos também não são seus? São apenas meus? Não são de todos os católicos, unidos pela mesma fé através do batismo, da penitência e da eucaristia?
Você diz que a Igreja se constrói “fazendo parte”. Por que, eu não faço parte dela? Mas o que faço, então, quando comungo? E quando rezo o terço? E quando confesso meus muitos e pesadíssimos pecados diante de Deus e do sacerdote? E quando tento levar, com argumentos da Igreja, pessoas das mais profundas trevas para a luz que é Cristo? Não faço parte, eu, a seus olhos, da Igreja? Para você, então, um católico que defende a doutrina da Igreja não faz parte da Igreja. Para você, faz parte da Igreja todo mundo, dos macumbeiros aos idólatras, dos judeus, aos pagãos, dos anglicanos aos calvinistas (incrível, os calvinistas). E lá vem você com um texto bem açucarado, cheio de erros graves, escrito por algum rebelde que viveu sem se submeter a autoridade do Papa, como se fosse possível ser cristão sem estar embaixo da coroa papal. E não é possível! Foi Pio XII quem disse que ninguém pode ser cristão sem estar submisso ao Papa. Leia o número quarenta da encíclica Mystici Corporis:
“Em erro perigoso estão, pois, aqueles que julgam poder unir-se a Cristo, cabeça da Igreja, sem aderirem fielmente ao seu vigário na terra. Suprimida a cabeça visível e rompidos os vínculos visíveis da unidade, obscurecem e deformam de tal maneira o corpo místico do Redentor, que não pode ser visto nem encontrado de quantos demandam o porto da eterna salvação”.
Seu amigo calvinista julgou poder unir-se a Cristo sem ser fiel vassalo do Papa. Ele errou! Que Deus tenha misericórdia da pobre e herética alma dele.
Não o conheci, e sei bem pouco de sua vida. Dizem que fez muitas obras. Mas quais obras? O que se entende, hoje, por obras? As obras sem a verdadeira fé não servem para nada. Grande místico? Mas grande místico na opinião de quem? Calvinista ele era? Chiiiiiiii........
Não vou comentar item por item o texto romântico e pouco verdadeiro dele, pois isto já está até mesmo ficando cansativo para quem lê. Mas quero apenas destacar uma passagem deste texto. Apenas uma. Permite-me? Pois bem, o filhote do luciferino e heresiarca Calvino escreveu:
“(...) Então compreende-se que a fé, a confiança em Deus, é uma realidade muito simples, tão simples que todos poderiam acolhê-la”.
Veja o que ele escreveu: que a fé é igual à confiança em Deus. Ora, esta é a concepção protestante de fé, ou seja, a fé é igual a confiança. Isto é errado, herético e amplamente condenado.
Claro que quem tem fé confia em Deus, mas a fé não é a confiança em Deus. A fé é a adesão às verdades reveladas por Deus e ensinadas pela Igreja. A fé é obediência a Cristo: “Obedece aos mandamentos”.
Sem esta adesão a Cristo e a Sua Igreja, sem esta obediência, não se possui fé. Para os protestantes, crer em Deus é sinônimo de fé. Ora, os demônios também crêem!
Os protestantes não tem fé, pois se perde a fé negando pertinazmente qualquer ponto ensinado como doutrina pela Igreja Católica. Por isso se diz que a fé é uma virtude como a virgindade: ou se a possui de forma plena, ou não se a possui.
E antes de encerrar, você me escreveu, como deixando um bilhete bem apressado, do tipo “quase ia me esquecendo”: “P.S. - Deus é Amor”!
Deus é amor! Como isto está bem dito! Deus nos manda amar a Ele sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Mas eu lhe pergunto, meu amigo, se você sabe o que é amar. O QUE É AMAR?
Sem querer ofender, mas perguntando de forma firme e fraterna, sabe você o que é amar? Permite-me tentar explicar-te esta questão? Incomoda-te se eu realçar que, antes de entrar no texto, tudo o que eu irei dizer abaixo foi retirado da doutrina da Santa Igreja Católica, do Catecismo, das encíclicas papais e dos textos dos santos? Pois foram!
A Igreja Católica ensina que amar uma pessoa consiste em querer o bem para ela. AMAR É QUERER O BEM!
Existem dois tipos de bens: o bem absoluto e o bem relativo. O bem absoluto existe e é Deus, que é bem, beleza e verdade plenas. O bem absoluto é a Vida Eterna, o Céu. Os bens relativos são vários: vida, família, saúde, dinheiro, alimentação, vestuário, emprego, carros, sucesso, propriedades, computadores, eletrodomésticos, etc.
E o que é o mal? Não existe o mal como um ser, como uma criatura, como uma pessoa. As coisas conhecidas como males relativos (a morte, doenças, tragédias, fracasso, desemprego, falta de dinheiro, solidão, etc.) na verdade são a perda de bens relativos.
Tudo o que existe foi feito por Deus. Logo tudo o que existe, todo ser, é bom enquanto ser. O que há são ações más, atos maus: roubar, assassinar, adulterar etc. E ações não são coisas.
Uma ação é má por desordenar os bens. Assim, roubar é uma ação objetivamente má pois o ladrão coloca o bem do dinheiro (bem menor) acima do bem da Justiça (bem maior). Assim, o que torna uma ação objetivamente má é a desordenação dos bens.
O mal objetivo de uma ação não vem da consciência de quem fez a ação má. Uma ação má é sempre objetivamente má, pois é uma desordem dos bens. Porém, a pessoa que age mal pode não ter consciência plena do que faz, e então -- subjetivamenente -- ela não tem culpa do que faz. Ela é então subjetivamente inocente.
Uma pessoa pode ter uma consciência errônea, o que a isenta de culpa, se ela tiver ignorância invencível, mas a ação que ela faz sem culpa pessoal, continua sendo objetivamente má.
E o que é o ódio? Odiar é querer a perda do bem. Existem dois tipos de ódios: o ódio absoluto e o ódio relativo. O ódio absoluto deseja o pecado, quer o inferno para o próximo. Já o ódio relativo quer a morte, doenças, tragédias, fracasso, desemprego, falta de dinheiro, solidão e muitos outras perdas de bens para o próximo.
Essas coisas, os males relativos, não são o pior que pode nos acontecer. O pior que pode nos acontecer é irmos para o inferno. Não existe perda de bem maior do que a ausência de Deus na alma da pessoa, que acarreta na condenação eterna.
O maior bem que podemos desejar é Deus. Amar plenamente é desejar o Céu para todas as pessoas. Assim, se amo alguém de fato, quero que esta pessoa vá para o Céu. Rezo e intercedo diretamente para que isto aconteça. Nós podemos até mesmo amar alguém que nós não gostamos. Não gostamos de fulano, mas desejamos Deus e o Céu para ele, e rezamos pela sua conversão. Isto é o amor perfeito, querido por Deus, ensinado por Nosso Senhor Jesus Cristo.
Um dos erros do mundo moderno é absolutizar os bens relativos. É fazer dos bens relativos algo que eles não são. É acreditar que a felicidade plena vem destas coisas que podem até mesmo serem boas, mas passageiras.
Bens relativos mal usados tiram o Céu de nossas vidas. Por exemplo, Nosso Senhor disse que se o olho nos levasse ao pecado, seria melhor arrancá-lo para entrar cego no Céu, do que enxergando irmos para o inferno (S. Mateus 5, v. 28 a 30). Note bem: a visão é um bem relativo, porque é bom enxergar. Ninguém quer ficar cego! Mas Nosso Senhor diz que se este bem nos tirar a Vida Eterna, então é melhor perdê-lo para podermos ir para o Céu.
Também Cristo demonstrou esta verdade quando, antes de qualquer coisa, perdoou os pecados de um paralítico. Ora, o perdão dos pecados conduz a vida Eterna. Nosso Senhor deu o Céu àquele homem. Posteriormente, por causa da dureza de coração dos escribas, resolveu curar o paralítico, ordenando que este caminhasse. Ou seja, somente depois de perdoar os pecados Cristo se preocupou em curar fisicamente. Para Cristo o bem absoluto vem sempre em primeiro lugar (S. Mateus 9, v. 2 a 8).
Outro exemplo prático desta verdade é o testemunho de vida de Santa Rita de Cássia, cujo marido foi assassinado. Ela possuía dois filhos que juraram vingar a morte do pai. Ao saber disto, a Santa teve convicção de que, caso seus filhos se tornassem assassinos, poderiam ir para o inferno . Então ela rezou a Deus, pedindo-Lhe que se fosse para seus filhos matarem alguém e depois irem para o inferno, então seria melhor que Deus os levasse antes, tirando esta vida deles (bem relativo), para garantir a vida eterna aos jovens (bem absoluto).
E os dois filhos de Santa Rita morreram pouco depois. Não tiveram tempo de se vingar e provavelmente estão no Céu, hoje. Deus atendeu ao pedido de Santa Rita, que amou tão perfeitamente seus filhos que pediu a Deus suas mortes. Ela percebeu que se eles continuassem vivos, poderiam perder o Céu. Assim, odiou a própria vida de seus filhos. E como Deus só nos atende se nós pedirmos bem, atendeu este pedido. E levou aqueles moços. E nisto consiste o ódio perfeito (Salmo 138, v. 22), citado pelo Rei Davi: Se um bem relativo tira o Céu de alguém, podemos até mesmo desejar um mal relativo (doenças, etc.) para que a pessoa tenha a possibilidade de se converter e ir para o Céu. O amor perfeito exige o ódio perfeito. Odiamos tudo aquilo que nos tira o Céu e que tire o Céu dos outros. Como o rei Davi (Salmos 25, [26] 5)!
O ódio imperfeito (detestado por Deus) é desejar o inferno para alguém. Podemos e devemos, se for o caso, desejar a perda de um bem relativo para que alguém alcance o bem absoluto, mas nunca desejar a perda de bens relativos por vingança e muito menos desejar que alguém receba as penas do inferno. Devemos abolir a expressão “vá para o inferno” de nossas vidas e de nossos corações.
Saibamos amar como Deus nos ensinou, sem sentimentalismos nada cristãos. Amar não é ser “bonzinho”. Amar não é distribuir apenas cestas básicas e nem ensinar a ler e a escrever os analfabetos. Estas são coisas importantes, mas sombras do amor verdadeiro. Por que de que adianta encher o estômago de alguém se não lhe der antes o bem absoluto? De que adianta ensinar a ler e escrever se não lhe der antes o próprio Cristo sacramentado na Eucaristia? Sem Deus na alma, poderão ser pessoas alfabetizadas e de estômago cheio no inferno. Amar não é ser a favor do ecumenismo, e muito menos respeitar os erros dos hereges, mas ao contrário, amar é convertê-los para que possam ir para o céu. Este é o maior amor que existe: desejar o céu para uma pessoa. E fora da Igreja Católica ninguém vai para o céu!
Amar é querer o bem. O bem absoluto! Amar é falar a verdade, que é Cristo, para que a pessoa conheça a Deus, se arrependa de seus pecados e vá para o Céu.
Não existe caridade mais elevada do que pregar a fé verdadeira, que consiste em aderirmos as coisas reveladas por Deus e ensinadas pela Sua Igreja! Una Santa, Católica e Apostólica Igreja, principalmente se isto exigir dar a vida pelo próximo.
In corde Iesu et Mariae. Semper!
Sandro Pelegrineti de Pontes
Sandroppontes@yahoo.com.br