Re: saramago e a bíblia, um debate fundamental
Escrito por:
Rui Vieira (IP registado)
Data: 08 de January de 2010 18:45
Não há dúvida que falar sobre um texto bíblico, sem ter os minimos conhecimentos de exegese, acaba por dar barraca, afirmações insensatas, como é o caso do herege Saramago,
Afinal, o que é que temos em Gn 4,1-16?
Temos um mito. temos uma história, passada de geração em geração, e colocada por escrito já na altura do exílio, pela redação Javista, ou Fonte Javista.
Porquê este Abel que é morto porque a sua oferta agradou ao SENHOR? Porquê este caim, que é apresentado como um personagem mau, e que dá origem a uma descendencia má?
Estamos realmente perante uma saga. Uma saga, uma história que é usada para explicar a situação actual, no momento da redação do texto. Primariamente podemos dizer que o autor deste texto de Gn cria este personagem caim para explicar a origem dos caimitas, povo que foi expulso da palestina aquando da chegada dos hebreus. Para o judeu, tudo tem a sua razão de ser em Deus, de forma directa ou indirecta. O autor pretende mostrar que, por detrás da derrota dos caimitas, está este antepassado caim, que pecou. Literalmente, uma saga. Uma explicação mitica que pretende justificar um aconteciento, uma vicissitude.
E Abel? É vitima porque oferece primogénitos do seu rebanho, o que agradou a Deus, em vez dos frutos da terra ofertados por Caim.
Que dizer?
Quando este texto foi escrito, há muito tempo que os judeus ofereciam os primogénitos do rebanho para o sacrificio no templo. Estamos perante uma história, que para além de ser uma saga para explicar a origem dos caimitas, pretende fazer uma ressalva ao culto judaico, e às normas para o sacrificio.
Escusado seja dizer que nada disto é histórico. O Génesis só começa a ter realmente dados históricos a partir de Abrão. Antes disso temos mitos, lendas, sagas. O que, aliás, não tira valor algum ao texto, enquanto inspirado. Pode tirar é uma falsa concepção de inspiração. A inerrãncia da Escritura diz respeito à verdade religiosa, e não à verdade histórica.
Obviamente que Saramago fala mal. E fala mal porque não sabe sequer o que diz. Quando diz que a Bíblia é um manacial de maus exemplos, ele não sabe que a Revelação é progressiva, do menos perfeito, para o mais perfeito. Repare-se que ser imperfeito não é o mesmo que ser mau. É apenas ser menos bom. Ora, a Revelação faz-se justamente das imperfeições, para o mais perfeito, sempre dentro das capacidades culturais e históricas, bem como dos modos de pensar e sentir do Povo onde decorre esta Revelação.