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Bispo abandonado pelo Vaticano
2001-09-02 12:02:57

Para quando um terceira diocese em Timor?
Já está planeada. Em princípio ficará situada na zona sul, apanhando quatro concelhos dos nove que tem a diocese de Díli.


Fizemos, inclusive, o levantamento sociológico da região. O processo está por enquanto parado até à proclamação da independência. Por outro lado, os partidos durante a campanha falaram muito na criação de novas províncias. Vamos aguardar mais um pouco para avançarmos depois de estar politicamente tudo definido pela Assembleia Constituinte. As circunscrições eclesiásticas deverão seguir as áreas das províncias.
O bispo da nova diocese será de Timor?
Será com certeza um timorense. Tudo depende da Santa Sé.

Uma terceira diocese já permite a constituição de uma conferência episcopal...
Desde 1983 que tenho vindo a pedir isso à Santa Sé. Agora há razões objectivas para que aconteça. Nós somos independentes da indonésia e, embora religiosamente nos sintamos unidos, Timor tem uma realidade pastoral específica.

Quando se sentava nas reuniões da conferência episcopal em Jacarta, entre bispos indonésios, sentia-se um estranho?
Não, porque eu também me preocupava com os problemas pastorais de lá. Mas havia sempre uma pressão muito grande para que eu declarasse que a integração era o único caminho. E era isso que os bispos e os leigos de lá esperavam.

Custava-lhe essa pressão?
Uma vez um bispo pediu para que eu falasse menos na comunicação social porque o Governo, depois, ia solicitar-lhes que me tentassem controlar. Eu disse-lhe: "Olhe senhor bispo, eu falo alto porque ainda sou novo; quando for velho assim como o senhor talvez fale mais baixo." Todos as anos me avisavam para comparecer nas reuniões, mas geralmente arranjava motivos para não ir.

Sentia falta de apoio por parte dos bispos indonésios?
O apoio que me davam era este: pediam-me para falar menos na comunicação social e diziam-me para aceitar que o melhor caminho para Timor era a integração.

Nunca cedeu?
Nunca.

Propôs alguma vez integrar-se numa outra estrutura eclesiástica que não a Conferência Episcopal indonésia?
Propus por escrito à Santa Sé, em 1990 e em 1995, que Timor, tal como Macau e o Nepal, fizesse parte da Federação dos Bispos da Ásia. Até hoje não recebi uma resposta. Macau é, Hong Kong é, como observador, o Nepal também é. Por que razão Timor não pode ser?

Nos anos de ditadura indonésia, sentia-se apoiado pelo Vaticano?
Pelo Santo Padre, sim. A Santa Sé ficava-se sempre por uma posição diplomática. Mesmo quando recebi o Prémio Nobel, nem uma palavra disseram sobre o assunto.

Sentiu-se alguma vez abandonado pela chefia eclesial?
Nós somos homens e por vezes precisamos que nos animem. Mas não há palavras de conforto. Nem sequer uma cartinha a dizerem que souberam desta ou daquela destruição... Só mesmo a fé nos dá forças e nos conforta.

Que é feito da comunhão eclesial?
Isso é muito bonito, mas às vezes sinto mais apoio de um bispo protestante do que de três ou quatro mil bispos católicos.

Quando é que a Santa Sé o nomeia bispo titular, já que por agora é somente administrador apostólico?
Que venha outro mais novo assumir isto como bispo residencial. Para mim já chega. Já sou administrador apostólico desde 1983, quando canonicamente está previsto que essa figura seja apenas aplicada em situações transitórias de quatro ou cinco anos. Por isso, tudo depende da Santa Sé. Vamos ver depois da independência.

O facto de ser administrador apostólico limitou a sua acção?
Trabalhei sempre tal como se fosse bispo residencial. Não limita em nada. Abri paróquias, criei o seminário maior, quando isso não é da competência de um administrador apostólico. A mim, apenas me dizem que fale menos aos jornais, que tenha mais prudência.

"OS BISPOS PORTUGUESES ESTÃO MUITO ZANGADOS"

A Igreja de Díli precisa de missionários?
Claro. Eu apelo aos senhores bispos portugueses e às ordens religiosas para que invistam cá. Já temos missionários verbitas, claretianos, franciscanos e jesuítas. Por que é que estes não mandam mais um padre? Queixam-se de que a língua portuguesa não vai para a frente. As congregações podiam enviar gente para ficar nas comunidades a gerir as escolas e a ensinar o português.

Trata-se de um apoio urgente?
Sim, mas os bispos portugueses estão muito zangados comigo. Dizem que falo mais para a imprensa do que para eles. Mas a realidade é essa. No ano passado o seminário maior andou a marcar passo por falta de professores.

Receia perder fiéis com os novos tempos em Timor?
Não. Nós orientamo-nos sempre por convicções. Até aqui tem havido muita adesão por causa da circunstância, e eu sempre dizia a Deus e a mim próprio que melhor é a qualidade. Poucos, mas bons, do que muitos e depois não frequentam. Não nos vamos sentir aflitos por causa disso. O mais importante é que a fé seja verdadeira, que vão à Igreja por convicção.

Como vai a Igreja de Díli reagir?
Temos que formar as pessoas. No ano passado a atenção foi concentrada na juventude. O próximo ano será dedicado à criança. No terceiro ano será para os adultos - o apostolado dos leigos. Em Junho de 2002 teremos uma espécie de assembleia diocesana, com a presença de padres religiosos e 66 leigos para programarmos o trabalho pastoral para um período de dez anos. Temos que pensar no que poderemos fazer num país novo.

Os leigos estão receptivos para colaborar mais activamente nas comunidades?
No tempo dos indonésios já tínhamos organizado dois congressos de leigos. No ano passado organizamos o terceiro. Leigo para mim não é somente o catequista ou o ministro da comunhão. É também o que está na política, na indústria, no comércio, com o espírito cristão.

É preciso mudar mentalidades?
Sim. A massa é um pouco apática, habituada a concentrar tudo nas mãos dos padres e das freiras. Temos que começar com a juventude e com as famílias para promover uma maior participação na vida da Igreja.

A Igreja continua a ser acusada de se meter na política?
Continua, continua, e isso está a confundir um pouco as pessoas. Ainda no domingo passado tive reuniões numa paróquia e perguntaram-me se sendo católicos podiam trabalhar para o Estado. Eu respondi: "Se és bom católico deves também trabalhar para o Estado; se trabalhas no Estado, e és bom católico, deves também colaborar na paróquia." Estado é Estado e Igreja é Igreja. Sendo cidadãos das duas realidades, temos que participar.

Como poderão ser as relações Igreja e Estado na nova realidade timorense?
Vamos ver. Temos que esperar. Uma coisa é certa, a maioria das população é católica. Por isso a Assembleia Constituinte, o futuro Estado, que será laico, deverá ter em conta a realidade sociológica.

Receia que o texto final da Constituição surja influenciado por alguma ideologia partidária?
Vamos ver. Poderá haver pressões para isso, mas os que estão na Assembleia Constituinte saberão que a massa é religiosa, um pouco conservadora. Portanto, terão que ter isso em conta.

Vai propor assinatura de uma concordata entre a Santa Sé e o Estado de Timor?
Penso que vai ser necessária a assinatura de um acordo entre ambas as partes. Depois se verá que tipo de documento jurídico melhor se adapta à realidade timorense.

Fonte DN

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