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Comentário: E a prudência?
2011-05-03 10:17:10

As grandes figuras do cristianismo - das quais muitas passaram à história como santos - foram, em toda a sua vida, grandes rostos da humanidade: foram pessoas de corpo inteiro - nas suas grandezas e nos seus limites, na sua coerência e nas suas circunstâncias. Tal como João Paulo II.

Ao longo dos 26 anos e meio do seu pontificado, foi evidente o compromisso do papa Wojtyla com grandes valores: a defesa da paz, o diálogo inter-religioso, o combate contra a pobreza, os apelos a um mundo com a riqueza mais distribuída. Foi ele que, na véspera da invasão do Iraque pelos EUA, afirmou que a guerra é sempre "uma derrota da humanidade". Foi ele que pediu o perdão da dívida externa que asfixiava os povos do Terceiro Mundo. Foi ainda ele que, em Jerusalém, apaziguou séculos de inimizades em relação aos judeus. Entre muitos outros gestos.

Mas uma herança nunca é unívoca. Os grandes santos do catolicismo dizem sempre que são também grandes pecadores. Porque reconhecem os limites da sua fragilidade. Porque se revêem inteiros na sua humanidade. Tal como João Paulo II.

O papa Wojtyla foi também o homem que fez sofrer mais de uma centena de teólogos, porque estes apenas queriam falar da sua fé de modo diferente da instituição eclesiástica. Foi ele também que fechou a possibilidade de a Igreja ter uma moral mais propositiva e menos proibitiva. Foi ele ainda que teve gestos de alguma complacência para com um ditador como Pinochet ou para com um pederasta como o padre Maciel e, ao contrário, se preocupou com os "desvios" doutrinais dos que queriam fazer do cristianismo um compromisso de libertação.

Tudo isso faz parte da herança de Wojtyla - que, acima de tudo, deixou um testamento complexo e poliédrico; que mereceria, por isso, que a História assentasse e fizesse o seu julgamento.

A Igreja Católica costuma falar da virtude da prudência. Na "discreta celeridade" do processo de João Paulo II, a prudência não terá sido a virtude dominante. Porque não é uma rápida beatificação ou canonização que tornam maior um gigante de humanidade. Como foi, em muitos aspectos, Karol Wojtyla.

António Marujo

Fonte Público

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