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Sida e violência na agenda africana do Papa "eurocêntrico"
2009-03-17 22:39:15

Fome, doenças, violência, guerras civis, corrupção, sida e doenças. Mas também as "mil diferenças" de um continente e o caminho para o desenvolvimento, bem como a necessidade de os africanos tomarem em mãos o seu destino. O Papa Bento XVI, que já foi chamado de "eurocêntrico", incluirá na agenda da sua primeira viagem a África, que hoje começa, todos aqueles temas - tirando referências concretas, o Papa quase não falou de África.

Com este primeiro périplo africano (é a 11.ª viagem deste Papa), Bento XVI parece seguir finalmente a intuição do seu antecessor, João Paulo II, no sentido de que o mundo não relegasse África para o "apêndice". A visita acaba por homenagear um país onde a convivência entre cristãos e muçulmanos é exemplar (Camarões) e outro onde começou a moderna evangelização do continente, há 500 anos (Angola).

Em pano de fundo está a vasta África, que Bento XVI quer "abraçar", como o próprio afirmou domingo.

Durante quase uma semana, o Papa quer falar das "vítimas da fome, das doenças, das injustiças, dos conflitos fratricidas e de qualquer forma de violência" que continua a atingir todos, incluindo religiosos.

Na sua intervenção de domingo, Bento XVI disse, citado pela Ecclesia, que irá falar também das "mil diferenças" do continente e da sua "profunda alma religiosa". E ainda dos "graves problemas, feridas dolorosas e enormes potencialidades".

Há outro objectivo eclesial para Bento XVI ir a África pela primeira vez: em Yaoundé, Camarões, o Papa entregará na quinta-feira, a bispos de 52 países africanos, o Instrumento de Trabalho, documento preparatório do Sínodo dos Bispos sobre África. Em Outubro, em Roma, terá como tema A Igreja em África ao serviço da reconciliação, da justiça e da paz.

O Papa Ratzinger referiu ainda a sua ida a Angola: "Um país que, depois de uma longa guerra interna, reencontrou a paz e agora é chamado a reconstruir-se na justiça", explicou. E disse que só o Evangelho pode "renovar também a África, porque gera uma irresistível força de paz e de reconciliação profunda e radical".

Já na semana passada, ao apresentar a viagem, o porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, referira que esta será uma oportunidade de o Papa apelar à justiça e à reconciliação num continente atravessado por conflitos mortíferos. No dia 20, perante diplomatas acreditados em Luanda, o Papa deverá referir-se às responsabilidades da comunidade internacional em África. Desde 1990, 20 países africanos envolveram-se em conflitos e o Papa deverá pedir que acabe o tráfico de armas.

Etapas importantes do programa serão ainda encontros com grupos de solidariedade, jovens (sábado, no Estádio dos Coqueiros), mulheres (com os grupos católicos de apoio à promoção da mulher) e representantes de outras religiões. Num centro de saúde em Yaoundé, o Papa deverá encontrar-se com doentes, muitos deles de sida - a doença matou mais de 25 milhões de pessoas, a maior parte delas na África subsariana. Mais de 22 milhões são portadores do HIV na mesma região.

Apesar da oposição oficial da Igreja ao preservativo, muitos padres e freiras distribuem o profiláctico aos portadores de HIV. E a Organização Mundial de Saúde publicou recentemente um relatório, segundo o qual pelo menos 30 por cento das infra-estruturas de saúde em África estão ligadas a instituições religiosas e 27 por cento dos centros de tratamento de sida estão ligados à Igreja Católica. O Vaticano tem insistido no acesso dos mais pobres aos medicamentos.

Nos Camarões, o Papa alemão, que já enfureceu a rua de vários países muçulmanos com o seu discurso de Ratisbona, pode apreciar o clima de convivência entre islão, protestantes e católicos. O país tem 40 por cento de cristãos e 20 por cento de muçulmanos, número em crescimento - numa população de 18,5 milhões.

Citado pela AFP, o imã Ibrahim Moubarak Mbombo, responsável da União Islâmica dos Camarões (UIC), diz que há interajuda mútua entre cristãos e muçulmanos. "Quando os cristãos desfavorecidos se nos dirigem, nós assistimo-los." E já houve um mecenas cristão que apoiou a construção de uma mesquita numa zona onde os muçulmanos não tinham lugar de oração.

O sociólogo católico camaronês Pierre Titi Nwel, citado também pela AFP, diz que os crentes das diferentes confissões juntam-se para trabalhar temas como " a luta contra a corrupção ou as violências sobre as mulheres", tentando encontrar soluções. Uma campanha conjunta contra a corrupção decorreu já em 2001, no país, fruto dessa colaboração.

Nem tudo é cor-de-rosa no panorama das mudanças religiosas que se estão a verificar no continente, outra das preocupações de Bento XVI: os novos movimentos religiosos estão em crescimento, o islão é agressivo em vários países e está também em crescimento. Apesar disso, o número de católicos aumentou três por cento em 2007, tendo-se mantido estável no resto do planeta.

No primeiro documento preparatório do Sínodo dos Bispos, colocava-se o acento na necessidade de os africanos "assumirem as suas próprias responsabilidades" sem tudo esperar do Ocidente. O Papa europeu pedirá, a partir de hoje, que assim seja.

AM

Fonte Público

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