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A Bíblia Dia e Noite prossegue em Roma e na internet
2008-10-10 09:30:56

Sucedem-se e alternam-se as vozes, os timbres, os ritmos, como numa paleta de cores, de clamores. Há poucos instantes, escutava-se o livro do profeta Jeremias, no capítulo 26: “Jeremias, porém, respondeu aos príncipes e ao povo: 'Foi o Senhor que me enviou a profetizar contra este templo e contra esta cidade os oráculos que ouvistes. Reformai, portanto, a vossa vida e as vossas obras, ouvi a palavra do Senhor, vosso Deus, e o Senhor afastará de vós o mal com que vos ameaça. Quanto a mim, entrego-me nas vossas mãos. Fazei de mim o que quiserdes e o que melhor vos parecer.'"


A leitura da Bíblia em directo na televisão italiana, iniciada no domingo ao fim da tarde pelo Papa Bento XVI, prossegue na Basílica de Santa Cruz de Jerusalém, em Roma. Os leitores revezam-se no pequeno ambão colocado no centro do templo, sobre o qual está uma Bíblia de altar. Com intervalos de cerca de hora e meia, vários artistas executam peças de música sacra antiga e contemporânea. “Dirige os meus passos”, peça de gospel, foi cantada por volta da uma e meia da tarde.

Um profundo exercício de escuta e atenção. Sem qualquer comentário, a leitura é apenas ritmada pela mudança dos leitores, entre cada capítulo. Por detrás, um ecrã projecta, de vez em quando, algumas imagens ou curtas legendas. “Esperança perante as catástrofes”, dizia o cenário, quando o leitor recitava: “Vou quebrar o jugo do rei da Babilónia! Dentro de dois anos, farei voltar a este lugar todos os objectos do templo do Senhor, que Nabucodonosor, rei da Babilónia, levou daqui e transportou para a Babilónia.”

Iniciativa para todos

Entre a assistência, há várias religiosas (entre as quais várias Missionárias da Caridade, congregação fundada por Madre Teresa de Calcutá, identificadas pelo hábito branco debruado a azul. Mas também jovens, gente anónima, várias pessoas de pé que enchem a basílica, situada perto da de São João de Latrão.

Prevista para durar até sábado, “A Bíblia Dia e Noite” percorrerá ainda vários livros proféticos do Antigo Testamento, antes de entrar nos evangelhos cristãos. Quando chegar ao fim, terão sido 140 horas sem interrupção, protagonizadas por mais de 1200 leitores, incluindo judeus, muçulmanos e não-crentes. O cardeal Tarcísio Bertone, secretário de Estado do Vaticano, lerá o último capítulo do Apocalipse, último livro da Bíblia cristã.

José Tolentino Mendonça escreve (A Leitura Infinita, ed. Assírio & Alvim), a propósito das interpretações estéticas da Bíblia: “Podemos justamente interrogar a natureza de todas estas releituras da simbólica bíblica. Não estará simplesmente, para usar uma expressão de Paul Claudel, a considerar-se a Bíblia ‘um imenso vocabulário’, uma espécie de mina de recursos plásticos e semânticos, disponível para uso público?”

O biblista, que fixou o texto da primeira tradução integral da Bíblia em português (A Bíblia Ilustrada, ed. Assírio & Alvim), acrescenta: “É importante pensarmos que o precioso património, cristão e laico, que constitui a recepção estética da Palavra Bíblica assinala uma procura que nada tem de rarefeito, mas se confunde com a maior das procuras, aquela que acende uma palavra, uma evidência ou um silêncio capaz de resgatar a existência.”. Como escrevia Vitorino Nemésio no poema “De Profundis”:

“Sim, daqui, deste abismo trivial

A que só as palavras dão fundura,

A ti clamo.”

Por António Marujo

Fonte Público

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