paroquias.org
 

Notícias






“O valor de uma pessoa não depende dos outros” - Entrevista à teóloga Jutta Burggraf
2006-07-11 22:37:52

A teóloga alemã Jutta Burggraf recorda que o valor de cada pessoa não depende da aceitação ou rejeição dos outros. Explica-o no seu novo livro “Liberdade vivida com a força da Fé” editado em Madrid pela Rialp.

Jutta Burgraf é professora de teologia dogmática na Faculdade de Teologia da Universidade de Navarra e tem escrito sobre o feminismo, ecumenismo e Santa Teresa d’Ávila.

- O seu livro intitula-se “Liberdade vivida”. Há liberdades não vividas?

Jutta Burggraf: Todos nós, homens, nascemos únicos, mas, às vezes, limitamo-nos a ser apenas cópias. Nessas circunstâncias, não correspondemos ao chamamento pessoal e único que recebemos ao entrar no mundo. «Sê tu mesmo. Sê como Deus te sonhou desde sempre».

Cada homem pode oferecer muitas surpresas, ter pensamentos novos, soluções originais, actuações únicas. É capaz de viver a sua própria vida e de ser fonte de inspiração e apoio para os outros.

Se uma pessoa não utiliza as suas pernas para caminhar, consideramo-la estranha ou provavelmente doente; mas se não usa o seu entendimento para pensar, nem a vontade para decidir, quase não damos conta do estado perigoso em que se encontra, porque estamos habituados a não viver à altura das nossas melhores possibilidades; com frequência, não utilizamos a capacidade mais rica e profunda que temos, a nossa liberdade.

Com efeito, ninguém deve converter-se num autómato, sem rosto nem originalidade. Às vezes convém recordar o olhar da criança para nos abrirmos à própria novidade e a cada pessoa e, assim, descobrir o desafio que encerra cada situação. O mundo será o que nós fizermos dele ou, pelo menos, a nossa vida será o que fizermos dela.


- Quando alude ao mundo «subtilmente tiranizante» em que nos coube viver, a que se refere concretamente?

J B: Nas nossas sociedades há «correntes douradas». Reina a tirania das massas e dos costumes. Não é difícil descobrir uma poderosa corrente colectivista que tende a despojar-nos do mais recôndito do nosso ser, com a finalidade de igualar e massificar os homens, senão todos, pelo menos os que pertencem a determinado partido, a uma associação concreta, a uma comunidade, a um site ou a um clube de golfe.

Está na moda cantar em uníssono, vestir-se com a mesma roupa, recorrer aos mesmos argumentos pré-fabricados, com as mesmas palavras, o mesmo olhar e, inclusive, o mesmo sorriso.

Há pessoas que nem se dão conta das correntes a que estão amarrados. Acomodam-se ao espírito que lhes parece óbvio. Mas o que elas sentem, pensam ou dizem não é coisa sua; são os sentimentos, pensamentos e frases feitas que foram publicadas em milhares de jornais e revistas, na rádio, na televisão e na Internet. Se alguém começa a pensar e a actuar por conta própria e mantém uma opinião divergente da geralmente aceite pelo «sistema» – que se voltou a fechar e não admite nada que seja incómodo – é simplesmente rejeitada.

No entanto, somos livres, apesar das circunstâncias adversas que nos podem rodear e influenciar. E não só temos o direito, mas também o dever de exercer a nossa liberdade.

Precisamente hoje, é mais necessário do que nunca tomar consciência da grande riqueza da nossa vida e procurar caminhos para chegar a ser «mais» homens e não pessoas desanimadas, assustadas e tristes.


- Como se aprende a ser livre? Qual é o primeiro passo?

JB: Ao crescer, o homem descobre, gradualmente, que tem um espaço interior, no qual está, de algum modo, à disposição de si próprio. Percebe que, essencialmente, não depende nem dos pais, nem dos professores, nem do colégio; não depende dos meios de comunicação, nem tão pouco da opinião pública. Experimenta um espaço no qual está a sós consigo próprio, em que é livre. Descobre o seu mundo interior, a sua intimidade.

A própria intimidade é o que só a pessoa conhece, é o «santuário» do humano. Posso entrar dentro de mim e aí ninguém me pode enredar.

Quando «estou comigo», facilmente percebo quão desnecessário e, inclusive, ridículo é procurar a confirmação e o aplauso dos outros. O valor de uma pessoa não depende dos outros. Não depende dos aplausos ou gestos de confirmação que possa receber ou não.

Somos mais do que o que vivemos no exterior. Há um espaço em nós ao qual os outros não têm acesso. É a nossa «pátria interior», um espaço de silêncio e quietude. Enquanto não o descobrirmos, viveremos de um modo superficial e confuso, procurando consolo onde o não há – no mundo exterior.

O homem é livre quando mora na sua própria casa. Infelizmente, há muitas pessoas que não «estão consigo» mas sempre com os outros. Não sabem descansar em si mesmas.


- Afirma no seu livro que obedecer a Deus é fonte de liberdade. O que pretende dizer com isso?

JB: O próprio Deus, a fonte de toda a vida, quer habitar cada vez mais profundamente em nós. A partir do nosso núcleo mais íntimo, quer dar-nos a vida em abundância de uma forma ou de outra; cada homem está chamado a reviver o drama experimentado por Santo Agostinho. «Tu estavas dentro de mim e eu fora. E eu procurava-Te fora de mim».

Deus pede-nos um mínimo de abertura, de disponibilidade e de acolhimento para a Sua graça «Se escutardes hoje a Sua voz, não endureçais os vossos corações». Para encontrar Deus dentro de nós, é preciso, misteriosamente, «abrir-Lhe as portas» da nossa casa. Por outras palavras, neste espaço íntimo do silêncio e da quietude que há em mim, onde ninguém pode entrar senão eu, não quero estar só. Convido Deus para entrar, a estar comigo e a conduzir a minha vida. Então a minha autodeterminação consiste em fazer o que Ele me disser.

Quando Deus habita em mim eu gosto de «estar comigo» e «entrar na própria casa». Nunca estarei só, mas acompanhado e protegido por Quem mais me ama. Não é necessário que eu mesmo resolva os pequenos e grandes problemas de cada dia. A vida cristã é uma vida estritamente dialogante.

Obediência quer dizer, na sua origem, que Cristo nos governa, é Ele o timoneiro da nossa barca. Não se sobrepõe às nossas acções; está no próprio núcleo da liberdade. É o que nos diz o Evangelista «Vede que o reino de Deus se encontra dentro de vós» (Lucas 17, 20)

http://www.opusdei.pt/art.php?p=17682

Fonte Opus Dei

voltar

Enviar a um amigo

Imprimir notícia