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As coincidências de Karl Marx com a Bíblia
2005-09-12 09:00:54

Karl Marx não fez mais, em algumas das sua análises económicas, do que repetir afirmações bíblicas, nomeadamente sobre a situação das camadas mais pobres, defendeu ontem o filósofo político Enrique Dussel, mexicano, durante uma das sessões do congresso Deus no século XXI e o futuro do cristianismo.

Perante uma plateia que, no final, se manifestou entusiasmada com a sua intervenção, Dussel fez um percurso histórico pelo processo da globalização, afirmando que os descobrimentos foram um reconhecimento das descobertas antes feitas pelos chineses. O filósofo condenou ainda o eurocentrismo do pensamento dominante e defendeu que as primeiras críticas à modernidade foram feitas por vários membros da Igreja - entre os quais, o frade dominicano Bartolomeu de las Casas.
Entre a vasta obra e a meia centena de livros que já publicou, Dussel escreveu um comentário às quatro redacções de O Capital, a obra principal de Marx, bem como uma História da Igreja na América Latina e uma Ética da libertação na idade da globalização e da exclusão. "Figura de renome mundial", foi como Anselmo Borges, organizador do congresso, se lhe referiu.

O filósofo que já foi
carpinteiro
Entre 1959 e 1961, o filósofo esteve em Belém, na Terra Santa, a trabalhar como carpinteiro. Nascido na Argentina há 70 anos, Dussel sofreu, em 1973, um atentado à bomba, no período da ditadura militar. Exilou-se no México, acabando por se naturalizar. Foi também professor de Oscar Romero, o bispo de El Salvador assassinado há 25 anos, e de vários teólogos da libertação, a corrente que defende uma intervenção da Igreja a partir dos mais desfavorecidos.
Com uma intervenção situada entre a filosofia, a política, a teologia e a economia, Enrique Dussel recordou que, em 1421, o centro do mundo estava na China, então com 150 milhões de pessoas (60 milhões na Europa): a economia, o papel, a indústria da porcelana, tudo vinha de lá. O mundo muçulmano estendia-se entretanto da Península Ibérica às Filipinas e a Europa era "periférica".
Por isso, hoje, volta a ser preciso de novo ter atenção ao gigante asiático, diria ao PÚBLICO, referindo-se não só às questões económicas como também à vasta cultura chinesa.

"Quem não paga o justo salário é um homicida"
O filósofo cita depois uma passagem do livro bíblico do Eclesiástico: "O pão dos indigentes é a vida dos pobres; quem o tira é um homicida, quem não paga o justo salário é um homicida." Foi este texto que, lido por Bartolomeu de las Casas, o converteu num defensor dos índios, contra o invasor espanhol.
Seria influenciado também por textos como este que Karl Marx escreveria várias das suas obras, disse Dussel. "O Eclesiástico e Marx coincidiam", mas os cristãos estavam rendidos ao fetichismo do capital, afirmou.
O problema actual, entretanto, é que a Europa se constituiu no centro do mundo e "fez do resto do mundo as periferias". Exploração e domínio são palavras usadas por Dussel para definir a relação que a Europa e os Estados Unidos mantêm com o resto do mundo.
Há como que um sacrifício humano aos ídolos, diz o filósofo. Partindo das expressões judaicas para trabalhar a terra (que significa produzir ou fazer um serviço) e para ser humano (carne e sangue), Dussel diz que os dominadores, tal como os conquistadores do século XV, exploram os que trabalham a terra, oferecendo-os no altar do capital.

António Marujo

Fonte Público

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