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A catequese do cardeal Meisner aos jovens II parte - «Buscar a verdade como sentido profundo da existência humana»
2005-08-18 22:59:11

Esta é a segunda parte da catequese que dirigiu o cardeal Joachim Meisner, arcebispo de Colónia, na Pista de Helicóptero (Eissporthalle) de Neuss sobre o tema: «Buscar a verdade como sentido profundo da existência humana».

5. No silêncio nos encaminhamos para nosso interior. Como rezavam nossas instruções para meditar: “Senta-te em silêncio! Junta as mãos! Fecha os olhos! Inclina a cabeça! Dirige tua consciência da cabeça ao coração!” Temos que regressar a esse ponto que constitui o núcleo de nossa existência. Esse é meu Eu a imagem de Deus, um Eu que se faz patente nos anseios de minha vida mais profunda. E disto é do que se trata aqui: de por de manifesto nossos anseios. Deixai-me que vos demonstre com alguns exemplos:

Há algumas décadas cruzei com um homem inteligente mas completamente incrédulo. Este homem me confessou abertamente e com toda sinceridade que o que não entendia de mim a quem também atribuía certa capacidade intelectual era como podia crer em Deus. Tentei então que obtivesse acesso a seu próprio Eu fazendo-lhe duas perguntas. Minha primeira pergunta foi: “Quer ser mal? Tão mal que os demais digam que não vale um centavo e que é mais mal que o demónio?”. Respondeu-me que por nada do mundo quisera ser assim. Insisti: “Mas todo efeito tem uma causa. E se você não quer ser mal, qual é o motivo de que não o queira ser?” Respondeu-me que nunca se havia proposto esta questão e que tampouco me podia explicar porque era assim. E por sua vez me perguntou se acaso eu o sabia. Respondi-lhe: “Eu sei sim”. E quando me perguntou se estava disposto a compartilhar com ele meus conhecimentos afirmei: “Supostamente que sim! O caso é que não somos exemplares originais, não somos protótipos, mas reproduções. Nosso modelo é o próprio Deus. Nós somos sua imagem. E como Deus sendo meu modelo é o bem mais valioso, eu como seu reflexo não posso querer ser mal. Ainda quando às vezes o seja. É como no caso de uma vela posta ao contrario. A chama não se põe ao contrario. Segue ardendo e brilhando para cima. Como quer que a gire ou lhe dê a volta a vela, a chama nunca arderá para baixo, mas sempre para cima. O mesmo ocorre com os seres humanos: o ser humano não pode querer ser mal, inclusive sendo-o as vezes, porque sua imagem original, seu núcleo mais profundo é a imagem de Deus. E este Deus é o bem supremo. E se às vezes não somos bons e nos surpreendem fazendo algo mal, em nosso interior se revela a imagem de Deus que marcou. E isto se reflecte corporalmente, porque começamos a suar ou ficamos vermelhos. Como meu Eu mais profundo como reflexo de Deus continua tendo o modelo original como referência, e este Deus é o bem supremo, não posso querer ser mal, para isso teria que me arrancar a própria pele”.

E minha segunda pergunta foi muito similar: “Quer que ninguém lhe ame?” A esta pergunta contestou o ateu: “Isso seria o inferno”. Precisamente esta é a definição teológica do que é o inferno. Mas como é que um ateu sem instrução na fé nem educação religiosa conhece a natureza do inferno? Qual é, pois, a causa do efeito na vida de toda pessoa de não querer ser uma pessoa? --A causa reside no fato de que somos imagem de Deus, porque Deus como um modelo de mim mesmo, como meu arquitecto, é o amor em pessoa. Quem declara de si mesmo: “Com amor eterno te amei” (Jer 31,3), não pode querer que o reflexo de si mesmo não seja querido. Isto simplesmente não é possível. Temos que passar da superfície para a profundidade de nossa vida. É como no caso de um rio. Os que querem degustar a qualidade da água do Reno não deverão fazê-lo aqui na margem do Reno, mas deverá peregrinar rio acima, ou seja nadar contra a corrente até sua nascente. Ali se pode saborear a água do Reno. Mas, como é sabido, os peixes mortos só nadam com a corrente. “Unicamente os peixes vivos e sãos podem nadar contra a corrente.”.

Temos que voltar à origem, a nosso modelo, a Deus que é o amor. A quem encontro na origem de minha vida? A Deus, ao Deus vivo. Criador de milhões de vias lácteas. Diz a seu povo Israel: “Com amor eterno te amei: por isso reservei graça para ti”. Isto não vale somente para o povo de Israel, mas também para mim pessoalmente! E uma e outra vez, o povo de Israel não pode crer que Deus o ame precisamente a ele, que tradicionalmente tem mais inimigos que membros, tal e como hoje em dia o povo de Deus. Em muitas ocasiões teve mais inimigos que amigos. E Deus elegeu a este povo e diz: “Somente quero a ti”. No fundo, Deus quer unicamente o amor. Isto também fica bem marcado no Evangelho de São João: continuando a Criação através da palavra, ou seja Jesus Cristo, que se faz homem. A palavra se faz carne e, como palavra feita carne, põe sua morada entre nós, os homens, para amar-nos em pessoa e de forma palpável.

Os Padres da Igreja tinham ainda o valor de dizer: “Deus é a palavra eterna, se faz homem para que o homem seja como Deus”. A Criação é grandeza, beleza e verdade. E o amor é carinho que cobrou vida. Quanto carinho necessita uma criança para fazer-se adulto? E agora damos conta de que o amor de Deus vai além de todos os conceitos. Não pode expressar-se em medidas, como o Universo não pode expressar-se em números. O segredo de tudo é o amor tal e como Deus o define. Em João 21, Jesus pergunta à Pedro: “Amas-me?” E Pedro responde: “Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que eu te amo, ainda que eu sou o que te negou, que não tinha a força de manter-me firme e seguir-te fiel à hora da tentação”. O amor de Pedro seguia inquebrantável. Isto é muito importante. Jesus aceita o amor deste discípulo infiel de igual forma que o amor da pecadora Maria Madalena. O amor do discípulo para Jesus é um amor pobre, mas é um amor que apesar da infidelidade pode voltar a brotar e busca seu sentido, seu lugar e sua origem. E Jesus aceita este amor. Por isso, este só “Tu” é mútuo e se chama amor.

Em princípio, cada um encontra a Deus por si só. Assim, basicamente cada um vive só, morrerá só e terá que assumir a responsabilidade só. Os demais, inclusive as pessoas mais queridas, somente podem estar a meu lado e apoiar-me. Mas Deus ama a cada um de nós. Fez-se homem por cada um de nós. Está inclusive mais perto de cada um do que podemos estar perto de nós mesmos. Se Deus, o Criador de milhões de sistemas planetários é tão infinitamente grande, cada pessoa pode confiar em que uma parte infinitamente grande do amor de Deus pertence somente a ela. E isto nos une uns aos outros. Por isso diz Pedro: “Mas vós sois linhagem eleita, sacerdócio real” (I Ped 2,9). Com os Reis Magos nos une não somente a busca, mas também nossa origem. Como eles somos de origem real e possuímos dignidade real. O conceito que temos de nós mesmos não pode ser suficientemente alto.

6. Também os Reis Magos, motivados por esta inquietude interior, por seu anseio, que tem sua origem no mais profundo de sua natureza, sobem às torres de vigia para buscar no céu sinais do amor de Deus. E então encontraram a estrela. E começou a grande aventura. Foram, empreenderam o caminho, orientando-se pela estrela. E quando a estrela desapareceu a buscaram, perguntaram, buscaram de novo no céu até que a encontraram de novo e chegaram a seu destino.

A Jornada Mundial da Juventude de Colónia me convida em primeiro lugar a ouvir para perceber minha origem, para dar-me conta de onde a imagem de Deus marcou minha vida e de onde surge toda minha ânsia, inquietude e saudade do santo, do bom, do belo e, ao fim e ao cabo, de Deus. E vós, como jovens, ainda não estais tão distantes da mão criadora de Deus como nós os maiores. Por isso, ao sentir mais de perto a presença da mão criadora, buscais o puro, o bom e o belo com maior intensidade que nós, os adultos. E quando regressemos para casa experimentaremos o mesmo que os Reis Magos. Empreenderemos o caminho em companhia. Nosso objectivo será pôr em prática tudo o que experimentamos em Colónia. Estou convencido de que Deus tem para cada um de nós um plano concreto e singular que não pode delegar-se a outra pessoa. O êxito de nossa vida depende de se o reconhecemos e conseguimos colocá-lo em prática.

Todos temos uma só vida. Na vida, na fé e no amor não existe tempo isento de responsabilidade como na auto-escola na hora de aprender a dirigir. Não, na vida, a fé e o amor, a pessoa se converte imediatamente em um “condutor” responsável. Não existe a vida, a fé ou o amor de teste. Sempre vai sério, desde o primeiro momento.

Como sei o que Deus quer de mim? Recomendo a todos urgentemente que se confessem ou até mesmo façam uma confissão completa de sua vida nestes dias. Assim o fizeram muitos participantes nas diferentes Jornadas Mundiais da Juventude. Devemos libertar a alma e o coração de todo o pecado, de toda a sujeira e de todos os escombros acumulados durante o tempo para voltar a ter uma visão mais clara de nós. Na Jornada Mundial da Juventude, Deus quer que cada um de nós se dê conta de sua vocação, para que o mundo não tenha que esperar tanto tempo, até que tenha pessoas que sigam as marcas da Madre Teresa, de Edith Stein ou Maximiliano Kolbe.

Gostaria de assinalar alguns caminhos mais para chegar desde a superfície de nossa vida até a profundidade de nossa existência, até a origem onde podemos experimentar a imagem de Deus. É uma característica de nossa existência que não possamos saciar nossa fome de eternidade e de infinito. A mim aconteceu muitas vezes na vida: quando ansiava algo --quando, por exemplo, queria ter um quadro bonito-- e o conseguia com mais ou menos dificuldades, me fascinava durante 15 dias ou 4 semanas, mas depois deixava de ser interessante e começava a ansiar outros objectos. Mas depois de obter estes outros se repetia a mesma história: as coisas perdiam sua fascinação e meu anseio não havia sido satisfeito. Nossa ânsia neste mundo é insaciável. Faz-nos aspirar uma coisa após a outra. Como disse Santo Agostinho: “Inquieto estará nosso coração até que descanse em ti”. Então não teremos uma coisa qualquer, mas teremos a Ele, que significa tudo para nós.

Devido à limitação de nossa existência devemos nos dar conta de que o enfoque de nossa vida é Deus e não o homem. Experimento isto sempre que escuto uma obra musical muito conhecida e espero com ânsia uma parte determinada desta obra que logo se me escapa imediatamente. Quero pegá-la, mas não consigo. Esta obra musical me faz feliz e ao mesmo tempo me causa um sentimento doloroso. Quero tê-la muito presente, mas não é possível. Se me escapa. Este exemplo mostra a limitação de nossa existência terrena, que colide com a ânsia de nosso coração. A música é muito intensa , mas pouco extensiva. Um quadro, ao contrário, é muito extensivo, o tenho sempre presente, mas por sua vez é muito pouco intensivo.

Aqueles que viajam em 15 dias por toda Itália vêem muitíssimas coisas diferentes, mas com pouca intensidade. Os que ficam 14 dias na cidade italiana de Florença ainda que não vêem tantas coisas diferentes, experimentam tudo de maneira mais intensiva. Quanto maior seja a quantidade de experiências diferentes, tanto menor será o conteúdo. Não se podem conseguir ambas coisas de uma vez. E isto choca com minha ânsia de eternidade. E isto demonstra que fomos criados em base a outras dimensões que as dimensões dos seres humanos ou do mundo. As dimensões do mundo e do homem sempre lhe resultarão demasiado pequenas ao homem.

”Inquieto estará nosso coração até que descanse em ti.” --Para que viestes a Colónia?-- A resposta nos é dada no lema da Jornada Mundial da Juventude: “Viemos adora-lo”. É precisamente esta ânsia de uma vida grande e plena que nos faz sair à rua para buscar e encontrar, como os Reis Magos, o que é a origem e a meta final de nossa vida: a Deus, que é meu tudo, a Deus que faz minha vida grande.

Quando um atleta de salto de altura quer superar o recorde tem que superar-se a si mesmo. Quem tem fé aposta por algo mais alto que por si mesmo: enfoca sua vida para Deus. Uma vez superado o recorde, o saltador se alegrará se escuta a frase: “Superou-se”. Os que têm fé, superam-se a si mesmos. Estamos chamados a isto, tal e como Maria, que confessa no Magnificat: “Porque o Poderoso fez em mim grandes obras” (Lc 1,49). O Poderoso faz grandes obras por vós.

Cardeal Joachim Meisner
Arcebispo de Colónia

[Tradução realizada por Zenit]

Fonte Zenit

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