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O COLECCIONADOR DE SANTINHOS
2004-10-19 17:45:54

Não deve haver ninguém que nunca tenha recebido um santinho na vida. Na primeira comunhão, numa romaria ou ao visitar uma igreja ou uma capela. Mas há um homem, em Braga, que não tem aqueles dez ou vinte santinhos mais usuais, de Nossa Senhora de Fátima, do Coração de Jesus ou de Santo António. Avelino Costa, antigo administrador da Casa da Sorte, agora na reforma, tem a maior colecção de santinhos do País: para cima de 25 mil imagens diferentes.

“Sempre me fascinaram muito estas imagens de santos, de Cristo e muito particularmente as de Nossa Senhora. Por isso, ao longo da minha vida, nas inúmeras viagens que fiz pelo País e até pelo estrangeiro, juntei todas as que pude. Quando me reformei, comecei então a ordená-las e a catalogá-las, segundo diversas temáticas e por ordem alfabética”, disse à Domingo Magazine este ex-seminarista a quem pouco faltou para chegar a padre.

Só estampas de invocações a Nossa Senhora, este coleccionador tem mais de sete mil, todas diferentes, ordenadas em 19 álbuns.

“O tema da minha predilecção é a Virgem Maria. Percorri montes e vales, por este País fora, à procura das estampas das ‘senhoras’ veneradas nas mais diversas terras. Às vezes, chegava aos locais de devoção, santuários ou ermidas, e não havia estampas da padroeira. Na maioria desses casos, consegui convencer o pároco ou a comissão fabriqueira a fazer a impressão da imagem, em dois ou três tamanhos, lembrando-lhes que é sempre uma boa fonte de receita e ajuda ao alargamento do culto ao orago”, referiu.

Avelino Costa não se limita a juntar pagelas ou estampas de santos, Jesus Cristo, Nossa Senhora ou até das mais emblemáticas passagens bíblicas. Ele procura sempre saber a origem das devoções, o porquê dos nomes e até a razão de determinados cultos em diversos lugares.

AS MIL MÃES DE JESUS

A Nossa Senhora representada nas imagens é sempre a mesma. A Virgem Maria de Nazaré, filha de Santa Ana que, há 2004 anos, deu à Luz o Filho de Deus feito homem, numa gruta de Belém, na Galileia. Mas, com o passar dos anos e a generalização do culto, foi adoptando vários nomes. Em muitos casos foi baptizada em função das terras onde o culto se enraizava, como a Senhora de Fátima, a Senhora do Sameiro ou a Senhora da Abadia; noutros casos nomeava-se em função das graças que concedia a quem lhas solicitava, como Senhora do Amparo, Senhora do Leite, Senhora da Boa Viagem ou Senhora dos Remédios.

E nos muitos passos que deu para ‘construir’ esta colecção (que, como todas colecções, está inacabada), Avelino Costa encontrou coisas muito curiosas e interessantes do ponto de vista sociológico e da religiosidade dos povos.

“Eu andei quilómetros e quilómetros para encontrar o Mosteiro de Santa Maria de Cárquere, no concelho de Resende, porque um grande historiador, meu amigo, me contou que Egas Moniz tinha ali levado D. Afonso Henriques, ainda bebé, porque este nascera ‘entrevadinho’, para pedir a Nossa Senhora que o curasse. E, reza a história, que o nosso primeiro Rei saiu de lá curado. Ora eu não podia deixar de ter aquela imagem, que por sinal até é muito bonita”, referiu-nos, como exemplo, o coleccionador.

Mas há mais. Em algumas localidades da Beira Alta, como Mangualde ou Teixoso, é grande a devoção a Nossa Senhora dos Verdes – até a imagem tem tom esverdeado. É que, em meados do século XVII, houve uma invasão de gafanhotos que dizimou tudo o que era verde por aquelas terras. Ora as pessoas, como popularmente se diz, ‘apegaram-se’ com Nossa Senhora e a praga acabou. A partir daí aquelas gentes passaram a venerar Nossa Senhora dos Verdes.

E foram razões como esta que fizeram ‘nascer’ Nossa Senhora do Sorriso, Nossa Senhora do Leite, Nossa Senhora da Vista, Nossa Senhora das Febres, Nossa Senhora da Formigueira ou Nossa Senhora da Gaiola. E de todas elas Avelino Costa tem as estampas.

Mas nesta “importante e valiosa colecção”, parafraseando o Cabido da Sé de Braga, há pagelas de incalculável valor. Há por exemplo santinhos de Nossa Senhora de Fátima de 1920, verdadeiras relíquias, assim como santinhos do Coração de Jesus de meados do século XIX. Mas tem também registos do século XVI e um notável conjunto de imagens dos santos portugueses.

E os números são impressionantes. Mais de mil imagens diferentes de Santo António, mais de duas mil de Nossa Senhora de Fátima, mais de três mil da Virgem e o Menino de todo o mundo. E milhares de santos e santas de dezenas de países. Dos mais venerados aos que nem se sonha que existem. Tudo isto para além de preciosidades como as 70 imagens do catecismo antigo e os originais da Ladainha de Nossa Senhora. Um notável acervo histórico-religioso que, por protocolo, será doado ao Museu da Sé de Braga.

O VERDADEIRO ST. ANTÓNIO

Uma das curiosidades da colecção de santinhos de Avelino Costa é “o verdadeiro retrato de Santo António de Lisboa, tal como é venerado na sua real casa”: uma imagem a lápis, que contraria a tese dos franciscanos, segundo a qual na primeira imagem o santo não tinha menino.

“O menino, assim como o saco do pão, integra os atributos do santo, ou seja, elementos através dos quais a sua mensagem e a sua vida ficou conhecida”, disse-nos Avelino Costa, admitindo, no entanto, que em tempos mais antigos tenham sido feitas imagens de Santo António sem o menino.

No entanto, o santo português mais popular no mundo, ficou conhecido por pregar aos peixes, por fazer o burro de um ateu ajoelhar-se para o converter e por dar pão às crianças famintas de Itália, país onde pregou e morreu.

De resto, os italianos chamam-lhe Santo António de Pádua porque, segundo as tradições da Igreja, os santos são das terras onde morrem.

DESTINO: SÉ DE BRAGA

Apesar de respirar saúde, Avelino Costa já legou os seus santinhos, num protocolo assinado, ao Tesouro Museu da Sé Catedral de Braga. “O que pretendo é que as imagens possam ser usufruídas pelo maior número possível de pessoas”, disse Avelino Costa, sem especificar a forma como gostaria que o fizessem.

“Há várias maneiras, e eu sei que os responsáveis do museu o saberão fazer muito melhor do que eu. No entanto, parece-me que, pelo menos ao nível das imagens de Nossa Senhora, têm material para uma exposição permanente. Quanto aos outros temas, pode fazer-se exposições segundo as efemérides”, referiu o coleccionador.

De resto, Avelino Costa, não pediu nada em troca ao Cabido da Sé de Braga, a não ser que, quando deixar este mundo, os cónegos lhe rezem pela alma. E isto está escrito no protocolo assinado há quatro anos pelo então Deão do Cabido.

Fonte CM

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