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Concordata É para Regular Mais Tarde
2004-05-18 21:11:34

O primeiro-ministro português, Durão Barroso, e o secretário de Estado do Vaticano, cardeal Angelo Sodano, assinam hoje a nova Concordata que passa a regular as relações do Estado português com a Igreja Católica - e que é considerada por Vera Jardim, ex-ministro da Justiça no Governo PS e um dos impulsionadores do processo, como um documento para a "estabilidade" das relações do Estado com a Igreja Católica.

O texto do tratado deixa, no entanto, várias matérias para regular em lei ordinária.

A cerimónia, que decorre a partir das 10 horas (9 horas em Lisboa) na Sala Régia, do Vaticano, será presenciada, do lado português, por três ministras envolvidas nos assuntos tratados na Concordata: Teresa Gouveia (Negócios Estrangeiros), Manuela Ferreira Leite (Finanças) e Maria Celeste Cardona (Justiça). Também os ex-ministros Martins da Cruz (PSD), Jaime Gama e Vera Jardim (PS) estarão presentes, ao lado do cardeal-patriarca de Lisboa, D. José Policarpo e do ex-bispo de Coimbra, D. João Alves, um dos negociadores do lado da Igreja. Depois da cerimónia, a delegação portuguesa encontra-se com o Papa, que hoje mesmo completa 84 anos (ver pág. 33).

A principal novidade do documento, conforme o PÚBLICO adiantou em Novembro (edição de 29/11), é aquela que diz respeito à entrada dos padres e das instituições católicas em todos os âmbitos do sistema fiscal. Significa isto que as actividades que não estavam sujeitas a IRS passam a ter o imposto retido. O caso mais notório será o dos padres que são professores de Educação Moral e Religiosa Católica (EMRC). Até aqui, a leccionação desta disciplina por um padre era considerada como parte do seu ministério - o que fazia com que alguns descontassem imposto e outros não, além de configurar uma situação de desigualdade para os professores da mesma disciplina que não são padres.

A nova Concordata estabelece que os actos do clero passam a estar também sujeitos ao pagamento de IRS, o que inclui a leccionação de EMRC - os padres que são professores de outras disciplinas ou que exercem outras actividades "civis" já estavam sujeitos a imposto. Resta a dúvida sobre se a incidência se fará sentir também no dinheiro que, desde há anos, o clero de algumas dioceses passou a receber de um bolo comum [o montante recebido pelos actos litúrgicos vai para um fundo diocesano e é redistribuído pelos padres, em partes iguais, em valores entre os 650 euros (Lisboa) e os 750 euros (Coimbra)]. Tudo indica que esse "salário" passará a estar sujeito a IRS, devendo as dioceses actualizar a verba atribuída.

As casas de religiosos que desenvolvem actividades comerciais - por exemplo, recebendo encontros de grupos em regime hoteleiro - passam a estar sujeitas ao IRC. "As pessoas jurídicas canónicas, quando também desenvolvam actividades com fins diversos dos religiosos considerados pelo direito português, ficam sujeitas ao regime fiscal aplicado à actividade", diz o texto, de acordo com a citação de alguns dos parágrafos feita pela Lusa.

A questão fiscal deverá ser complementada com a entrada da Igreja Católica no regime previsto já na Lei de Liberdade Religiosa (LLR), de acordo com o qual cada contribuinte pode decidir o destino de 0,5 da sua contribuição de IRS. Mas a definição desses pormenores fica para as negociações entre o Estado e a Conferência Episcopal Portuguesa - que passa a ter, por via do reconhecimento da personalidade jurídica, a representação da Igreja Católica para negociar qualquer acordo.

Capelães, UCP e divórcio
Entre as outras disposições que constituem novidade, está o fim do estatuto militar dos capelães das Forças Armadas, substituído pela "assistência religiosa aos membros" do Exército, Marinha ou Força Aérea "que a solicitarem". Em concreto, esta questão terá que ser regulamentada depois, tendo em conta também a possibilidade da assistência religiosa de outras confissões, prevista na LLR. Tal como acontecerá, aliás, com os hospitais e as prisões, onde se seguirá de perto o modelo da Lei da Liberdade Religiosa, de acordo com uma pessoa envolvida no processo, ouvida pelo PÚBLICO.

Para um futuro acordo fica ainda a concretização do estatuto da Universidade Católica - um dos pontos que terá atrasado mais as negociações. Esta é respeitada na sua "especificidade institucional", mas tem que trabalhar de acordo "com o direito português", no que se refere "ao reconhecimento de graus, títulos e diplomas".

O Estado passa a reconhecer a "necessidade de preservação e salvaguarda" do património histórico e cultural da Igreja, sendo ao mesmo tempo criada "uma comissão bilateral para o desenvolvimento da cooperação dos bens móveis e imóveis da Igreja que integrem o património cultural do Estado". Também aqui fica aberta a possibilidade de concretizar o modo concreto, mas tudo aponta para que a conservação do património fique a cargo do Estado, podendo a Igreja utilizar os bens à guarda do Estado para fins religiosos.

Matérias já definidas são a possibilidade de um processo canónico de anulação de casamento ter valor civil de divórcio, desde que cumpridas as regras de audiência com ambas as partes. Também a possibilidade de o Estado vetar algum novo bispo, que estava na Concordata de 1940 e caíra entretanto em desuso, fica de fora no novo texto. Mantém-se, no entanto, a exigência de que os novos bispos sejam de nacionalidade portuguesa.

Fica consagrada no texto a existência da disciplina de EMRC, continuando os professores a ser nomeados pelos bispos e pagos pela tutela. Ao mesmo tempo, o Acordo Missionário - uma espécie de suplemento do acordo de 1940 - é substituído agora pela possibilidade de "acções de cooperação no plano internacional, designadamente no que respeita aos países de expressão portuguesa", de acordo com a citação da Lusa.

O texto do acordo prevê uma comissão paritária para resolver dúvidas e conflitos sobre a interpretação ou aplicação do documento que terá agora que passar pelo crivo da Assembleia da República e do Presidente Jorge Sampaio.

Fonte Público

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