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Lei da liberdade religiosa dependente dos capelães
2001-03-10 22:01:39

A PRESENÇA de capelães na hierarquia das Forças Armadas e a Concordata entre Portugal e a Santa Sé vão dificultar a aprovação da Lei de Liberdade Religiosa. A votação no Parlamento está, todavia, agendada para terça-feira.

A comissão parlamentar encarregue de aprovar na especialidade aquela lei não se entende. Enquanto o projecto original, de autoria do deputado do PS Vera Jardim, propõe apenas que o Estado deve criar, para todas as confissões, as condições adequadas ao exercício da assistência religiosa nas instituições públicas, incluindo as Forças Armadas, a proposta dos comunistas vai mais longe, exigindo que os capelães militares devem deixar de ser equiparados a oficiais.

O problema é que o apoio do grupo parlamentar do PCP é imprescindível para que a Lei seja aprovada na Assembleia da República. Os partidos mais à direita (PSD e PP) demarcaram-se do projecto desde o início mas o Bloco de Esquerda anuncia agora a intenção de votar contra.

Capelães polémicos...

No passado dia 20 de Fevereiro, o PCP apresentou na Comissão Parlamentar, um conjunto de cinco novas propostas de alteração ao projecto do PS. Além da já referida retirada dos capelães das Forças Armadas da hierarquia militar e de todas as Instituições Públicas, o PC avança ainda com novos artigos, exigindo a caducidade do acordo missionário entre Portugal e a Santa Sé, a regulamentação do ensino religioso nas escolas públicas, a inscrição orçamental de verbas entregues às instituições religiosas através das declarações de IRS.

Jorge Lacão, deputado do PS e presidente da Comissão Parlamentar dos Assuntos Constitucionais, na qual está a ser deliberada a lei, disse ao EXPRESSO que nenhum partido se pronunciou depois de tomar conhecimento das propostas dos comunistas. O deputado do PS ressalva, contudo, que quanto à assistência religiosa está garantinda a salvaguarda «do princípio de cooperação e de independência entre o Estado e as confissões». Por seu turno, Francisco Louçã, deputado Bloco de Esquerda, garante que o seu partido lançará de novo uma «discussão sobre este problema» dos capelães militares, caso ele não passe na terça feira - «o que é de esperar», salienta -, já que o considera «completamente inconstitucional».

Este entendimento, sublinhe-se é também o da Aliança Evangélica Portuguesa (AEP), o maior grupo religioso, depois da Igreja Católica. Além de defender «um regime de voluntariado para a assistência religiosa, quer seja nas Forças Armadas ou outras instituições, como hospitais e prisões», o presidente honorário da AEP, José Dias Bravo, sublinha «a inconstitucionalidade da actual situação dos capelães das Forças Armadas». Curiosamente, também o vigário-geral castrense, D. Januário Torgal Ferreira, já admitiu por diversas vezes aceitar que os capelães não sejam militares.

Caso a proposta do PCP vá por diante, falta saber qual o futuro que o Governo reserva para a meia centena de capelães militares católicos, para os sacerdotes que dão assistência nos hospitais e nas prisões, que ultrapassam as duas centenas e usufruem do estatuto de funcionários públicos com progressão na carreira garantida de três em três anos. Tanto mais que parece existir um entendimento entre socialistas e comunistas. O PC mantém um profundo silêncio sobre a solução de terça-feira. António Filipe, deputado do PCP e membro daquela Comissão Parlamentar, não quis mesmo pronunciar-se sobre o assunto, evitando assim dar a conhecer a intenção de voto do seu partido. Ou seja, se mantêm a intransigência na defesa das alterações propostas.

... e Concordata inconstitucional

É nesta comissão que se têm levantado mais problemas. Francisco Louçã, do BE, mostra-se contra a Lei em causa, nomeadamente o polémico artigo 58º, que ressalva a Concordata entre a santa Sé e a República Portuguesa, garantindo assim um regime fiscal especial para a Igreja Católica. «É um regresso a 1940» - altura em que foi assinado aquele acordo -, anota Louçã, sublinhando que «uma parte da Concordata é já tida como inconstitucional». Louçã garante mesmo que na terça-feira o BE vota contra a Lei se esta posição permanecer.

Recorde-se que os benefícios fiscais, ao nível de IRS e IVA, concedidos à Igreja Católica resultam de uma leitura da Concordata. Foram somente sucessivas interpretações governamentais que foram, à sombra da Concordata, concedendo isenções fiscais aos membros e instituições da Igreja Católica. Entre outros, o constitucionalista Gomes Canotilho, professor na Universidade de Coimbra, considera inconstitucional o sistema concordatário.

O próprio presidente da Conferência Episcopal, o cardeal-patriarca D. José Policarpo, defende que a revisão da Concordata (já assumida como facto irrecusável pelo Governo do PS e a Santa Sé) terá de se «acertar» com o conteúdo da futura lei de liberdade religiosa.


Fonte Expresso

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