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Conhecer e estimar as Igrejas do Oriente
2003-10-30 21:09:26

Que os cristãos do Ocidente conheçam e estimem cada vez mais a espiritualidade e as tradições litúrgicas das Igrejas do Oriente.

1. No primeiro século da sua história, o Cristianismo desenvolveu-se, sobretudo, na metade oriental da bacia do Mediterrâneo. As primeiras comunidades surgiram na Palestina (Jerusalém, Cesareia…), daqui passaram à Síria (Damasco, Antioquia…) e, de seguida, sobretudo por obra de S. Paulo e seus companheiros, por toda a Ásia Menor (actual Turquia – Éfeso, Galácia…). O continente europeu veio a seguir, com as viagens de S. Paulo à Macedónia (Filipos e Tessalónica) e à Grécia (Atenas e sobretudo Corinto). Entretanto, outros missionários faziam chegar o Evangelho a Roma, ao Norte de África e ao Egipto. De Roma, saíram missionários para toda a Europa ocidental, de modo que, pelo séc. VI, quase não havia região da Europa onde o nome de Cristo não fosse anunciado.

2. A permanência da estrutura imperial no Oriente, com a capital em Constantinopla, e o fim do império romano no Ocidente, introduziu um factor de divisão política na unidade imperial de outrora. Esta divisão, aliada à diversidade cultural presente desde o início na vida das comunidades cristãs, conduziu a um progressivo afastamento entre as Igrejas do Oriente e do Ocidente mediterrânicos – a disciplina eclesiástica e os costumes comunitários, incluindo o modo de celebrar os sacramentos, foram-se tornando cada vez mais particularizados, embora permanecesse comum o essencial da fé. Com o passar dos séculos, porém, esta diversidade tornou-se desconhecimento, à medida que o intercâmbio de pessoas e dons entre as Igrejas do Oriente e do Ocidente ia sendo cada vez mais raro – em parte, por causa do islamismo, que, a partir do séc. VII, se tornou a força política e religiosa dominante no Mediterrâneo oriental e tornou muito difícil a circulação de cristãos nessa região; em parte, por causa dos diferendos surgidos em torno das relações de autoridade entre o Papa de Roma e as Igrejas do Oriente, cada vez menos predispostas a aceitarem uma autoridade que lhes aparecia longínqua e estranha; e, em parte, devido a diferendos doutrinais que se revelaram impossíveis de ultrapassar… Tudo isto levaria à ruptura da comunhão, pelo século XI. Com o passar dos séculos, algumas comunidades cristãs do Oriente foram retomando a sua união com Roma, embora mantendo a legítima diversidade de costumes; mas em geral a divisão manteve-se, a ignorância mútua aprofundou-se e, por vezes, chegou a ser motivo de ódio e violência, em particular ao tempo das cruzadas. As sequelas de todo este acumular de incompreensões mútuas ainda se fazem sentir e continuam a tornar muito difícil o ecumenismo e a desejada unidade entre as Igrejas cristãs da ortodoxia e aquelas fiéis à autoridade de Roma.

5. Apesar disso, o século XX viu chegar o tempo em que os cristãos do Oriente e do Ocidente se puderam reencontrar, tentando deixar para trás um milénio de ignorância e desconfiança. Os encontros entre os Papas Paulo VI e João Paulo II e os Patriarcas de Constantinopla assinalaram simbolicamente o desejo de que a única Igreja de Cristo possa voltar a caminhar unida, na diversidade de costumes e tradições que em nada ofendem a unidade da fé. As viagens de João Paulo II a países onde a tradição da Ortodoxia é maioritária alimentaram ainda mais este desejo de unidade e espera-se que, a seu tempo, os frutos deste diálogo possam ser colhidos.

6. Este desejo não poderá, contudo, concretizar-se sem um esforço de conhecimento e respeito mútuos, que é tarefa de todos. As Igrejas do Oriente, herdeiras de uma tradição bimilenar, conservam uma riqueza teológica, espiritual e litúrgica que, muitas vezes, os cristãos do Ocidente desconhecem em absoluto. Há dimensões da espiritualidade destas Igrejas capazes de preencher o vazio que, tantas vezes, se apoderou da nossa oração, mais racionalizada, mais preocupada em dizer coisas do que em experimentar aquilo que Deus, através do seu Espírito Santo, tem para nos dizer. Há uma beleza nas celebrações, nos templos, na pintura religiosa das Igrejas do Oriente que pode ser lição para a frieza do nosso culto, para o desencanto das nossas celebrações, para a banalidade de muitas das nossas igrejas, para a miséria artística de muita da nossa pintura e escultura religiosas. Conhecer estas riquezas não empobrece, antes enriquece as Igrejas e os cristãos do Ocidente, tornando-os mais sensíveis à multiforme acção do Espírito Santo nestas comunidades eclesiais. Acolhendo o apelo do Santo Padre, esforcemo-nos, pois, por conhecer melhor para amarmos mais os nossos irmãos das Igrejas orientais – e, deste modo, estaremos a contribuir para um ecumenismo que vai à raiz das coisas, porque se entranha na vida e não se resume a declarações de princípios, necessárias, sem dúvida, mas pouco eficazes porque longe do coração dos crentes.

Elias Couto

Fonte Ecclesia

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