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Será George W. Bush demasiado cristão? Ou não o será suficientemente? - Debate sobre o papel da religião na política externa dos Estados Unidos da América
2003-03-18 21:16:43

WASHINGTON, D.C., 15 de Março de 2003 (Zenith.org) – Os Estados Unidos são governados por um perigoso fanático religioso. É assim que muitos colunistas de opinião, americanos ou estrangeiros, estão a descrever o presidente George W. Bush.

Para Georgie Anne Geyer, que escreve para o Chicago Tribune, num artigo datado de 7 de Março último, a intenção do presidente de invadir o Iraque “baseia-se principalmente numa obsessão religiosa e visões de grandiosidade pessoal”.
“O presidente dos Estados Unidos da América”, alegava ela, “vê-se a si próprio como parte do plano divino de Deus”.


A revista Newsweek dedicou a capa do seu número de 10 de Março último à religiosidade de Bush. E num artigo de opinião separado, Martin E. Marty reconheceu que “poucos duvidam que Bush seja sincero na sua fé”, mas mostrou-se inquieto com a “evidente convicção” do presidente “de que está a fazer a vontade de Deus”.



Do mesmo modo, Jackson Lears, num artigo de opinião publicado a 11 de Março no New York Times, se mostrava preocupado que a certeza de Bush de estar a concretizar a “intenção divina” possa levá-lo a perigosas simplificações e o faça “derrapar para a auto-rectidão”. Tal como Lears o vê na Casa Branca, “a fé na Providência liberta-nos da necessidade de considerarmos o papel do acaso num conflito armado, o menos previsível dos assuntos humanos. Entre a vontade divina e a capacidade tecnológica americana, temos tudo sob controlo”.



No Times, de Londres, do passado dia 1 de Março, Stephen Plant escrevia: “Os apoiantes de Bush herdaram a ideia do destino manifesto. Para eles a guerra contra o Iraque não é por causa do petróleo, mas sim o próximo encontro da América com a Salvação”.



Estas e outras críticas semelhantes não têm ficado sem resposta, mesmo da parte dos adversários de Bush. Na edição de 18 de Fevereiro do New York Post, E. J. Dionne notava que não tem quaisquer problemas em criticar o presidente. Mas acrescentava: “ Poderemos, por favor, parar de fingir que as regulares invocações de Bush do Todo-poderoso fazem dele um tipo de estranho fanático religioso? Neste aspecto, ele é muito mais tipicamente presidencial do que o pintam, especialmente os nossos amigos do estrangeiro”.



Num comentário publicado pela Business Week On-line, Stan Crock admitia que não estava sempre de acordo com a utilização, pelo presidente, de uma linguagem religiosa, mas discordava que o fanatismo religioso estivesse por detrás da estratégia da Casa Branca. Um dos principais estrategas da administração para o Iraque, observou, é o Sub--secretário da Defesa, Paul Wolfowitz, um judeu. E o Secretário da Defesa Donald Rumsfeld não está “a falar em várias línguas quando fala com o General Tommy Franks sobre os planos de guerra”.



Fred Barnes, no número de 17 Março da Weekly Standard, explicou que enquanto Bush invoca Deus, evita falar de Jesus Cristo, e clama pela tolerância de todas as religiões. “Os seus comentários têm-se confinado a quatro áreas específicas: o conforto das pessoas em sofrimento, a citação da capacidade da fé de melhorar a vida das pessoas, o comentário sobre os misteriosos caminhos da providência e a menção à preocupação de Deus com a Humanidade”.



Mapa da arte de governar



No entanto, alguns comentários defendem que Bush está a abrir um perigoso precedente ao permitir que a sua fé influencie a política externa. Mas ainda que os princípios cristãos estejam por detrás das suas decisões, isto não seria nada de novo para o país.



A religião e a política externa, de facto, há muito que se encontram ligadas nos Estados Unidos, nota Leo P. Ribuffo, numa colecção de ensaios, “A Influência da Fé: Grupos Religiosos e Política Externa dos Estados Unidos”, editada por Elliott Abrams e publicada em 2001. Ribuffo, um professor de história na Universidade George Washington, explicou que os debates sobre política externa durante o século XIX incluíam temas religiosos, tais como o desejo de espalhar a Cristandade e os receios de indevida influência Católica.



Em 1898, o presidente William McKinley disse ao Congresso que a intervenção em Cuba preencheriam as aspirações americanas “como um povo cristão, amante da paz” citou Ribuffo. Durante a I Guerra Mundial, um par de Presbiterianos proeminentes – o presidente Woodrow Wilson e o Secretário de Estado William Jennings Bryan – estavam “convencidos que os Estados Unidos tinham uma missão especial no mundo” salienta o ensaio.



A religião continuou a desempenhar um papel na política externa americana durante a II Guerra Mundial e mesmo para além disso. No entanto, Ribuffo crê que a religião tem uma influência indirecta, e não determinante, na política externa.



Num outro ensaio, o professor de Harvard Samuel Huntington afirma que “a política e a religião não podem ser separadas”. Salienta a grande ligação entre a Cristandade e a democracia. Em muitos países cristãos e não-cristãos, observa, a religião é central para uma identidade nacional, em ambas as formas, positiva e negativa.



A sabedoria convencional em décadas passadas defendia que a política externa americana deveria evitar a ligação com a religião, observou Mark Amstutz, professor de ciência política na Faculdade de Wheaton. Mas a religião e as instituições religiosas ainda desempenham um papel vital na vida das pessoas. As Igrejas e as organizações baseadas na Fé também têm um papel, se bem que indirecto, na política externa, conclui Amstutz. Através da oferta de perspectivas éticas e de valores morais, as Igrejas e as organizações religiosas podem ajudar a formular um “mapa” da política externa, defende Amstutz.



Uma anterior colectânea de ensaios, publicada em 1994, concordava que fundamentar a política externa dos Estados Unidos em bases puramente materiais e seculares, enquanto se ignora a importância que a religião tem em muitos países, é um grande erro. Em “Religião, a Dimensão Perdida do Estadismo”, especialistas como Edward Luttwak e Barry Rubin apelaram a uma maior apreciação do papel dos factores religiosos por parte daqueles que são responsáveis pela determinação da política externa.



Dizer que o presidente Bush está motivado em parte pela sua Fé não significa que ele esteja a prosseguir com uma política ditada pelas igrejas. O presidente professa o culto da Igreja Metodista. Mas, na opinião do Bispo Melvin Talbert, o principal representante ecuménico dos Metodistas Unidos, expressada numa entrevista publicada pela Newsweek on-line, a 7 de Março último, “é para nós claro que ele não está a seguir os ensinamentos da sua própria igreja, ou os ensinamentos das igrejas que acreditam na teoria da ‘guerra justa’”.



Nem as crenças religiosas de Bush significam que os cristãos tenham necessariamente que concordar com a sua estratégia política. O antigo presidente Jimmy Carter, bem conhecido pela sua invocação dos princípios cristãos quando estava no poder, expressou o seu forte desacordo com a actual política americana no que se refere ao Iraque, num artigo publicado pelo New York Times de 9 de Março.



Paradoxalmente, a política de Bush sobre o Iraque tem sido fortemente criticada por ignorar princípios morais, enquanto, ao mesmo tempo, comentadores seculares o atacam por ser um fanático religioso.



Observadores externos apenas podem especular quanto ao peso que a religião possui nas decisões do presidente. O que é claro é que ele descobre na sua fé uma fonte de conforto e força pessoal e moral, juntamente com uma série de princípios que ajudam a guiar as suas acções. Outras considerações – políticas, económicas, militares, etc. – também desempenham um papel nas tomadas de decisão, evidentemente.



Defender que um político deveria decidir as suas políticas num vácuo religioso e moral é ignorar as há muito estabelecidas tradições americanas dos seus presidentes e líderes políticos que têm frequentemente utilizado uma linguagem religiosa.



Além disso, procurar negar a legitimidade do envolvimento político de um cristão devido às suas convicções sobre o bem comum é uma forma de “secularismo intolerante”, observa a nota doutrinal sobre política e religião, recentemente publicada pela Congregação para a Doutrina da Fé, do Vaticano. A marginalização da Cristandade “ameaçaria as mais profundas fundações espirituais e culturais da civilização”, afirma-se aí.



Na sua mensagem para o corpo diplomático acreditado na Santa Sé, a 13 de Janeiro último, o Papa João Paulo II observou: “De facto, a indispensável competência profissional dos líderes políticos não poderá encontrar legitimidade a não ser que se encontre ligada a profundas convicções morais”. Muitos líderes cristãos – que pensam que a política americana para o Iraque necessita de uma maior influência religiosa, e não menor – devem concordar com este ponto de vista.


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