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O drama das sanções internacionais está a matar o Iraque
2003-03-03 22:00:16

A Agência ECCLESIA publica a carta da Ir. Sherine, uma iraquiana da Congregação Dominicana de Catarina de Sena, um documento revelador sobre a verdadeira dimensão do drama humanitário que se vive no Iraque desde a Guerra do Golfo, em 1991.

O texto apresenta dados concretos assustadores. “As sanções mataram mais de 1,5 milhões de iraquianos, a maior parte dos quais mulheres e crianças, por causa da falta de comida e medicamentos, da contaminação da água potável e da falência do sistema económico”, pode ler-se no documento que agora apresentamos:

“SAÚDE
Os mais idosos sofrem de doenças crónicas como hipertensão, diabetes e problemas cardíacos. Não têm acesso a medicamentos para o tratamentos dessas doenças.

O sistema de saúde do Iraque, antes exemplar, está à beira do colapso, após 12 anos de sanções. Não obstante o aumento da disponibilidade de medicamentos clínicos e de equipamento médico, os governos dos EUA e Reino Unido fazem uso frequente do seu poder de congelar encomendas enquanto determinam a validade dos produtos.
Como resultado, estes produtos tecnicamente disponíveis não o estão de facto quando são necessários. A enorme destruição das infra-estruturas e da economia Iraquianas tem uma nítida influencia no desempenho dos hospitais e serviços de saúde. Como podem os bancos de sangue, laboratórios , raio – x, e equipamento médico funcionar sem geradores eléctricos?

A capacidade dos hospitais iraquianos caiu 30%. O pessoal médico defronta-se com uma grande insuficiência de oxigénio. Isto obriga os médicos a colocar mais de uma criança na mesma incubadora e mais de um doente a participar o mesmo cilindro de oxigénio.
A somar a isto os hospitais não conseguem fornecer comida a uma suficiente quantidade de doentes.
As famílias vêem-se forçadas a assumir esse papel.
Uns dias antes de partir para a Jordânia fiz uma visita a uma amiga que é também minha aluna. Ela está encarregue da unidade de Leucemia. Contou-me que o seu coração se despedaçava ao ver as mães a chorar á cabeceira de seus filhos a morrer. Realçou que muitos dos doente morrem devido a deficiente medicação. Muitas vezes são-lhe administradas apenas metade das doses recomendadas. Noutras ocasiões tomam um medicamento que nada tem a ver com a sua doença, apenas para aliviar as dores e parar as lágrimas.

Os técnicos de saúde ficam de coração partido por não conseguirem assegurarem os antibióticos que permitem combater as doenças contagiosas, que pioram o povo iraquiano em especial crianças e grávidas. Devido á água contaminada há muitas anemias febre tifóide, diarreia, poliomielite e sarampo. Muitos iraquianos estão a sofrer de doenças que eram facilmente tratáveis antes da guerra do Golfo e do embargo.
Antes da guerra do Golfo, 95% da população iraquiana tinha fácil a cesso á água potável para beber. Este aspecto tem vindo a melhorar ligeiramente, mas longe dos níveis registados antes da guerra do Golfo.

O embargo levou ao isolamento intelectual da comunidade médica e científica do Iraque.
O pessoal médico sente-se isolado porque as bolsas de estudo para estudar no estrangeiro são recusadas. As publicações científicas não estão disponíveis e os médicos iraquianos não estão autorizados a participar nas conferencias médico-científicas internacionais.
Um dos desastres escondidos da guerra do Golfo foi o uso de Urânio.

Os E.U. e o Reino Unido desenvolveram este tipo de armas porque o urânio utilizado é um metal denso capaz de perfurar tanques blindados. Com o impacto o urânio vaporiza-se permanecendo no solo e na atmosfera.
320 toneladas de urânio foram usadas no Iraque. O resultado é existirem certas regiões no país onde as pessoas tem sofrido um banho de radioactividade durante os difíceis 12 anos.
Tem-se verificado um crescimento alarmante de leucemia e cancro do rim, pulmão e mama.
Segundo um especialista em oncologia, iraquiano existe um estudo da universidade de Bagdad que prevê que 40% da população da província de Basnau morrerá de cancro.
Isto representa, 755.000 pessoas. Quanto à quimioterapia, a quantidade de drogas é insuficiente até mesmo para as pessoas mais abastadas que podem pagar. Quanto á radio terapia, o equipamento é muito pobre. Embora algumas das máquinas sejam muito antigas, continuam a operar.

Devido ao embargo o Governo está impossibilitado de importar equipamento actualizado, bem como peças para reparação do antigo.

BOMBAS
Os aviões e mísseis destroem a vida e os sistemas que a suportam.. Os rostos das crianças gelam de medo permanente. As sirenes vão avisando a proximidade de um novo ataque bombista.
Este tipo de devastação reflecte-se na percentagem de 80 %. de crianças que perderam os seus pais o outros familiares durante a Guerra no Golfo. Os que sobreviveram ao ataque tem necessidade de uma atenção especial em termos de acompanhamento psicológico, reabilitação, orientação e instrução, para que possam retomar as suas vidas normais.

Antes da guerra do Golfo e dos ataques bombistas dos E.U., cristãos e muçulmanos conviviam pacifica e amigavelmente. Eu era professora num colégio particular. Os meus alunos, eram cristãos e muçulmanos, estudando e brincando juntos e as irmãs eram respeitadas e as confidentes dos estudantes e dos seus pais.
As tensões religiosas no Iraque estão hoje empoladas devido á instabilidade causada pela sanções e pelo crescente sentimento anti-ocidental que se sente na região.

O cristianismo está associado ao Ocidente particularmente aos E.U. Isto traduz-se num pensar crescente nas relações entre muçulmanos e cristãos.. Nós., Dominicanas temos verificado um aumento de incidentes de carácter religioso com o dobro do tamanho.
A estátua de Maria, Mãe de Jesus foi coberta com um « Hijab» e «Abijah» como forma de insultar os cristãos.
Após uma celebração numa Igreja dominicana as pessoas foram atacadas á saída. 16 homens, mulheres e crianças foram feridas, devido ao nosso hábito, símbolo dos nossos votos. As irmãs são facilmente reconhecidas recebendo insultos verbais e até ameaças, especialmente as irmãs mais novas que frequentam a universidade.

O incidente mais sério aconteceu com uma irmã de 70 anos brutalmente assassinada no seu convento em Bagdad. Nada foi roubado, mas desrespeitaram os objectos sagrados.

É importante realçar que em qualquer destas ocorrências, o Governo iraquiano saiu em defesa da comunidade cristã.

SITUAÇÃO DA EDUCAÇÃO
O sistema educativo tem sofrido muito com as sanções. A má nutrição prejudica a capacidade intelectual. As famílias não matriculam as crianças nas escolas por não poderem suportar os custos. A literatura desceu de 90 para 50%. Em vez de frequentarem a escola as crianças vão para a rua mendigar, vender jornais ou engraxar sapatos, de modo a auxiliar as suas famílias ao. Ao mesmo tempo dá-se uma fuga de cérebros. Muitos especialistas, médicos e membros da classe média de elevado grau académico emigram em massa relutantemente. O país era considerado pelo seu avançado sistema educativo, agora, universidades, colégios e escolas têm falta de coisas tão básicas como equipamento de laboratório. A publicação de livros e revistas é quase impossível devido tanto à falta de papel como aos elevados custos de publicações. O nosso coração fica partido ao ver as salas de aulas com vidros partidos tetos rachados, electricidade cortada , falta de cadeiras, de abastecimento de água e até ausência de quadros de ardósia e giz.

Muitos estudantes têm falta de manuais escolares actualizados. Muitas instituições sofreram avultados danos. A UNICEF estima que terão sofrido obras 450 escolas. Mas há mais de 5.000 a necessitarem do mesmo, devido ao crescimento populacional . 40%.dos iraquianos tem menos de 15 anos. O país necessita de cerca de 5.000 novas escolas.

Um elevado número de estudantes do secundário e universitários abandonaram os estudos após a guerra do Golfo. Embora o ensino seja garantido o custo das roupas, livros e material escolar é Proibitivo. Eles têm necessidade de trabalhar para ajudar os pais a sustentar a família.
A somar aos elevados custos da educação e dos transportes, além disso não é atribuído ás aulas qualificações o seu devido valor. Pessoas com Mestrados e doutoramentos trabalham como motoristas de taxi e em hotéis ou restaurantes.

Estamos impedidos de importar seja o que for, relacionado com o processo de ensino e aprendizagem.

SITUAÇÂO ECONÓMICA
Em 1981 viajei pela Europa durante um mês com 400 dinares (id) iraquianos e ainda me sobrou dinheiro para comprar presentes . Hoje um quilo de farinha no mercado negro custa 400 (id). Um kg de açúcar 600 (id) um k de arroz 500 (id), um kg de carne custa 4.000 id tudo isto apesar da drástica descida do salário médio.

De acordo com uma organização humanitária europeia, em 1988 , no Iraque antes da guerra do Golfo, o salário médio era de 1200 dólares. Após a guerra do Golfo era de 450. Actualmente é de 4 dólares por mês.
Antes da guerra do Golfo o Dinar iraquiano valia 3 Dólares americanos agora um dólar custa 2500 (id).A descida continua com a proximidade da Guerra.
70% da população iraquiana não tem dinheiro para comprar comida e outros bens essenciais. A classe média teve que vender a mobília: frigoríficos, televisões, vídeos roupas e até livros para comprar comida para os filhos.

Actualmente estas famílias não tem mais nada para vender, sendo vítimas de má nutrição e fome.
O pesadelo da pobreza e da fome abriu uma ferida no coração de cada iraquiano que cresce de dia para dia.
A pobreza e a fome conduziram aos roubos, assassínios, exploração, migração forçada desistabilização da família iraquiana. Sofremos de fome e apesar de o Iraque ser um país de muitas riquezas a flutuar num oceano de ouro negro. O nosso petróleo é suposto ser uma bênção para o nosso país e o seu povo, mas transformou-se numa maldição e fonte se sofrimento.

SITUAÇÃO POLITICA
A situação instável, os contínuos ataques bombistas e as ameaças constituem um pesadelo que preocupa o nosso povo e o deixa em pânico. As nossas crianças têm sonos conturbados e choram durante a noite. A migração de homens jovens causou muitos problemas sociais. O mais grave disto é a proporção de 8 mulheres para cada homem entre cristãos.

Muitas mulheres jovens continuam solteiras ou casam fora da sua religião.

AGRICULTURA
Antes do embargo o Iraque importava 70% do seu equipamento agrícola e sementes. A agricultura enfrenta com os quais o Iraque não estava familiarizado. Centenas de milhares de ratos e ratazanas invadiram 6 províncias iraquianas e arruinaram a maior parte das colheitas que constituem uma importante fonte de alimentação.
Para os cidadãos iraquianos, os EUA utilizaram armas biológicas. De acordo com o relatório de 2000, da Cáritas Internacional, introduziram os vermes da mosca do caracol., no Iraque. Causou muitos problemas aos humanos e ao gado. A mosca espalhou-se por 6 seis províncias. Em 1997 os aviões americanos largaram larvas de insectos que infestaram as Palmeiras a mataram muitas delas ; isto originou o aumento do preço do milho da tâmara, de 50 para 1200 id. Uma província do Sul foi atacada por vermes e aranhiços que provocaram enormes estragos.

Serão as sanções impostas por motivos válidos?
As sanções atingem as pessoas certas?
Alcançaram as sanções os seus objectivos?
Serão as sanções limitadas temporária mente de forma razoável?
As sanções constituem um genocídio, prejudicam a população Iraquiana, especialmente mulheres e crianças, bem como a cultura e a terra. As consequências das sanções são mais nefastas do que todos os ataques bombistas durante a guerra.

O embargo e as sanções económicas privaram-nos do direito á aprendizagem e ao desenvolvimento, não podem ser justificadas. Os inocentes, os fracos e as pessoas sem voz não deveriam pagar pelos erros em relação aos quais, não têm qualquer responsabilidade. As sanções deviam ser levantadas para que o país readquiri-se a sua dignidade, o normal desenvolvimento de relações frutíferas e amigáveis com outros países.
Imploro a cada pessoa capaz de pressionar os líderes do mundo, especialmente o Presidente Bush, para que advoguem o levantamento das nefastas sanções, injustamente impostas e evitem o pesadelo de uma nova guerra perseguindo as crianças iraquianas, as mulheres e as pessoas inocentes e vulneráveis, isto para que readquiram a sua dignidade.

AS NOSSAS ACTIVIDADES
Nestas dificílimas condições será que a presença de 200 irmãs dominicanas, irmãos e padres e mais 1000 Dominicanos ultimamente, significa alguma coisas? Segundo o preceito do Evangelho, nós somos chamados a pregar a verdade, o amor, a esperança e a compaixão. Somos impelidos a participar do sofrimento do nosso povo. Humildemente acredito que o façamos apesar das difíceis circunstâncias que vivemos.

A nossa formação Dominicana faz-nos ler os sinais dos tempos de forma profética e a escutar os lamentos do nosso povo.
Damos o nosso melhor para sermos um sinal de esperança, para identificarmos as suas necessidades mais urgentes e dar-lhes resposta a través da partilha , do amor e da compaixão de Deus.
Durante estes momentos difíceis esforçamo-nos por estar junto dos pobres e para os pobres. A nossa Congregação inaugurou 10 centros de costura para a promoção. Cursos gratuitos de costura e tricô para donas e casa e jovens para lhes estimular a auto- estima. Devido á falta de esperança e ás dificuldades que os nossos jovens enfrentam tem havido um grande aumento de depressões.

Temos de acompanhá-los e tentar suavizar o seu sofrimento. A nossa Congregação transformou dois dos seus conventos em orfanatos para acolher órfãos e adolescentes femininas que atravessam difíceis problemas sociais.

Convertemos um outro convento em maternidade para prestar serviço médico de qualidade aos recém-nascidos e suas mães. Damos catequese a crianças de todas as idades algumas irmãs dão cursos de teologia em Bagdad e Mosul, contribuindo assim para a formação de outros catequistas.

Abrimos os nossos centros educativos aos estudantes e outras pessoas que sem esta oportunidade não teriam acesso a livros para leitura, pesquisa e escrita.

FAMÍLIA DOMINICANA
Nós irmãos e irmãs Dominicanos do Iraque expressamos o nosso grande agradecimento e gratidão a toda a restante comunidade dominicana pelos esforços e acções que desenvolveram em nosso beneficio e em beneficio do nosso povo.

Apreciamos profundamente as suas sentidas orações e prontidão que certamente «afastarão os demónios». Somos encorajadas no nosso esforço pelos dominicanos espalhados por todo o mundo que nos apoiam com as suas orações, prontidão e solidariedade. É nossa esperança que os irmãos Dominicanos utilizem a força da sua fé para acorrer ao desespero e isolamento do povo iraquiano. Têm de dar conhecimento do choro das crianças iraquianas em cada púlpito, pátria, sala ou em qualquer lugar onde a palavra de Deus obtenha uma reacção compassiva.

Como Dominicanos, a Ordem dos Pregadores que está profundamente enraizada no Evangelho e na difusão dos direitos humanos é compelida a pedir o fim das sanções e do embargo económico contra o Iraque, de modo a terminar com a angústia, a morte de crianças.”

Tradução do original
Cláudia Silva

Fonte Ecclesia

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