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Homilia de D. Teodoro de Faria na Solenidade da Imaculada Conceição
2002-12-09 22:21:04

Homilia de D. Teodoro de Faria na Solenidade da Imaculada Conceição, na Sé do Funchal, no dia em que o Corpo nacional de Escutas celebrou o seu 74.º aniversário:
Avé Cheia de Graça
Caros cristãos
Caros jovens escuteiros


1. Este ano, a Solenidade da Imaculada Conceição coincide com o segundo domingo do Advento, tempo forte de preparação para o Natal, que tem prioridade sobre qualquer outra festa. Os bispos portugueses pediram a Roma para que em Portugal se celebrasse neste domingo a Solenidade da Imaculada Conceição, devido à Senhora da Conceição ser Padroeira de Portugal. Desta maneira, sem deixar de ouvir hoje a voz de João Baptista que no Evangelho se apresente como «voz que grita no deserto: preparai o caminho do Senhor», vamos pedir à Mãe de Jesus que seja ela nossa Mestra a conduzir-nos até ao presépio e a reconhecer e adorar a Jesus, como nosso Salvador e nosso Deus.

A mulher da promessa

2. A festa da Imaculada Conceição convida-nos a celebrar um mistério de graça que Deus concedeu a Maria, mãe de Jesus, e que a Igreja exprimiu em toda a sua história como a «toda santa»; só mais tarde definiu como doutrina de fé, dizendo que esta santidade nunca foi manchada, nem mesmo por aquela deficiência que atinge todos os homens e que a tradição da Igreja chama pecado original. Deus não poupou a Maria os sofrimentos do mundo, mas não a maldade; ela é nossa irmã nos suores, trabalhos e dores mas não no pecado nem na revolta contra Deus.
A mãe de todos os viventes, Eva, foi criada por Deus para ser a companheira do homem com a missão de com ele transmitir a vida. Com a desobediência a Deus, Adão e Eva, deserdaram os seus filhos da felicidade e transmitiram-lhe a debilidade espiritual e a morte.
Maria, pelo contrário, unida a Cristo, será colaboradora da nova criação que Deus anunciou no livro do Génesis. Maria é a mulher da promessa. O pecado de Adão foi para Deus ocasião de nos prometer uma coisa muito mais bela, um Salvador e a sua mãe isenta de qualquer pecado. O mal deixou de ter o domínio sobre o homem e o mundo, ele vai continuar presente até ao fim dos tempos, mas não terá a vitória definitiva, que será sempre de Cristo e de Deus. A narração do Livro do Génesis, de género sapiencial, mostra como desde sempre Deus se coloca ao lado do homem, não o abandona; se ele cai, Deus levanta-o; se ele se esconde e se sente nu, Deus procura-o e promete revesti-lo com a veste da salvação e da felicidade.
Apesar das doenças, calamidades naturais, desgraças, das nossas faltas e maldades, Deus não nos abandona. Ele não pensou apenas em dar-nos a vida, traçou também um projecto de salvação para atingir toda a humanidade. Qual deve ser a nossa atitude? São Paulo dá-nos a resposta na carta escrita aos cristãos de Éfeso devemos louvar a Deus, manifestar a nossa confiança na sua admirável sabedoria e misericórdia. Temos a certeza que estamos em suas mãos e no seu coração, e que Ele governa o mundo apesar dos nossos erros e abuso da nossa liberdade.
«Bendito seja Deus, Pai de nosso Senhor Jesus, exclama são Paulo (Ef. 1, 3 ss), que do alto dos céus nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo... para sermos santos e irrepreensíveis, em caridade, na sua presença».
Nossa Senhora, a mãe do Redentor, é o sinal mais claro e transparente do triunfo de Deus sobre o mal. Na totalidade da vida de Maria, desde o primeiro momento da sua existência, as suas escolhas estiveram sempre de acordo com a vontade de Deus.
Por isso a Igreja afirmou em todos os tempos: Ó Maria, tu és a toda formosa, e a mancha original não te contaminou. «Totta pulchra es Maria».

Maria dialoga com Deus

3. Depois do pecado, Adão e Eva escondem-se, têm medo de Deus. Maria diante do anjo dialoga com ele, tem dificuldade em compreender a mensagem de ser mãe, quando ela se consagrara a Deus . Maria acredita na mensagem do anjo, mas a fé não consiste em fechar os olhos e apagar a luz da inteligência, mas em procurar compreender o comportamento de Deus para depois aderir com toda a inteligência e a vontade. Maria pergunta qual é a missão que Deus lhe quer confiar, e aceita alegre e imediatamente a iniciativa do altíssimo: «faça-se em mim segundo a tua palavra».
A fé será sempre um caminho no escuro que se percorre a tatear, é sofrimento até que Deus nos dê a tranquilidade. Recordo a frase de uma mulher inteligente que após a sua conversão, e continuando sempre a lutar, me disse com alegria: «a fé é uma teimosia». A fé leva-nos sempre a procurar Deus, a descobrir o seu rosto, para isso precisamos de humildade e oração, mas nunca de ter medo de Deus, a fugir como Adão e Eva, mas como Maria a pedir mais luz para melhor acreditar. Santa Isabel no encontro com Maria, louvou a sua fé e não a honra de ser mãe de Deus: «bem-aventurada porque acreditaste».
Nossa Senhora, é modelo e figura da Igreja. Assim como Deus agiu com Maria, procederá também connosco. Deus libertou Maria de qualquer forma de escravidão, a pior das quais é o pecado. «Eis a serva do Senhor, responde ela ao anjo». Serva de Deus significa obedecer só a Ele, reconhecê-lO como única autoridade, estar livre para amar e servir o Seu Reino, e estar associada com Cristo libertador.
Diante de Deus, e olhando para Maria, sentimo-nos muito pequenos, pobres e humilhados. Não podemos desanimar, nem escondermo-nos dEle. Para «Deus nada é impossível» e cada um de nós, por pior que seja, não é um grande problema para Deus. Ele tem a arte de cinzelar obras primas onde encontra maior pobreza e miséria, como nos mostra em tantos santos da Igreja.

A beleza salva o mundo

Caros escuteiros

4.Todos os anos o Corpo Nacional de Escutas (CNE) do Funchal vêm honrar e festejar connosco Nossa Senhora da Conceição. Desde a mais tenra infância que as crianças devem aprender a olhar para Maria, mãe de Deus, como a nossa mãe, e ao mesmo tempo, a amar a beleza espiritual que resplandece na mãe de Jesus.
A Solenidade da Imaculada Conceição é a festa da graça e da beleza. A glória de Deus reflecte-se da forma mais perfeita na beleza da mãe de Jesus.
Todos nós somos atraídos pela beleza. Um grande escritor soviético, Dostoevsky, escreveu que «o mundo será salvo pela beleza», mas podemos também afirmar que o mundo pode perder-se pela beleza.
A beleza é própria de Deus, assim como a verdade, a bondade e o amor. A beleza humana, por seu lado, pode tornar-se ocasião de lágrimas, sofrimento e morte. O grande filósofo cristão, Pascal, escreveu que há três espécies ou ordens de beleza: a das coisas materiais ou dos corpos, como o mundo criado por Deus, a pessoa humana e as riquezas materiais; a da inteligência e do génio que cria as maravilhas da arte e da ciência; e a da bondade e santidade. Esta última é a mais perfeita, não envelhece, não murcha nem morre.
Esta é a beleza de Maria que contemplamos hoje na sua Imaculada Conceição. É a beleza da santidade e da graça, toda interior, feita de luz e harmonia e corresponde à imagem que tinha Deus quando criou a mulher.
Caros jovens escuteiros, todas estas três formas de beleza devem ser admiradas por vós, mas tende cuidado, a beleza humana está sujeita a muitas ciladas e perigos.
Quantos adolescentes e até crianças são hoje manchados, deturpados por uma maré de tentações e sensualidade?
É tão doloroso pensar no número de crianças e jovens aliciados para o mal, e, muitas vezes, forçados a alimentar vícios e desequilíbrios de adultos.
Para além dos crimes, que devem ser sujeitos aos tribunais humanos e severamente julgados, que pensar da hipocrisia da nossa sociedade pouco preocupada com a difusão de revistas indecentes e material pornográfico que facilmente são colocados nas mãos de adolescentes e os perturbam e pervertem!
Como defender crianças e jovens de programas e filmes pornográficos que vêm na televisão à noite, enquanto os pais dormem, e que os levam depois, cheios de sono, a dormir nas aulas durante o dia?
Será que para evitar doenças incuráveis se deve colocar em primeiro lugar defesas externas e não se esforçar mais por educar o coração dos jovens, fortalecendo-os para os valores do autodomínio, respeito do corpo humano, o seu e o dos outros?

Consciência fragmentada

5. O cultivo da verdadeira beleza, que felizmente se defende em muitos lares cristãos, leva-nos, por outro lado, a reflectir sobre a escola, os divertimentos, os tempos livres e perguntar: os nossos moços e moças que coisas lêem, vêem, ouvem e desejam?
Que podemos esperar de bom quando se permite, e até fomenta, a indisciplina dos costumes, se toleram vícios que desprezam e rebaixam o amor humano e o corpo se torna instrumento de sedução, e sex appeal? A indústria do sexo, do dinheiro e da pornografia, abate-se sobre o que é mais indefeso, inocente e puro, ela mostra o declínio da pessoa humana quando foge a todo o controle moral e espiritual.
Cria-se nos jovens uma consciência fragmentada, em que os valores variam segundo os contextos, em que as ideias se associam ao acaso, sem uma estrutura ou intenção definidas.
Enquanto não se aprender a respeitar, e não ridicularizar a altíssima dignidade e beleza do nosso corpo, lugar onde se manifesta o amor humano, haverá abortos, abuso de menores e jovens feridos na sua dignidade moral.
Apesar de tudo a pessoa humana não obscureceu de todo a imagem e a marca de Deus criador, e revolta-se contra as afrontas e o abuso de crianças e adolescentes indefesos.
Mesmo nas estruturas de pecado, Deus faz resplandecer a sua beleza no coração e na vida de tantos jovens, homens e mulheres do nosso tempo. A verdadeira beleza não desapareceu da nossa terra. Mesmo na água dos pântanos florescem lírios e açucenas. A beleza não está morta, todos os que honram, louvam e recorrem a Maria, descobrem e são atraídos pela sua beleza eterna, sem ruga nem mancha. Totta pulchra es Maria.
Senhora da Conceição, Padroeira de Portugal, ajuda os nossos jovens escuteiros a apreciar e transparecer na sua vida a beleza interior feita de luz e harmonia, para corresponderem ao modelo que tinha Deus quando criou o homem e a mulher à sua imagem.

Funchal, 08 de Dezembro de 2002

Solenidade da Imaculada Conceição
+Teodoro de Faria

Bispo do Funchal

Fonte Ecclesia

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