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Prática Dominical, Ministérios Sacerdotais e Ministérios Laicais
2002-11-06 12:36:47

1. Por várias razões, designadamente no contexto da análise dos resultados do Recenseamento da Prática Dominical de 2001, e da relação dessa prática com o número e a distribuição etária dos Padres ao serviço da Igreja em Portugal, tem-se vindo a falar mais, entre nós, da dimensão ministerial da Igreja.

É altura de recordar alguns textos do Magistério que constituem, a meu ver, pontos de referência importantes e úteis para o tratamento desta questão.
João Paulo II, no n. 23 da Exortação Apostólica Christifideles laici, sobre a vocação e missão dos leigos na Igreja e no mundo, de 30 de Dezembro de 1988, lembrou o seguinte:
“A missão salvífica da Igreja no mundo realiza-se não só pelos ministros que o são em virtude do sacramento da Ordem, mas também por todos os fiéis leigos: estes, com efeito, por força da sua condição baptismal e da sua vocação específica, na medida própria de cada um, participam no múnus sacerdotal, profético e real de Cristo.
Por isso, os Pastores devem reconhecer e promover os ofícios e as funções dos fiéis leigos, que têm o seu fundamento sacramental no Baptismo e na Confirmação, bem como, para muitos deles, no Matrimónio.
E, quando a necessidade ou a utilidade da Igreja o pedir, os pastores podem, segundo as normas estabelecidas pelo direito universal, confiar aos fiéis leigos certos ofícios e certas funções que, embora ligadas ao seu próprio ministério de pastores, não exigem, contudo, o carácter da Ordem. O Código de Direito Canónico escreve: «Onde as necessidades da Igreja o aconselharem, por falta de ministros, os leigos, mesmo que não sejam leitores ou acólitos, podem suprir alguns ofícios, como os de exercer o ministério da palavra, presidir às orações litúrgicas, conferir o baptismo e distribuir a sagrada Comunhão, segundo as prescrições do direito». Todavia, o exercício de semelhante tarefa não transforma o fiel leigo em pastor; na realidade, o que constitui o ministério não é a tarefa, mas a ordenação sacramental. Só o sacramento da Ordem confere ao ministro ordenado uma peculiar participação no ofício de Cristo, Chefe e Pastor, e no Seu sacerdócio eterno. A tarefa que se exerce como suplente recebe a sua legitimidade, formal e imediatamente, da delegação oficial que lhe dão os pastores e, no seu exercício concreto, submete-se à direcção da autoridade eclesiástica.”

2. De facto, o tema não era novo. Alguns anos após o termo do Concílio Vaticano II, em plena fase de consolidação do processo de recepção da doutrina e espírito do Concílio, Paulo VI afirmara, na Exortação Apostólica Evangelii numtiandi, sobre a evangelização no mundo actual, de 8 de Dezembro de 1975, n. 73, após ter posto em realce a importância da presença activa dos leigos nas realidades temporais:
“No entanto, é preciso não descurar ou deixar no esquecimento outra dimensão: os leigos podem também sentir-se chamados ou vir a ser chamados para colaborar com os próprios Pastores ao serviço da comunidade eclesial, para o crescimento da vida da mesma, pelo exercício dos ministérios muito diversificados, segundo a graça e os carismas que o Senhor houver por bem depositar neles.
Não é sem experimentar intimamente uma grande alegria que Nós vemos uma legião de Pastores, religiosos e leigos, apaixonados pela sua missão evangelizadora, a procurarem moldes mais adaptados em que anunciar eficazmente o Evangelho; e encorajamos a abertura que, nesta linha e com esta preocupação, a Igreja demonstra ter alcançado nos dias de hoje. Abertura para a reflexão, em primeiro lugar; e depois, abertura para ministérios eclesiais susceptíveis de rejuvenescer e de reforçar o seu próprio dinamismo evangelizador.
É certo que, ao lado dos ministérios ordenados, graças aos quais alguns fiéis são colocados na ordem dos Pastores e passam a consagrar-se de uma maneira particular ao serviço da comunidade, a Igreja reconhece também o lugar de ministérios não-ordenados, e que são aptos para assegurar um especial serviço da mesma Igreja.
Um relance sobre as origens da Igreja é muito elucidativo e fará com que se beneficie de uma antiga experiência nesta matéria dos ministérios, experiência que se apresenta válida, dado que ela permitiu à Igreja consolidar-se, crescer e expandir-se. O atender assim às fontes, deve ser completado ainda pela atenção às necessidades actuais da humanidade e da mesma Igreja. O ir beber nestas fontes sempre inspiradoras, e o nada sacrificar destes valores, mas saber adaptar-se às exigências e às necessidades actuais, constituem a base sobre que há-de assentar a busca sapiente e o colocar na devida luz os ministérios de que a Igreja precisa e que bom número dos seus membros hão-de ter a peito abraçar para uma maior vitalidade da comunidade eclesial.
Tais ministérios virão a ter um verdadeiro valor pastoral na medida em que se estabelecerem com um respeito absoluto da unidade e aproveitando-se da orientação dos Pastores, que são precisamente os responsáveis e os artífices da mesma unidade da Igreja.
Tais ministérios, novos na aparência mas muito ligados a experiências vividas pela Igreja ao longo da sua existência – por exemplo, os de catequistas, de animadores da oração e do canto, de cristãos devotados ao serviço da Palavra de Deus ou à assistência aos irmãos em necessidade, ou ainda os de chefes de pequenas comunidades, de responsáveis por movimentos apostólicos, ou outros responsáveis – são preciosos para a implantação, para a vida e para o crescimento da Igreja e para a sua capacidade de irradiar a própria mensagem à sua volta e para aqueles que estão distantes.”

3. Não obstante a reflexão que sobre o assunto tem sido produzida pelos Pastores e pelos teólogos, e apesar da urgência pastoral de que se reveste, a verdade é que persistem ainda questões por aprofundar e há decisões por tomar. Os trechos seguintes do n. 13 da Carta Pastoral ‘Os cristãos leigos na comunhão e missão da Igreja em Portugal’, publicada pela Conferência Episcopal Portuguesa, em 8 de Setembro de 1989, são significativos e representam um contributo importante para a definição de uma estratégia pastoral sobre esta matéria:
“No que aos ministérios diz respeito, é preciso chegar à definição clara do âmbito de cada um e esclarecer em que circunstâncias a forma habitual de servir a Igreja, numa esfera considerada permanente da sua acção, pode dar origem a um ministério estável. …
Mas é, sobretudo, no esclarecimento e estruturação dos ministérios laicais que é preciso dar passos em frente. …
É preciso não confundir ministérios instituídos, em sentido estrito, e serviços prestados pelos leigos, para a realização da missão da Igreja. Convém estruturar e incentivar esses serviços, porquanto só a partir daí se tornará claro quais os ministérios especificamente laicais a instituir.
É preciso não os confundir com aquelas funções pastorais que leigos exercem extraordinariamente em substituição dos sacerdotes, tais como presidir a determinadas acções litúrgicas, conferir o Baptismo, distribuir a sagrada Comunhão, etc. Para o exercício destas funções, os fiéis leigos não recebem o ministério sacerdotal; tais funções, porém, também não são específicas de um ministério laical.
Entre nós deveremos dar novos passos na instituição dos ministérios de leitor e acólito, mesmo a candidatos que não se destinam ao presbiterado nem ao diaconado. Será preciso garantir-lhes uma formação específica e pensar na sua intervenção pastoral. Trata-se de dois ministérios que se inserem em duas coordenadas decisivas da nossa acção pastoral: a da evangelização e a da acção litúrgica.
Para além destes dois ministérios instituídos, e enquanto não vêm da Santa Sé as novas normas prometidas, poderemos cultivar alguns serviços permanentes da comunidade, exercidos por leigos e que são, por natureza, funções laicais, isto é, atribuições que decorrem da própria qualidade baptismal. Alguns desses serviços permanentes poderão, um dia, desabrochar em ministérios instituídos. É-nos possível identificar, desde já, certas áreas onde esses serviços laicais se situam: a da catequese, a da pastoral sócio-caritativa, a da música litúrgica, a do acolhimento, a da administração dos bens eclesiásticos. Em todas estas áreas, poderão um dia surgir ministérios laicais instituídos, confirmando numa função aqueles que se preparam para esses serviços permanentes da comunidade e que estão dispostos a exercê-los de forma estável e duradoura.
É também importante que apareçam algumas dessas funções permanentes no âmbito da presença da Igreja no mundo. Áreas como a da assistência aos doentes e marginais, da informação, compreendida como um serviço, do ensino, da solidariedade, etc., são propícias a fazer surgir funções eclesiais com identidade própria.
Só despertará nas comunidades o sentido autêntico dos ministérios se cultivar a dimensão baptismal, verdadeira raiz de todo o ministério laical.”

4. A situação, em Portugal, no que respeita à celebração dominical, pode resumir-se em poucas linhas. Quase todas as celebrações dominicais coincidem com a celebração da Eucaristia, estando perfeitamente claro e bem definido que só os sacerdotes (isto é, os bispos e os presbíteros) validamente ordenados, podem presidir à celebração desse sacramento. Em algumas regiões do país estão a fazer-se celebrações dominicais (ou assembleias dominicais) na ausência de presbítero, cabendo a sua presidência ou a um diácono, ou a um outro fiel para tal devidamente preparado e designado pela autoridade diocesana. Actualmente, na grande maioria das celebrações dominicais, intervêm muitos outros fiéis, tais como acólitos, leitores, membros do coro, animadores litúrgicos, etc., na forma de colaboradores, mais ou menos habituais, e não no exercício de ministérios instituídos. Numa situação semelhante estão os ministros extraordinários da comunhão, aos quais, em muitas comunidades, têm sido atribuídas tarefas não só de natureza litúrgica, mas também no âmbito das funções evangelizadora e sócio-caritativa. Em suma, temos muitos servidores da comunidade, na prática, apesar de não haver ainda ministérios laicais (ou não-ordenados) instituídos.
Entretanto, é necessário não reduzir a questão dos ministérios à presidência das celebrações dominicais, nem aos outros ministérios que possam ser exercidos no âmbito da Eucaristia, ou da liturgia, em geral. Por outro lado, há um longo trabalho pastoral a continuar quer em termos de formação, quer no cultivo da participação co-responsável dos cristãos na vida e na missão da Igreja, a partir de uma consciência e de uma prática mais profundas do que é ser membro de Cristo, na Igreja.

Manuel Luís Marinho Antunes
Director CESP/UCP

Fonte Ecclesia

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