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A EMRC entre Reformas
2002-06-06 22:21:26

A Educação Moral e Religiosa Católica tem sido, na verdade, um espinho cravado na garganta de quantos, de forma mais velada ou de forma menos despudorada, pretendem impor a todo País, a pretexto de democracia, de isenção religiosa (isto é, de laicidade estatal), uma educação redutiva, com uma filosofia subjacente, para a qual o universo não é senão uma mistura de pedaços, que viajam entre o caos e o cosmos, a pessoa humana não ultrapassa os limites do espaço e do tempo, a vida se resume a uma harmoniosa combinação biológica, quando muito condicionante e condicionada por um mundo psíquico, às vezes surpreendente, mas já em adiantada fase de programação controlada e tentativa de cativeiro informático.

A Concordata de 1940, entre o Estado Português e Santa Sé, tendo em conta a situação da época, porventura moldada religiosamente pelas circunstâncias sociológicas, consagrou a confessionalidade do ensino público. Desde os símbolos cristãos nas salas de aula, até aos conteúdos religiosos e catequéticos (quem se não recorda da Bíblia das Escolas, dos manuais de História da Salvação?...) e às próprias actuações dos docentes, vivemos um certo período de verdadeira Religião e Moral Católica no nosso sistema escolar.
O decreto-lei 323/83 veio alterar significativamente as coisas. Nele encontramos a afirmação de um fundamento para a escolha do quadro de valores do sistema educativo não num acordo com uma confissão religiosa, mas na natureza da família, isto é, no direito e dever prioritário dos pais em matéria educativa. E isto a partir da própria declaração Universal dos Direitos do Homem e de outros diplomas internacionais ratificados pelo Estado Português. Daqui decorre também o reconhecimento da função de educação para a cidadania activa por parte da disciplina de Educação Moral e Religiosa Católica, agora oferecida como opção positiva dos Pais ou dos próprios alunos (quando têm idade para o fazer). E tudo isto em consonância com os preceitos constitucionais.
Após longas negociações, que envolveram o Governo, a Presidência da República, as Confissões Religiosas e outros parceiros educativos, o decreto-lei 386/89 consagrou, definitivamente, a oferta, por parte do Estado e de acordo com as obrigações que lhe cabem em matéria educativa, de uma pluralidade de opções de valores na educação - uma área de Formação Pessoal e Social, que se desenvolve, entre outras formas, por disciplinas alternativas, de matriz confessional ou não - a Educação Moral e Religiosa (das diversas confissões) ou o Desenvolvimento Pessoal e Social.
A Igreja Católica empenhou-se seriamente na implementação da disciplina. A qualificação dos docentes, a elaboração de programas e suportes didácticos, a divulgação dos objectivos desta hermenêutica da vida, do homem, do mundo, foram um esforço notável, acompanhado pela maioria das dioceses. E o resultado foi uma escolha livre da opção pela EMRC a rondar os 50% dos alunos do 2º e 3º Ciclos do Ensino Básico e do Ensino Secundário. E estes resultados conseguidos apesar de subtis formas de chantagem, como a fraca ou nula implementação das alternativas, a colocação da disciplina nas franjas horárias, a marginalização dos docentes... Até ao ano lectivo 2000/2001, estas percentagens mantiveram-se: no Ensino Básico são mais de metade dos alunos inscritos (+ de 55%); no Secundário, sujeito a todas as pressões competitivas e à conhecida fragmentação de cursos, ainda assim as inscrições ascendem aos dois dígitos (cerca 12%).
A avaliação feita, nas Escolas e por outros parceiros educativos, a partir de 1996 - e perguntamo-nos por que razão - não contemplou sequer a Área de Formação Pessoal e Social. Aí começou o ataque/marginalização da Educação Moral e Religiosa, procurando retirar-lhe a função educativa pessoal e social e colocando-a, de novo, sem alternativa, para dificultar mais a sua escolha. Seria, no dizer de um antigo Ministro da Educação, uma sobremesa, para quem a desejar. A par disso, ignorou-se o contributo educativo que as Igrejas têm significado ao longo da nossa história, já que foram sempre ignoradas em todo o processo de Revisão e Reorganização Curricular.
Os decretos 6/2001 e 7/2001 vieram consagrar esta marginalização, com os quadros anexos: apesar de o teor dos decretos afirmar a obrigatoriedade de oferecer a disciplina e, em microscópicas notas de rodapé, ser referenciada a EMRC como área curricular disciplinar, os figurinos curriculares fazem-na aparecer separada das outras áreas curriculares e emparceirando com áreas não curriculares, sugerindo tratar-se de actividades de enriquecimento ou projectos optativos para as Escolas.
O anterior Governo esquivou-se a considerar a situação que desencadeou como uma reforma educativa. Naturalmente que essa natureza envolveria outras discussões e outros níveis de discussão. Mas estamos, realmente, em presença de uma situação que configura uma verdadeira Reforma. Com a agravante de que envolve a violação de direitos fundamentais, atropelos à Constituição da República, alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo, ofensas à natureza da pessoa humana e desrespeito pela identidade cultural do Povo Português.
Não cremos que a barca se afunde! Por isso, estamos empenhados em motivar educadores e educandos para a inscrição na disciplina; estamos a desenvolver esforços para fazer da EMRC um genuíno contributo educativo, sob inspiração dos valores evangélicos; continuamos a lutar para que seja reconhecido o papel da vertente religiosa como integrante do sistema educativo, naturalmente para os que a desejarem ter; continuamos certos de que, sem quadros de valores morais explícitos, estamos a hipotecar o futuro da nossa sociedade.

P. Querubim Silva, Director do SNEC


Fonte Ecclesia

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