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Fantasma da Resignação Paira Sobre o Aniversário do Papa
2002-05-19 08:34:55

Uma aparência variável, ora muito frágil, ora revigorada, e um estado físico progressiva e lentamente mais débil são as notas principais do estado de saúde de Karol Wojtyla, o polaco que governa os destinos da Igreja Católica como Papa João Paulo II e que hoje completa 82 anos.

A data acaba por ficar marcada pelo crescente número de vozes autorizadas da hierarquia do Vaticano que comentam em público o possível cenário de uma abdicação por motivos de saúde.

Ontem, o porta-voz do Vaticano, Joaquin Navarro-Valls, afastou essa ideia: "Conforme ele próprio [João Paulo II] já disse, ele governará a Igreja enquanto Deus assim o quiser." Nos últimos anos, a saúde deste ancião que continua a mobilizar milhares de jovens pelos sítios onde passa deteriorou-se, mas Wojtyla insiste em manter as suas actividades, agora com a ajuda de uma cadeira de rodas, para se movimentar nos imensos corredores do Palácio Apostólico, a sua residência no Vaticano.

O Papa não desiste sequer de viajar: na próxima semana, está prevista uma deslocação à Bulgária e Azerbaijão, em fins de Julho irá ao Canadá para a Jornada Mundial da Juventude, em Agosto regressará à sua Polónia natal, para mais uma despedida. Em Junho de 1999, esteve na Polónia naquela que foi a mais longa viagem do seu pontificado, com 13 dias de duração e visitas a 20 cidades. Na altura, esta deslocação foi entendida como o "adeus" de um Papa já frágil à sua terra natal. Afinal, a despedida pode actualizar-se em Agosto próximo.

A viagem ao Canadá não deixará de constituir mais um revigoramento para o estado anímico de Wojtyla: os contactos com jovens constituíram desde sempre verdadeiros balões de oxigénio para um Papa que desde há anos se apresenta publicamente em deficientes condições de saúde, inversamente proporcionais ao seu grau de resistência física e tenacidade espiritual.

Esta dupla condição física e psicológica foi resumida há pouco mais de um mês pelo cardeal Edward Cassidy, ex-presidente do Conselho Pontifício para a Unidade dos Cristãos. Depois de ter jantado com João Paulo II, Cassidy afirmou que "o Papa está algo débil, o joelho dói-lhe, mas o seu coração e a sua cabeça estão fortes".

Esta ideia foi quase posta em causa nos últimos dois meses, quando funcionários da Casa Branca, nos EUA, deixaram escorregar declarações pouco abonatórias da posição da Santa Sé sobre a actual crise israelo-palestiniana. Dúvidas sobre a capacidade mental do Papa e a autoria dos discursos por ele proferidas foram notas implícitas em conversas com jornalistas. O pouco eco que tiveram revela a fraca consistência da suspeita.

A visita doméstica à ilha de Ischia, frente a Nápoles, no início de Maio, onde mais uma vez participou numa jornada de oração com centenas de jovens e adolescentes, funcionou novamente como um sopro de vitalidade. Debaixo de uma oliveira, o Papa ouviu a multidão cantar "O Sole Mio", numa demonstração do afecto napolitano. João Paulo II, que muitos consideram dever abdicar da cadeira de Pedro, em nome da saúde da Igreja Católica, respondeu com uma saudação surpreendente para um octogenário.

Jovens, a força revigoradora
São, no entanto, episódios como este que contrariam os mais cépticos. A visita de Ischia foi uma réplica, em escala menor, do que já tinha acontecido no Encontro Mundial da Juventude, durante o Grande Jubileu do ano 2000. Dessa vez, dois milhões de jovens oriundos de todo o mundo católico assistiram com o Papa, no palco de Tor Vergata, nos arredores de Roma, a um festival de paz e solidariedade. Também nessa altura, João Paulo II, nitidamente entusiasmado, saudou a imensa multidão exortando "as sentinelas da manhã" - expressão cara a Karol Wojtyla quando trata com os jovens - a "navegar no mar alto".

Ao longo deste pontificado, as grandes manifestações juvenis têm sido constantes. Foi João Paulo II quem inspirou a organização bienal dos encontros mundiais da juventude, cuja edição deste ano está marcada para a cidade de Toronto, no Canadá, na última semana de Julho, e onde se poderá repetir o que aconteceu em Roma - ou o que já tinha acontecido em Manila (Filipinas) dois anos antes, quando uma multidão calculada em quatro ou cinco milhões de pessoas - a maior concentração de sempre para um acontecimento - se juntou à volta do Papa.

Nestes acontecimentos, a simples presença do pontífice romano transforma-se numa inusitada euforia, quase a roçar o culto da personalidade que tanto desagrada a grupos e sectores católicos que criticam o que consideram o espectáculo de uma fé massificada. Mas poucos poderão duvidar de que este tipo de acontecimentos tem funcionado como possibilidade de reconstituição da força anímica de um homem angustiado com a paz do mundo, em geral, e com situações como a da Terra Santa, em particular. De um homem também empenhado no dialogo ecuménico e inter-religioso, mas que enfrenta tensões entre católicos e outros credos em diferentes partes do mundo, de um Papa peregrino que está a caminho da sua centésima viagem fora de Itália ao longo de 23 anos de pontificado.

"Não me retiro porque Jesus também não desceu da cruz", terá confidenciado Wojtyla aos mais próximos, que também terão ouvido que "na Igreja não há lugar para um Papa emérito". Uma persistência inabalável, que tem um reverso da medalha: o governo da Igreja está cada vez mais fragilizado, sente-se o ambiente de fim de pontificado, à espera de um sopro renovador e de um dinamismo reforçado. À semelhança do que aconteceu quando, no já longínquo Outubro de 1978, os cardeais elegeram o polaco e atlético Karol Wojtyla como Papa João Paulo II.

Fonte Público

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