paroquias.org
 

Notícias






Dai-nos a PAZ! - Mensagem dos Bispos de Angola e S. Tomé.
2002-03-18 21:01:51

. Perante o novo panorama político-militar decorrente dos últimos acontecimentos, somos levados a reflectir sobre a actual situação e os principais problemas que ela nos apresenta, dum modo particular com respeito à paz.

Sem cair em optimismos temerários, pois o quadro não tem só luzes mas também tem sombras, vamos alimentar a nossa esperança de paz dando-lhe razão de ser, com a abnegada colaboração de todos nós: Governo, Unita, Igrejas e demais cidadãos.
Neste sentido, registamos com particular agrado as diversas diligências políticas que têm sido feitas nos últimos dias, por não poucas instâncias, à procura do caminho certo que nos conduza à paz. É preciso avançar. Mas, todos juntos.

2. Cumpre-nos saudar o Governo pela linguagem e gestos de benevolência que tem manifestado, não descartando a hipótese de avançar uma declaração de tréguas nas hostilidades militares. Damos o nosso apoio a esta atitude do Gover-no, que rogamos a Deus venha a ser traduzida em actos concretos.
Mas à Unita cumpre-nos pedir outro tanto. Não faria sentido calarem-se as armas dum lado e continuarem a atroar do outro. Esperamos que os Responsáveis da Unita tenham a razão e a coragem de darem aqui o seu insubstituível contri-buto. Só com o definitivo calar das armas se pode restituir ao Povo a paz que, injustamente, lhe foi outra vez usurpada, já lá vão quase quatro anos.
A única condição que se deve propor para um cessar-fogo eficaz e definitivo é a segurança de pessoas e bens de todos os cidadãos, sem excluir os que andaram na guerra. Tudo isto será um gesto que, tanto da parte da Unita como do Go-verno, há-de merecer em todo o mundo o mais alto aplauso.

3. O cessar-fogo deve ser observado com honradez e assegurado com gestos de perdão, não somente a nível das cúpulas mas também a nível da base. Não bastam as amnistias. É precisa, sobretudo, a reconciliação fraterna entre os cidadãos.
Em boa verdade, a guerra tem sido realizada pelos filhos do Povo os quais, fardados e armados e sob ordens superiores, é que se têm perseguido e matado uns aos outros, abrindo-se mutuamente profundas feridas no coração. Só o bálsamo do perdão reconciliatório as poderá sarar.
Mas, o mais ofendido, quem mais tem a perdoar é o próprio Povo, a quem as armas fizeram perder a sua casa, os seus haveres, os seus filhos e até, nalguns casos, a honra das suas mulheres. Ao povo pedimos que tenha um coração grande e a coragem de perdoar.

4. Entre todas as pessoas ofendidas pela guerra, destacamos os deslocados, que já ultrapassam o número de quatro mi-lhões, a viverem em indescritíveis situações de miséria humana. São quatro milhões de Angolanos condenados ao des-terro, à fome e à morte, talvez lenta, mas irreversível e cruel.
Terá sido esta a libertação e a defesa que a guerra lhes prometeu?
Pedir lá fora ajuda humanitária para eles, num gesto de compaixão pelo seu sofrimento, e continuar a aumentar o seu número com a insistência da guerra, venha esta donde vier, parece-nos um ultraje à dignidade humana.
Esta tragédia humanitária dos Angolanos, provocada por irmãos seus, vai ficar registada como a página talvez mais infamante de toda a nossa história.

5. Os grupos de deslocados que vão aparecendo estão a ser para nós motivo de grande apreensão. É que, entre as pesso-as apresentadas, por vezes vêem-se quase só velhos, mulheres e crianças. Onde estão esses jovens e homens válidos que não aparecem, torna-se uma pergunta sobremaneira inquietante.
Fora de legítima defesa ou de legítimo combate, é sempre crime tirar a vida seja a quem for. Eliminar um pretenso ini-migo pode vir a ser criar dezenas deles a saber: todos os amigos do eliminado.
Sabemos que o bilateral desaparecimento de não poucos Angolanos, após o Protocolo de Lusaka e, portanto, fora de combate, foi um delituoso acontecimento a que não esteve alheio o retorno à guerra. Pedimos a Deus e aos homens que tal loucura se não repita mais na nossa Pátria.

6. Na expectativa dum próximo cessar-fogo, para o qual vimos exortando incessantemente os beligerantes, urge prepa-rar uma rede de medianeiros de paz, a que chamamos conciliadores, para apaziguar ódios e evitar vinganças.
Para este mesmo efeito, muito poderá também contribuir o estabelecimento dum núcleo activo de Direitos Humanos, nas principais localidades ou sedes municipais, ao qual possam recorrer as pessoas ameaçadas pela violação dos seus direitos, sobretudo no que respeita à segurança de pessoas e bens.
Desde já solicitamos às instâncias competentes que prevejam e preparem a realização deste projecto, que nos parece muito oportuno e necessário.

7. Presumimos que, com o regresso da paz, também se irá verificar o regresso das populações deslocadas às suas terras de origem. Doutra maneira, ao acabar a pouca ajuda humanitária ainda existente, como poderá viver sem emprego tanta população concentrada nas nossas cidades? Não será origem dum descalabro social, capaz de desencadear outro género de guerras? É um tema urgente a que se não podem furtar, de forma alguma, os Responsáveis da Nação.
O regresso dos deslocados às suas terras de origem, porém, faz-nos pensar na ocupação de terras que recentemente começou a fazer notícia. Não podemos deixar de aprovar o racional aproveitamento das terras, para a segurança alimen-tar e o desenvolvimento do País.
Isto não obstante, entendemos também que é grave dever do Governo velar pela defesa dos espaços vitais das popula-ções rurais, não permitindo que os terrenos de que precisam hoje ou vão precisar amanhã para o seu desenvolvimento sejam alienados, trocando o seu bem comum por interesses particulares. As lições do passado são bastante eloquentes para nos ensinarem a não cometer agora os mesmos erros que então condenámos.
8. Fazemos aqui um veemente apelo às Nações Unidas bem como a outros Organismos de beneficência a favor dos deslocados, para que não deixem de nos ajudar a ajudá-los, com o socorro humanitário que, por enquanto, ainda preci-sam.
Antes de acabar, aproveitamos esta oportunidade para, publicamente, nos congratulamos e associamos à celebração do Jubileu dos Missionários Espiritanos, a quem tanto deve a evangelização de Angola.
E terminamos volvendo o nosso olhar para a Virgem Maria, Mãe de Angola, a Cuja protecção confiamos as nossas esperanças de paz. .

Luanda, 12 de Março de 2002
Os Bispos Católicos de Angola e S. Tomé

Fonte Ecclesia

voltar

Enviar a um amigo

Imprimir notícia