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Discurso de D. José Policarpo
2001-11-12 21:25:38

Discurso do Presidente da CEP na abertura da Assembleia Plenária
Fátima; 12-15 de Novembro de 2001


1. Saúdo Vossas Excelências Reverendíssimas no início de mais uma Assembleia Plenária da Conferência Episcopal Portuguesa. Na pessoa. de Vossa Excelência Reverendíssima, Senhor Núncio Apostólico, saúdo o Santo Padre, a quem nos sentimos profundamente unidos, na fé e na caridade, de modo particular neste momento de ansiedade de toda a família humana, em que o seu ministério de Pastor Universal nos diz a palavra de serenidade e de esperança, autêntico rasto de luz a iluminar os caminhos da paz e da justiça. Na pessoa e no ministério do Papa a Igreja aparece como verdadeiro sinal e fermento de um
mundo novo, cujo ritmo e momento só Deus conhece.

Uma saudação muito amiga para o Senhor D. António Montes Moreira, novo Bispo de Bragança, que pela primeira vez participa nesta Assembleia, nessa qualidade. Pedimos a Deus que o seu ministério episcopal, na continuidade dos seus ilustres antecessores, seja rasto de luz para a Igreja de Bragança, a quem nos sentimos unidos, na comunhão fraterna das Igrejas. Saúdo igualmente o Senhor D. Januário Torgal Ferreira, nomeado Ordinário Castrense, e o Senhor D. Amândio Tomás, eleito Bispo Auxiliar de Évora. Da sua generosidade pastoral muito esperam a Conferência Episcopal e as Igrejas que vão servir.

2. Reúne-se a nossa Assembleia sob o impacto e o estímulo de diversos acontecimentos, que nos interpelam, sublinhando a exigência do nosso ministério pastoral: a beatificação de D. Frei Bartolomeu dos Mártires, que foi Arcebispo de Braga, modelo de Bispo e de pastor; o Sínodo dos Bispos, reunido em Roma durante o mês de Outubro e que teve como tema exactamente o ministério do Bispo servidor do Evangelho para a esperança do mundo; os acontecimentos de 11 de Setembro nos Estados Unidos da América, que lançaram a humanidade num período de grande instabilidade e ansiedade. Procuraremos, à luz da nossa fé em Jesus Cristo, captar os sinais contidos nestes acontecimentos.

A beatificação de um Bispo português recorda﷓nos a exigência de radicalidade evangélica do nosso ministério. Servidores do Evangelho, somos chamados a ser num momento concreto da história, profetas da esperança.

Servidores do Evangelho, na nossa vida pessoal e na coerência do nosso ministério pastoral, só o seremos na fidelidade a Jesus Cristo, o único Pastor da sua Igreja. O Evangelho é a palavra eterna e perenemente actual do Senhor Jesus Cristo. Ser servidor do Evangelho é não querer outra verdade, não procurar outra mensagem; é ter a coragem de procurar aí a resposta iluminadora que a Igreja é chamada a dar às variadas e complexas situações da vida dos homens. Não é sempre fácil de escutar a resposta do Evangelho; quantas vezes seria mais fácil e simpático dar respostas mais adaptadas às exigências da mutação cultural; mas a verdade que liberta e salva está na palavra de Cristo. Ser servidor do Evangelho pode significar, também, sofrer pelo Evangelho, ser “mártir” do Evangelho, Só assim o Bispo será profeta da esperança.

A esperança é a mais revolucionária experiência do coração humano. Não se confunde com o simples optimismo, tem a sua raiz na certeza de fé que Cristo venceu o mal e continua a poder vencê﷓lo no coração de todos os homens, qual fruto precioso da acção do Seu Espírito no meio de nós. Só são testemunhas de esperança aqueles que acreditam no amor que o Espírito de Cristo depositou nos nossos corações.

3. Este desafio que nos é lançado de sermos profetas da Esperança, reveste﷓se de uma exigência particular no contexto das actuais incertezas da família humana. Não faz parte da nossa missão de pastores fazer análises geo-estratégicas político﷓militares. Mas toca﷓nos o coração os milhares de vítimas inocentes, apanhadas na teia de interesses e ódios acumulados; não podemos ficar indiferentes às multidões de pobres e deslocados, rosto dramático das desordens do mundo actual; aprofunda﷓se em nós a certeza de que a violência não é solução, embora por vezes seja inevitável defender﷓se da violência com outras formas de violência; ser profeta da esperança é anunciar, mesmo nas circunstâncias mais adversas, que a paz é possível, que a paz pelas caminhos da justiça é um dever.

Na presente teia dos acontecimentos e das reacções que eles provocam, há um aspecto que nos interpela particularmente: a maneira como tem sido invocado a Santo nome de Deus. A nós cristãos, a quem foi revelado que Deus é amor, repugna﷓nos profundamente que se invoque o nome de Deus para justificar qualquer forma de morte ou de violência, como nos entristece igualmente a atitude daqueles que, perante acontecimentos tão dramáticos, ousam dizer que toda a fé em Deus é a causa de todos os males da humanidade. Mas também nos inquieta verificar que os que confessam que Deus é amor, não fazem tudo o que está ao seu alcance para construir uma civilização do amor, alicerçada na justiça e na fraternidade.

Na nossa missão de pastores devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para levar as pessoas, crentes e descrentes, a repor o problema de Deus, ajudando﷓os a responder à pergunte: mas quem é, afinal, Deus? Sabemos que o caminho para esse resposta é descobrir Deus, contemplando o rosto de Jesus Cristo, que nos amou até ao dom da própria vida. O Deus verdadeiro não se encontra na discussão, nem sequer no diálogo inter-cultural ou inter﷓religioso. Encontra﷓se abrindo o coração ao seu mistério de amor, o que só se verifica se o nosso coração está aberto a esse amor infinito. Deus não se conclui, Deus acontece, irrompe como surpresa e transforma﷓se então no único fundamento da nossa esperança.

4, No presente conflito tem﷓se sublinhado o confronto entre o “ocidente cristão" e grupos extremistas da fé islâmica, confronto já assinalado pelo sacrifício violento de cristãos, exactamente porque o eram. Partilhamos a pensamento de quantos têm afirmado que não é legítimo identificar este extremismo violento com o Islão como um todo, sublinhando a afirmação do Santo Padre que a religião sincera nunca pode ser geradora de violência.

Continuamos a pensar que o diálogo inter﷓religioso, baseado no respeito mútuo, é um caminho para a paz, Mas pensamos igualmente que, depois destes acontecimentos dramáticos, o diálogo inter﷓religioso não se pode limitar à simples tolerância; esta esvai﷓se quando a motivação da violência é mais forte. É preciso dar passos novos no conhecimento recíproco, nos valores que partilhamos, na busca comum de caminhos de paz e de justiça. Esperamos dos nossos irmãos muçulmanos sinais que mostrem ao mundo que a sua fé religiosa é promotora de paz e da defesa da dignidade da pessoa humana, sinais que terão, necessariamente de passar por um maior respeito pela liberdade de consciência e de religião. Caso contrário, as imagens de intolerância e de violência acabarão por marcar a maneira de ver de todo o mundo não islâmico.

Aproveito este ocasião para saudar os nossos irmãos de fé islâmica radicados em Portugal, garantindo﷓lhes a nossa determinação em continuar a construir com eles urna convivência radicada no diálogo e no respeito mútuo. Inseridos numa sociedade democrática, baseada na liberdade e no respeito pelas opções religiosas dos cidadãos, têm entre nós direito de cidadania, a mesmo que gostaríamos de ver garantidos para os cristãos nos países de maioria muçulmana. A sua coragem em avançar pelos caminhos do diálogo e do respeito mútuo, dará um dia frutos neste caldear doloroso de um mundo novo.

5. Profetas da esperança, torna﷓se assim mais urgente acolher o desafio do Papa para o novo milénio. Como receber a "Novo Mlliennio 1neunte", faz parte da nossa agenda. A esperança anuncia﷓se através de sinais: o serviço desinteressado e generoso; a predilecção pelos pobres, o que supõe um coração de pobre, a solidificação da família como comunidade de vida e de amor; a educação como aventura de descoberta da vida, aprendizagem da liberdade e de generosidade.

Que a Senhora do Rosário ouça as nossas preces e nos proteja como Mãe, e que o Beato Bartolomeu dos Mártires nos obtenha de Deus partilharmos o seu zelo de pastor.

+ José, Cardeal-Patriarca
Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa

Fonte Ecclesia

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