Bom dia a todos,
Venho-vos pedir, por favor, que me esclareçam algumas dúvidas que tenho em relação a meditação contemplativa.
1ª A palavra, “Mantra”, maranatha, deve ser articulada, pronunciada suavemente, em voz baixa, ou deve ser apenas dita mentalmente?
2ª O mantra deve ser dito constantemente, repetidamente, ou só devemos volver ao mantra quando a mente começa a divagar?
3ª O mantra deve estar associado, sincronizado, com a respiração?
Fico muito agradecido se alguém me puder esclarecer.
Cumprimentos e felicidades.

Citação:

fernandonunes
Bom dia a todos,
Venho-vos pedir, por favor, que me esclareçam algumas dúvidas que tenho em relação a meditação contemplativa.
1ª A palavra, “Mantra”, maranatha, deve ser articulada, pronunciada suavemente, em voz baixa, ou deve ser apenas dita mentalmente?
2ª O mantra deve ser dito constantemente, repetidamente, ou só devemos volver ao mantra quando a mente começa a divagar?
3ª O mantra deve estar associado, sincronizado, com a respiração?
Fico muito agradecido se alguém me puder esclarecer.
Cumprimentos e felicidades.

Boa noite.

1- O "mantra" é originário do hinduísmo, o conceito não existe no cristianismo e só foi introduzido depois, impropriamente, por analogia. A palavra "Mantra" vem de "Man" (mente) e "Tra" ou "Trai" (proteger, libertar). Etimologicamente, portanto, pode ser traduzido na expressão "pensamento que liberta". (Liberta do "Sansara", a ilusão do mundo.)

A palavra "maranatha" tem outra etimologia, tem origem aramaica, "Maran" (vem) e "Atha" (Senhor).

Respondendo sua pergunta: sim, num "mantra" a palavra deve ser vocalizada. Mais exatamente, o "mantra" seria a própria mente sonorizada. Um hindu crê que a união das palavras corretas, associadas a correta inflexão da voz, na frequência sonora correta do mantra corretamente recitado, seriam capazes de sincronizar a mente do orante com a divindade, estabelecendo algum tipo de contato. As palavras corretas (bija) carregam poder que associado a forma sonora correta (sakti) movem a divindade, ou para a divindade. Mas não se trata só de "esforço técnico", porque a mente também deve estar em sintonia no processo.

Esse tipo de ideário não faz nenhum sentido no cristianismo, é-nos completamente estranho. Entretanto, se desconsiderar tudo isso e atentar apenas na etimologia, então é possível imaginar a oração cristã como um tipo de "pensamento que liberta". Assim, só impropriamente podemos falar de "mantras" na oração cristã. As jaculatórias cristãs não têm semelhança com os mantras hindus, as possíveis semelhanças são exteriores, na aparência, pelo fato das repetições. Para uma brevíssima introdução ao hesicasmo (oração cristã do coração, que também associa voz, pensamento e respiração) sugiro a leitura de "O Peregrino Russo". É uma ótima leitura, muito edificante.

2- O mantra hindu é sempre sonorizado, já que a combinação das vibrações sonoras é que moveriam o orante para o plano da divindade.

3- Sim novamente.

Se o assunto te interessa, no contexto cristão, recomendo as leitura abaixo:
1) Filocália - é um clássico da literatura católica ortodoxa, mas de leitura mais difícil.
2) O peregrino russo - já citado, é outro clássico, mas com leitura bem mais "palatável" :)
3) A oração do nome de Jesus - publicado pela Loyola na coleção "A oração dos pobres". Lindo livrinho! Leitura ótima.

Fica com Deus.

Bom dia,
Obrigado pela sua resposta tão esclarecedora.
Sobre o conceito do, “Mantra”, associado ao pensamento / filosofia oriental, já tinha algum conhecimento. E, segundo o que li sobre a meditação cristã, o significado da palavra, “Maranatha”, quando recitada na oração contemplativa, não é importante, aliás, diz o autor / escritor, que não se deve pensar no significado da mesma. Mas estou apenas a constatar o que li, o meu conhecimento sobre a meditação cristã é muito escasso.
De resto, vou tentar arranjar os livros que me sugeriu e lê-los.
Cumprimentos e felicidades,

Fernando

Um muito bom dia a todos,
Comecei a meditar à pouco tempo e tenho distrações constantes, que quase me fazem perder a paciência e a perseverança.Álem disto. qualquer pequeno dissabor influencia a qualidade da minha atenção.
Desde já um muito obrigado a quem me possa ajudar.

Olá José.

O problema que colocas foi e é o grande problema de todos os mestres de oração e meditação.
Essas dificuldades vais encontrar sempre. Na verdade, elas até são necessárias no caminho de uma purificação e elevação interior, na medida em que são sinais de alerta que te são dados, e que te permitem ver que esse caminho é um caminho nunca terminado. Por outro lado, o caminho da elevação é um caminho de deserto - o Pai quer que percas todas as seguranças que te sirvam de apoio, de modo que te abandones, não a técnicas de concertação, ou ao conforto dado pela ideia de que tudo está bem - mecanismos de compensação, mas sim que te abandones a Ele, e somente a Ele.

Sugiro que leias um livro sobre esses assuntos. Sugiro-te dois: Mostra-me o Teu Rosto, de Ignacio Larrañaga; Se soubesses o dom de Deus, de Luís Rocha e Melo, S.J.

Concede, Senhor, que eu bem saiba se é mais importante invocar-te e louvar-te, ou se devo antes conhecer-te, para depois te invocar. Mas alguém te invocará antes de te conhecer? Porque, te ignorando, facilmente estará em perigo de invocar outrem. Porque, porventura, deves antes ser invocado para depois ser conhecido? Mas como invocarão aquele em que não crêem? Ou como haverão de crer que alguém lhos pregue? Com certeza, louvarão ao Senhor os que o buscam, porque os que o buscam o encontram e os que o encontram hão de louvá-lo (S. Agostinho, Confissões)

Obrigado Rui Vieira,
a tua resposta é profunda e esclarecedora.
Um bem haja.

Olá José Alves,

(parece que faz um século que não escrevo no fórum, mas vamos lá)

Apenas reforçando as dicas passadas pelo Rui:

Diferente de outras formas de meditação, a meditação cristã é antes um exercício de abandono de si nas mãos do Pai do que propriamente uma prática de técnicas de concentração ou algum tipo de exercício baseado no esforço pessoal. Talvez por isso mesmo, a "simplicidade" dela seja tão "difícil".

Seguem alguns conselhos práticos:

1) A meditação é uma forma de oração, e ninguém tem poder para "produzir" uma boa oração. Acreditamos que isso é um dom, vem do Pai e do Filho através do Espírito. As dicas práticas como escolher um lugar sossegado e uma boa postura para o corpo, elas podem ajudar, mas em si não trazem garantia nenhuma de "boa oração".

2) Depois do anterior, é importante esse outro conselho: não existe "oração ruim". Se dedicou parte do seu tempo para o encontro com o Senhor, com boa intenção e sinceridade, se ficou lá e "lutou" contra o sono, contra as distrações, se esperou e não desesperou, então a oração já foi "boa". Aprenda com ela.

3) A meditação cristã é um "encontro com um amigo". Converse com ele e viva a experiência do encontro. Haja de acordo e respeite a dignidade especial desse amigo único que tb é seu Senhor.

4) Terminado o encontro, examine como foi para aprender a linguagem do coração, que Deus também "fala". Ele sempre diz algo importante para si, então não procure recados ou lições para os outros, mas veja o que há em si que está sendo curado.

5) Contabilidades são distrações. Desespero é tentação. Conheça-te melhor, reconheça-te pecador, mas tudo isso sempre sob a ótica de Deus. Ele certamente não quer te jogar para baixo ou te destruir, mas te levantar e curar.

6) Uma dica que pode ajudar contra as distrações é "não lute com elas". Se enveredar por esse caminho pode ocorrer de cair na cilada de pensar que a solução é (novamente) o esforço pessoal, e no pior caso até a luta contra a distração pode também se tornar uma distração... Abandone-se nas mãos de Deus. Transforme a distração em oração e ela desaparecerá. Converse com o Senhor e pergunte: "por que isso agora?", "há algo para aprender de mim nessa distração?", "Pai, o que está buscando curar em mim?", etc.

7) Não espante que dissabores afetem sua oração, pode mesmo ser bom sinal até, pq mostra que sua oração não está desconectada da sua vida. Outra vez, se um dissabor te incomodou muito, isso pode te dar uma pista de algo que precisa do toque curador do Senhor. Enfim, traga sua vida para a oração, e então a oração vai de fato fazer parte da sua vida ;)

Espero que ajude,

Paz e Bem.