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O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 04 de May de 2010 19:44

Embora não me considere propriamente muito «balthasariano», tenho, talvez por motivos diferentes dos de Urs von Bathasar, uma grande devoção ao dia de Sábado Santo. Senti-me «estimulado» a deixar aqui uma breve nota sobre o assunto ao ver que o Papa Bento XVI desenvolveu uma curta mas muito rica meditação sobre o tema, a propósito da sua visita ao «Santo Sudário» de Turim, este domingo passado.

Assim, aproveito a oportunidade para uma pequena nota que tinha em mente sobre o tema e para deixar uma cópia do texto de Bento XVI, que me parece merecer atenção meditativa.


I.

Pequenas considerações


Para lá da óbvia questão de tipo dogmático, relacionada com o artigo do «Símbolo dos Apóstolos», que diz que Jesus Cristo «desceu à mansão dos mortos», há dois âmbitos de tipo espiritual aos quais aplico este «quadro». Aqui vou apenas falar de um deles, que me é bastante caro.

Tem a ver com a questão da «morte de Deus», não tanto enquanto abordagem nietzscheana, sartriana ou pós-moderna, mais ou menos teórica e distanciada, mas primariamente enquanto experiência vital/espiritual pela qual passam tantas pessoas.

a) É a experiência de tantas pessoas que se dizem descrentes (ateias ou agnósticas), porque em boa consciência não encontram mais que um «nada», um «silêncio», uma «ausência», quando não um «sem-sentido», e esbarram com a impossibilidade real de dar o chamado «salto da fé». Por estranho que possa parecer, isto não deveria ser totalmente «alheio» aos crentes. Às vezes imagino uma espécie de «hipocentro do âmbito teologal da fé» onde se encontram o crente e o descrente, em suma pobreza, diante do silêncio do Sábado Santo. Acreditar (=dar crédito) numa «voz» que anuncia o «impossível» é certamente uma graça. O crente dá o passo; o descrente, com a mesma sinceridade, não o dá.

[Evidentemente, aqui não estou a tocar a questão (de outro nível de abordagem) das «provas» da existência de Deus, em abstracto, nem sequer a questão da possibilidade de conhecimento racional de Deus, «com certeza», segundo os termos da «Dei Filius» (Concílio Vaticano I). [Sobre isto vejam-se os números 27-30, 31-35 e 36-38 do Catecismo da Igreja Católica]. Estas questões mostram «apenas» que para o crente a fé não exclui a razão, não que quem não tem fé é menos «racional» ou menos inteligente. Tenha-se ainda presente que a fé não se resume a um «“kit” de conteúdos». É muito menos e muito mais que isso.]

b) É a experiência de muitos crentes que num dado momento da sua relação com Deus «O» perdem, mesmo num contexto de habitual e intensa oração. «Desolação espiritual», «noite escura» ou outras são expressões usadas frequentemente para falar destas coisas. Habitualmente as desolações não duram muito tempo, mas há algumas situações de desolações atrozes, de experiências de «nihilismo», entre crentes. Superar estas desolações é, evidentemente, também, uma graça. Três grandes Teresas passaram por isso, muito embora isto seja mais frequente do que se pensa: Teresa de Ávila, Teresa de Lisieux e Teresa de Calcutá. Infelizmente, de Teresa de Lisieux fez-se um retrato «melífluo», que pouco tem a ver com a grandeza da sua «luta interior». De Teresa de Calcutá, quando vieram a público algumas revelações sobre as suas lutas interiores de fé, começaram criar-se boatos sem sentido de que isso iria atrasar ou anular a sua beatificação.

Isto leva-me a esboçar algumas consequências. No entanto, não se queira ver no que digo a seguir qualquer recado a quem quer que seja, porque esta é uma questão muito antiga nos meus «solilóquios».

1. É fundamental cultivar um grande respeito por toda a pessoa que sinceramente não se sente impelida a dar o passo da fé. Não é frequente ter a possibilidade de encontrar um descrente que se preste ao diálogo de visitar o tal «hipocentro» do âmbito onde se dá (ou não) o passo da fé, mas essa dificuldade também existe entre os crentes. Não é fácil «visitar» com valentia esse espaço radical (=espaço da raiz). Tanto entre crentes como descrentes entram em jogo muitas imagens mais ou menos idolátricas de Deus e muitas motivações não propriamente purificadas.

2. Nós, crentes, não temos méritos pessoais para nos considerarmos «superiores» àqueles que se declaram não ter fé. Por muito que consideremos a fé como um grande dom, talvez o maior de todos, ela é sempre isso, DOM, dom recebido. Revisitar o Sábado Santo pode ajudar-nos a crescer na gratidão, na humildade e sentido de responsabilidade e solidariedade (ou «com-paixão»).

3. Naturalmente, há que levar também com distância crítica as invectivas de que a descrença é a única opção racional possível. Mas talvez algumas dessas invectivas sejam convites à purificação das nossas motivações e «apologias» fáceis.


Com tudo isto, volto ao Sábado Santo. Gosto de pensar que ao «descer à mansão dos mortos», Jesus Cristo visita todos os espaços da nossa desolação, pessoal, social, histórica; os âmbitos onde aparentemente não há mais esperança para lá do que vemos no imediato e onde «só um Deus nos pode salvar». Penso nisto a propósito, também, por exemplo, das relações pessoais «mortas» ou «feridas de morte». E porque visita tudo isso, só Ele pode ressuscitar tudo isso.

Assim, é na experiência de máximo dramatismo (Urs von Balthasar eleva este dramatismo ao máximo, ao «transferi-lo» para o seio da Santíssima Trindade) que se poderá vislumbrar uma pequena centelha de esperança. Para o crente, o Sábado Santo é o «tempo» da «espera» e da esperança, o espaço genuíno onde Deus Se pode revelar como tal: quando tudo parece ter acabado em trevas, em silêncio, em nada, Deus intervém, tem a última palavra. Num tempo e num modo que nos escapam. E isso é a Páscoa.

Deixar que Jesus Cristo visite a minha mansão dos mortos, para que (só Ele) possa ressuscitar o que for ainda reino das trevas, da morte, do desamor...



II.

A meditação de Bento XVI a propósito do «Santo Sudário», em tradução espanhola, «via 'Zenit'». Original em italiano.


Como verão, é um texto meditativo, que se escapa oportunamente da questão muitas vezes badalada da autenticidade da relíquia, tema que, se alguém julgar importante, o poderá sugerir no fórum geral (não aqui).


Citação:
Bento XVI
Queridos amigos:
.
Se trata de un momento muy esperado por mí. En otra ocasión, estuve ante la Sábana Santa, pero ahora vivo esta peregrinación con particular intensidad: quizá porque el paso de los años me hace todavía más sensible al mensaje de este extraordinario icono; quizá, y diría sobre todo, porque estoy aquí como sucesor de Pedro, y traigo en mi corazón a toda la Iglesia, es más, a toda la humanidad. Doy las gracias a Dios por el don de esta peregrinación, y también por la oportunidad de compartir con vosotros una breve meditación, que me sugiere el subtítulo de esta solemne exposición: "El misterio del Sábado Santo".

Se puede decir que la Sábana Santa es el icono de este misterio, icono del Sábado Santo. De hecho, es una tela de sepulcro, que ha envuelto el cuerpo de un hombre crucificado, y que corresponde en todo a lo que nos dicen los Evangelios sobre Jesús, quien crucificado hacia mediodía, expiró a eso de las tres de la tarde. Al caer la noche, dado que era la Parasceve, es decir, la vigilia del sábado solemne de Pascua, José de Arimatea, un rico y autorizado miembro del Sanedrín, pidió valientemente a Poncio Pilato que le permitiera sepultar a Jesús en su sepulcro nuevo, que había excavado en la roca a poca distancia del Gólgota. Tras alcanzar el permiso, compró una sábana y, tras la deposición del cuerpo de Jesús de la cruz, lo envolvió con aquel lienzo y lo puso en aquella tumba (Cf. Marcos 15,42-46). Es lo que refiere el Evangelio de Marcos y con él concuerdan los demás evangelistas. Desde ese momento, Jesús permaneció en el sepulcro hasta el alba del día después del sábado, y la Sábana de Turín nos ofrece la imagen de cómo era su cuerpo en la tumba durante ese tiempo, que cronológicamente fue breve (en torno a un día y medio), pero con un valor y un significado inmenso e infinito.

El Sábado Santo es el día del escondimiento de Dios, como se lee en una antigua homilía: "¿Qué es lo que hoy sucede? Un gran silencio envuelve la tierra; un gran silencio y soledad, porque el Rey duerme [...]. Dios en la carne ha muerto y el Abismo ha despertado" (Homilía sobre el Sábado Santo, PG 43, 439). En el Credo, profesamos que Jesucristo "padeció bajo el poder de Poncio Pilato, fue crucificado muerto y sepultado, descendió a los infiernos, al tercer día resucitó de entre los muertos".

Queridos hermanos y hermanas: en nuestro tiempo, especialmente después del siglo pasado, la humanidad se ha hecho particularmente sensible al misterio del Sábado Santo. El escondimiento de Dios forma parte de la espiritualidad del hombre contemporáneo, de manera existencial, casi inconsciente, como un vacío en el corazón que ha ido haciéndose cada vez más grande. Al final del siglo XIX, Nietzsche escribía: "¡Dios ha muerto! ¡Y nosotros le hemos matado!". Esta famosa expresión, si se analiza bien, es tomada casi al pie de la letra, por la tradición cristiana, con frecuencia la repetimos en el Vía Crucis, quizá sin darnos cuenta plenamente de lo que decimos. Después de las dos guerras mundiales, de los lagers y de los gulags, de Hiroshima y Nagasaki, nuestra época se ha convertido cada vez más en un Sábado Santo: la oscuridad de este día interpela a todos los que reflexionan sobre la vida, de manera particular nos interpela a nosotros, creyentes. También nosotros tenemos que vérnoslas con esta oscuridad.

Y, sin embargo, la muerte del Hijo de Dios, de Jesús de Nazaret, tiene un aspecto opuesto, totalmente positivo, fuente de consuelo y de esperanza. Y esto me hace pensar en el hecho de que la Sábana Santa se comporta como un documento "fotográfico", dotado de un "positivo" y de un "negativo". De hecho, es precisamente así: el misterio más oscuro de la fe es al mismo tiempo el signo más luminoso de una esperanza que no tiene confines. El Sábado Santo es la "tierra de nadie" entre la muerte y la resurrección, pero en esta "tierra de nadie" ha entrado Uno, el Único, que la ha recorrido con los signos de su Pasión por el hombre: "Passio Christi. Passio hominis". Y la Sábana Santa nos habla exactamente de ese momento, es testigo precisamente de ese intervalo único e irrepetible en la historia de la humanidad y del universo, en el que Dios, en Jesucristo, ha compartido no sólo nuestro morir, sino también nuestra permanencia en la muerte. La solidaridad más radical.

En ese "tiempo-más-allá-del-tiempo", Jesucristo "descendió a los infiernos". ¿Qué significa esta expresión? Quiere decir que Dios, hecho hombre, ha llegado hasta el punto de entrar en la soledad máxima y absoluta del hombre, donde no llega ningún rayo de amor, donde reina el abandono total sin ninguna palabra de consuelo: "los infiernos". Jesucristo, permaneciendo en la muerte, cruzó la puerta de esta soledad última para guiarnos también a nosotros y atravesarla con él.

Todos hemos experimentado alguna vez una sensación aterradora de abandono, y lo que más miedo nos da de la muerte es precisamente eso, como niños que tenemos miedo de estar solos en la oscuridad y sólo la presencia de una personas que nos ama nos puede tranquilizar. Esto es precisamente lo que sucedió en el Sábado Santo: en el reino de la muerte resonó la voz de Dios. Sucedió lo impensable: es decir, el Amor penetró "en los infiernos"; incluso en la oscuridad máxima de la soledad humana más absoluta podemos escuchar una voz que nos llama y encontrar una mano que nos saca afuera. El ser humano vive por el hecho de que es amado y puede amar; y si incluso en el espacio de la muerte ha llegado a penetrar el amor, entonces incluso allí ha llegado la vida. En la hora de la máxima soledad nunca estaremos solos: "Passio Christi. Passio hominis".

¡Este es el misterio de Sábado Santo! Precisamente desde allí, desde la oscuridad de la muerte del Hijo de Dios, ha surgido la luz de una nueva esperanza: la luz de la Resurrección. Me parece que al contemplar esta sagrada tela con los ojos de la fe se percibe algo de esa luz. La Sábana Santa ha quedado sumergida en esa oscuridad profunda, pero es al mismo tiempo luminosa; y yo pienso que si miles y miles de personas vienen a venerarla, sin contar a quienes la contemplan a través de las imágenes, es porque en ella no sólo ven la oscuridad, sino también la luz; más que la derrota de la vida y del amor, ven la victoria, la victoria de la vida sobre la muerte, del amor sobre el odio; ciertamente ven la muerte de Jesús, pero entrevén su Resurrección; en el seno de la muerte ahora palpita la vida, pues en ella mora el amor. Este es el poder de la Sábana Santa: del rostro de este "varón de dolores", que carga con la pasión del hombre de todo tiempo y lugar, incluso con nuestras pasiones, nuestros sufrimientos, nuestras dificultades, nuestros pecados --"Passio Christi. Passio hominis"-- emana una solemne majestad, un señorío paradójico. Este rostro, estas manos y estos pies, este costado, todo este cuerpo habla, es en sí mismo una palabra que podemos escuchar en silencio ¿Cómo habla la Sábana Santa? ¡Habla con la sangre, y la sangre es la vida! La Sábana Santa es un icono escrito con sangre; sangre de un hombre flagelado, coronado de espinas, crucificado y herido en el costado derecho. La imagen impresa en la Sábana Santa es la de un muerto, pero la sangre habla de su vida. Cada traza de sangre habla de amor y de vida. Especialmente esa gran mancha cercana al costado, hecha de la sangre y del agua manados copiosamente de una gran herida provocada por una lanza romana, esa sangre y ese agua hablan de vida. Es como un manantial que murmura en el silencio y nosotros podemos oírlo, podemos escucharlo, en el silencio del Sábado Santo.

Queridos amigos, alabemos siempre al Señor por su amor fiel y misericordioso. Al salir de este lugar santo, nos llevamos en los ojos la imagen de la Sábana Santa, llevamos en el corazón esta palabra de amor, y alabamos a Dios con una vida llena de fe, de esperanza y de caridad. Gracias.


[Traducción del original italiano realizada por Jesús Colina
©Libreria Editrice Vaticana]

Alef



Editado 1 vezes. Última edição em 04/05/2010 20:14 por Alef.

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Miriam (IP registado)
Data: 04 de May de 2010 22:54

Alef,
Que reflexão linda!

A meditação do Santo Padre já tinha lido, refiro-me agora à tua. Muito bonita, vou levá-la à minha leitura espiritual de amanhã e vou meditar nalguns dos pontos que propões, como o da desolação e a relação que ela pode ter – e tem – com o silêncio, o ir ao deserto, a introspecção, o interior, ao mais fundo de nós mesmos e à raiz das nossas motivações. No fundo, ao encontro mais pleno e perfeito que podemos ter com Deus enquanto vivemos na terra.

Muito obrigada por teres partilhado connosco. E, sobretudo, por me fazeres recordar de algo tão importante quanto esquecido ou por mim tão mal meditado: o Sábado santo e o que ele representa.

No final da adoração da Santa Cruz de Sexta Santa, os sacerdotes costumam recomendar o silêncio até à vigília pascal. Quando mais pequena, não compreendia o que significava este silêncio e perguntava-me frequente e secretamente porque seria que o silêncio não durava só o resto da Sexta mas se prolongava no Sábado todo o dia.

Hoje, já conhecendo o significado profundo do silêncio, o Sábado Santo é, talvez, o dia – mais rico em meditações do ano litúrgico.

Aquele silêncio orante, que espera, que já conhece o desfecho da história, é cheio de significados:
1 Falo sempre por mim. Por um lado, é no silêncio que consigo maravilhar-me ainda mais, e de um modo sempre renovado, com o grande amor que Deus tem por mim. Amor tão grande que, para me salvar das trevas do pecado e da morte eterna, carregou sobre si o peso dos meus pecados. É assustador pensar-se a sério nisto, olhar para o amor de Jesus com olhos de ver e depois contrastar com a frieza e infidelidade com que lhe tenho correspondido (ou talvez nem isso). Neste sentido, estamos perante um silêncio envolvido na gratidão, de um coração que, embora de luto, rejubila por ter sido amado de um modo tal que levou à morte o filho de Deus. Trata-se, pois, de um silêncio ao mesmo tempo triste e alegre, repleto de gratidão e de contínuas acções de graças. Triste, porque reflexo de uma introspecção em que constato a minha falta de correspondência ao tão grande amor do meu Jesus.
2 É um silêncio vitorioso, triunfante, uma vez que já aguardamos a vitória da vida sobre a morte, o triunfo da graça sobre o pecado. Sabemos que por nós Cristo morreu, mas que a morte não teve a última palavra. E aí, medito nas riquezas que são o perdão, a reconciliação e o amor em sentido pleno: seja por Deus seja pelos irmãos. E também o verdadeiro e profundo significado da alegria cristã.
3 É como dizes, o Sábado Santo e o silêncio a que somos convidados nesse dia obrigam-nos a, como costumo dizer, «fugir para dentro de nós». No dia-a-dia, raramente paro para fazer silêncio. Parece que o silêncio, quando prolongado, me acusa e, assim sendo, quase sem me dar conta, fujo dele.

Agora quando somos “obrigados” pelas circunstâncias a fazer silêncio – não só exterior mas também, e sobretudo, interior -, é inevitável a introspecção, a consideração do meu pecado, da minha infidelidade, da minha debilidade, de tudo aquilo de que fujo no dia-a-dia.
4 Ao longo do ano, deveria fazer mais vezes a experiência transformadora do Sábado Santo. Porque desse período de silêncio “obrigatório”, tiro sempre grandes lições espirituais.

Já me deixaste aqui um preciosíssimo contributo: quando estiver na desolação, vou meditar no Sábado Santo. Nunca tal me tinha ocorrido e a meditação desse silêncio que espera e que procura ir ao mais fundo e escondido de nós é uma meditação muito rica na desolação.

É rica porque temos sempre em vista que o silêncio, o nada, o abismo insondável da desolação que nos atormenta não têm a última palavra. Há sempre a luz ao fim do túnel, vem sempre a consolação depois da desolação, a vida depois da morte, o perdão depois dos rancores, o amor depois do ódio e o Tudo – de Deus – depois do nada em que estou envolvida a quando da falta de fé, quando fico sem chão, quando tudo desmorona, quando parece que vou cair num precipício, quando estou na noite mais escura entre as mais escuras.

Tudo isto para dizer que a tua reflexão é de uma profundidade espiritual, de uma beleza, de uma grandeza, para mim, difíceis de expressar com palavras.

Deus te abençoe sempre muito pelo bem espiritual que fazes.

Amanhã esta linda reflexão vai a meditação mais profunda e para o meu diário espiritual.

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Miriam (IP registado)
Data: 05 de May de 2010 11:02

Algo de que me esqueci ontem:
Na lista das Teresas, falta a Edith Stein, Santa Teresa Benedita da Cruz. Esta, a par da madre Teresa e possivelmente ainda mais do que ela, é talvez a que melhor se enquadra no teu post, visto que ela foi uma intelectual ateia e depois, convertida a Deus e à única verdade, igualmente intelectual mas católica.

Escreveu dois livros belíssimos – só tenho estes -: um sobre a teologia da cruz, do sofrimento, da Redenção; outro, magnífico, vivamente recomendável a feministas católicas, sobre a mulher na família e na vida profissional.

Edith Stein é um grande exemplo de ateia que procurava sinceramente a verdade e que foi transformada pelo amor misericordioso de Jesus.

Conheço ateus de dois tipos:
Os hostis a Deus – os que eu chamaria verdadeiros ateus;
E os que, convencendo-se de que não acreditam em Deus, andam sempre à procura de o encontrar. Estes andam sempre em busca de respostas, sempre à procura de ver Deus nalguma situação, nalguma pessoa. Quase me atreveria a dizer que, de um certo modo, pensam mais em Deus do que muitos crentes. Mas há algo dentro deles que não lhes permite dar o tal passo de que falas, um bloqueio qualquer, um medo não confessado, e até possivelmente nem sequer consciente.

Estou convicta de que esses, mais cedo ou mais tarde, sentirão a presença amorosa e confortadora de Deus nas suas vidas. Deus nunca deixa sem resposta os que o buscam de coração sincero e com recta intenção. E esses, embora não o admitam expressamente, procuram a Deus.

Podem nunca virem a passar por um processo de conversão perfeita – refiro-me a abraçar a fé verdadeira -, mas vão sentindo como Deus os ama infinita e incondicionalmente, como são únicos no mundo para Deus e como o encontram nas tribulações, a dar-lhes conforto e força.

Essa relação pessoal com Deus que o ex ateu vai vivenciando não é ainda fé. Na minha opinião, acreditar em Deus não é ainda ter fé. A fé é uma virtude teologal, é a adesão da inteligência e da vontade às verdades divinamente reveladas e a consequente correspondência da nossa fidelidade à graça recebida, ao dom de Deus. Foi o que fez Edith Stein quando se converteu a Deus. Convertendo-se a Deus, converteu-se também à verdadeira fé. É uma conversão perfeita.

Conheci vários: uns converteram-se ao Cristianismo, outros não. Mas, mesmo os que não se converteram à fé cristã – católica -, converteram-se a Deus, mudaram as suas vidas, amam o Senhor e sentem a sua presença actuante nas suas vidas. E isso, nestas pessoas por vezes até tão marcadas pela dor, é o mais importante, é o fundamental: encontrar Deus e saber que Ele as ama e que é o verdadeiro Senhor da sua história. Quando vivem as suas experiências dolorosas, marcantes, vivem-nas com um Deus que as ama e que transfigura a sua dor. Isso, para elas, é a ressurreição, o renascimento espiritual, a mudança de atitudes. Quando sabemos que temos um Deus - o absoluto, o transcendente - ao nosso lado a vivificar-nos com a sua graça e a fortalecer-nos com a sua força; quando sentimos que temos um Deus ao nosso lado que efectivamente pode dar sentido à nossa história por vezes escrita de sofrimento e mágoa, a nossa atitude perante os outros, perante a vida é diferente. E quem chora, gradualmente, aprende a sorrir. E quem vive de rancores, paulatinamente, aprende a amar.

Deus existe, Deus transforma! Eis o lema de um ex ateu amigo meu, também ex recluso.

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Miriam (IP registado)
Data: 06 de May de 2010 22:59

Alef,
Ainda que os tópicos não tenham participações (se tal se viesse a verificar), não deixes de nos presentear com estas reflexões espirituais que, sei, não colocas noutro lugar a não ser aqui. A mim dão-me muito jeito, fazem-me muito bem e ajudam-me a meditar. Dão-me, algumas delas, até um esquema de prioridades na meditação do dia. Portanto, venham mais, sempre!

***

Aos outros:
Ou melhor, a quem possa interessar:
[vida-espiritual-catolica.blogspot.com]

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Miriam (IP registado)
Data: 09 de May de 2010 23:45

Um plano de santificação para quem já se julga santo e não consegue fazer o que realmente interessa e é preciso ser feito – ou seja, para mim:
[vida-espiritual-catolica.blogspot.com]

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Cassima (IP registado)
Data: 10 de May de 2010 15:01

Não tenho uma associação particular ao Sábado Santo (eu chamo-lhe Sábado da Aleluia, foi assim que lhe ouvi chamar durante muito tempo). Durante a minha infância não havia nenhuma cerimónia em particular neste dia nem lhe associei eu nada, a não ser a espera do Domingo de Páscoa. Lembro-me de uns Sábados Santos, em que se fazia a bênção da água para se pôr na igreja e se levar para casa. Entretanto cresci e nos últimos tempos temos celebrado Vigílias Pascais. Mas confesso que continuo sem dedicar grande atenção ao Sábado da Aleluia. Tem sido sempre o tempo de espera até à Páscoa. Mas talvez que os sentimentos que associo à Sexta-Feira Santa e ao Domingo de Páscoa, se possam estender ao significado do Sábado.

A Sexta-Feira Santa é um dia triste. As cerimónias são tristes, carregadas de simbologia de luto e dor. As leituras da Adoração da Cruz (leituras da Paixão) estão carregadas de sofrimento. O Enterro do Senhor, por ser um funeral, é triste. Os cânticos são tristes, pungentes de dor. E no entanto, não me sinto triste na Sexta-Feira Santa! Reconheço todo o sofrimento que Jesus sentiu, não consigo imaginar o que terá passado, tenho pena que tenha sofrido tanto, mas sei que, logo, logo, chega a Páscoa com todo o esplendor.

O Domingo de Páscoa é um dia radioso! Lindo! Neste dia parece que cantam passarinhos no coração e o sol brilha, mesmo se o dia estiver chuvoso e cinzento. Neste dia, nem o Jesus crucificado parece sofrer. Há esperança, há alegria. Será que as memórias da minha infância, com as visitas pascais, a animação, os rebuçados, contribuíram para esse sentimento especial do Domingo de Páscoa?! Creio que sim, mas também acredito que hoje vejo as coisas de forma mais madura.

Sobre a descida de Jesus à mansão dos mortos, sobre os nossos períodos negros, comecei há pouco a pensar. Um livro do padre Ariel Valdés lançou-me nesse ponto. Ao falar na descida à mansão dos mortos, dizia que tinha libertado o Homem da Morte, e isso equivalia a libertar todos os que tinham morrido antes de Jesus, não só os que fossem morrer depois.

Também tenho os meus períodos de descrença. Períodos em que me questiono se a fé é autêntica ou se construímos Deus apenas para não nos sentirmos pequenos nesta imensidão. Ou se a crença na vida depois da morte não foi uma forma de ultrapassar o medo do vazio e do esquecimento. Lembro-me de uma vez, muito jovem, ter interiorizado de tal forma a hipótese da inexistência de vida após a morte, e a angústia sentida foi tão grande que ainda hoje não gostaria de repetir a sensação. E quando estamos em momentos de desespero vejo como é tão fácil vacilar. Como a esperança desse Sábado Santo não existisse.

Tento agarrar-me a Jesus. Na Pessoa de Jesus. E espero que estes momentos sejam sempre vencidos pela forma como sinto a Paixão e a Ressurreição.

Gostei muito de ler a mensagem do Papa. Fui lê-la em inglês, que prefiro ao espanhol :). E gostava de terminar com uma sua citação (linda!):

It is like a spring that murmurs in the silence, and we can hear it, we can listen to it in the silence of Holy Saturday.

Cassima

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: vitor* (IP registado)
Data: 13 de May de 2010 00:09

o Alef é um dom de Deus.
Há dias que ando à procura de palavras que melhor descrevam o que sinto ao ler essas palavras do Alef.
Fico-me pelo silêncio delicioso.

Re: O «Sábado Santo»: uma leitura espiritual a partir do «Santo Sudário» de Turim
Escrito por: Miriam (IP registado)
Data: 14 de May de 2010 23:40

"o Alef é um dom de Deus."

Sem a mais leve sombra de dúvidas!

Um dom que por vezes é posto de lado por quem devia e tinha a obrigação de o considerar realmente uma bênção.

Mea culpa...



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