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Deve ou não comungar?
Escrito por: Nina (IP registado)
Data: 11 de October de 2004 20:40

Boa noite!

A minha questão é a seguinte:

Tenho um casal na minha familia que não se casou pela igreja, logo ambos estão «proibidos de comungar» no entanto a minha prima sempre que pode confessa-se e é absolvida pelo pároco. No entanto falei com uma pessoa minha conhecida especializada em direito canónico que me disse que se o padre lhe dá a absolvição então não deve proibi-la de comungar pois entramos em contradição.

Gostaria muito de saber as vossas opiniões sobre este caso.

Saudações cordiais
Nina

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 11 de October de 2004 21:05

Nina:

Que significa que o pároco a absolve? Significa que nesse momento o pároco tem presente que a pessoa em causa vive maritalmente com alguém sem ser casada? Não haverá aqui um "engano tácito" por parte da pessoa "absolvida"? Que eu saiba, nenhum padre pode absolver ninguém de uma relação, logo essa pessoa não pode receber a absolvição nessas condições.

Repito: se a situação é tal como a descreves -- a pessoa vive maritalmente quando poderia estar casada pela Igreja --, não pode haver absolvição, porque se podem absolver pecados, mas não relações entre pessoas. Uma relação "ilegítima" só pode ser "sanada" com o fim da "ilegitimidade" dessa relação. Se a pessoa no momento da confissão oculta ao padre que vive nessa situação, poderá receber a absolvição "dos seus pecados", mas estamos diante de uma situação muito grave de dolo (chamemo-lhe assim), que leva o terrível nome de sacrilégio (uff!). Se o pároco é consciente da situação e, apesar disso, absolve, na realidade está a absolver algo que não pode ter absolvição. A menos que exista algum elemento que leve ao pároco a actuar bem. Mas esse elemento oculto só pode ser um que altere a figura do caso completamente e, nesse caso, a exposição do caso seria diferente. É caso para dizer: neste caso "a história estaria mal contada". Aqui entraríamos no campo "infinito" da casuística.

Talvez ajudasse perceber melhor alguns elementos: essa pessoa não casa/casou porquê? Sabendo a resposta a esta pergunta poder-se-á dizer algo mais.

Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Ana (IP registado)
Data: 11 de October de 2004 22:16

Alef

Pode ela querer casar e o marido não querer...falta saber a questão de não serem casados pela igreja. Para ela se ir confessar, é porque gostava de casar...!!!

Na minha igreja, há uma senhora que comunga e dorme quando lhe apetece com um homem. Devemos avisar o padre? E se o padre, não gosta destes avisos? Tenho receio disso.

Os padres aquí, é dificil de conhecerem a todos....pois somos uma comunidade com mais de 10.000 Portugeses e apenas uma igreja de língua Portuguesa e numa grande cidade...

Respondam a isto também...Padre Luis, dê aquí a sua opinião.

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Fátima (IP registado)
Data: 13 de October de 2004 13:05

Olá Alef,

Será que entendi que na tua opinião quem vive maritalmente, não deve ter direito a confessar os seus pecados e pedir perdão? A ser absolvido?
E isto aplicar-se-ia também a quem se divorcia?
Mesmo que se tenha fé, acredite em Deus e precise de ajuda?

Fátima

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 13 de October de 2004 17:10

Cara Fátima:

Estamos a entrar em campos de difícil tratamento, porque muitas vezes na discussão destes assuntos vêm ao de cima emoções particulares, casos concretos que nos afectam de um ou outro modo. De qualquer forma, apesar destas dificuldades, vamos tentar ver isto por partes, com a calma possível.

Basicamente, referes dois casos em relação ao acesso ou não ao sacramento da Reconciliação e à absolvição: o das pessoas que vivem maritalmente e o das pessoas que se divorciam. Embora muitas vezes se conjuguem os dois casos (há pessoas que vivem maritalmente porque pelo menos uma das partes é divorciada), distingo aqui os dois casos, partindo do suposto que tratamos aqui os divorciados que não se “recasaram”.

O caso das pessoas divorciadas é, em princípio, mais simples, caso a pessoa divorciada não se tenha ligado a outra pessoa (vulgo: se não é “recasada”). Em tal situação, a pessoa pode, em princípio, recorrer ao sacramento da Reconciliação, ser absolvida e comungar. Caso bem diferente e muito mais complicado é o caso dos comummente chamados “recasados” (divorciados que voltaram a casar-se e que querem receber os sacramentos). Sobre isto, veja-se o que foi escrito noutro tópico, "Carta Aberta à Igreja Católica" (clicar para abrir), sobretudo algumas das minhas mensagens mais “sistemáticas”.

Mas aqui estamos a tratar de “outro” caso: o das pessoas que vivem maritalmente. [Falo aqui dos “casos gerais”, porque, em alguns casos, haveria matizações a fazer.] Se uma pessoa acredita na eficácia do sacramento da Reconciliação (e, já agora, dos outros), acredita também que as relações fora do matrimónio não estão de acordo com o Evangelho. Tal é a situação de pessoas que vivem maritalmente. Repito: falo aqui dos casos gerais. Ora, só tem sentido que uma pessoa se aproxime do sacramento da Reconciliação se estiver arrependida dos pecados de que se acusa e se estiver na disposição de não querer voltar a cometer os mesmos pecados. Se uma pessoa vive maritalmente e vai continuar nesse estado, temos aqui real arrependimento? Podemos dizer que está em condições de propósito de emenda? Pode uma pessoa dizer que está arrependida se quer continuar a fazer exactamente o que fazia antes? Eu não acredito nisso e não creio que alguém possa acreditar em tal coisa. O grande obstáculo à recepção da absolvição é a inexistência de arrependimento (só posso pedir perdão daquilo de que me arrependo!). Como pode Deus perdoar se eu não me arrependo? Como posso estar arrependido se pretendo continuar a fazer o mesmo? Não será esta uma forma de euto-engano?

Voltando à tua questão, Fátima, perguntas se «quem vive maritalmente, não deve ter direito a confessar os seus pecados e pedir perdão». É uma pergunta com o seu quê de problemático: se essa pessoa tem uma consciência evangélica, perceberá certamente que o viver maritalmente não está de acordo com o Evangelho, mas como pode pedir sinceramente perdão de algo que quer continuar a praticar, da mesma forma? Sim, pode num certo sentido pedir perdão, mas é um pedido certamente incompleto, defeituoso, chamemo-lhe assim, porque, na verdade, pode sentir dor ou mal-estar pelo seu “estado”, mas poder-se-á dizer que essa pessoa está arrependida?

A tua pergunta prolonga-se, colocando a questão se tais pessoas não têm o direito a serem absolvidas. Mas note-se que só pode haver absolvição se houver arrependimento, e então voltamos ao princípio.

Uma nota e distinção importantes: alguém poderá dizer: mas, na verdade, confessamo-nos e voltamos a fazer os mesmos pecados! É (quase sempre) verdade. Mas, pelo menos, há que pôr os meios mínimos de não voltar a cometê-los. Os meios mais mínimo são o estar arrependido e o desejo de não voltar a cometê-los. Tradicionalmente chama-se a isto a contrição e propósito de emenda. Pode alguém que vive maritalmente mostrar esta disposição?
Por outro lado, note-se que há graus de gravidade de pecados. Para quem o sacramento da Reconciliação é importante, é igualmente importante saber isso. O viver maritalmente não é o mesmo que uma falta leve... E a Reconciliação não pode ser vista como uma simples “panaceia psico-religiosa” auto-justificadora de estados de vida.

Note-se também que isto é também válido para outros casos, de que se podem dar alguns exemplos, para que nos entendamos: se eu pertenço a um grupo terrorista que se dedica a matar pessoas e a destruir os bens de outros, não posso ser absolvido enquanto não deixar tal grupo e tais práticas; se eu roubei algo e não devolvi segundo aquilo que é de justiça, não posso ser absolvido (como se manifesta o arrependimento por um roubo, senão pela reposição da justiça? – falo aqui de casos gerais e não do “clássico” “roubar para comer”). O mesmo se pode dizer em relação a um médico ou enfermeiro que trabalha numa clínica abortiva (enquanto elemento-chave de um processo) ou de alguém que pertence a estruturas criminosas...


Colocas na última frase algo muito importante em relação ao eventual não acesso de certas pessoas à absolvição sacramental: «Mesmo que se tenha fé, acredite em Deus e precise de ajuda?». Entramos aqui noutro lado da questão, de que haverá muito a dizer. Valeria a pena começar por perguntar: o que significa aqui “ter fé” e “acreditar em Deus”? Se “acreditar em Deus” significa apenas “aceitar que Deus existe”, isso é pouco ou nada. Tomando a linguagem tradicional e bíblica, poderemos ver que o Demónio também sabe que Deus existe mas nem por isso vai para o céu. ;-) Ter fé e acreditar em Deus é outra coisa. Acreditar é “dar crédito”, isto é, diz respeito a uma relação pessoal. Ora, dar crédito a Deus significa deixar que Ele entre na minha vida, aceitar o amor com que Ele me ama e entrar numa dinâmica de resposta de acordo com o Evangelho. Posso incluir nessa dinâmica de resposta algo que literalmente vai contra o Evangelho? Posso dizer que dou crédito a Deus quando pauto a minha vida por critérios que parecem vir de outro lado em matérias tão importante como a questão do matrimónio? Não se cairá no risco de querer construir um Deus à nossa imagem e semelhança?

A tua última frase tem ainda outro aspecto importante, a questão da necessidade de ajuda. Certamente, essas pessoas precisam de ajuda, de toda a ajuda possível. Mas a ajuda de que precisam não se resolve com o fechar os olhos a algo importante, fazendo de conta que tanto faz viver maritalmente ou não... A ajuda é de outro género e aqui é necessário muito tacto dos agentes de pastoral, sobretudo os padres e directores espirituais (também há directores espirituais que não são padres, homens e mulheres, mesmo em Portugal). E uma das ajudas que se deve dar é o de ajudar a pessoa a perceber a sua situação e a decidir, com a ajuda da oração, o que deve fazer. Porque eu falei dos casos gerais, mas às vezes há casos muito especiais. Em alguns casos, especialíssimos, até pode dar-se o caso de o confessor aceitar dar a absolvição e conceder que a pessoa comungue (casos muito raros, mas eles existem; veja-se de novo o que escrevi no mesmo tópico “Carta aberta à Igreja Católica”). Noutros casos (infelizmente, talvez a maioria) não é possível que as pessoas possam receber a absolvição e comungar e aí há que ajudar as pessoas a viver responsavelmente com essa dificuldade, mostrando-lhes que a vida cristã não se reduz à possibilidade de comungar. Podem participar na Eucaristia (ainda que incompletamente, por não comungarem), crescer na oração e viver empenhadamente o serviço pelo próximo (que aqui está o centro do Cristianismo).

Pode haver a tendência de começarmos a tratar neste tópico dos casos “excepcionais”, mas devíamos antes centrar a nossa atenção na questão inicial e de base: é possível viver maritalmente e dizer-se arrependido, para assim poder receber a absolvição no sacramento da Reconciliação? É a absolvição uma solução para esta situação? Trata-se aqui de uma questão de direito? Só depois de ver estes aspectos “de princípio” poderemos ver os chamados “casos difíceis” ou “de (possível) excepção”.

Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Fátima (IP registado)
Data: 13 de October de 2004 19:10

Alef,
Colocando as coisas assim, trata-se de uma questão de mera coerência com a qual sou obrigada a concordar. Efectivamente, como se pode estar arrependido de algo que se continua e pretende continuar a fazer?
Por outro lado, e pelo que julgo ter entendido também, não faz sentido estar meio arrependido...isto é, não se está arrependido de se viver maritalmente, mas está-se arrependido de uma outra situação e pretende-se absolvição para a 2ª apenas...aqui tratar-se-ia de falta de coerència nos pricípios cristãos...será assim e terei entendido bem?

Quanto à questão que colocas relativamente ao facto de sabermos o verdadeiro significado de frases como "ter fé" e "acreditar em Deus", mais uma vez sou obrigada a concordar contigo, incluindo-me, infelizmente muitas vezes, no grande grupo que as cita sem saber o real significado (espero não ser rengada logo no primeiro dia de fórum por constatrem que não sei nada...)

Também por isso, se calhar vim ter convosco...para entender.

Fátima

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 13 de October de 2004 23:20

Fátima:

Três notas três...

1. Tens toda a razão em relação ao que dizes sobre o "meio arrependido". Creio que é isso mesmo que se passa com muitas pessoas que vivem em situações como as que referi. Sabem que a sua situação é algo "anómala", mas gostariam de a colocar de alguma forma entre parêntesis e "ir tratando das despesas correntes" até um dia se poder resolver a "anomalia"...

2. Sobre o significado do "ter fé", este é um tema que vem ao de cima de vez em quando. Lembro-me que há um tópico onde se tratou da relação entre razão e fé. Podes encontrá-lo aqui (clica para ler). Aí poderás encontrar alguns elementos que te podem servir.

3. Quanto à tua nota, dizendo que esperas «não ser rengada logo no primeiro dia de fórum por constatrem que não sei nada...», não tens que temer, porque este fórum não tem exame de admissão, nem nota mínima de acesso, nem "numerus clausus". ;-) Todos temos a aprender uns com os outros, da mesma forma que todos temos algo a partilhar e oferecer. Creio que é disso que depende o sucesso de um fórum.

Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: rmcf (IP registado)
Data: 14 de October de 2004 00:41

Muito rapidamente, porque nao estou por Portugal... mas nao resisti: é mais uma provocaçao, mas que julgo que exige esclarecimento: por que razao "se uma pessoa acredita na eficácia do sacramento da Reconciliação, acredita também que as relações fora do matrimónio [ou que, diria eu, decidem nao se estabelecer de forma sacramental] nao estao de acordo com o Evangelho"? Onde é que o Evangelho diz isto explicitamente? E onde distinguir, no Evangelho, entre a literalidade e o espirito?

Nao tenho tempo (nem computador) para mais...

Abraço fraterno

Miguel

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 14 de October de 2004 10:28

Miguel:

Acho que isso é ainda mais explícito que a própria definição evangélica do sacramento da Reconciliação. Não te parece?

Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: rmcf (IP registado)
Data: 14 de October de 2004 16:47

por acaso nao... pode ser que seja culpa minha... nao sei onde é que se fala de casais que não sejam casados "pela Igreja"... peço desculpa...

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: rmcf (IP registado)
Data: 14 de October de 2004 17:10

Será Mat . 19:6? Mas onde se diz, no Evangelho (e sublinho isto), que a união de duas pessoas, mesmo se não confirmada pela Ecclesia nascente, é um pecado mais grave do que os ditos "pecados leves"? A fé da Igreja nasce da Bíblia e da tradição, e esta encontra os seus alicerces naquela... mas, nem sempre se pode dizer que esta e aquela dizem a mesma coisa, na medida em que esta nasce e se desenvolve a partir daquela (e não só)... ora, a fé da Igreja nasce de ambas... mas parece-te evangélica tout court a afirmação que fazes?

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 14 de October de 2004 18:48

Caro Miguel:

A tua observação leva-nos para outras questões, que ultrapassam o âmbito deste tópico, embora sejam assuntos muito importantes. Quando se fala de evangélica não o fazemos como uma referência literalista.

Dizes que «A fé da Igreja nasce da Bíblia e da tradição, e esta encontra os seus alicerces naquela... mas, nem sempre se pode dizer que esta e aquela dizem a mesma coisa, na medida em que esta nasce e se desenvolve a partir daquela (e não só)... ora, a fé da Igreja nasce de ambas...» (destaques meus). Será exactamente assim?

Parece-me que o que afirmas deve ser revisto, de acordo com uma leitura atenta da «Dei Verbum». A fé da Igreja nasce não da Bíblia e da Tradição, mas de uma relação pessoal com Jesus Cristo no seu Mistério Pascal, que se transmite [<tradere, <traditio, tradição] por testemunho de geração em geração. É a fé dos Apóstolos. Os alicerces da Tradição estão em primeiro lugar em Jesus Cristo, embora, naturalmente, a Tradição esteja confirmada pela Bíblia e não em contradição. Mas a própria Bíblia é produto histórico da Tradição e há-de ser lida à luz do contexto que lhe deu origem. Não esgota a Tradição. A Bíblia não é a Revelação. De resto, a fé é sempre mediada e a nossa fé é a fé da Igreja, Igreja que é histórica, cuja compreensão do Evangelho vai progredindo ao longo dos séculos.

Será que pretendes afirmar que o sacramento do matrimónio é fé da Igreja, mas não evangélica? Que significa esta aparente (?) dicotomia?

Certamente a Tradição tem a sua história; o Novo Testamento não fala literalmente de sete sacramentos, como também não fala da Santíssima Trindade, da transubstanciação, ou da Assunção de Maria. Mas o entendimento do Evangelho (no seu todo, enquanto Pessoa e mensagem de Jesus Cristo, que não se reduz aos escritos "ipsis verbis" na Bíblia) foi sendo gradual e hoje percebemos melhor o significado dos sacramentos que, note-se, só aparecem como uma lista de sete já no segundo milénio do Cristianismo.

Para me cingir a um exemplo, lembro que o sacramento da Reconciliação, com confissão auricular, é uma "descoberta" bastante tardia, quando já estava bem mais claro o que se refere ao matrimónio, pelo menos em termos de continuidade de prática.

Creio que isto é já suficiente para não reduzirmos a linha argumentativa ao "ipsis verbis". De resto, com essa mesma linha argumentativa não consegues fundamentar o que escreveste!

[Já agora, basta analisar o título do Evangelho de Marcos para deitar por terra essa ideia do "Evangelho tout court"...]

Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: rmcf (IP registado)
Data: 14 de October de 2004 23:31

Sem muito tempo:

é verdade o que dizes, mas nao inteiramente claro também:

- é legitimo, como tu o fazes, entender o Evangelho como algo dinâmico que nao se esgota nos textos, mas que engloba toda a tradiçao, toda a fé da Igreja, que nos foi entregue pelos nossos pais, Jesus Cristo que se encontra presente na sua Igreja, através dos séculos. Contudo, como bem percebeste certamente, nao foi a este conceito mais alargado que dirigi a provocaçao mas a um entendimento mais estrito que me parece igualmente legitimo.

- é óbvio que os Evangelhos fazem eles próprios parte da tradiçao: contudo eles sao Palavra da Salvaçao, eles próprios. E sao o especial intermezzo da Revelaçao, o texto fundacional a partir do qual a Verdade se revela. Se a Revelaçao se apresenta em Jesus Cristo, ela é mediada pelos textos evangélicos que sao, é verdade, parte já de uma tradiçao, mas sao, eles próprios também, e tout court, e peço desculpa, a Palavra da Salvaçao: por isso os distinguimos da epistola e das restantes leituras na missa...

- de facto, como eu disse, os textos da tradiçao interpretativa crista (a que vulgarmente se chama "Tradição") alicerçam-se nos textos bíblicos, dos quais se distinguem pelo menos em termos de canonicidade;

- eu nunca desmereci o papel da tradiçao: apenas me parece que nao é muito correcto dizeres que nao estao de acordo com o Evangelho as relaçoes fora do casamento, se se entender por Evangelho os textos canónicos; a tradiçao interpreta assim e isso tem todo o valor e, entre os catolicos, nao pode ser desmerecida; o texto evangélico é omisso em relaçao a este ponto.

- Nao é "cientificamente" ilegitimo que se leia os Evangelhos de forma pelo menos autonoma em relaçao a uma tradiçao de leitura; é isso que tem dado um impulso notavel à teologia bíblica desde há pelo menos duzentos e cinquenta anos. É por isso possível dizer que os textos evangélicos dizem uma coisa ou omitem determinada questao, que depois foi considerada relevante pela tradiçao posterior: era a isso que me estava a referir quando falei de Evangelho tout court.

- De facto, é também possivel dizer que muitos dos sacramentos têm base na tradiçao interpretativa secular da Igreja (o que nao desmerece por isso o seu valor), mas que lhes falta uma rigorosa fundamentaçao nos textos evangélicos/tradiçao evangélica do século I (A Reconciliaçao ou o Matrimónio são apenas dois deles)... Nao é uma dicotomia: é uma evidência...

- de resto o título do Evangelho de Marcos é claro: aquele é o texto que pretende apresentar, por escrito, a boa nova de Jesus Cristo... tout court... e esse é um texto que deita por terra dizer que a condenaçao das relaçoes que nao se traduzem em matrimónio vai contra o Evangelho... é que esse texto nao se refere a este assunto... vai sim contra a tradição POSTERIOR, que, como tu fazes, pode ser considerada Evangelho, no sentido alargado de fé da Igreja, mas que não se confunde estritamente com os textos evangélicos considerados Palavra da Salvaçao.

Abraço

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 15 de October de 2004 16:00

Miguel:

Duas meias verdades não fazem uma verdade. O texto que escreveste tem elementos válidos (com algumas revisões a fazer em muitos casos), mas nele saltam-se planos, o que torna complicada a tarefa de discutir correctamente uma questão. É fundamental termos consciência do plano em que nos situamos, para não desconversarmos.

Estou disposto a tratar qualquer plano, mas sempre com a condição que nos mantenhamos nele, para evitarmos conversas de surdos. Posso, por exemplo, manter o diálogo ao nível de quem não acredita sequer que Deus existe, e a essa pessoa não vou argumentar com a questão dos sacramentos como meios de graça, etc. Mas -- por exemplo -- também não posso aceitar que esteja num mesmo plano uma proposição sobre a eficácia de um sacramento e uma resposta de que Deus nem sequer existe.

Ora, o plano em que se começou por tratar este tópico é muito distinto daquele de onde retiras argumentos. Neste tópico, no seu título e na mensagem que lhe deu origem, estamos no plano de uma prática religiosa que se insere na prática da fé da Igreja tal como a conhecemos hoje, no contexto da Igreja Católica Romana, mais concretamente a de rito latino.

Neste plano temos (entre muitas outras coisas) a prática da Reconciliação com confissão auricular e temos um conjunto de elementos doutrinais, litúrgicos, etc. Neste todo insere-se também a doutrina relativa ao matrimónio, que é bastante clara quanto à pecaminosidade dos actos sexuais fora do casamento e quanto à "anomalia" (em termos religiosos) da mera coabitação (vulgo "viver maritalmente"). Não tem sentido nenhum que alguém que se insere nesta “tradição” (agora no sentido mais frequente em meios anglos-saxónicos e protestantes, entendida como conjunto de práticas) pretenda recorrer à absolvição dos seus pecados, pelo sacramento da Reconciliação mantendo uma vida de “matrimónio” incompatível com essa mesma “tradição”.

Por uma questão de coerência, como dizia a Fátima e bem.

Tu levantaste a questão de isso estar ou não inscrito “tout-court” nos Evangelhos canónicos. Aí eu respondo que estamos a saltar para outro nível, onde a discussão é possível, mas não para resolver esta questão que – creio eu – já está bastante clara. Com efeito, podemos, sim, tratar da questão da “literalidade” da avaliação moral e religiosa das relações fora do matrimónio-sacramento, mas não para dizer que podemos colocar essa questão entre parêntesis quando nos abeiramos do sacramento da Reconciliação. Não misturemos planos.

Creio que este “saltar de planos” é um dos erros mais frequentes em discussões de assuntos de religião, sobretudo quando dizem respeito à Igreja Católica.


Voltando à tua distinção “tout-court”, importa reafirmar que não é o (teu) “tout-court” o fundamento da Igreja ou dos sacramentos. Disso creio teres dado conta, embora o discurso pareça esquecê-lo. De resto, pareces incorrer (provavelmente só ao nível do discurso) num atavismo teológico, que é o de querer fundamentar os sacramentos em detreminados “actos institucionais” de Cristo relatados pelos Evangelhos canónicos. Isso é um erro em que caiu a teologia manualística e que a teologia pós-Vaticano II tem corrigido e bem (embora certos sectores conservadores se encarreguem de manter a manualística ligada à máquina da respiração artificial). Trata-se do seguinte: os sacramentos não se fundamentam primordialmente neste ou naquele texto evangélico (embora se possa dizer algo mais sobre a Eucaristia), mas sim, primordialmente, em Jesus Cristo, no todo da sua vida. Por exemplo, dizer – como se dizia na teologia manualística– que o matrimónio é um sacramento porque foi instituído por Jesus nas Bodas de Caná, é francamente muito pouco. Tu não o dizes desta forma, literalmente, mas realças que «[a alguns sacramentos] lhes falta uma rigorosa fundamentaçao nos textos evangélicos/tradiçao evangélica do século I». Será esse o cerne da questão?

[Ainda sobre a “rigorosa fundamentação” dos sacramentos nos textos evangélicos, aparentemente dás mais um “passo” ao dizeres que «muitos dos sacramentos têm base na tradiçao interpretativa secular da Igreja». Mas é um passo em falso, pelo menos no sentido teológico de “rigorosa fundamentação”: a fundamentação teológica dos sacramentos não está simplesmente neste ou naquele passo da Escritura, mas na pessoa de Jesus Cristo. Ele é que, sim, é A Revelação de Deus, o Sacramento por excelência, no Qual se fundam(entam) todos os sacramentos da Igreja. Essa Revelação foi transmitida aos Apóstolos, cuja fé se reflecte canonicamente mas não se esgota nos textos bíblicos. É importante que deixemos de uma vez por todas a ideia de que há ditos ou episódios da vida de Jesus que fundam o do sacramento A ou B. Mesmo no caso da Eucaristia: é redutor ver na Eucaristia um sacramento que se fundamenta na Última Ceia, apenas porque Jesus disse: «Fazei isto em memória de Mim». É isto, mas muito mais!]


Dizes: «eu nunca desmereci o papel da tradiçao: apenas me parece que nao é muito correcto dizeres que nao estao de acordo com o Evangelho as relaçoes fora do casamento, se se entender por Evangelho os textos canónicos». Acontece que eu mantive-me no mesmo plano de tratamento da questão e nesse contexto não tem sentido a distinção que pretendes fazer. Nem teria sentido o tópico que discutimos. De resto, não somos literalistas, nem os Evangelhos canónicos pretendem ser um livro de moralidade onde se possa conferir "ipsis verbis" a moralidade do acto A ou B, ficando "nós" com o benefício da dúvida em caso de omissão! ;-) Voltarei a este teu texto, que me parece problemático para a discussão deste tópico.


- Dizes ainda que «Nao é "cientificamente" ilegitimo que se leia os Evangelhos de forma pelo menos autonoma em relaçao a uma tradiçao de leitura; é isso que tem dado um impulso notavel à teologia bíblica desde há pelo menos duzentos e cinquenta anos. É por isso possível dizer que os textos evangélicos dizem uma coisa ou omitem determinada questao, que depois foi considerada relevante pela tradiçao posterior: era a isso que me estava a referir quando falei de Evangelho tout court.».

Respondo: claro que é legítima e até necessária tal distinção metodológica (!), mas ela não pode ser feita para “saltar planos” quando se discutem questões como a deste tópico. Nem estamos no contexto da teologia bíblica. Poderemos usar tal distinção para tratar questões relacionadas com este tópico, mas noutro plano. Poderemos averiguar, por exemplo, que entendimento tinham os primeiros cristãos do matrimónio, que “vestígios” teremos nos Evangelhos ou no Novo Testamento, mas não para justificar que alguém que vive maritalmente sem ser casado (=recebido o sacramento do matrimónio) pode receber a absolvição no sacramento da Reconciliação e, portanto, comungar...

Vejam-se outros âmbitos paralelos: é claro que não vi nunca no Evangelho a distinção entre pecado mortal (grave) e venial, mas é um dado adquirido da Teologia; não se vê em nenhum texto do Novo Testamento que não participar na Eucarisita dominical seja um pecado grave, mas é assim que a Igreja o vem ensinando (já estou a ver alguém espantado), mesmo que para muitos católicos -- a maioria! -- isso seja de menor importância. Ou seja: embora perceba a tua “provocação”, ela acaba por ser um tiro ao lado, porque desloca a questão para outro âmbito... Não sei se me faço entender.


De outra forma, com um exemplo, do texto que já citei acima. Dizes: «apenas me parece que nao é muito correcto dizeres que nao estao de acordo com o Evangelho as relaçoes fora do casamento, se se entender por Evangelho os textos canónicos». Ora bem: de que serve realmente este argumento para o caso em questão? Se nos mantivermos no plano em que te pões com esta questão, tem sentido o tópico que temos estado a tratar? Não, porque neste plano nem se coloca o problema do sacramento da Reconciliação tal como o conhecemos! Estamos então simplesmente a desconversar! É o resultado de um despropositado salto de plano! Há outros modos de desconversar que são outros saltos de planos. Poderia alguém dizer: mas para quê tudo isto se não temos provas de que Deus existe? É uma forma similar: apenas uma decisão de salto de plano e já está uma forma de “contra-argumentação”! Isto não serve.

E basta por agora.

Já agora, que quer dizer que «os Evangelhos [canónicos] [...] são o especial intermezzo da Revelação»? Intermezzo? “Intermezzo” sugere a ideia de intervalo... :-|

Bom, já agora também, sobre o título do Evangelho de Marcos: limitaste-te a um sentido. Faltam dois. E deixemos de parte essa do “tout-court” enquanto escrito canónico. “Tout-court”, Evangelho, significa, como saberás, “Boa Notícia” e essa, mais do que um escrito, é uma Pessoa.

Shalom!

Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 15 de October de 2004 17:00

Felicito o Alef e o Miguel pela discussão, a qual me parece ser esclarecedora.

Apesar de "formalissimamente" as questões levantadas pelo Miguel poderem, em parte, ser laterais à discussão, como diz o Alef, parecem-me muito pertinentes.

Mas admito que há (melhor: que se entendi alguma coisa, me parece haver) dois planos diferentes de vista:
- o Alef fala de um plano "em Igreja";
- o Miguel fala do plano dos Evangelhos "tout court", ou seja dos 4 livros da Bíblia com esse nome e objectivo.

Isto lembra-me de algo que faço com frequência: "passo" as questões pelo "crivo" dos Evangelhos (no sentido de Evangelhos que me pareceu ser o dado pelo Miguel).

Será redutor este procedimento?



João (JMA)

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 15 de October de 2004 20:39

JMA:

Escreves: «Isto lembra-me de algo que faço com frequência: "passo" as questões pelo "crivo" dos Evangelhos (no sentido de Evangelhos que me pareceu ser o dado pelo Miguel).
Será redutor este procedimento?»


É mais fácil de dizer que de aplicar. A Bíblia é a "norma non normata" e ponto de referência último, enquanto espelho da fé apostólica (da Igreja) em Jesus Cristo. Mas isso não significa fazer da Bíblia um código deontológico ou uma colecção de preceitos casuísticos, sobretudo ao que nos convém. E não podemos nunca pretender ler os Evangelhos sem a Igreja que lhes deu "berço" e legitimamente os vem interpretando desde a sua canonização.

Idealmente, não seria necessário sequer que o Evangelho estivesse escrito (não consta que Jesus mandasse escrever, mas sim que anunciassem o Evangelho -- também por aqui se vê que "Evangelho" tout court não se reduz ao que foi escrito --), muito menos o "Código de Direito Canónico", a "Instrução Geral do Missal Romano" ou qualquer Encíclica ou textos conciliares... Bastaria a "lei da caridade inscrita nos corações".

.........

Não somos anjos e mesmo esses... Dizem que o Demónio também o é... ;-)

Alef



Editado 1 vezes. Última edição em 23/04/2005 16:23 por Alef.

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: rmcf (IP registado)
Data: 16 de October de 2004 02:43

Caro Alef,

- continuo a considerar que tem relevância a questao que coloquei, sem com isso significar saltar planos: admitindo o carácter sacramental da Reconciliaçao, é possível questionar, e ir com isso até à própria Bíblia, o entendimento que a Igreja, na qual me incluo, tem de determinadas atitudes como pecado... de outro modo, negar a possibilidade de questionar estes entendimentos com base na interpretação da Bíblia, equivaleria sempre a questionar os próprios sacramentos, o que emperraria naturalmente qualquer discussão... por isso, parece-me possível discutir com base evangélica (ou outras) a consideração de determinada atitude como pecado e, assim, como algo passível de ser ou não levado a confissão... (mas claro, tambem é possível alargar a discussão e questionar a própria Reconciliaçao, mas não era disso que se falava neste tópico)...

- também desconversas...: em sítio nenhum disse que este era um caso estrito de teologia bíblica (que apenas referi como exemplo) ou que os sacramentos se deveriam obrigatoriamente fundamentar neste ou naquele texto evangélico... mas é verdade que eles nascem da tradiçao interpretativa da Igreja acerca de quem foi Cristo e da sua própria vida, o que é uma afirmaçao menos retórica do que a que fazes acerca da fundamentaçao primordial dos sacramentos no próprio Cristo, que é historicamente improvável para não dzer outra coisa...

- ora, nessa tradiçao há elementos que constituem hoje pedra de toque fundamental da fé crista; mas há muitas coisas que já foram admitidas e depois rejeitadas e que são admitidas e que serao no futuro rejeitadas; entre os argumentos para tal está muitas vezes a sua falta de coerência com os Evangelhos, nos quais (embora nao apenas neles, de acordo) Jesus Cristo continua hoje ainda a ser 'descoberto'.

- intermezzo também significa em italiano intermediário; era de resto esse o título que o Pe. Stanislas Lyonnet usava na Gregoriana para se referir aos Evangelhos (talvez com alguma ironia)... lamento...

Shalom

Miguel

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: AF (IP registado)
Data: 16 de October de 2004 13:39

Cara Nina,

Acho estranho que um sacerdote possa absolver qualquer um dos membros desse casal e lhes permita aproximarem-se da comunhão, pois por muito arrependimento que haja em ambos, enquanto não contrairem Matrimónio não alteram o seu estado.

Provavelmente o que o sacedote faz é ouvir a senhora em direcção espiritual e procurar orientar a vida dela. Mas nada mais do que isso.

Beijos



&quot;Nossa pequenez nunca deverá ser impedimento para a nossa grande missão&quot; (Pe. José Kentenich)

Álvaro

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 16 de October de 2004 17:32

Miguel:

Pelos vistos a minha mensagem anterior “picou-te”, pelo que peço desculpa. Temos mais que fazer que cair em picardias pessoais. Em todo o caso, devo, em abono daquilo que penso ser o correcto, deixar claros alguns pontos.


1. O "intermezzo"... Começo pelo fim da tua mensagem, que me parece ser irónico em relação à “dúvida” por mim colocada e deve ser, por isso, desde já clarificado e possivelmente arrumado. Dizes: «intermezzo também significa em italiano intermediário; era de resto esse o título que o Pe. Stanislas Lyonnet usava na Gregoriana para se referir aos Evangelhos (talvez com alguma ironia)... lamento...».

Não sei o que queria dizer exactamente Lyonnet com tal expressão, e é sabida a proverbial “scorrettezza” linguística que grassa nessa ilustre Universidade, mas devo dizer o seguinte: tu usas “intermezzo” como substantivo (com a função de nome predicativo do sujeito: dizes que «os Evangelhos são o especial intermezzo da Revelação») e, que eu saiba, “intermezzo”, enquanto substantivo não significa “intermediário”, até porque em italiano “intermediário” diz-se também “intermediario”, apenas se escreve sem acento. Socorro-me de um “mestre” insuspeito, que certamente conheces: o Zingarelli (Zanichelli). Ora, o Zingarelli diz o seguinte acerca do termo “intermezzo”:
Citação:
- A. s.m. 1 Breve spettacolo a carattere leggero tra un atto e l'altro di una rappresentazione | (est.) Interruzione, pausa, intervallo.
2 (mus.) Brano musicale di carattere buffo che nel teatro musicale del sec. XVIII veniva rappresentato tra un atto e l'altro di un'opera seria | Interludio | Composizione strumentale in forma libera.

- B. agg. Intermedio
O Zingarelli que uso neste momento não diz absolutamente mais nada sobre a palavra. Note-se que a minha observação estava absolutamente correcta: “Intermezzo” sugere a ideia de intervalo...

Por sua vez, sobre a palabra “intermediario”, diz o seguinte:
Citação:
- A. agg. Che ha una funzione di mediazione, di tramite tra più persone o cose: attività commerciale intermediaria
- B. s.m. Mediatore: fare l'intermediario in un affare; desidero trattare senza intermediari.
Independentemente daquilo que o P. Lyonnet quisesse dizer com a expressão que documentas, a formulação que apresentaste e tal como a apresentaste, parece-me pouco clara. Perguntei-te o que querias dizer com essa expressão; limitaste-te a dizer que alguém, o P. Lyonnet a usa, mas fiquei sem a explicação, que será sempre bem-vinda.

Parece-me, assim, precipitada a forma, certamente irónica, com que despachas o assunto com um suspensivo “Lamento”.


2. Conferindo planos. Saltos de planos? Insistes na legitimidade da tua objecção sem que ela signifique um saltar de planos. Não sei se me fiz entender convenientemente. Bom, não vou repetir-me. Se bem percebo, achas que é possível tratar da questão concreta colocada neste tópico com a consideração de que os quatro evangelhos canónicos não dizem nada sobre a pecaminosidade do “viver maritalmente”... Não disseste claramente (pelo menos não vi isso) que quem viver maritalmente pode receber a absolvição do confessor e comungar sem problemas, mas, já agora, podes manifestar-te a este propósito que, afinal, era a pergunta do tópico.


3. Colocando o guizo ao gato. Como não pretendo repetir toda a linha argumentativa da mensagem anterior, limito-me então a colocar algumas perguntas, às quais te peço uma resposta directa e individual:

1) os sete sacramentos são parte da fé da Igreja ou não?

2) os sete sacramentos são evangélicos ou não? (podes referir-te ao teu sentido “tout court”, mesmo que eu considere que identificar em absoluto tal “Evangelho tout court” com os evangelhos canónicos é um erro teológico de enorme monta)

3) algum dos sete sacramentos está em contradição com os evangelhos canónicos?

4) a consideração da imoralidade das relações fora do casamento cristão faz parte da fé da Igreja ou não?

5) o ensino da Igreja sobre o casamento cristão é suportado pelo ensino apostólico ou está em contradição com ele?

6) é possível conciliar o casamento meramente civil (ou a simples coabitação, “sem papéis”) com a fé da Igreja?


4. Da “desconversa”. Dizes que eu também desconverso quando me refiro à tua observação sobre a teologia bíblica. Vejamos então de novo se há desconversa e onde. Começas por dizer: «Nao é "cientificamente" ilegitimo que se leia os Evangelhos de forma pelo menos autonoma em relaçao a uma tradiçao de leitura; é isso que tem dado um impulso notavel à teologia bíblica desde há pelo menos duzentos e cinquenta anos.» A minha resposta menciona a tua alusão (“exemplo”, como lhe chamaste agora) à teologia bíblica quando diz:

«Respondo: claro que é legítima e até necessária tal distinção metodológica (!), mas ela não pode ser feita para “saltar planos” quando se discutem questões como a deste tópico. Nem estamos no contexto da teologia bíblica. Poderemos usar tal distinção para tratar questões relacionadas com este tópico, mas noutro plano. Poderemos averiguar, por exemplo, que entendimento tinham os primeiros cristãos do matrimónio, que “vestígios” teremos nos Evangelhos ou no Novo Testamento, mas não para justificar que alguém que vive maritalmente sem ser casado (=recebido o sacramento do matrimónio) pode receber a absolvição no sacramento da Reconciliação e, portanto, comungar...».

Dizes que com isto desconverso, porque -- afirmas -- «em sítio nenhum disse que este era um caso estrito de teologia bíblica (que apenas referi como exemplo) ou que os sacramentos se deveriam obrigatoriamente fundamentar neste ou naquele texto evangélico». Ora bem: será que realmente estou a desconversar? Acuso-te de fazeres deste caso um caso estrito de teologia bíblica? Não vejo tal coisa. Limito-me a reafirmar que a distinção é metodológica e não se aplica a este caso concreto, o da pergunta inicial, que se coloca no plano de uma questão pastoral. Afirmo então que não estamos no contexto da teologia bíblica, que foi o exemplo que apresentaste. Mas ao dizer isso não te acuso de reduzires este caso a «um caso estrito de teologia bíblica».

Quanto à tal necessidade de cada sacramento se fundar neste ou naquele texto evangélico, se bem notares, dou-te o benefício da dúvida em termos de convicções, mas chamei a atenção para uma possível ambiguidade do discurso. Isso nota-se em vários passos, mas particularmente quando dizes que «muitos dos sacramentos têm base na tradiçao interpretativa secular da Igreja [...], mas que lhes falta uma rigorosa fundamentaçao nos textos evangélicos/tradiçao evangélica do século I». Fez-me alguma impressão esse «falta uma rigorosa fundamentação»... É que se lhe falta, deveria ter...


5. Da retórica. Fazes então uma acusação muito grave, do ponto de vista teológico, já se vê. Defendes o teu ponto de vista sobre o nascimento dos sacramentos «da tradiçao interpretativa da Igreja acerca de quem foi Cristo e da sua própria vida» e atiras então que tal afirmação, que eu reclamei ser imprecisa «é uma afirmaçao menos retórica do que a que fazes acerca da fundamentaçao primordial dos sacramentos no próprio Cristo, que é historicamente improvável para não dzer outra coisa...».

Oops! Sinceramente, acho uma afirmação tremendamente infeliz, teologicamente aterradora. Será que confundimos fundamentação teológica com origem histórica? Mas não se torna evidente que tal afirmação desliga teologicamente os sacramentos da sua fonte, de Jesus Cristo? Que significa neste contexto a definição clássica de sacramentos como meios eficazes de graça ou acções de Cristo? Dizer que os sacramentos se fundam(entam) em Cristo é retórica?! Mas então, onde está, afinal, a fé da Igreja a este propósito? Mas que andam então teólogos como Philip Rosato a fazer? Retórica?


6. Da hierarquia de verdades e sua relação com os sacramentos ou vice-versa. Dizes ainda que «nessa tradiçao [a tradição interpretativa da Igreja] há elementos que constituem hoje pedra de toque fundamental da fé crista; mas há muitas coisas que já foram admitidas e depois rejeitadas e que são admitidas e que serao no futuro rejeitadas; entre os argumentos para tal está muitas vezes a sua falta de coerência com os Evangelhos, nos quais (embora nao apenas neles, de acordo) Jesus Cristo continua hoje ainda a ser 'descoberto'.

Certamente, o que dizes é verdade, trata-se da questão da hierarquia de verdades, que o próprio Vaticano II reconhece na Unitatis Redintegratio. Mas que importância tem isso para a questão? É isso que importa clarificar, para não nos ficarmos por generalidades. Há então que perguntar: que lugar ocupam os sacramentos na hierarquia de verdades? Que relação têm com o núcleo da fé cristã? Que elementos são mutáveis? Colocar as questões nestes termos já é outra “loiça”... Mas, de novo, este nível de tratamento da questão coloca-se noutro plano, que não o estritamente pastoral, que foi o nível em que se colocou a questão deste tópico. Legítimas estas questões? Sem dúvida. Mas tratadas no plano que lhes convém. Porque, no fundo, nem estamos em especial desacordo. Estamos é a falar de planos diferentes e assim até parece que pertencemos a credos diferentes. Credo, nem tanto! ;-)

Shalom!
Alef

Re: Deve ou não comungar?
Escrito por: Fátima (IP registado)
Data: 16 de October de 2004 21:13

Alef e Miguel,

Porquê "shalom" no final das mensagens?
Paz e Bem já me foi explicado...

Fátima

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