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Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 13 de December de 2011 14:48

Estou a fazer uma coisa muito curiosa que ainda não tinha feito antes, que é ler a Bíblia de seguida, isto é,livro após livro.

Achei interessante a saga dos Patriarcas, mas começo a ficar curioso com a questão de casarem com as irmãs, para além de outras relações que consideramos incestuosas.
Génesis 20, no caso de Abraão
Génesis 24, no caso de Isaac
Genesis 29, no caso de Jacob

Para além de Esaú, etc.

Existe alguma catequese por detrás deste facto, ou é uma mera questão cultural da época, ou… qualquer outra explicação?

João (JMA)

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: Cassima (IP registado)
Data: 14 de December de 2011 15:34

Quando comecei a ler a Bíblia decidi lê-la de seguida. Mas saltei algumas partes.

Do pouco que eu conheço dos costumes da época e lugar, parece-me que será uma questão cultural e não catequética.

Ocorre-me, além dos exemplos que dás, o caso de Lot e das filhas. Não me parece que o tom usado na história seja de desaprovação.

Cassima

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 14 de December de 2011 17:42

Boa tarde Cassima,

A questão de Lot parece ser diferente e tem um propósito específico. Como diz a respectiva nota:
O que se pretende explicar nesta lenda popular é a ligação dos moabitas e amonitas com Abraão, mas que, por serem filhos do incesto, são inferiores a Israel (Nm 22,1-24,25; Dt 23,4-7; Ne 13,1-3).

Ou seja, tem um intuito muito claro, que não vejo na questão dos Patriarcas...

E tens razão também quanto a não existir nenhum tom de reprovação nesses incestos.

João (JMA)

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: Cassima (IP registado)
Data: 14 de December de 2011 18:13

Há pouco queria falar no caso da Tamar e do Amnon.

Esse episódio parece reflectir naturalidade na união com as irmãs, visto que ela, ao tentar evitar a violação, lhe diz para a pedir ao rei que a concederá.

É de notar, no caso de Sara e Abraão e no caso de Tamar e Amnon, que tanto o adultério como a violação são condenados. Mas o incesto (entre irmãos, neste caso) parece ser natural e aceitável.

Não poderá reflectir um costume originado pela não mistura com as outras raças? Há várias leis no A.T. proibindo os casamentos com outros povos.

Cassima



Editado 1 vezes. Última edição em 14/12/2011 18:14 por Cassima.

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 15 de December de 2011 16:52

Bem, a "explicação" que encontro até agora para o incesto dos patriarcas remete para um "velho costume" de permissão de casamento de meios-irmãos mais tarde abolido. É o que diz a nota explicativa do caso de Tamar e Amnon:
Um antigo costume (Gn 20,12) permitia o casamento entre meio-irmãos. Posteriormente, estas uniões foram proibidas (Gn 34,27; Lv 18,11; 20,17; Dt 22,21; 27,22).


Poderá ter a ver com as origens das sagas dos patriarcas, e ser apenas uma reminiscência dos tempos mais antigos, eventualmente até pedida "emprestada" aos cananeus...

Ou, como colocam na boca de Labão: assim ficava tudo em casa...

Não teria assim nenhum função catequética, meramente um costume antigo de alguma ou algumas tribos...

Porém a nota que referi é muito lacónica a esse respeito, parece mais apologética que outra coisa...

João (JMA)

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: Cassima (IP registado)
Data: 16 de December de 2011 16:02

Uma coisa que parece ajudar no sentido de ser um costume, é o facto de noutros povos da região os irmãos também casarem entre si. Lembro-me dos egípcios, no caso dos faraós que casavam com as irmãs.

Cassima

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 16 de December de 2011 16:30

Pois, provavelmente trata-se mesmo de costumes da região e nada de catequético...

As referências que encontro são sempre no sentido da proibição, mas provenientes de séculos depois...

Aliás a própria moral dos patriarcas deixava bastante a desejar, pelo que provavelmente muitos dos factos narrados são a mera reprodução das histórias mais antigas, com os patriarcas por heróis.

João (JMA)

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: Rui Vieira (IP registado)
Data: 14 de April de 2012 01:02

Olá.

Na verdade, não creio que a narrativa seja tão inocente assim.

É certamente fundada numa praxe habitual no médio oriente antigo.
Mas, sem dúvida que esta narrativa, e seus paralelos (Gn 12,10-20;26,1-11), tem uma função celebrativa.

Como referiste, e bem, nas narrativas acerca dos patriarcas, estes são apresentados com as maiores qualidades, como a sagueza, a beleza da matriarca, e a proteção que estes recebem de Deus.
Na verdade, estas narrativas tendem a apresentar mais a visão dos autores, do que a formalidade histórica - trata-se de uma releitura do passado, à luz do Israel do momento, um Israel que procura firmar a sua identidade e unidade de Povo de Deus, sobrevalorizando, ampliando, os feitos dos patriarcas.

Mas, também referiste que estas situações acabaram sendo proibidas.

Ora, isto testemunha, antes de mais, as vicissitudes do processo redacional. Rasguem as vestes os Tradicionalistas e sectários, mas um Moisés a escrever o Pentateuco é coisa torpe de ser afirmada. No caso destas narrativas, estamos diante de histórias que devem ter começado a ganhar corpo literário a partir de Salomão, e que acabaram sendo reunidas durante o exilio, pela redação final, feita pela designada "fonte sacerdotal".

No entanto, aquilo que eu julgo que se deve valorizar é o carácter progressivo da consciencia moral bíblica. O nosso Deus não é um intruso, que invade e suprime as nuances do mundo humano. Na verdade, a relação entre Lei moral e humanidade não é uma relação ad-extra, mas ad-intra. O nosso Deus é um Deus envolvido nestas vicissitudes. E continua envolvido também hoje, numa humanidade em mutação, que vive novos paradigmas morais.
Rasguem de novo as vestes os Tradicionalistas, mas urge reapreciar certos conceitos.
O carácter progressivo da moral não findou com a Revelação. Na Revelação
apresentou-se o Rosto que dá sentido aos rostos com quem vivemos. Mas também este Rosto é sujeito de uma descoberta, um desvelamento sempre feito de novo, em cada tempo. O "desvelar-se" da Revelação em cada tempo, há-de ser também sempre um novo e continuo desvelar-se do mundo moral humano, um mundo sempre a caminho, sempre marcado pela contingencia, tendo os olhos fixos nAquele que é meta, plenitude.

Concede, Senhor, que eu bem saiba se é mais importante invocar-te e louvar-te, ou se devo antes conhecer-te, para depois te invocar. Mas alguém te invocará antes de te conhecer? Porque, te ignorando, facilmente estará em perigo de invocar outrem. Porque, porventura, deves antes ser invocado para depois ser conhecido? Mas como invocarão aquele em que não crêem? Ou como haverão de crer que alguém lhos pregue? Com certeza, louvarão ao Senhor os que o buscam, porque os que o buscam o encontram e os que o encontram hão de louvá-lo (S. Agostinho, Confissões)

Re: Umas dúvidas sobre a saga dos Patriarcas
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 14 de May de 2012 13:38

Faz sentido o que escreveste.

De acordo que Moisés não parece nada um escriba do Pentaeuco, nem me parece que faça muito sentido.

Se considerarmos tudo isto como a evolução de um processo redacional bem como um caminho de evolução na moral, faz de facto sentido que comportamentos inicialmente aceites venham depois a ser abandonados.

E a questão final que colocas de uma Revelação sempre a ser redescoberta pelo Homem e nesse sentido a actualizar-se parece-me bastante interessante.

João (JMA)



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