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Carta ao Presidente Bush
Escrito por: Mia Couto (IP registado)
Data: 26 de March de 2003 21:37

CARTA AO PRESIDENTE BUSH

Mia Couto

Senhor Presidente:

Sou um escritor de uma nação pobre, um país que já esteve na vossa lista negra. Milhões de moçambicanos desconheciam que mal vos tínhamos feito. Éramos pequenos e pobres: que ameaça poderíamos constituir ? A nossa arma de destruição massiva estava, afinal, virada contra nós: era a fome e a miséria.

Alguns de nós estranharam o critério que levava a que o nosso nome fosse manchado enquanto outras nações beneficiavam da vossa simpatia. Por exemplo, o nosso vizinho - a África do Sul do "apartheid" - violava de forma flagrante os direitos humanos. Durante décadas fomos vítimas da agressão desse regime. Mas o regime do "apartheid" mereceu da vossa parte uma atitude mais branda: o chamado "envolvimento positivo". O ANC esteve também na lista negra como uma "organização terrorista!". Estranho critério que levaria a que, anos mais tarde, os taliban e o próprio Bin Laden fossem chamadas de "freedom fighters" por estrategas norte-americanos.

Pois eu, pobre escritor de um pobre país, tive um sonho. Como Martin Luther King certa vez sonhou que a América era uma nação de todos os americanos. Pois sonhei que eu era não um homem mas um país. Sim, um país que não conseguia dormir. Porque vivia sobressaltado por terríveis factos. E esse temor fez com que proclamasse uma exigência. Uma exigência que tinha a ver consigo, Caro Presidente. E eu exigia que os Estados Unidos da América procedessem à eliminação do seu armamento de destruição massiva. Por razão desses terríveis perigos eu exigia mais: que inspectores das Nações Unidas fossem enviados para o vosso país. Que terríveis perigos me alertavam? Que receios o vosso país me inspiravam? Não eram produtos de sonho, infelizmente. Eram factos que alimentavam a minha desconfiança. A lista é tão grande que escolherei apenas alguns:

- Os Estados Unidos foram a única nação do mundo que lançou bombas atómicas sobre outras nações;
- O seu país foi a única nação a ser condenada por "uso ilegítimo da força" pelo Tribunal Internacional de Justiça;
- Forças americanas treinaram e armaram fundamentalistas islâmicos mais extremistas (incluindo o terrorista Bin Laden) a pretexto de derrubarem os invasores russos no Afeganistão;
- O regime de Saddam Hussein foi apoiado pelos EUA enquanto praticava as piores atrocidades contra os iraquianos (incluindo o gaseamento dos curdos em 1998);
- Como tantos outros dirigentes legítimos, o africano Patrice Lumumba foi assassinado com ajuda da CIA. Depois de preso e torturado e baleado na cabeça o seu corpo foi dissolvido em ácido clorídico;
- Como tantos outros fantoches, Mobutu Seseseko foi por vossos agentes conduzido ao poder e concedeu facilidades especiais à espionagemamericana: o quartel-general da CIA no Zaire tornou-se o maior emÁfrica. A ditadura brutal deste zairense não mereceu nenhum reparo dosEUA até que ele deixou de ser conveniente, em 1992;
- A invasão de Timor Leste pelos militares indonésios mereceu o apoio dos EUA. Quando as atrocidades foram conhecidas, a resposta da Administração Clinton foi "o assunto é da responsabilidade do governo indonésio e não queremos retirar-lhe essa responsabilidade";
- O vosso país albergou criminosos como Emmanuel Constant um dos líderes mais sanguinários do Taiti cujas forças para-militares massacraram milhares de inocentes. Constant foi julgado à revelia e as novas autoridades solicitaram a sua extradição. O governo americano recusou o pedido.
- Em Agosto de 1998, a força aérea dos EUA bombardeou no Sudão uma fábrica de medicamentos, designada Al-Shifa. Um engano? Não, tratava-se de uma retaliação dos atentados bombistas de Nairobi e Dar-es-Saalam.
- Em Dezembro de 1987, os Estados Unidos foi o único país (junto comIsrael) a votar contra uma moção de condenação ao terrorismo internacional. Mesmo assim, a moção foi aprovada pelo voto de cento e cinquenta e três países.
- Em 1953, a CIA ajudou a preparar o golpe de Estado contra o Irão na sequência do qual milhares de comunistas do Tudeh foram massacrados. A lista de golpes preparados pela CIA é bem longa.
- Desde a Segunda Guerra Mundial, os EUA bombardearam: a China (1945-46), a Coreia e a China (1950-53), a Guatemala (1954), a Indonésia (1958), Cuba (1959-1961), a Guatemala (1960), o Congo (1964), o Peru (1965), o Laos (1961-1973), o Vietname (1961-1973), o Camboja (1969-1970), a Guatemala (1967-1973), Granada (1983), Líbano (1983-1984), a Líbia (1986), Salvador (1980), a Nicarágua (1980), o Irão (1987), o Panamá (1989), o Iraque (1990-2001), o Kuwait (1991), a Somália (1993), a Bósnia (1994-95), o Sudão (1998), o Afeganistão (1998), a Jugoslávia (1999)
- Acções de terrorismo biológico e químico foram postas em prática pelosEUA: o agente laranja e os desfolhantes no Vietname, o vírus da pestecontra Cuba que durante anos devastou a produção suína naquele país.
- O Wall Street Journal publicou um relatório que anunciava que 500 000 crianças vietnamitas nasceram deformadas em consequência da guerra química das forças norte-americanas.

Acordei do pesadelo do sono para o pesadelo da realidade. A guerra que o Senhor Presidente teimou em iniciar poderá libertar-nos de um ditador. Mas ficaremos todos mais pobres. Enfrentaremos maiores dificuldades nas nossas já precárias economias e teremos menos esperança num futuro governado pela razão e pela moral. Teremos menos fé na força reguladora das Nações Unidas e das convenções do direito internacional. Estaremos, enfim, mais sós e mais desamparados.


Senhor Presidente:

O Iraque não é Saddam. São 22 milhões de mães e filhos, e de homens que trabalham e sonham como fazem os comuns norte-americanos. Preocupamo-nos com os males do regime de Saddam Hussein que são reais. Mas esquece-se os horrores da primeira guerra do Golfo em que perderam a vida mais de 150 000 homens.

O que está destruindo massivamente os iraquianos não são as armas de Saddam. São as sanções que conduziram a uma situação humanitária tão grave que dois coordenadores para ajuda das Nações Unidas (Dennis Halliday e Hans Von Sponeck) pediram a demissão em protesto contra essas mesmas sanções.

Explicando a razão da sua renúncia, Halliday escreveu: "Estamos destruindo toda uma sociedade. É tão simples e terrível como isso. E isso é ilegal e imoral". Esse sistema de sanções já levou à morte meio milhão de crianças iraquianas.

Mas a guerra contra o Iraque não está para começar. Já começou há muito tempo. Nas zonas de restrição aérea a Norte e Sul do Iraque acontecem continuamente bombardeamentos desde há 12 anos. Acredita-se que 500 iraquianos foram mortos desde 1999. O bombardeamento incluiu o uso massivo de urânio empobrecido (300 toneladas, ou seja 30 vezes mais do que o usado no Kosovo)

Livrar-nos-emos de Saddam. Mas continuaremos prisioneiros da lógica da guerra e da arrogância. Não quero que os meus filhos (nem os seus) vivam dominados pelo fantasma do medo. E que pensem que, para viverem tranquilos, precisam de construir uma fortaleza. E que só estarão seguros quando se tiver que gastar fortunas em armas. Como o seu país que despende 270 000 000 000 000 dólares (duzentos e setenta biliões dedólares) por ano para manter o arsenal de guerra. O senhor bem sabe oque essa soma poderia ajudar a mudar o destino miserável de milhões deseres.

O bispo americano Monsenhor Robert Bowan escreveu- lhe no final do ano passado uma carta intitulada "Porque é que o mundo odeia os EUA ?" O bispo da Igreja Católica da Florida é um ex--combatente na guerra do Vietname. Ele sabe o que é a guerra e escreveu: "O senhor reclama que os EUA são alvo do terrorismo porque defendemos a democracia, a liberdade e os direitos humanos. Que absurdo, Sr. Presidente ! Somos alvos dos terroristas porque, na maior parte do mundo, o nosso governo defendeu a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos alvos dos terroristas porque somos odiados. E somos odiados porque o nosso governo fez coisas odiosas. Em quantos países agentes do nosso governo depuseram líderes popularmente eleitos substituindo-os por ditadores militares, fantoches desejosos de vender o seu próprio povo às corporações norte-americanas multinacionais ? E o bispo conclui: O povo do Canadá desfruta de democracia, de liberdade e de direitos humanos, assim como o povo da Noruega e da Suécia. Alguma vez o senhor ouviu falar de ataques a embaixadas canadianas, norueguesas ou suecas? Nós somos odiados não porque praticamos a democracia, a liberdade ou os direitos humanos. Somos odiados porque o nosso governo nega essas coisas aos povos dos países do Terceiro Mundo, cujos recursos são cobiçados pelas nossas multinacionais."


Senhor Presidente:

Sua Excelência parece não necessitar que uma instituição internacional legitime o seu direito de intervenção militar. Ao menos que possamos nós encontrar moral e verdade na sua argumentação. Eu e mais milhões de cidadãos não ficamos convencidos quando o vimos justificar a guerra. Nós preferíamos vê- lo assinar a Convenção de Kyoto para conter o efeito de estufa. Preferíamos tê-lo visto em Durban na Conferência Internacional contra o Racismo.

Não se preocupe, senhor Presidente. A nós, nações pequenas deste mundo, não nos passa pela cabeça exigir a vossa demissão por causa desse apoio que as vossas sucessivas administrações concederam apoio a não menos sucessivos ditadores. A maior ameaça que pesa sobre a América não são armamentos de outros. É o universo de mentira que se criou em redor dos vossos cidadãos. O perigo não é o regime de Saddam, nem nenhum outro regime. Mas o sentimento de superioridade que parece animar o seu governo. O seu inimigo principal não está fora. Está dentro dos EUA. Essa guerra só pode ser vencida pelos próprios americanos.

Eu gostaria de poder festejar o derrube de Saddam Hussein. E festejar com todos os americanos. Mas sem hipocrisia, sem argumentação e consumo de diminuídos mentais. Porque nós, caro Presidente Bush, nós, os povos dos países pequenos, temos uma arma de construção massiva: a capacidade de pensar.

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: cristina (IP registado)
Data: 28 de March de 2003 21:13

O Tio Sam parece que está a ficar paranoico e ninguém tem poder para o dominar...

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: Ricardo Carvalho (IP registado)
Data: 04 de April de 2003 14:02

cada vez me revolta mais todas as atitudes norte-americanas, mas é verdade, quem tem poder para dizer: " calma aí!"?

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: Ana Amorim (IP registado)
Data: 07 de April de 2003 18:33

Infelizmente, Ricardo, os norte-americanos dividem para reinar, isto é, não são apologistas de outra "democracia e liberdade" que não seja a sua própria.
Saddam Hussein é um ditador abjecto, mas foi treinado e armado pelos próprios Estados Unidos aquando da Guerra contra o Irão.
Agora tornou-se incómodo e está à frente de um país que tem, nada mais nada menos que a segunda maior reserva de petróleo do Mundo. Ora, é claro como a água que estão reunidos os pretextos para uma invasão norte-americana ao Iraque.
Tem armas de destruição massiva? Pode ter, mas dessas armas também as há na Coreia, na Índia, no Paquistão, na China...e nos próprios Estados Unidos...Por que razão tanta pressa em ir logo desarmar o Iraque?
Se há armamento proibido no Iraque, os EUA ganham a justificação para a guerra? Não. Agindo na legalidade, era os inspectores da ONU ficarem mais tempo no Iraque, tal como foi dito pelo próprio Hans Blix. É uma guerra ilegal, sem o aval da ONU, à margem de todo e qualquer direito internacional. Não há como "tapar o sol com a peneira".
À pala da imposição pela força (????!!!) da democracia e da Liberdade no Iraque, as empresas norte-americanas já negoceiam a reconstrução do país, falando-se de contratos milionários! Assim como está em curso um plano para a administração do território por parte de americanos e de iraquianos designados...pelos americanos...claro! E lá vamos nós outra vez à mesma história de sempre: daqui a uns anos, o fantoche que eles põem hoje no poder iraquiano, irá tornar-se como Saddam - incómodo e à frente do país com a segunda maior reserva de petróleo do mundo. Basta que haja uma outra recessão e aí vemos os americanos em força novamente para o Iraque: isto, claro, se eles não tiverem o descaramento e o despudor de se apoderarem da exploração petrolífera no Iraque em regime de exclusividade...
É caso para dizer que, por serem imbatíveis a nível militar, eles fazem o que querem e bem lhes apetece e depois não querem ser julgados internacional e imparcialmente no TPI (embra gostem de mandar para lá muitos).
Eles dizem "basta" quando lhes apraz, quando isso convém aos seus interesses económicos e geo-estratégicos. Quando não convém, pois que morram crianças à vontade por esse mundo fora...azar, tivessem nascido num país com recursos potencialmente interessantes à economia americana...assim, nã há liberdadi, nem democra(cia) pra ninguém!
É uma tristeza...

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: Ricardo Carvalho (IP registado)
Data: 13 de April de 2003 15:16

é fantástico como partilho exactamente da mesma opinião.. e nada mais há a dizer.. a não ser que ainda bem que nao temos petróleo.. ou que toda a gente pensa que somos uma provincia espanhola. Assim, se atacarem, que ataquem Madrid...

Ricardo.

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: mariana (IP registado)
Data: 14 de April de 2003 15:13

bem, que visão tão mórbida!!!
isso é que é respeito pela humanidade e sentido de irmandade... não haja dúvida...
por isso é que não conseguimos ser verdadeiramente sinal de Cristo... por estas e por outras...
"fixe... não é comigo...ainda bem"

o problema é quando nos baterem as coisas à porta...

um abraço a todos

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: cristina (IP registado)
Data: 14 de April de 2003 20:49

O dinheiro que se gasta em armamento dava perfeitamente para criar novas tecnologias que recorressem a energias alternativas e dava também para matar a fome no mundo.
O Bush e seus seguidores são umas grandes bestas. desculpem a expressão ,mas é preciso ter uma visão mesmo limitada para guerrear pelo petroleo até porque é um recurso energetico que com mais dez anos de exploração se esgosta naturalmente.
Não há justificação nenhuma para a guerra. Que dessem meios de sobrevivencia ao povo em vez de embargos comerciaise ele proprio se revoltaria contra saddam quando assim o entendesse . è só para parecerem eles os libertadores , querem ser adorados para depois aconselharem coca-cola, pornografia , hamburgers, casamentos monogamicos e divorcios , consumismo , desemprego e todas as delicias da vida americana.
ADORO A AMÉRICA , estou a pensar ir para lá , e comprar uma casinha nos suburbios todos degradados cheios de pessoal drogado , desempregado , desalojado e de alta criminalidade , o outro lado da vida americana e dos espaços descaracterizados das grandes cidades. Acho que vou ser muito feliz lá e tem um sistema de saude espetacular , são fantasticos aqueles tipos.Disseram horrores do palacio presidencial , é enormes e os artistas de hollywood que mais não fazem do que dizerem asneiras e despirem o corpinho compram ilhas e destroiem outras de ganancia como cuba e republica demonicana. Os americanos adoram aquilo , sentem-se bem junto da miseria , sentem-se muito poderosos. Hipocritas querem resolver a desgraças dos outros paises e nem sequer resolvem as desgraças dos paises vizinhos pobres. Hipocritas é o que eles são.
cristina

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: Ana Amorim (IP registado)
Data: 16 de April de 2003 17:46

Uma coisa é certa: eles falam de Deus, andam sempre com Cristo na boca, que isto e que aquilo...e o que é curioso, é que seguem precisamente o contrário dos ensinamentos cristãos:

1. Mutilam e deformam a natureza das coisas: já ouviram falar dos alimentos transgénicos? As experiências loucas que fazem? Os atentados permanentes contra o meio-ambiente?

2. Brincam com a vida e com a dignidade humana: a Clonaid, já ouviram falar? Sem comentários...penso que a clonagem, neste caso, nada tem a ver com fins terapêuticos...E depois, os maus tratos que infundem aos prisioneiros, a pena de morte em alguns estados (esta, com relatos surpreendentemente bárbaros).

3. Hipocrisia: eles têm uma regra que se resume em três letrinhas apenas: PDA, ou seja, Public Demonstration of Afection. Um casal que se encontre em local público a trocar um simples beijo, isto só para dar um exemplo, pode incorrer de uma pequena multa, ou de uma chamadinha de atenção. No entanto, surgem depois "fenómenos" tipo Playboy, pornografia às toneladas, orgias intermináveis com muito sexo e muita droga, programas televisivos no mínimo degradantes e estupidificantes...e fiquemos por aqui...

4. Arrogância, insulto e excesso: na América, há pessoal tão rico, tão indecentemente rico, que, para além das mansões, dos iates, e de tudo o mais, dá-se ao luxo de comprar ilhas, aldeias, etc...ora, isto é um verdadeiro insulto a quem não tem sequer o que comer...
Consequentemente, para suportar todo este luxo, todo este excesso, alguém tem que pagar a factura: e esse alguém, quando os recursos começam a escassear, são os outros países, coitados, que, para além de uma população não raro faminta, têm de vender aquilo que poderiam aproveitar, para que estes senhores não deixem as susas vidinhas cómodas de luxo, conforto e prazer...Para isso, lá se inventam umas guerrinhas de vez em quando...quanto mais não seja, para testar armamento novo...pois!

No fundo, no fundo, tenho muita pena dos americanos...penso que são profundamente infelizes...
Lá diz um velho adágio que "quanto mais vazio é o caixote, mais barulho faz"...


Anna

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: autor: Leonardo Boff (IP registado)
Data: 13 de September de 2003 18:32

Santos de pau oco

Há dias caiu-me em mãos uma foto da Reuters que mostrava George Bush, Collin Power e Donald Rumsfeld (para alguns o verdadeiro eixo do mal) de olhos fechados, mãos entrelaçados em sinal de profunda oração. Era antes de uma reunião do Gabinete na qual se tomariam decisões importantes em vista da guerra contra o terrorismo e o Iraque. Revelou-nos um editorial do Le Monde de 30 de março último (Deus e a América) que George W. Bush é um "born again christian", um renascido para fé depois de uma juventude de alcoólatra e cheia de desvarios. Convertido, aproximou-se da extrema direita evangélica especialmente dos pregadores mediáticos ultraconservadores como Pat Robertson e Jerry Farwell, fazendo desta direita um dos núcleos inspiradores de sua administração. Seus discursos são recheados de referências bíblicas. Instaurou a praxe de iniciar as reuniões de Gabinete com uma prece preparada por um ministro em sistema de rodízio. É uma sinistra "comunidade de base", com propósitos belicosos.

Essa piedade forneceu a Bush não só a linguagem com a qual caracteriza sua guerra preventiva contra quem ameaçar os Estados Unidos, mas também subministrou-lhe a mística para levar verdadeira cruzada (palavra usada uma vez por ele) contra o derrotado Saddam Hussein e o terrorismo mundial. Ele e seu círculo mais íntimo crêem que não está longe a "batalha do grande dia", quando, segundo o Apocalipse (16,16), os inimigos do Cristo serão exterminados no lugar chamado de Armagedon. Então começará um reino de paz. Sentem-se instrumentos desta estratégia. Dai o sentido de missão em sua política externa.

Aqui cabe perguntar: de que Deus estamos falando? É o Deus-Pai e Mãe, da experiência de Jesus, da ternura dos humildes e padrinho dos pobres? Mas esse Deus é vivo e jamais ordenaria tirar a vida dos outros. Não estaria Bush manipulando o nome de Deus (e pecando renitentemente contra o segundo mandamento, o de "não usar o santo nome de Deus em vão") para conferir chancela de legitimidade a uma guerra dizimadora de inocentes e de instituições civis?

Importa reconhecer, porém, que, as religiões, de modo geral, e o cristianismo, de modo particular, se deixaram, historicamente, manipular em função de interesses dos poderosos, que nada têm a ver com os interesses de Deus e do povo. Especificamente os filhos de Abraão, judeus, cristãos e muçulmanos, com frequência, usaram a crença de serem "povos escolhidos" (mito tribalista) para submeter os demais pela violência doce do processo civilizatório ou pela violência dura das guerras e do assujeitamento. Mas quando deixamos Deus ser Deus, a religião ser religião e damos centralidade ao cristianismo originário (as igrejas são traduções culturais posteriores)então fica claro que a guerra e a discriminação são contrários à natureza destas instâncias. Elas têm tudo a ver com a busca da justiça que funda a paz, com o serviço humilde aos deserdados e com a compaixão pelos caidos dos caminhos.

O Deus a quem Bush reza, é um ídolo. Ele e seus auxiliares diretos, imbuidos de fundamentalismo religioso, são santos de pau oco. Tanto os ídolos quanto esse tipo de santos são insensíveis e precisam do sangue dos outros para se sentirem vivos. Dai o risco que representam, pois acreditam piamente em suas próprias fabulações religiosas e políticas.

Leonardo Boff <www.leonardoboff.com>

Re: Carta ao Presidente Bush
Escrito por: Esclarecimento (IP registado)
Data: 13 de September de 2003 18:34

klaro k nao foi o leonardo k pos aqui o artigo dele



Desculpe, não tem permissão para escrever ou responder neste fórum.

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