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Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: João Oliveira (IP registado)
Data: 02 de December de 2002 12:31


Ok, 'bigado...

João

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 21 de December de 2002 20:57

A propósito de Pio XII (anexo notícia):

Revelado documento condenatório do Nazismo na Santa Sé
2002-12-21 20:20:55

A agência Zenit apresenta hoje um documento que demonstrar uma clara oposição da Igreja Católica ao nazismo, condenando-o publicamente e com muita dureza.

A inclusão no célebre “Índice” dos livros proibidos do Vaticano da obra mais importante de Alfred Rosenberg, ideólogo do Partido Nazi, intitulada “O mito do século XX”. Quem aprovou esta resolução, no dia 9 de Fevereiro de 1934 (duas semanas depois de Hitler ter nomeado Rosenberg chefe ideológico do Partido Nazi) foi o Cardeal Eugenio Pacelli, futuro Pio XII, o então Secretário de Estado do Vaticano.
O texto latino original, apresentado pela Zenit, explicava os motivos pelos quais se incluía o livro de Rosenberg no “Índice”: “Este livro despreza e recusa completamente todos os dogmas da Igreja Católica, e inclusive os fundamentos da religião cristã. Defende a necessidade de fundar uma nova religião e uma nova Igreja alemã. Enuncia o princípio segundo o qual é necessário que haja uma nova fé mítica do sangue, uma fé em que se acredita na natureza divina do homem, uma fé aprovada pela ciência que estabelece que a raça ariana representa esse mistério que se supera e se substitui aos antigos sacramentos”.

Fonte Ecclesia


Por aqui se verica que a melhor "apologia" é a verdade aberta ao mundo.

É que a Igreja existe neste mundo, e não numa torre de marfim inacessível.

E a verdade vem sempre ao de cima.Felizmente.

João (JMA)

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 23 de February de 2003 19:41

Vale a pena ver o «Destaque» do «Público» de hoje, inteiramente sobre o assunto. Há aspectos muito, muito interessantes. Como os artigos se encontram on-line apenas durante uma semana, copio-os para aqui.

Alef
_________________
artigo 1

Imagem do Papa Pio XII Pode Sair "Melhor" da Investigação nos Arquivos


Vaticano abriu acesso à documentação

Polémica entre o "Papa de Hitler" e o "Papa dos judeus" continua


O historiador Andrea Riccardi, presidente da Comunidade de Santo Egídio, pensa que a imagem do Papa Pio XII "sairá melhor do que se pensa" da investigação que venha a ser feita nos arquivos do Vaticano respeitantes ao seu pontificado. Desde sábado, dia 15, a Santa Sé declarou aberta a parte dos arquivos respeitantes à época em que Eugenio Pacelli, o futuro Pio XII, foi núncio em Munique (1922-25) e em Berlim (1925-29).

Pacelli é acusado por muitos de ter silenciado o Holocausto. Em 1999, o jornalista católico inglês John Cornwell escreveu o livro "O Papa de Hitler" em que critica os silêncios de Pio XII sobre o Holocausto. Em resposta, um outro jornalista católico, italiano, escreveu "Pio XII, o Papa dos Judeus". Mas estas são apenas duas das últimas de um vasto conjunto de obras dedicadas ao tema.

Em entrevista ao PÚBLICO (ver texto nestas páginas), Andrea Riccardi, um dos historiadores que mais tem trabalhado sobre o pontificado de Pio XII, não adopta a tese do silêncio. "Pio XII escolheu fazer condenações indirectas e tentou fazer da sua Igreja um espaço de asilo aos perseguidos e um espaço de mediação diplomática", diz. Mas o historiador afirma ser necessário "abrir os arquivos do Vaticano". "Repito-o a todos, desde há 15 anos". Aceitando os "problemas técnicos" ainda existentes - que fazem com que o resto dos arquivos sobre Pio XII só possam ser abertos em 2006 -, Riccardi insiste na necessidade de o Vaticano "investir" nesse sector.

O português António Telo, professor na Academia Militar, que tem investigado este tema, está convicto de que os novos documentos irão revelar as opiniões pessoais de Eugenio Pacelli, antes de ser eleito Papa, em relação ao regime nazi. E, acredita, revelarão "uma condenação clara" do nazismo.

A peça "O Vigário"
A polémica sobre o que Pio XII (não) disse ou (não) fez começou no pós-guerra, com declarações críticas da actuação do Papa. Intelectuais católicos como o francês François Mauriac ou o italiano Carlo Bo lamentaram não ter havido "palavras claras e inequívocas" e criticaram o "espírito de adpatação" da Igreja. Mas a maior acusação viria em 20 de Fevereiro de 1963 - fez quinta-feira 40 anos -, com a estreia da peça "O Vigário", de Rolf Hochhuth, no Teatro Kurfürstendamm, em Berlim-Leste, capital da comunista RDA. Na peça, Pio XII era acusado de "criminoso".

Durante as últimas décadas, a polémica foi-se centrando nos argumentos do que Pio XII disse ou não disse, do que fez ou não fez. Teria sido útil ou desejável uma condenação pública e explícita do nazismo e do extermínio que estava a ser feito? António Telo tem dúvidas em dar uma resposta definitiva e positiva a esta pergunta: "Não vejo muitas vantagens e os inconvenientes são fáceis de detectar". Um pronunciamento público do Papa teria sem dúvida "consequências", mas estas poderiam não compensar os eventuais efeitos benéficos, que poderiam ser "bastante limitados".

António Telo considera que "o principal efeito benéfico era justamente o efeito político futuro: partir do momento em que o Vaticano via que a guerra ia terminar com derrota esmagadora da Alemanha e da Itália, seria politicamente conveniente tomar uma posição de condenação". Mas, acrescenta, esta atitude implicaria "um preço" e esse era o dilema. "Preferiu-se prejudicar a posição da própria Igreja em relação ao futuro em vez de obrigar inocentes a pagar um preço por uma tomada de posição."

Como Riccardi, António Telo encara a acção do Papa Pacelli como reveladora de "um problema de consciência muito grave: ele próprio era obrigado a moderar as posições que a consciência o levava a tomar". As acções de Pio XII "indiciam, enquanto acções não públicas, as simpatias" para com a causa dos Aliados, "mas são justamente acções não públicas". O grande problema da Igreja, acrescenta, "era que tinha uma espécie de arma de um só tiro; podia fazer uma condenação pública das políticas de extermínio; mas isso feito, acabavam-se as munições; e depois viriam represálias".

ANTÓNIO MARUJO
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 23 de February de 2003 19:49

artigo 2:

João Paulo II e a Aproximação Entre Cristãos e Judeus


Em Março de 2000, na declaração "Memória e Reconciliação", do Vaticano, afirma-se que "um dos domínios que exige um exame de consciência particular é o da relação entre cristãos e judeus", cujo balanço é sobretudo "negativo". Esta relação, agravada pela inimizade histórica dos cristãos para com os judeus, acabou por criar um ambiente onde o germinaram o antisemitismo e o Holocausto, apesar de estes serem ideologias pagãs e que desprezavam a fé, como afirma o texto. Poucos dias depois da sua publicação, o Papa João Paulo II iria a Jerusalém depositar no Muro das Lamentações o pedido de perdão pelas injustiças infligidas aos judeus ao longo da história.

Já em Março de 1998, um outro texto do Vaticano intitulado "Nós Recordamos - Uma Reflexão Sobre o Holocausto" negava que a "indizível tragédia" da "Shoah" fosse responsabilidade dos cristãos. Antes "foi obra de um regime neo-pagão moderno" que encontrou as raízes do anti-semitismo "fora do cristianismo e, procurando os seus objectivos, não hesitou opor-se à Igreja, perseguindo igualmente os seus fieis".

Tendo em conta que foi a Europa tradicionalmente cristã o palco do Holocausto, o documento levanta também a questão "da relação entre a perseguição nazi e a atitude dos cristãos em relação aos judeus no decurso dos séculos". Foi para atenuar essa inimizade histórica que, desde o início do seu pontificado, o actual Papa João Paulo II teve um conjunto de iniciativas tendentes a aproximar católicos e judeus. Ele próprio amigo de judeus na infância em Cracóvia, João Paulo II acabaria por reconhecer o Estado de Israel, tornando-se o primeiro Papa a ir rezar, em Jerusalém, ao Muro das Lamentações.

A.M.
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]
_____________________

artigo 3:

Bibliografia Consultada



"Pio XII e a Segunda Guerra Mundial - Que Dizem os Arquivos do Vaticano?", Pierre Blet, ed. Principia

- "O Papa de Hitler - A História Secreta de Pio XII", John Cornwell, ed. Terramar

- "Pio XII, o Papa dos Judeus", Andrea Tornielli, ed. Civilização

- "Pio XII", dir. de Andrea Riccardi, Editori Laterza (Roma)

- "Il Potere del Papa da Pio XII a Paolo VI", Andrea Riccardi, Editori Laterza (Roma)

A.M.
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 23 de February de 2003 19:57

artigo 4:
"Pio XII Somatiza o Catolicismo dos Anos 50, com as Suas Debilidades, a Sua Força, as Suas Contradições"


Entrevista com Andrea Riccardi

Um dos historiadores que mais tem investigado a época e o pontificado de Pio XII, Andrea Riccardi, diz que aquele Papa "escolheu fazer condenações indirectas e tentou fazer da Igreja um espaço de asilo aos perseguidos e de mediação diplomática". Admitindo que "outros papas teriam sido mais fortes", Riccardi mantém que, apesar disso, está convencido de que "Pio XII não tinha simpatia pelo nazismo".

Andrea Riccardi, historiador e presidente da Comunidade de Santo Egídio, esteve quinta-feira em Lisboa para apresentar o seu livro "O Martírio do Século" (ed. Quetzal), sobre as perseguições aos cristãos durante o século XX. Ao PÚBLICO falou também do pontificado e da acção de Pio XII durante a II Guerra Mundial e o Holocausto.

PÚBLICO - Os testemunhos que apresenta no seu livro, de perseguições de Hitler a cristãos, abonam em favor da tese de que o Papa Pio XII era contra o nazismo?
ANDREA RICCARDI - O nazismo aproveitou-se da divisão profunda entre protestantes e católicos. Deu-se uma "nazificação" de uma parte importante do protestantismo alemão. A Igreja Católica resistiu, teve mártires. Mas aqui está o problema de Pio XII, uma personalidade que deve ser vista na sua plenitude, porque a História não deve condenar ou absolver. Como dizia Braudel, a tarefa do historiador é compreender e nós devemos tentar compreender como trabalhou Pio XII.

O próprio Pio XII falou do silêncio. Há um encontro entre ele e o núncio Roncalli - futuro Papa João XXIII - em que: "O que diz o público sobre os meus silêncios em relação aos alemães?" Isto é: Pio XII escolheu fazer condenações indirectas. Foi uma escolha. Mas não porque fosse filo-nazista. Temos provas de que Pio XII ajudou, de longe, a ideia de uma conjura contra Hitler. É o tiranicídio, previsto mesmo pela doutrina católica.

Pio XII escolheu fazer condenações indirectas e tentou fazer da sua Igreja um espaço de asilo aos perseguidos e de mediação diplomática. Em Roma, os conventos e as instituições do Vaticano abriram-se aos hebreus e aos perseguidos. Esta foi a sua escolha, uma escolha lúcida, não ditada pelo medo, mas por uma convicção. Outros papas teriam sido mais fortes. Talvez Pio XI tenha sido mais forte na condenação do nazismo, mas eram tempos e carácteres diversos. Pio XII viveu uma sorte estranha: até aos anos 60, foi considerado um grande Papa, mas, a partir de "O Vigário" de Hochhuth, fez-se este discurso muito duro sobre ele. Mas Pio XII não tinha simpatia pelo nazismo.

P. - Mas já antes de "O Vigário" havia intelectuais católicos, como François Mauriac ou Carlo Bo, que tinham criticado Pio XII...
R. - Sim. Mauriac dizia "queríamos ter ouvido palavras fortes". Pode pensar-se ou sonhar-se que outro Papa teria feito de outro modo, mas os historiadores devem compreender o que fez Pio XII. Arriscamo-nos a exagerar: mesmo os Aliados - americanos, ingleses - não bombardearam Auschwitz. Precisamos de ver o que era a Igreja Católica durante a guerra: em Roma, estava um pequeno grupo de homens fechado no Vaticano, com uma cidade ocupada pelos nazis. Naturalmente, Pio XII não fez uma escolha profética, de denúncia. Fez outra. Isto pode agradar ou não, mas é fruto de uma história.

P. - O debate deveria centrar-se mais na questão da escolha que Pio XII do que naquilo que fez ou não?
R. - É a minha posição. E por isso sou favorável, desde há 15 anos, à necessidade de abrir os arquivos do Vaticano. Nós, historiadores, trabalhamos sobre documentos fundamentais. E, à excepção dos já publicados na colecção de "Actas e Documentos" por vontade de Paulo VI, não temos documentos. Este é o nosso problema.

Creio que Pio XII sairá melhor do que se pensa de um estudo aprofundado de toda a documentação. Mas é preciso aceitar o desafio da história. O Vaticano não abre os arquivos também por problemas técnicos, mas é preciso investir e abri-los. Creio que haverá coisas com muito interesse. E interessa-nos compreender como se colocaram os problemas a a gente como Pio XII, Montini, o futuro Paulo VI, Tardini, o futuro secretário de Estado de João XXIII, Como se lhes pôs o problema da guerra, dos judeus. Não basta dizer o que fez, mas como chegou a tal decisão - e isto está nos documentos vaticanos -, que informações tinham, que percepção. A história está cheia de subtilezas.

P. - Pode dizer-se que Pio XII é condenado por aquilo que não disse, mas que foi elogiado depois da guerra, por muitos judeus, por aquilo que fez?
R. - Sim, foi elogiado pelos judeus. Os de Roma queriam ser recebidos logo depois pelo Papa para agradecer-lhe. Foi considerado de modo positivo. É preciso compreender também que as comunidades judaicas estavam destruídas e não queriam pôr o problema do Holocausto naquele momento. O problema vem com "O Vigário" e com a mudança da mentalidade na América. Depois, começa-se a fazer o discurso das vítimas da história, o discurso sobre a "Shoah" e sobre o próprio Pio XII. É preciso passar do mito à história: trabalhei muito sobre Pio XII e ainda estamos muito no mito e pouco na história.

ANTÓNIO MARUJO
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]
________________
artigo 5:

Pio XII Somatiza o Catolicismo dos Anos 50


Qual era a personalidade de Pio XII?

A pessoa de Pio XII ainda não foi compreendida. Era considerado uma espécie de Papa-ditador no tempo dos césares, o último hierático do tempo de Hitler e Mussolini, mas também do tempo de Churchill e Estaline. Pio XII era um homem tímido, que tinha medo de desagradar aos outros. Alguns cardeais não o queriam Papa porque diziam que eram precisos homens fortes, homens duros em tempos difíceis. Mas foi também um homem forte: indubitavelmente, quando foi eleito Papa, era um dos maiores diplomatas da Igreja Católica. Um homem atormentado, à busca da perfeição.

Este Papa tímido era democrático?
Creio que sim. A sua escolha pela democracia é sincera, mesmo se olhava com interesse os regimes autoritários - a Espanha de Franco e o Portugal de Salazar, com os quais assina Concordatas.

É também um inovador: as primeiras inovações na liturgia foram feitas por ele, ainda que tenha bloqueado a nova teologia e os padres-operários. Pio XII somatiza o catolicismo dos anos 50, com as suas debilidades, a sua força, as suas contradições. Não se pode fazer dele uma caricatura, é preciso estudá-lo como personagem histórico. É a síntese do catolicismo da primeira metade do século, como, em certo sentido, Wojtyla é a síntese do catolicismo da segunda metade do século.

ANTÓNIO MARUJO
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 23 de February de 2003 20:01

artigo 6:

"Ficaria Supreendido Se Encontrassem Um Documento Explícito Sobre a Relação de Pio XII com o Holocausto "


O jesuíta e historiador norte americano Gerald Fogarty foi um dos membros que integrou a Comissão Mista judaico-católica criada pela Santa Sé, em 1998, para definir os contornos da figura do Papa Pio XII e as polémicas sobre as suas responsabilidade no Holocauso. Por questões, ainda não suficientemente esclarecidas, a comissão viria a dissolver-se em 2001. Uma semana depois da abertura dos Arquivos do Vaticano relativos ao período entre guerras, o historiador diz, nesta entrevista ao PÚBLICO, que ainda existem muitas lacunas na informação disponível mas que está confiante no cabal esclarecimento da actuação da Santa Sé.

PÚBLICO - Quais são as suas expectativas em relação à abertura desta parte do arquivo histórico do Vaticano?
Gerald Fogarty - Todo o pontificado de Pio XI, especialmente depois de 1929, revela alguns antecedentes necessários para compreender o papel de Pio XII durante a II Guerra Mundial. Como sabem, Eugenio Pacelli (durante os anos 30) sabia o que estava a acontecer na Alemanha, em especial aos judeus. As minhas investigações nos arquivos norte-americanos indicam muito claramente a repressão que também a Igreja católica estava a sofrer, em clara violação da Concordata de 1933. O primeiro relatório foi enviado a Washington pelo embaixador americano na Alemanha, logo em Janeiro de 1934.

Espero que esta abertura possa clarificar a nossa visão sobre as negociações lideradas por Pacelli quando era secretário de Estado, e possa esclarecer como este período moldou o seu comportamento depois de ser eleito Papa. A documentação vai revelar a complexidade de questões que só podem ficar totalmente esclarecidas quando as outras secções dos arquivos sobre a II Guerra Mundial forem abertas aos historiadores.

P - O que é que se pode dizer com precisão do papel de Pio XII durante a II Guerra?

R - Ainda existem muitas lacunas. Neste momento estou a investigar as relações entre os EUA e o Vaticano durante a II Guerra e, para isso, comecei a estudar o período da I Guerra, quando quase não existiam contactos. Quando os EUA adoptaram uma política isolacionista, Eugenio Pacelli estava consciente da necessidade de estabelecer relações com os norte-americanos.

Ora, é a luz desta minha investigação que continuo a dizer que muito ainda terá de vir a lume. Mas estou também convencido de que não iremos seguramente encontrar nenhum documento que demonstre claramente as intenções de Pio XII. Se posso invocar, a este propósito, uma questão contemporânea digo-lhe que tenho tido muitas discussões com pessoas que me dizem: "Bem, até agora o Papa ainda não disse directamente uma palavra sobre a política americana em relação ao Iraque". E respondo sempre que, apesar disso, o cardeal secretario de Estado, Angelo Sodano, se tem referido muito claramente a esta questão. "Mas ele não é o Papa", respondem-me. Ora o mesmo argumento é utilizado sobre Pio XII e a guerra. E eu contraponho: o secretário de Estado da Santa Sé não fala senão em nome do Papa.

Este é o problema, porque ainda se continua à procura do indício documentado que demonstre explicitamente que o Papa pediu a ordens religiosas e aos fieis que salvassem os judeus. E, no entanto, num documento recentemente tornado público existe o relatório enviado a Berlim de um cabo das SS de Roma em que este se lamentava que o Vaticano estava a salvar os judeus. Ora, se o Vaticano estava a salvar os judeus, o Papa estava a par do que se passava. Mas ficaria surpreendido se algum dia se viesse a encontrar qualquer documento desse teor.

P - O que é que se passou exactamente com a Comissão Mista?

R - Inicialmente, a comissão pretendia examinar a documentação disponível nos 11 volumes publicados pelo Vaticano que, na sua maior parte, tinham sido ignorados. Mas desde o princípio, achei que cada um dos membros alimentavam diferentes expectativas. Alguns dos judeus que integravam a comissão nunca tinham visto os documentos. Com o passar do tempo comecei também a achar que os arquivos deveriam ficar completamente acessíveis. Acontece que era impossível, porque o cardeal Edward Cassidy (presidente da Comissão Pontifícia para as Relações Religiosas com o Judaísmo) não tinha nem a autoridade, nem o poder, para nos garantir o acesso aos documentos. Este foi o ponto que fez quebrar a Comissão. Mas devo sublinhar que o Vaticano não é a única instituição que mantém fechados os arquivos.

Outra razão que, penso, estará a atrasar a abertura total prende-se com uma questão muito simples: é uma decisão que implica com a vida de muitas pessoas, umas que ainda se encontram vivas, outras que faleceram recentemente.

Todavia, acho que a abertura destes arquivos não vai aplacar as criticas... Mas estou confiante.

CARLOS PICASSINOS, em Roma
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 23 de February de 2003 20:04

artigo 7:
As Peças da Polémica


Na cena 3 do I acto de "O Vigário", estreado em 1963, um dos protagonistas, Kurt Gerstein (baseado numa personagem real) diz a um amigo judeu que a culpa do que está a acontecer não é do povo alemão e que só o Vaticano, através de um protesto público, poderá parar o extermínio. No segundo acto, Ricardo, um outro protagonista, acrescenta: "Um vigário de Cristo que tem todas estas crueldades diante dos olhos e que, por razão de Estado, espera (...) para elevar a voz do seu coração e amaldiçoar (...) semelhante Papa é um criminoso."

Para escrever a peça, Rolf Hochhuth ter-se-à baseado num relatório enviado para a Alemanha pelo embaixador junto da Santa Sé, Ernst von Weizsäcker, em Outubro de 1943. Nesse documento, o diplomata vangloria-se de ter conseguido o silêncio de Pio XII. Mas o que Weizsäcker não transmite para Berlim é que a secretaria de Estado do Vaticano lhe tinha entregue várias notas de protesto, ao que o embaixador ameaçou com perseguições ainda piores por parte do regime nazi.

Mais tarde, o autor de "O Vigário" confessou não conhecer a radiomensagem papal do Natal de 1942, nem tão pouco o discurso de Pio XII aos cardeais, de 2 de Junho de 1943. Na radiomensagem, o Papa Pacelli afirmava que havia "centenas de milhares de pessoas que, sem a menor culpa, às vezes só devido à sua nacionalidade e raça, foram escolhidas para morrer ou para ser gradualmente eliminadas".

Doze anos antes da peça de Hochhuth, o escritor católico francês François Mauriac afirmava ter havido "heroísmo e caridade de muitos bispos, sacerdotes e religiosos para com os judeus perseguidos" mas, acrescentava, "não tivemos o conforto de sentir o sucessor do galileu Simão Pedro condenar com palavras claras e inequívocas, e não com alusões diplomáticas, a crucifixão destes numerosos 'irmãos do Senhor'". E concluía: "O silêncio do Papa e da hierarquia mais não foi do que um repugnante dever; tratava-se de evitar desgraças piores."

Também o italiano Carlo Bo, intelectual católico que coordenou a edição da peça de Hochhuth em Itália, afirmava: "A Igreja que tem medo do pior e se adapta e escolhe o caminho do mal menor, responde no fundo a um espírito de adaptação, a uma espécie de abdicação."

Na década de 60, por ordem do Papa Paulo VI, uma comissão de historiadores jesuítas empreendeu a publicação da documentação das "Actas e Documentos" respeitantes ao pontificado. Mas a polémica reacende-se na dácada de 90, quando vários investigadores e responsáveis de instituições judaicas reclamam a abertura dos arquivos do Vaticano.

Em 1999, o jornalista John Cornwell retoma as teses de Rolf Hochhuth no livro "O Papa de Hitler", denunciando a "incapacidade de falar com franqueza sobre a Solução Final, que então estava a ser aplicada". No ano passado, foi o realizador Costa Gravas quem retomou a mesma tese no filme "Amen" (não exibido em Portugal).

António Marujo
«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]

Re: Arquivo secreto do Vaticano
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 23 de February de 2003 20:09

artigo 8:
Perguntas e respostas - Os Temas e Argumentos do Debate


O Papa Pacelli não condenou publica e explicitamente o Holocausto. Mas as suas acções levaram a que muitos judeus pudessem ser salvos. Estes são dois dos argumentos dos que condenam e dos que compreendem a acção de Pio XII. Mas há mais. Aqui ficam alguns argumentos do debate.

Porquê os silêncios?

* Pio XII referiu-se, na sua rádio-mensagem do Natal de 1942, às "centenas de milhares de pessoas que, sem a menor culpa, às vezes só devido à sua nacionalidade e raça, foram escolhidas para morrer ou para ser gradualmente eliminadas". John Cornwell, autor de "O Papa de Hitler", pensa que esta declaração é "ambígua" por não ter usado as palavras "judeu, não ariano, alemão e nazi". Andrea Tornielli, em "Pio XII, O Papa dos Judeus", diz que "o que tem faltado é um debate sério e sereno sobre a 'vexata quaestio' do 'silêncio' (...) Pacelli, embora tenha denunciado as perseguições e protestado formalmente muitíssimas vezes junto do Governo alemão, optou por não atacar os nazis com públicas invectivas ou excomunhões". E todos, acrescenta, terão percebido "claramente" o sentido daquela frase.

* Apesar do que o Papa (não) disse, as posições das hierarquias católicas nos diversos países foram diferentes, lembra António Telo. Na Áustria e na Polónia, dois países que depois seriam ocupados pelos nazis, os bispos católicos condenaram abertamente o nazismo. Em Portugal, o cardeal Cerejeira fez também uma condenação explícita e conjunta do nazismo e do comunismo, o que motivou um protesto diplomático do embaixador alemão.

* O próprio Pio XII assumiu como estratégia o seu silêncio público (ver entrevista de Andrea Riccardi) e, no seu testamento, registou: "O conhecimento das minhas deficiências, imperfeições e culpas cometidas durante um tão longo pontificado e numa época tão grave, tornou mais claras ao meu espírito toda a minha insuficiência e indignidade. Peço humildemente perdão a todos aqueles a quem pude ofender, prejudicar, escandalizar com as palavras e com as obras."

Que judeus foram salvos?

No livro "Pio XII o Papa dos judeus", Andrea Tornielli cita o diplomata israelita Pinchas Lapide, cônsul israelita em Milão, em "Roma e gli ebrei. L'azione del Vaticano a favore delle vittime del nazismo", um livro de 1967. Graças à acção de Pio XII, diz Lapide, mais de 800 mil judeus escaparam aos campos de concentração e não existiria "um Papa na história a quem os judeus tenham agradecido tão calorosamente pela ajuda e salvação oferecida aos seus irmãos em momento de grave perigo". Andrea Riccardi pensa que não se pode fazer uma contabilidade deste género: "Só em Roma, foram milhares os judeus que foram salvos pelo Vaticano, mas é muito difícil [fazer cálculos], porque é uma hospitalidade clandestina, não temos os números. Fiz um inquérito nos anos 70, mas não se consegue ter os números", diz ao PÚBLICO.

Tornielli cita os inúmeros testemunhos dos que, depois da guerra, agradeceram os gestos de Pio XII. Golda Meir, que foi primeira-ministra de Israel, mandou um telegrama ao Vaticano quando Pio XII morreu: "Quando o martírio mais espantoso atingiu o nosso povo, durante os dez anos de terror nazi, a voz do Pontífice ergue-se a favor das vítimas." O rabino chefe de Roma, Elio Toaff, diz que foi salvo dos campos de concentração graças a um padre e agradeceu a Pio XII. Também o Presidente de Israel, Itzhak Ben-Zvi, aproveitou a morte de Pio XII para se referir aos "sentimentos dos numerosos refugiados judeus, salvos da morte e da tortura, pela intercessão de Pio XII". E William Zuckermann, director da revista judaica dos EUA "Jewish Newsletter", escreveu na mesma ocasião: "Provavelmente, nenhum estadista daquela geração tinha dado aos judeus uma ajuda tão poderosa [quanto Pio XII] na hora da maior tragédia: a ocupação nazi da Europa. Aquilo que o Vaticano fez foi uma das maiores manifestações de humanitarismo no século XX e constituiu um novo e eficaz método para combater o anti-semitismo".

Houve planos de Hitler para invadir o Vaticano e raptar o Papa?

O próprio Papa Pio XII e o Vaticano estariam convencidos de que Hitler pensava invadir o Vaticano e levar Pacelli para a Alemanha. "No Vaticano, esconderam cartas e documentos", diz Riccardi. "Pio XII conhecia a possibilidade dessa invasão e rapto. Isto diz das condições em que ele trabalhava. Sobretudo entre Setembro de 1943 e a libertação de Roma, em 1944, o Papa vive meses como um prisioneiro de luxo. Não sai do Vaticano, poucas informações lá chegam, o Vaticano está cheio de espias. Não são só os judeus nem os perseguidos [que lá entram], são também os espias. Isto ajuda a compreender. O Vaticano era um escolho num oceano nazi."

Qual o papel da diplomacia?

Todos concordam que a acção diplomática de Pio XII nos bastidores, mesmo antes da guerra, foi intensa. Pierre Blet, historiador e padre jesuíta, o único sobrevivente da euqipa que editou, na década de 60, grande parte da documentação já conhecida, enumera em "Pio XII e a Segunda Guerra Mundial" inúmeras iniciativas diplomáticas de Pio XII. John Cornwell, em "O Papa de Hitler", lembra a assinatura de uma Concordata entre a Alemanha nazi e o Vaticano, bem como o suporte dado pelo Papa ao fascismo da Croácia, país de maioria católica, com o objectivo de se opor ao avanço soviético. Pio XII, embora fizesse profissão de fé na democracia, também olhava com curiosidade as experiências dos fascismos ibéricos de Salazar e Franco, diz Andrea Riccardi.

«Público», Domingo, 23 de Fevereiro de 2003
[jornal.publico.pt]

[fim da série de 8 artigos]

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