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Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 28 de May de 2007 17:40

O tema da infalibilidade papal e das definições ex cathedra tem sido tocado muitas vezes neste fórum, em vários tópicos, pelo que me parece importante abrir um tópico específico. O tema é complexo e precisa de algum estudo para ser tratado devidamente. Dada a «urgência» do tema e a falta de tempo para um texto sistemático sobre estes temas, recorro a um texto de Dom Estêvão Tavares Bettencourt. O texto é extenso (umas 10 páginas A4), mas é do melhor que já vi e merecedor de ser citado aqui na íntegra. A partir dele poderemos ver muitas questões. Recomendo a leitura integral e atenta.

.Os destaques em negrito e sublinhado são meus. Editei algumas pequenas gralhas e coloquei algumas siglas por extenso, para melhor compreensão.

.Alef

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.
Citação:
Dom Estêvão Tavares Bettencourt
. .
INFALIBILIDADE PAPAL E DEFINIÇÕES EX-CATHEDRA




. .O presente artigo aborda questões atinentes ao Magistério da Igreja, credenciado por Jesus Cristo para ensinar de maneira autêntica as verdades reveladas pelo Senhor (cf. Mt 16,16-19; 28, 18-20; Lc 21, 31s; Jo 21,15-17...). Tal Magistério tem suas modalidades: 1) Magistério ordinário (o ensinamento comum dos Bispos do mundo inteiro); 2) Magistério extraordinário (definições solenes de Concílios universais e do Romano Pontífice em matéria de fé e de Moral). O artigo apresenta a série de definições proferidas pelos Papas no decorrer dos séculos.

.
***


.Há interesse, por parte dos fiéis, em saber quantas verdades de fé já foram definidas pelos Papas no exercício do carisma da infalibilidade. Este desejo é legítimo, mas há de merecer uma resposta abrangente, pois se deve dissipar a concepção de que as verdades da fé começam a ser tais mediante definições ou decretos. Daí a conveniência de propormos, nas páginas subseqüentes:

.- a noção de Magistério da Igreja;

.- o significado de uma definição pontifícia;

.- as definições papais registradas através dos séculos.

.
1. O MAGISTÉRIO DA IGREJA


.Jesus Cristo confiou à sua Igreja a função de ensinar as verdades da fé; e, para que o fizesse autenticamente, prometeu-lhe a sua assistência infalível, assim como a do Espírito Santo:[1]

.Mt 28,19s: "Ide, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando-as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos".

.Mt 10,26s: "Não tenhais medo... Pois nada há de encoberto que não venha a ser descoberto, nem de oculto que não venha a ser revelado. O que vos digo às escuras, dizei-o à luz do dia; o que vos é dito aos ouvidos, proclamai-o sobre os telhados",

.Jo 20,21s: Jesus disse aos Apóstolos: "A paz esteja convosco! Como o Pai me enviou; também eu vos envio".

.Mc 16,15-20: "Disse-lhes: ‘Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura.’ E eles saíram a pregar por toda parte, agindo com eles o Senhor, e confirmando a Palavra por meio dos sinais que a acompanhavam",

.A Igreja vem cumprindo a tarefa mediante seus órgãos credenciados, que são:

.1) o Magistério ordinário, ou seja, o ensinamento dos Bispos do mundo inteiro concordes entre si sobre artigos de fé e de Moral. Este Magistério ordinário manifesta-se cotidianamente através de palavras orais, impressos, gestos e feitos, como também através da Liturgia, pois lex orandi, lex credendi (as normas da oração são as normas da fé). Grande número de verdades de fé está no ensinamento do Magistério ordinário da Igreja. Quando necessário ou em casos esporádicos, é exercido também:

.2) o Magistério extraordinário, que tem duas expressões autênticas:

.- as definições de Concílios Ecumênico[2] ;

.- as definições do Sumo Pontífice quando fala ex-cathedra.

.O Magistério extraordinário supõe sempre condições especiais (dúvidas, controvérsias, contestação...), que solicitem um pronunciamento solene seja de um Concílio plenário, seja do Pontífice Romano. Não é necessária uma definição solene para que haja um dogma de fé.

.A definição da infalibilidade pontifícia em matéria de fé de Moral ocorreu em 1870, no Concílio do Vaticano I; todavia não foi nessa data que surgiu a convicção de que o Bispo de Roma goza de assistência especial para definir proposições de fé e de costumes. Essa persuasão tem suas bases na própria S. Escritura e se expressou através da história da Igreja. Tal doutrina, muito antiga na Igreja, foi reafirmada pelo Concílio do Vaticano II na Constituição Lumen Gentium no. 22-25.

.Os principais textos bíblicos atinentes ao primado de jurisdição e de magistério de Pedro e seus sucessores são os seguintes:

.Mt 16,17-19: "Jesus respondeu a Simão Pedro: ‘Bem-aventurado és tu, Simão, filho de João, porque não foram carne e sangue que te revelaram isso, e sim o meu Pai, que está nos céus. Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre essa pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do Inferno nunca prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos Céus, e o que ligares na terra será ligado nos céus, e o que desligares na terra será desligado nos céus".

.Lc 22,31s: "Simão, Simão, eis que Satanás pediu insistentemente para vos peneirar como trigo; eu, porém, orei por ti, a fim de que tua fé não desfaleça. Quando te converteres, confirma teus irmãos".

.Jo 21,15-17: "Jesus disse a Simão Pedro: ‘Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?’ Ele lhe respondeu: ‘Sim, Senhor, tu sabes que te amo’. Jesus lhe disse: ‘Apascenta os meus cordeiros’. Uma segunda vez, Jesus lhe disse: ‘Simão, filho de João, tu me amas?’ - ‘Sim, Senhor’, disse ele, ‘tu sabes que te amo’. Disse-lhe Jesus: ‘Apascenta as minhas ovelhas’. Pela terceira vez, disse-lhe: ‘Simão, filho de João, tu me amas?’ Entristeceu-se Pedro, porque pela terceira vez lhe perguntava Tu me amas?’ E lhe disse: ‘Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que te amo’. Jesus lhe disse: ‘Apascenta as minhas ovelhas’".

.Sobre o primado de Pedro nos escritos do Novo Testamento e na história da Igreja nascente, ver Pergunte e Responderemos 375/1993, pp. 338-344; PR 13/1959, pp. 9-20.

.Detenhamo-nos agora de modo particular sobre as definições pontifícias.

.
2. O SIGNIFICADO DE UMA DEFINIÇÃO PONTIFÍCIA


.1. Tenha-se consciência, antes do mais, de que uma definição papal nunca é imposição brusca ou repentina de alguma sentença. As definições representam geralmente o termo final de um processo lento, durante o qual uma verdade contida no depósito tradicional da Revelação vai aflorando plenamente à consciência da hierarquia sacerdotal e dos fiéis em geral. Em outros termos: as definições não são senão a formulação explícita e solene de uma maneira de ver já implicitamente existente na Cristandade desde os tempos de Cristo. E o motivo pelo qual se dá essa formulação solene é geralmente o surto de alguma heresia que tente negar ou obliterar a sentença em foco. As definições pontifícias, por conseguinte, têm sempre caráter extraordinário, excepcional. Quanto ao magistério ordinário da Igreja, ele se exerce pela pregação unânime do episcopado unido ao sucessor de S. Pedro, o Papa. Donde se vê que não é necessário, seja uma verdade solenemente definida pelo Sumo Pontífice, para que pertença ao depósito da fé; basta, para isto, tenha sido sempre e em toda a parte professada pelos cristãos: quod ubique, quod semper, quod ab omnibus creditum est, hoc est etenim vere proprieque catholicum. - O que todos em toda parte e sempre acreditaram, isso é verdadeira e propriamente católico, dizia Vicente de Lerins em meados do séc. V.

.Das noções acima também se depreende que não se "criam" dogmas na Igreja. Assim como num organismo vivo não nasce nem se cria algum órgão da noite para o dia, mas, ao contrário, qualquer fenômeno somático é expressão da estrutura e da vitalidade permanentes do indivíduo, assim também na Igreja não se praticam inovações de estrutura; ao contrário, qualquer afirmação autêntica dos cristãos não é senão o desdobramento do depósito da Palavra e da Vida que Cristo colocou em seu Corpo Místico e que Ele conserva sob a assistência do Espírito Santo. Nunca se poderá inculcar demais que a Igreja não é simplesmente uma escola, muito menos uma Câmara Legislativa, mas um organismo vivo, o Corpo de Cristo prolongado na terra, Corpo onde tudo se processa segundo as leis da vida, ou seja, passo por passo, homogeneamente, mediante a colaboração de membros superiores e membros inferiores.

.2. Voltando a focalizar diretamente as definições papais, observaremos que três condições devem ser necessariamente preenchidas para que alguma proposição do Romano Pontífice tenha a autoridade de sentença infalível:

.1) Requer-se que o Papa fale "ex-cathedra", isto é, como Pastor e Mestre dos cristãos, não como doutor particular.

.Não há, porém, trâmite prescrito para o pronunciamento do Pontífice. Não se exige, portanto, que o Santo Padre, antes de se definir, consulte algum concílio, pois este requisito suporia que o concílio possa exercer influência restritiva sobre a autoridade papal ou esteja acima do Papa no governo da Santa Igreja[3].

.2) O objeto da definição infalível são apenas proposições de fé e de moral, isto é, normas relativas ou à crença ou à conduta dos cristãos neste mundo.

.3) É necessário outrossim que o Sumo Pontífice intencione proferir sentença definitiva sobre o assunto focalizado.

.Somente tal sentença definitiva goza do privilégio da infalibilidade. Este não se estende nem aos argumentos previamente apresentados para fundamentar a definição nem às conclusões que desta decorram.

.Quanto aos sinais pelos quais se pode reconhecer uma definição infalível, deve-se dizer que não há fórmula de redação obrigatória. Basta que o Pontífice manifeste explicitamente sua intenção de declarar alguma doutrina como pertencente ao depósito da fé ou como contrária a este. Os termos habitualmente usados são: "definimus, auctoritate apostolica definimus..." ou "definitive damnamus et reprobamus, auctoritate Dei et beatorum apostolorum Petri et Pauli damnamus et reprobamus...".

.Há casos, porém, em que o documento pontifício é redigido de tal modo que a simples análise dos termos não permite aos teólogos dizer se estão diante de alguma definição "ex cathedra" ou não. Em tais circunstâncias, será lícito julgar que não se trata de sentença obrigatoriamente imposta à fé dos cristãos, pois ensina a Moral: "Non est imponenda obligatio de qua certo non constat. - Não se deve impor obrigação de que não conste com certeza". Todavia, mesmo em tais casos, pode haver para os cristãos grave dever de crer na proposição focalizada, dever decorrente de outra fonte, isto é, do ensinamento comum dos Sumos Pontífices ou do episcopado.

.É o que se dá, por exemplo, quando se examina a encíclica Arcanum do Papa Leão XIII (10 de fevereiro de 1880). Este documento professa a instituição divina do casamento, a indissolubilidade do mesmo, assim como a autoridade integral e exclusiva da Igreja sobre o matrimônio cristão. A redação das frases, porém, não permite dizer que tais doutrinas estejam aí solenemente definidas; não obstante, a todos os cristãos incumbe estrito dever de as aceitar, porque são verdades ensinadas pelo magistério universal e tradicional da Igreja. - O mesmo se diga da encíclica Providentissimus Deus (18 de novembro de 1893), em que o mesmo Pontífice afirma a noção católica de inspiração bíblica, assim como a veracidade de texto sagrado. S. Santidade, embora não tenha aí usado as expressões características de uma definição solene, incutiu verdades que, em vista do ensinamento comum da Igreja, são obrigatórias para todos os fiéis.

.Destas observações se depreende quão pouco a Igreja ou os Papas fazem questão de definir dogmas! Qualquer definição é sempre algo de extraordinário no seio da Igreja.

.Feitas estas ponderações, examinemos o catálogo dos documentos pontifícios que são geralmente tidos como portadores de definição infalível.

.
3. A LISTA DAS DEFINIÇÕES PONTIFÍCIAS


.De acordo com a ordem cronológica, eis a série dos documentos:

.1) Em 449, a carta do Papa S. Leão Magno a Flaviano, bispo de Constantinopla, expunha com autoridade a sã doutrina referente ao mistério da Encarnação: em Cristo há uma só Pessoa (a Divina) e duas naturezas (a Divina e humana); cf. Denzinger-Schönmetzer, Enchiridion symbolorum definitionum et declarationum de rebus fidei et morum[3] nº 296-299. Esta carta foi enviada pelo Papa à assembléia geral do Concilio ecumênico de Calcedônia em 451 no intuito de dirimir, uma vez por todas, as dúvidas teológicas concernentes ao assunto. Os Padres conciliares consideraram o documento como definitivo e estritamente obrigatório para todos os fiéis. A tradição católica, em particular a profissão de fé do Papa S. Hormisdas (datada de 517; cf. DS 363-365), sempre reconheceram autoridade máxima a tal documento.

.A controvérsia assim rematada por S. Leão Magno é a seguinte:

.Desde os inícios da era cristã, perguntava-se como podia Cristo ser simultaneamente Deus e homem. A primeira tentativa de solução foi a dos Docetas no séc. II, os quais ensinavam que o Salvador não fora verdadeiro homem, pois não tivera senão uma aparência de corpo humano (dokéo, parecer, em grego). - Tal solução não tendo conseguido implantar-se, no séc. V propôs-se outra fórmula: Nestório, Patriarca de Constantinopla, asseverava que Cristo era tão realmente Deus e homem que nele havia duas Pessoas (a Divina e a humana) e duas naturezas (a Divina e a humana). Sabemos que em linguagem técnica "natureza" vem a ser a essência ou a estrutura de um ser, ao passo que "pessoa" é o sujeito consciente ou o "Eu" que age por meio de determinada natureza.

.A sentença de Nestório, admitindo duas pessoas ou dois" Eu" em Cristo, cindia a unidade do Salvador; foi, por isto, rejeitada no Concílio de Éfeso (431). - Tomou vulto então, à guisa de reação contra o erro condenado, a teoria oposta, propugnada por Eutiques, de Constantinopla, e Dióscoro de Alexandria: em Cristo haveria uma só natureza (a natureza divina, a qual teria absorvido a natureza humana). Tal era a doutrina do Monofisismo... Pois bem; S. Leão Magno rejeitou esta tese como contraditória ao genuíno conceito de Encarnação, asseverando em 449 haver em Cristo uma só Pessoa (ou um só "Eu"), a Pessoa Divina, a qual se manifestava por duas autênticas naturezas (a Divina e a humana) não mutiladas nem confundidas. Assim punha-se fim a uma etapa importante da Cristologia.

.2) Em 680 a carta do Papa S. Agatão "aos Imperadores" afirmava, também em termos definitivos, haver em Cristo duas vontades distintas, a Divina e a humana, sendo, porém, que a vontade humana ficava em tudo moralmente submissa à vontade divina; cf. DS 547s.

.Como se vê, o Pontífice reprimia, em última análise, uma modalidade nova de Monofisismo: o Monotelitismo, que afirmava em Cristo haver unicamente a vontade divina. O documento foi enviado autoritativamente pelo Papa à assembléia do Concílio de Constantinopla III (680/81), a qual aceitou com aplausos a sentença de Roma, proclamando que Pedro acabara de falar por Agatão. - De então por diante na história, não haveria mais sérias dúvidas sobre a união do Divino e do humano em Cristo.

.3) Em 1302, a bula Unam Sanctam do Papa Bonifácio VIII é tida como portadora de definição dogmática em sua parte final, onde o Pontífice "declara, afirma, define e pronuncia (declaramus, dicimus, definimus et pronuntiamus)" que toda criatura humana está sujeita ao Romano Pontífice; cf. DS 875.

.Esta sentença há de ser entendida no seu respectivo quadro histórico.

.Desde os tempos de S. Agostinho (+430), os cristãos conceberam o ideal de uma "Cidade de Deus", ou seja, de uma organização civil que fosse toda penetrada pelos princípios do Cristianismo, ficando os interesses e afazeres temporais totalmente subordinados aos espirituais. Dentro desta perspectiva, criou-se em 800, pela coroação de Carlos Magno, o Sacro Império Romano dos Francos, ao qual no séc. X sucedeu o Sacro Império dos Germanos. Sob o Papa Inocêncio III (1198-1216) o ideal tomou vulto assaz concreto. Pouco depois, porém, fizeram-se ouvir no cenário europeu vozes nacionalistas, que tendiam a criar um Estado leigo, independente da religião; um dos primeiros arautos dessa corrente foi o rei Filipe IV o Belo da França (1285-1314). Pois bem: foi contra essa tendência a laicização do Estado que se pronunciou o Papa Bonifácio VIII, afirmando que o poder temporal está subordinado ao espiritual e que, por conseguinte, todas as criaturas humanas, mesmo os monarcas, estão sujeitos ao Vigário de Jesus Cristo na terra.

.Tem-se discutido a respeito da mente do Pontífice na Bula Unam Sanctam. Em qualquer caso, interpretar-se-á a sentença final (cujos dizeres são assaz gerais) no sentido da chamada "potestas indirecta”, não no da "potestas directa"; o que quer dizer: o Romano Pontífice tem jurisdição sobre toda e qualquer criatura humana "ratione peccati", isto é, na medida em que as atividades de determinada pessoa dizem respeito à vida eterna; foi, com efeito, a Pedro e aos sucessores de Pedro que Cristo confiou as chaves do Reino dos céus. Não pertence à missão dos Papas interferir na técnica administrativa dos governos civis.

.4) Em 1336, a Constituição Benedictus Deus de Bento XII definia que, logo após a morte corporal, as almas totalmente puras são admitidas à contemplação da essência de Deus face a face; cf. DS 1000.

.Esta declaração se deve ao fato de que alguns cristãos tanto estimavam o dogma do Corpo Místico que dificilmente concebiam pudessem algumas almas atingir a sua felicidade consumada, enquanto outras ainda lutavam na terra; em conseqüência, afirmavam que a visão beatífica só seria outorgada no fim dos tempos, isto é, após a ressurreição da carne e o juízo universal. - Contra este parecer, a fé cristã formulada por Bento XII de acordo com vários textos da S. Escritura (d. Lc 23,43; Jo 17,24; Hb 8,175; 10,19s; 1Cor 13,8s; 2Cor 5,6s; FI1, 23), afirma que, logo após a morte corporal, se dá o juízo particular, entrando, a seguir, as almas na posse da sua sorte definitiva.

.5) Em 1520, a Bula Exsurge Domine de Leão X condenava 41 proposições de Lutero como heréticas; cf. DS 1451-1492.

.6) Em 1653 a Constituição Apostólica Cum occasione de Inocêncio X reprovava as cinco seguintes proposições extraídas da obra "Augustinus" de Cornélio Jansênio, tachando-as de heréticas:

.1 - Há preceitos de Deus que, vistas as exíguas energias do homem, não podem ser cumpridas por justos que os desejem observar e se esforcem por conseguí-lo. A esses justos falta também a graça, que tornaria possíveis tais preceitos.

.2 - No estado da natureza decaída, o homem nunca pode resistir à graça interior.

.3 - Para merecer e desmerecer no estado da natureza decaída, não se requer liberdade que exclua necessidade (interior); basta a liberdade que exclua coação (exterior).

.4 - Os Pelagianos admitiam a necessidade da graça interior preventiva para cada ato particular, mesmo para o início da fé; eram hereges por asseverarem que essa graça era tal que a vontade podia ou resistir-lhe ou obedecer-lhe.

.5 - É semipelagiano dizer que Cristo morreu ou derramou o seu sangue por todos os homens sem exceção" (DS 2001-2207).

."Pelagianos" e "Semipelagianos" foram hereges dos séc. V/VI que acentuaram exageradamente as possibilidades da natureza humana no tocante à salvação eterna.

.O Jansenismo, ressentindo-se dos debates excitados por Lutero sobre as conseqüências do pecado original, nutria um conceito pessimista da natureza humana, julgando-a escravizada à concupiscência e ao pecado; em conseqüência, admitiam que o homem só pode praticar o bem em virtude de irresistível influxo da graça divina. O pessimismo jansenista ainda era acentuado pela tese de que Cristo não remiu todos os homens, mas apenas os predestinados. - Como se vê, tais proposições são totalmente alheias à genuína mensagem do Evangelho, que visa não a abater, mas a soerguer o homem pecador, fazendo que os cristãos considerem mais a Misericórdia do Salvador do que a própria miséria. É o que explica a condenação proferida por Inocêncio X.

.7) Em 1687, a Constituição Apostólica Caelestis Pastor de Inocêncio XI condenou como heréticas 68 proposições quietistas de Miguel de Molinos (+1696); cf. OS 2201-2269.

.O Quietismo era uma tendência mística que fazia coincidir a perfeição espiritual com tranqüilidade e passividade da alma tais que o cristão não desejaria mais a sua bem-aventurança eterna, nem a aquisição da virtude; qualquer tendência nele estaria extinta. A alma colocada nesse estado de aniquilamento não pecaria mais, mesmo que por sua conduta externa parecesse violar os mandamentos de Deus ou da Igreja; ser-lhe-iam desnecessárias orações vocais, práticas de penitência e resistência às tentações.

.Evidentemente, tais idéias contradizem à genuína mente cristã, que S. Agostinho tão bem exprime na fórmula: "Deus, que te criou sem ti, não te salva sem ti". O ideal do cristão não é propriamente a apatia estóica, ou seja, a ausência de todo e qualquer afeto sensível, mas, sim, a metriopatia; ou seja, o domínio sobre os afetos tal que possa servir à vida em graça.

.8) Em 1699, a Constituição Cum alias de Inocêncio XII condenava 23 proposições de François de Salignac Fénelon, extraídas da obra [/i]Explications des maximes des Saints sur la vie intérieure[/i]; cf. DS 2351-2374. As sentenças pretendiam renovar o Quietismo, apresentando-o qual modalidade de puríssimo amor a Deus.

.9) Em 1713, a Constituição Unigenitus de Clemente XI condenou 101 afirmações do livro Réflexions morales de Pascásio Quesnel (+1719); cf. DS 2390-2502. Era de novo o Jansenismo, com suas concepções pessimistas, que o Sumo Pontífice assim denunciava.

.Embora as escolas jansenistas tenham perdido em breve a sua voga, a mentalidade jansenista até os últimos decênios ficou, até certo grau, impregnada no espírito de muitos cristãos, alimentando uma piedade intimidada, alheia aos sacramentos e, por isto, anêmica. Justamente em plena crise jansenista se deram as aparições do Sagrado Coração de Jesus (1673-1675), que, sob forma simbólica, queriam lembrar ao mundo que Deus é o Amor, e o Amor que se fez companheiro dos homens.

.10) Em 1794, a Constituição Auctorem Fidei de Pio VI visava a 85 teses heréticas promulgadas em 1786 pelo Sínodo de Pistoia (Toscana); cf. DS 2600-2700.

.As idéias dos conciliares de Pistoia não eram senão a expressão extremada do nacionalismo e do despotismo de Estado que haviam começado a tomar vulto nos tempos de Filipe IV o Belo da França (ver o documento n.º 3 da presente lista). No fim do séc. XVIII esse nacionalismo se havia apoderado das cortes européias em geral, levando os soberanos católicos a pretender criar Igrejas regionais, mais ou menos independentes do Sumo Pontífice; tal tendência tomou vulto na França de Luís XIV, em Portugal do marquês de Pombal, na Espanha de Aranda e Florida Branca, na Áustria de José II e, de maneira especial, no Grão-Ducado da Toscana, cujo titular, o Grão-Duque Leopoldo, era irmão de José II. Leopoldo obteve o apoio do episcopado da Toscana, chefiado por Cipião Ricci, bispo de Pistoia, para 57 artigos que visavam a profundas reformas da estrutura e da disciplina da Igreja, em grande parte inspiradas por idéias de Jansênio e de Quesnel: entre outras medidas, preconizavam a subordinação da Igreja ao Estado e a quase absoluta independência dos bispos em relação ao Sumo Pontífice; a abolição da devoção ao S. Coração de Jesus, das procissões, das imagens, da praxe das indulgências, dos honorários de S. Missa e de serviços religiosos em geral; apregoavam a redução das Ordens e Congregações Religiosas a um só tipo norteado pelo exemplo de Port-Royal (mosteiro jansenista próximo a Paris); queriam outrossim a celebração da Liturgia em vernáculo, o que em si nada tem de reprovável, mas era contingentemente associado a reivindicações heréticas (isto foi suficiente para que o postulado da Liturgia em vernáculo se tornasse, mais uma vez, suspeito aos olhos de Roma, como se tornara suspeito quando os reformadores o formularam no séc. XVI). - Antes mesmo que Pio VI condenasse as proposições de Pistoia, já o povo toscano havia mostrado sua veemente indignação contra elas, de tal modo eram alheias à genuína tradição cristã; o próprio bispo Ricci submeteu-se ao alvitre de Pio VI.

.11) Em 1854, a bula Ineffabilis Deus de Pio IX definiu o dogma da Imaculada Conceição de Maria: dizia o Pontífice, apelando para testemunhos da Escritura e da Tradição, que a Virgem Santíssima, desde o primeiro instante de sua conceição, foi preservada do pecado original, ou seja, da nódoa com que nascem todos os filhos de Adão; isto se deu por aplicação antecipada dos méritos do Redentor a fim de que a criatura que devia ser mansão do Verbo Encarnado, jamais ficasse sujeita ao hediondo império de Satanás e do pecado (Maria, portanto, não deixa de ser tributária ao Redentor; ela foi remida). Cf. DS 2803s.

.Antes da definição do dogma da Imaculada Conceição, perguntavam alguns teólogos que motivo havia para que o Sumo Pontífice se pronunciasse em tom solene e extraordinário sobre uma proposição que era pacificamente professada pelos fiéis católicos. A tal questão foi dada a seguinte resposta: a afirmação de alguma verdade concernente a Maria equivale sempre à afirmação sucinta de toda a dogmática cristã; com efeito, em Maria a fraqueza do homem e a graça de Deus, a Encarnação, a Redenção, o mistério da Igreja e a glória final se acham compreendidos de maneira estupenda. Em conseqüência, uma definição mariológica em meados do século passado teria o valor de uma profissão compêndios de fé cristã frente ao racionalismo e ao materialismo que pesavam sobre a cultura da época. Tal foi o sentido profundo do pronunciamento de Pio IX.

.12) Em 1950, o Papa Pio XII em sua Constituição Munificentissimus Deus definiu o dogma da Assunção Corporal de Maria: a Mãe de Deus, ao deixar este mundo, foi, sim, glorificada em corpo e alma, sem conhecer a deterioração do sepulcro. Esta proposição está intimamente ligada com o dogma da Imaculada Conceição: na verdade, se Maria nunca esteve sujeita ao pecado, compreende-se que não tenha ficado sob o império da morte, a qual não é senão uma conseqüência do pecado (Pio XII, porém, não quis definir a questão até hoje aberta: terá Maria ao menos atravessado a morte antes de ser glorificada ou haverá sido preservada mesmo de morrer, de modo a passar sem hiato, desta vida para a glória celeste?). Cf. DS 3900-3904.

.A crença na Assunção corporal de Maria não sofria contestação antes de ser definida; a definição, porém, foi justificada por motivos análogos aos que acima indicamos: o presente século continua sujeito às influências do racionalismo e do materialismo; principalmente nos últimos decênios a matéria ou o corpo do homem têm sido lamentavelmente vilipendiados pelo libertinismo dos costumes e pelos morticínios coletivos (bombardeios) das grandes guerras. Nesta época, portanto, a afirmação da Assunção corporal de Maria lembrava ao mundo o destino transcendente do corpo humano e o valor que o Criador a este quis atribuir.

.Os teólogos têm perguntado se algum dos documentos dos Pontífices recentes contrários ao racionalismo e ao modernismo (a encíclica Quanta cura e o Syllabus de Pio IX, a encíclica Pascendi e o decreto Lamentabili de S. Pio X) não gozam da autoridade de declarações infalíveis. Examinando, porém, o teor preciso desses textos, assim como as circunstâncias em que se originaram, a maioria dos comentadores é inclinada a crer que os dois mencionados Papas, ao promulgar esses documentos, não intencionaram fazer uso de sua prerrogativa de infabilidade doutrinária, embora não reste dúvida de que tenham interpretado a mente de Cristo e da Igreja nos termos mais autênticos possíveis, merecendo por isto plena aquiescência por parte dos fiéis.

.Nos últimos decênios, tem-se considerado com grande interesse a Encíclica Humane Vitae (1968) de Paulo VI, que rejeita a contracepção artificial e apregoa os meios naturais de controle da natalidade. Como não usa a fórmula clássica "Declaramos e definimos", há quem julgue que não é documento infalível e, portanto, não merece obediência. A esta posição fazemos duas observações:

.1) mesmo que não recorra aos termos de uma definição solene, a Encíclica Humanae Vitae é um documento do magistério ordinário da Igreja, ao qual os fiéis católicos devem o respeito recomendado pelo Concílio do Vaticano II na Constituição Lumen Gentium n.º 25:

."Religiosa submissão da vontade e da inteligência deve, de modo particular, ser prestada ao autêntico Magistério do Romano Pontífice, mesmo quando não fala ex- cathedra. E isto de tal modo que seu magistério supremo seja reverentemente reconhecido, suas sentenças sinceramente acolhidas, sempre de acordo com sua mente e vontade. Esta mente e vontade constam principalmente ou da índole dos documentos ou da freqüente proposição de uma mesma doutrina, ou de sua maneira de falar".

.2) Paulo VI, ao formular a doutrina da Encíclica Humanae Vitae, sabia não estar senão transmitindo preceitos da lei natural, segundo a qual o amor humano é, por si, unitivo e fecundo e, por isto, não deve ser artificialmente privado da sua fecundidade. Em conseqüência, a Humanae Vitae goza da autoridade da própria lei natural, que é a lei de Deus.

.Algo de semelhante se diga a respeito da Encíclica Veritatis Splendor: é documento pontifício, que merece acato como tal e - mais ainda - reafirma a lei natural frente a tendências subjetivistas de conceber a Moralidade.

.
4. CONCLUSÃO


.Eis os casos em que, conforme ensinam os teólogos, os Papas, no decorrer da história, fizeram uso de seu magistério infalível para formular alguma sentença dogmática. Doze vezes em vinte séculos!... Tão exígua cifra talvez surpreenda não poucos leitores, pois, quando se fala da infalibilidade pontifícia, facilmente se tem a impressão de que os católicos vivem num regime de imposições procedentes do capricho de um mestre humano. Tal impressão, como se vê, está longe de corresponder à realidade.

.Não queremos dizer, é claro, que os dogmas cristãos se reduzem às proposições atrás enunciadas. Também não negamos que há definições emanadas de Concílios Ecumênicos. O que nos interessava, porém, na redação deste artigo, era apenas mostrar o sentido exato de uma definição papal: esta (o mesmo se pode dizer também de uma definição conciliar) é sempre algo de extraordinário e esporádico, suscitado pelas necessidades do povo de Deus posto em perigo de perder a sua fé; uma definição solene é sempre a resposta a um problema, a uma dúvida. Nas circunstâncias normais de sua história, o povo de Deus professa a fé que ele recebeu de Cristo e dos Apóstolos e que vai sendo pacificamente transmitida de geração a geração , sob a tutela do "episcopado, que o Espírito Santo estabeleceu para apascentar a Igreja de Deus" (cf. At 20,28).

.***

.NOTAS:
[1] Há preceitos de Deus que, vistas as exíguas energias do homem; não podem ser cumpridos por justos que os desejem observar e se esforcem por consegui-lo. A esses justos falta também a graça, que tornaria possíveis tais preceitos.
[2] No estado da natureza decaída, o homem nunca pode resistir à graça interior.
[3] Será citado pela sigla DS.

.Dom Estêvão Tavares Bettencourt, Pergunte e Responderemos, 381/1994.

.[O texto encontra-se reproduzido em vários sítios na Internet: aqui, ali e acolá.]

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Editado 1 vezes. Última edição em 28/05/2007 17:43 por Alef.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: catolicapraticante (IP registado)
Data: 28 de May de 2007 18:14

Afinal a chas que a HV é infalível?

católica praticante

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: firefox (IP registado)
Data: 28 de May de 2007 20:45

Interessante o texto trazido pelo Alef. Alguns acharam que as exigências que citei eram muito restritivas e que com isso eu iria contemplar apenas uns poucos casos de infalibilidade... e agora observo que o Dom Estevão considera apenas doze exemplos!!! Pelo visto eu ainda estava sendo maximalista. rs!



Editado 1 vezes. Última edição em 28/05/2007 20:46 por firefox.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Tilleul (IP registado)
Data: 28 de May de 2007 20:52

Citação:
firefox
Não há nenhum desacordo: um fala de números absolutos e outro fala de proporção.
Respondendo ao Tilleul: não há nenhuma lista de pronunciamentos Ex-Cathedra! E sobre os outros temas citados, acho que já conseguiu perceber que o dogma da infalibilidade não descarta a necessidade do discernimento! Observe como o fato de vc não ter conseguido responder com clareza acerca dos cinco pré-requisitos foi necessariamente implicar na falta de clareza sobre a infalibilidade ou não das questões levantadas. Ora, o desejo de um papa não é suficiente para encerrar uma questão dogmática na igreja católica!

Ainda sem ler a longa introdução do Alef, pergunto, onde acaba o desejo de um papa e começa um dogma? Nos dois dogmas Marianos que já por vezes citei onde está essa fronteira.

Do fundo do coração e sem qualquer pretensão de criar discussão peço a um dos dois mais "teológicos" que me dê uma ajuda.

Em comunhão

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: s7v7n (IP registado)
Data: 28 de May de 2007 21:12

Eu penso que a a vontade do povo, aliada aos ensinamentos dos santos, fizeram com que a verdade fosse descoberta e proclamada. Porque não tentas responder ao post que te deixei? Também era capaz de dar uma boa discussão.

"Ama e faz o que quiseres" - Santo Agostinho

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 01:33

Cara catolicapraticante:

Um ponto bastante claro é que Humanae Vitae não é uma definição papal «ex cathedra».

Menos claro e mais discutido é o grau de infalibilidade desta encíclica. Vi várias posições.

Alguns autores conside(ra)ram esta encíclica como «irreformável», pela sua relação directa à famosa lei moral natural.

Outros tomaram uma posição bem diferente. Karl Rahner, por exemplo, considerou que esta encíclia entra no conjunto de declarações magisteriais da Igreja, «decisões magisteriais autênticas, mas não definitórias, e consequentemente pelo menos fundamentalmente reformáveis».

Nota este teólogo que:

Citação:
«em nenhuma parte da encíclica [...] se encontra uma formulação que possa dar a impressão de que se trata de uma definição "ex cathedra". [...] uma declaração magisterial constitui uma definição "ex cathedra" apenas quando ela mesma sublinha explicitamente esse carácter [...]».

Daqui conclui:

Citação:
«Uma carta pastoral do Papa que constitui verdadeira e propriamente uma definição é fundamentalmente um ensino reformável.(*)

Isto não significa, contudo, que Rahner negue a importância do documento. Bem longe disso.


Em todo o caso, a publicação da «Ordinatio sacerdotalis», de «Ad tuendam fidem» e de outros documentos, as distinções de Rahner parecem tornar-se insuficientes. Entre as verdades dogmáticas e aquelas que são reformáveis, aparece uma nova categoria, que se tem prestado a alguns problemas interpretativos. O meu próximo «post» faz referência a isso.

Alef
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Nota:
(*) As citações de Karl Rahner provêm de uma tradução do artigo «Zur Enzyklica "Humanae vitae"», publicado na revista Stimmen der Zeit.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 01:38

Este tema da infalibilidade papal e das definições ex cathedra liga-se, naturalmente, a um tema vasto e bastante complexo, que é o Magistério da Igreja. Um dos assuntos que teremos que tratar aqui alguma vez (creio ter-me referido já antes a ele) é o problema dos níveis de verdades ou categorias de ensino do Magistério e atitude devida do católico a cada um desses níveis de verdade ou de ensino. Tenho que tentar encontrar algo na Internet que valha a pena neste difícil tema.

De uma forma resumidíssima, tradicionalmente têm-se distinguido as verdades tidas como reveladas (expressas de forma dogmática por um papa, por um Concílio ou pelo magistério universal ordinário) e as doutrinas autoritativas do magistério, ainda que sem a nota da infalibilidade. Às primeiras exige-se assentimento absoluto, enquanto às segundas é devida uma «adesão religiosa da inteligência e da vontade». Contudo, com a publicação da «Ordinatio Sacerdotalis», sobre a (im)possibilidade de ordenação das mulheres, as coisas tornaram-me mais complicadas. Tecnicamente não é uma definição dogmática, mas a formulação anda lá perto, na medida em que se apresenta como «doutrina definitiva». Assim, os teólogos viram-se na necessidade de estabelecer um nível intermédio na «hierarquia» dos tipos de ensino do Magistério. E com isto apareceram não poucos problemas.

Vários estudiosos se têm debruçado sobre estes assuntos, entre os quais Francis Sullivan é um dos mais significativos. Richard R. Gaillardetz publicou na Theological Studies o interessante artigo «The ordinary universal magisterium: unresolved questions» [Theological Studies, 63 (2002) 447-471], de que encontrei uma versão condensada, em espanhol, da revista Selecciones de teología. Dada a relevância do assunto e o formato (*.pdf), reproduzo aqui tal texto condensado, que, mesmo assim, é bastante longo. Pode ser uma boa ajuda para quem se interesse por estes temas. Todos os itálicos constam no original.

Alef

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Citação:
Richard R. Gaillardetz
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EL MAGISTERIO ORDINARIO UNIVERSAL: PROBLEMAS NO RESUELTOS



. .La convicción de que el magisterio ordinario de los obispos era una guía segura para la fe cristiana se remonta a los primeros siglos. Desde las décadas del Vaticano II, el recurso al “magisterio ordinario universal” ha crecido dramáticamente. El autor estudia esta expansión bajo el pontificado de Juan Pablo II, y explora los difíciles problemas teológicos que suscita.
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. .Título original: «The ordinary universal magisterium: unresolved questions», Theological Studies, 63 (2002) 447-471.
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Una de las contribuciones más significativas del Concilio Vaticano II fue la reflexión teológica sobre el papel del obispo. Lumen gentium dice que la principal responsabilidad de los obispos es la predicación y la enseñanza. Los obispos son “testigos de la verdad divina y católica” y los fieles tienen obligación de “adherirse a su enseñanza con religiosa sumisión del espíritu”. El Concilio añade “Aunque cada uno de los obispos no goza de la prerrogativa de la infalibilidad, sin embargo si todos ellos, aún dispersos por el mundo, pero manteniendo el vínculo de comunión entre sí y con el sucesor de Pedro, convienen en un mismo parecer como maestros auténticos, que exponen como definitiva una doctrina en las cosas de fe y de costumbres, anuncian infaliblemente la doctrina de Cristo” [25]. Este texto se refiere al llamado magisterio universal ordinario.
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El origen del término “magisterio universal ordinario” ha sido estudiado en otras partes. En este artículo considero la frecuente apelación a este magisterio, realizada desde el Vaticano II y, particularmente, durante el pontificado de Juan Pablo II.
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RECURSOS A LA INFALIBILIDAD DEL MAGISTERIO UNIVERSAL ORDINARIO (1965-2002)

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Humanae vitae
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Después de la publicación de la Humanae vitae de Pablo VI, sobre los anticonceptivos, algunos teólogos sostuvieron que aquella enseñanza tenía las condiciones establecidas en la Lumen gentium para el ejercicio infalible del magisterio universal ordinario. Una de estas voces vino, inesperadamente, de Hans Küng. Propuso que la enseñanza cumplía los requisitos de la Lumen gentium. La intención de Küng, sin embargo, era mostrar que debía ser rechazada la misma doctrina de la infalibilidad, dado que la investigación moderna había demostrado el error de la enseñanza de la encíclica. Algunos años más tarde, John C. Ford y Germain Grisez publicaron su más discutido estudio de esta materia, concluyendo, con una intención completamente distinta de Küng, que la enseñanza de la Iglesia ciertamente había sido infalible. Su artículo provocó un vivo debate. El interlocutor más notable fue Francis A. Sullivan. En algunos círculos eclesiásticos creció la tendencia a aceptar la tesis de Ford / Grisez: por ejemplo, un vademecum para confesores, salido de una Congregación Vaticana.
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Ordinatio sacerdotalis y Responsum ad dubium
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Quizás la reclamación más significativa y controvertida del ejercicio del magisterio universal ordinario está asociada a la carta apostólica de Juan Pablo II Ordinatio sacerdotalis, sobre la ordenación de las mujeres. En esta carta escribió: “Para quitar toda duda respecto a una materia de gran importancia, que pertenece a la misma constitución divina de la iglesia, en virtud de mi ministerio de confirmar los hermanos, declaro que la iglesia no tiene autoridad alguna para conferir la ordenación presbiteral a las mujeres y que esta sentencia tiene que ser mantenida definitivamente por todos los fieles de la iglesia.” Reafirma lo que ya se había propuesto antes en su mismo pontificado, y en el de Pablo VI. La novedad de la carta de 1994 no era la argumentación teológica, sino la misma formulación de la enseñanza.
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La frase “se ha de mantener definitivamente” se encuentra en la Lumen gentium [25] refiriéndose a la enseñanza infalible del magisterio universal ordinario de los obispos. Así, aunque la palabra “infalible” no se encuentra en la carta apostólica, el uso de esta frase suscitó preguntas, ya que el Papa proponía una enseñanza “para ser mantenida definitivamente”, por lo que parece ser un ejercicio del magisterio papal ordinario, no del magisterio universal ordinario de todo el colegio episcopal. “¿Qué obligación impone este documento? Se establece explícitamente que lo que aquí se afirma debe ser mantenido definitivamente en la iglesia, y que esta cuestión ya no queda abierta al diálogo de opiniones diferentes. ¿Es una afirmación dogmática? El Papa no propone ninguna nueva fórmula dogmática, sino que confirma una certeza vivida constantemente y mantenida firme en la Iglesia. Aquí tenemos un acto de magisterio ordinario del Sumo Pontífice, no una solemne definición ex cathedra, aunque en términos de contenido se presenta una doctrina que se ha de considerar definitiva. Se confirma por la autoridad apostólica del Papa una certeza, que ciertamente existe en la Iglesia, pero que ahora algunos cuestionan. Se ha dado una expresión concreta, que también expresa de forma obligatoria lo que siempre se ha vivido” (cardenal Ratzinger).
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La Congregación para la Doctrina de la Fe, el 28 de octubre de 1995, publicó un Responsum ad dubium, respuesta formal a una pregunta dirigida a la Santa Sede: “Si la enseñanza de que la Iglesia no tiene autoridad alguna para conferir la ordenación sacerdotal a las mujeres, que se presenta en la Carta Apostólica Ordinatio sacerdotalis para ser mantenida definitivamente, se ha de entender como perteneciente al depósito de la fe”. La respuesta es afirmativa. Y añade: “Esta enseñanza pide una adhesión definitiva, ya que está fundada en la Palabra escrita de Dios y, desde el principio, mantenida y aplicada constantemente en la Tradición de la Iglesia y ha sido establecida como infalible por el magisterio universal ordinario. Por esto, en las presentes circunstancias, el Romano Pontífice, en el ejercicio de su propio oficio de confirmar a los hermanos, ha confirmado la enseñanza con una declaración formal, estableciendo explícitamente lo que hay que mantener siempre, en todas partes y por todos, como perteneciente al depósito de la fe”.
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Como en el caso de la Ordinatio sacerdotalis, el Responsum ad dubium lejos de zanjar la discusión teológica, la incrementó dramáticamente.
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Evangelium vitae
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Este mismo año, Juan Pablo II había publicado su encíclica Evangelium vitae, en la cual explícitamente apela a la autoridad del magisterio universal ordinario en sus tres condenas: 1) la muerte directa y voluntaria de una vida inocente, 2) el aborto, y 3) la eutanasia. Según el Papa, la primera condena estaba “confirmada por la Sagrada Escritura, transmitida por la Tradición de la Iglesia y enseñada por el Magisterio universal ordinario”. La segunda y tercera enseñanzas estaban basadas ambas “en la ley natural y en la Palabra escrita de Dios, como transmitidas por la Tradición de la Iglesia y enseñadas por el magisterio universal ordinario”. El sumario oficial de encíclicas del Vaticano nota que, en esta encíclica, el Papa, ejerciendo su propia autoridad magisterial, confirma una doctrina enseñada por el magisterio universal ordinario. Las formulaciones de esta encíclica, junto con las respuestas de la Congregación de la Fe acerca de la Ordinatio sacerdotalis, levantaron importantes cuestiones sobre la relación entre un ejercicio del magisterio papal ordinario “confirmando” una enseñanza del magisterio universal ordinario, y el mismo ejercicio del magisterio universal ordinario.
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Ad tuendam fidem y el comentario Ratzinger / Bertone
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En el verano de 1998, Juan Pablo II publicó la carta apostólica Ad tuendam fidem. En esta carta incorporó algunas adiciones tanto al Código de Derecho Canónico como al Código Canónico de las Iglesias Orientales. Intentaba conciliar el CDC de 1983 con las categorías doctrinales establecidas por la Profesión de Fe y el Juramento de Fidelidad. En la Professio fidei se añadieron tres párrafos al Credo Niceno-Constantinopolitano. El primero, se refería a aquellas enseñanzas de la Iglesia que se han propuesto como reveladas divinas, ya sea por una definición solemne del Papa, o del Concilio, o por el magisterio universal ordinario. El segundo párrafo considera “doctrinas definitivas” aquellas enseñanzas de fe y moral que han sido “propuestas definitivamente por la Iglesia”. El creyente las debe “aceptar y tener firmemente” como verdaderas. Finalmente, el tercer párrafo se refiere a las “doctrinas autoritativas, no definitivas”, aquellas que han sido enseñadas por el magisterio autoritativamente, aunque no infaliblemente. El creyente tiene que adherirse “con una sumisión religiosa de la inteligencia y la voluntad”.
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La intención de la carta era llenar una laguna legislativa. Mientras el actual CDC menciona la primera y tercera categoría de enseñanzas de la Iglesia y especifica “justas sanciones” para los que disienten, no hay ninguna mención, en el Código, de la segunda categoría, doctrinas definitivas, y por consiguiente ninguna sanción para los que disientan. Más significativo era el comentario sobre la Professio fidei, del cardenal Ratzinger y el arzobispo Bertone, que acompañaba la carta apostólica. Aunque el comentario no tiene carácter formal de magisterio, de alguna manera refleja la mente del Papa y orienta la interpretación de las enmiendas del derecho canónico. El comentario ofrece ejemplos de doctrinas definitivas enseñadas con el carisma de infalibilidad: la naturaleza ilícita de la prostitución y fornicación, la condena de la eutanasia por Evangelium vitae, la ordenación sacerdotal reservada a los hombres, y la declaración de León XIII de que la ordenaciones anglicanas eran nulas e inválidas. Sin embargo, ninguno de los ejemplos citados parece ser el resultado de una solemne definición, sino más bien enseñanza del magisterio universal ordinario. La inclusión de la doctrina sobre las ordenaciones anglicanas arrastró la máxima atención y suscitó muchas objeciones de los ecumenistas.
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La Profesión de Fe compuesta para Robert Nugent
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En el invierno de 1998, al final de una serie de investigaciones sobre la enseñanza y escritos de Robert Nugent y Jeannine Gramick, fue enviada a Nugent una profesión de fe, en la cual tenía que afirmar las enseñanzas de la Iglesia respecto a la homosexualidad. Se habían ordenado según tres categorías: enseñanza dogmática, doctrina definitiva y doctrina autoritativa no definitiva. Las enseñanzas incluidas en la segunda categoría son particularmente significativas. El texto decía: “Acepto y mantengo firmemente que toda persona bautizada, revestida de Cristo, está llamada a vivir la virtud de la castidad de acuerdo a su particular estado de vida: las personas casadas están llamadas a vivir la castidad conyugal; todos los demás deben practicar la castidad en la forma de continencia. El encuentro sexual sólo se puede dar en el matrimonio. También acepto y mantengo que los actos homosexuales son siempre objetivamente malos. Sobre el sólido fundamento del testimonio bíblico constante que presenta los actos homosexuales como una grave perversión. La Tradición siempre ha declarado que los actos homosexuales son intrínsecamente desordenados”.
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Dado que no conozco ninguna solemne definición sobre la naturaleza objetivamente mala de los actos homosexuales, debo deducir que el Vaticano presenta esta enseñanza como doctrina definitiva enseñada infaliblemente por el magisterio universal ordinario. Estos párrafos van seguidos por otros tres adicionales. Cada uno empieza por “me adhiero con sumisión religiosa de la voluntad y la inteligencia a...” por consiguiente, lo que sigue se ha de considerar como doctrinas autoritativas, no definitivas. Incluso en estos párrafos hay formulaciones que establecen que la inclinación homosexual constituye una tendencia hacia un comportamiento intrínsecamente malo, y que estas personas, aún mereciendo ser tratadas con respeto y sin “formas injustas de discriminación”, no pueden reclamar ningún derecho para el comportamiento homosexual y, finalmente, que las personas homosexuales pueden crecer en la perfección cristiana “por la virtud del autodominio”.
Nugent devolvió a Roma una forma de profesión ligeramente enmendada (p.e. puso “actos homosexuales [genitales] son siempre, objetivamente hablando, moralmente erróneos” en vez de “objetivamente malos” y un párrafo final que dice: “Respecto a las dificultades para determinar si una enseñanza ha sido, de hecho, enseñada como infalible por un acto no definitivo del magisterio universal ordinario (CDC 749.3) y reconociendo y afirmando la naturaleza autoritativa y obligatoria de una tal enseñanza, me esforzaré para mantener una actitud positiva de oración, estudio y ulterior comunicación con la Sede Apostólica, en estas materias”.
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La respuesta del Vaticano a esta enmienda final es pertinente: “Aunque su exacto significado no es del todo claro, la referencia a “las dificultades para determinar si una particular enseñanza ha sido, de hecho, enseñada infaliblemente por un acto no definitivo del magisterio universal ordinario” en el contexto específico de una Profesión de Fe en materia de homosexualidad, sólo se puede entender que el autor desea cuestionar la categoría definitiva de las doctrinas referentes a la homosexualidad incluidas en los párrafos primero y segundo de la Profesión de Fe. El implícito es que la categoría de las doctrinas de los párrafos primero y segundo permanece abierta al debate, por esto, esta adición contribuye decisivamente a hacer inadecuada su Respuesta (cursiva en el original)”
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Este panorama de las llamadas a la infalibilidad del magisterio universal ordinario, después del Vaticano II, aunque no comprensivo, puede demostrar la importancia dada a este ejercicio de la enseñanza de la Iglesia. Muchos de estos recursos a la infalibilidad se refieren a doctrinas controvertidas entre renombrados teólogos católicos.
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PROBLEMAS NO RESUELTOS

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En los manuales dogmáticos, populares en el período entre los dos concilios Vaticanos, era poca la reflexión teológica sobre el magisterio universal ordinario. Esto cambia, dramáticamente, en los últimos 25 años, por el frecuente recurso a este ejercicio en materias controvertidas.
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El exacto carácter autoritativo de las enseñanzas del magisterio universal ordinario
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Cuando una verdad de revelación divina se enseña infaliblemente por el magisterio universal ordinario, resulta un “dogma no definido”. Si estas enseñanzas dogmáticas son “definitivas”, aunque “no definidas”, invitan a preguntar si merecen la misma condición que los dogmas “definidos”. O en negativo, ¿la negación de un dogma no-definido constituye una herejía, como en el caso de un dogma definido? La respuesta del CDC es afirmativa. El canon 750 sostiene que “todo lo que se propone como revelación divina, ya sea por el magisterio solemne de la Iglesia o por su magisterio universal ordinario, debe ser creído con fe divina y católica”. El canon siguiente, define la herejía como “la obstinada negación, después de recibir el bautismo, de una verdad que se debe creer con fe divina y católica”. Francis Sullivan observa que, si las consecuencias de negar un dogma no definido son las mismas que las de negar un dogma definido, el principio articulado en el canon 749 § 3 de que “ninguna doctrina se ha de entender infaliblemente definida si no está claramente establecido como tal”, se ha de aplicar por igual en ambos casos. Argumenta:“Ya que las consecuencias para los fieles, son las mismas... concluyo... que ninguna doctrina se ha de entender como propuesta infaliblemente a menos que esté claramente establecido, tanto si ha sido definida, como si ha sido enseñada por el magisterio universal ordinario.” El enfoque de Sullivan es insistir en el alto nivel que adquiere una verdad enseñada infaliblemente por el magisterio universal ordinario.
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Otra línea de pensamiento, por lo menos desde finales del S. XIX, llega a una conclusión distinta. Vacant escribió en 1887, que las enseñanzas del magisterio universal ordinario, aunque enseñadas infaliblemente, no se deberían considerar dogmas de fe católica. En su análisis de la tradición, no encontró ninguna evidencia de la nota teológica de herejía adjunta a una enseñanza propuesta sólo por el magisterio universal ordinario. Menciona específicamente el dogma de la Inmaculada Concepción, cuya negación nunca se consideró herejía, antes de su formal definición, aun cuando presumiblemente fue enseñada por el magisterio universal ordinario.
Unos 70 años después de Vacant, Karl Rahner y Karl Lehmann en su artículo “kerygma y dogma”, en Mysterium Salutis, concluyen que la tendencia actual es pensar los dogmas en términos de una solemne definición. Y notan la necesidad de reconocer el mayor grado de certeza que ofrecen los dogmas definidos. Kenneth Kaucheck, canonista, llega a la misma conclusión: “Aunque el magisterio ordinario tiene la misma autoridad que las definiciones solemnes, sólo una definición solemne puede definir una enseñanza... Solamente se manifiesta hereje el que niega una proposición definida.” Las diferencias entre Sullivan y Rahner / Lehmann no son significativas. Comparten un interés por el creyente. Sullivan pone un nivel más estricto de reconocimiento para los dogmas no-definidos y Rahner / Lehmann reconocen que, en la tradición, los dogmas no definidos no ofrecen el mismo grado de certeza que los dogmas definidos. Aun concediendo que un dogma definido posee mayor grado de certeza y que la negación de un dogma no-definido no constituiría una herejía, el argumento de Sullivan mantendría que una enseñanza ha de ser propuesta claramente sin error para ser dogmática.
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Uno de los aspectos más problemáticos del intercambio entre Nugent y el Vaticano consiste en la falta de voluntad del Vaticano para aceptar la condición de Nugent, es decir, la dificultad para determinar que una doctrina concreta ha sido propuesta como infalible por el magisterio universal ordinario. En este caso (y en el de Gramick) las consecuencias son muy serias. Su negación a firmar la Professio fidei repercutió en severas restricciones para su actividad pastoral y teológica. Sullivan tiene razón al extender la finalidad del canon 749 § 3 a los dogmas no-definidos. Todo recurso a la infalibilidad, tanto si se trata de dogma como de doctrina definida, se debe “manifestar claramente” para evitar afirmaciones no justificadas, y posiblemente dañosas, de herejía o de errores serios y de consiguientes penas canónicas.
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Alcance del objeto del magisterio universal ordinario
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La categoría, relativamente nueva, de doctrina definitiva, considerada en Ad tuendam fidem, ocasiona un montón de dificultades. Muchas de las recientes reclamaciones, respecto al ejercicio del magisterio universal ordinario, se refieren a la doctrina definitiva. La extensión de estas reclamaciones se ha facilitado, por una sutil reinterpretación del alcance de la categoría de doctrina definitiva.
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Según Jean-François Chiron, el recurso explícito al ejercicio del carisma de infalibilidad respecto a verdades no reveladas se remonta a la controversia jansenista, en la que se supuso que el magisterio enseñaba infaliblemente, no sólo en la condenación de las cinco proposiciones heréticas del Augustinus, de Jansenio, sino también en su determinación de que la obra contenía, de hecho, aquellas afirmaciones.
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Muchos manuales de seminario, en el S. XVIII y principios del XIX afirmaban la posibilidad del ejercicio de la infalibilidad respecto de las verdades no reveladas.
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Después del Vaticano I, se hizo común la explícita distinción entre dos objetos de la infalibilidad: el objeto primario, verdades reveladas, y el secundario, verdades no reveladas. En algunos casos, la segunda categoría se limitaba a lo estrictamente necesario para defender la revelación y, en otros, se ampliaba a hechos sencillamente “conexos” con la revelación. El Vaticano I no trató explícitamente esta materia. Sin embargo, el decreto sobre la infalibilidad papal, Pastor aeternus, estableció que cuando el Papa define “una doctrina concerniente a la fe o a la moral debe ser mantenida (tenendam) por toda la iglesia”. El uso de tenenda, más bien que credenda, sugiere que el Papa puede enseñar infaliblemente en una materia no revelada, no para ser creída sino mantenida. El obispo Gasser, en su relatio dirigida al concilio, hizo mención explícita de la posibilidad de la infalibilidad de la Iglesia, ampliada a verdades no reveladas, sólo en la medida en que sean necesarias para salvaguardar la divina revelación. Tanto Gasser como los manualistas, después del Vaticano I, estaban de acuerdo en que esta infalibilidad ampliada, no era revelada sino sólo “teológicamente cierta”.
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Aunque el Vaticano II no trató explícitamente este tema, Lumen gentium establece que el ejercicio de la infalibilidad “se extiende sólo a cuanto abarca el depósito de la divina revelación, que se ha de conservar santamente y exponer fielmente” [25]. La Comisión Teológica del concilio trató explícitamente la cuestión, optando por un ámbito restringido para el objeto secundario, que se describe como aquellas enseñanzas “que se requieren para salvaguardar religiosamente el mismo depósito y exponerlo fielmente”. Es la interpretación que aceptó, en 1973, la Congregación para la Doctrina de la Fe, en Mysterium ecclesiae. Y encontró su camino en la nueva cláusula que Juan Pablo II insertó en el CDC, canon 750 § 2: “...todas y cada una de las proposiciones que se requieren para la sagrada preservación y fiel explicación del depósito de la fe, deben ser firmemente abrazadas y mantenidas”.
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En contra de esta interpretación restrictiva, evidente en el Vaticano I y II e incluida en la inserción canónica promulgada en Ad tuendam fidem, un pasaje anterior de la carta apostólica y una afirmación en el comentario Ratzinger / Bertone, amplían el ámbito para incluir también enseñanzas conexas con la divina revelación por una “necesidad lógica” o “histórica”. Esta formulación, más ambigua, surgió en anteriores documentos, el más notable, la “Instrucción sobre la Vocación Eclesial del Teólogo”. Estas formulaciones recientes muestran una desafortunada vuelta a la interpretación más amplia del objeto secundario. Existe el peligro de trasladar la tercera categoría de enseñanzas de la iglesia, doctrinas autoritativas, a la segunda, doctrinas definitivas, por el camino de retorcidas demostraciones de necesidad lógica o histórica. Como observa Chiron, “siempre se ha tratado, por parte de los más cualificados autores y de los concilios, de proteger la revelación en sí misma, y no de ampliar, más o menos subrepticiamente, el campo de la infalibilidad”.
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Esta tendencia a afirmar doctrinas definitivas enseñadas por el magisterio ordinario universal refleja un retorno a un modelo preocupado por la enumeración de verdades y una inacabable elucidación de la relación lógica e histórica de unas con otras. Dei Verbum, optó por el modelo basado en la unidad integral de la revelación divina, manifestada en una persona, Jesús de Nazareth, y no en un sistema de proposiciones.
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“La intención del Concilio en esta materia era sencillamente una... Los padres estaban interesados en superar un intelectualismo neo-escolástico, para el cual la revelación significaba principalmente un cúmulo de misteriosas enseñanzas sobrenaturales, que reducían automáticamente la fe, en gran manera, a una aceptación de estas ideas sobrenaturales. En oposición a esto, el Concilio quería expresar de nuevo el carácter de revelación como una totalidad, en la cual la palabra y el acontecimiento constituían un todo, un diálogo verdadero que afectaba al hombre en su totalidad, no sólo un desafío intelectual, sino, como diálogo, dirigiéndose a él como compañero, dándole por primera vez su verdadera naturaleza” (J. Ratzinger).
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Lo que estamos viendo hoy, respecto a esta nueva categoría de doctrinas definitivas, se parece a este criticado tratamiento neo-escolástico de verdades reveladas.
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El problema de la verificación
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Timoteo Zapelena, en un manual de dogma que se publicó unas décadas antes del Vaticano II, advierte de la dificultad para verificar el consenso de los obispos en el magisterio universal ordinario. La dificultad de verificación es todavía mayor cuando se reconoce que no puede ser simplemente una cuestión de consenso tácito. Lumen gentium mantiene que los obispos deben estar de acuerdo en que “la enseñanza se ha de mantener definitivamente” [25]. Esta cláusula final sugiere que no sólo ha de haber consenso en la doctrina, sino también consenso en que esta doctrina se ha de proponer irrevocablemente. No se puede excluir la posibilidad de que los obispos estén de acuerdo sobre una enseñanza dada, pero mantenida, en el lenguaje de las sentencias teológicas, sólo como “teológicamente probable” y no “que se ha de tener como definitiva”. Sullivan sugiere que “es posible que a una enseñanza papal ordinaria, mientras no sea impugnada abiertamente, se le dé una recepción pasiva, o incluso cualificada, por un significativo número de obispos”. En la historia de la Iglesia, ha habido ocasiones en que ha faltado, a un obispo u obispos, la requerida experiencia o conocimiento para dar a una enseñanza algo más que esta aceptación pasiva.
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Más serias son las dificultades surgidas por la posibilidad de un consenso coaccionado virtualmente por la directiva papal. La prohibición del Vaticano de discutir libremente, entre los obispos, una determinada materia, puede ser prudente en ciertas circunstancias. Sin embargo, cuando esta prohibición se ha de imponer, es inevitable que la unanimidad episcopal aparezca como poco más que una anuencia a la directiva del Vaticano.
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Es posible concebir un proceso que muestre un genuino consenso episcopal. En la vida de la primitiva Iglesia, la interacción colegial se manifestaba de numerosas maneras: participación en sínodos regionales, distribución de cartas circulares, participación compartida en la ordenación de obispos, enviar y recibir “cartas de recomendación,” etc. Estas múltiples interacciones alimentaban una enseñanza común de todo el colegio, confirmada por el respaldo de la comunión episcopal. De ahí, la gravedad del cisma eclesial. El cisma aislaba a una iglesia de la amplia communio ecclesiarum y la privaba del testimonio de las otras iglesias. Hoy existen oportunidades alternativas para construir la enseñanza común de los obispos: la colegialidad manifestada en las conferencias episcopales, los sínodos episcopales, incluso la posibilidad (por desgracia tan poco utilizada) de concilios plenarios y provinciales, etc. El potencial de estas instituciones ha sido severamente comprometido por una atmósfera, creada por el Vaticano, en la cual las agendas sinodales son cuidadosamente controladas, se obstaculiza el tratamiento de temas controvertidos y se emplean rigurosas comprobaciones para el nombramiento episcopal. Se dice que los obispos no están para manifestar públicamente su desacuerdo con la enseñanza papal. Una tal atmósfera hace dudoso todo recurso a la unanimidad episcopal, cuando es evidente un amplio desacuerdo teológico y los obispos, en privado, admiten sus reservas.
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Más allá del problema del consenso episcopal, Sullivan ha propuesto otros dos criterios para evaluar si una enseñanza ha sido enseñada infaliblemente por el magisterio universal ordinario: el consentimiento de los teólogos y el consensus fidelium. En Tuas libenter, Pío IX afirma que se debe igualmente un acto de fe a aquellas enseñanzas propuestas infaliblemente por el magisterio ordinario y “por consiguiente tenidas, por el consenso universal y constante de los teólogos católicos, como pertenecientes a la fe”. Sullivan escribe: “En esta cláusula final, Pío IX propone claramente un criterio por el que se pueden identificar, como divinamente reveladas, doctrinas que han sido enseñadas por el magisterio universal ordinario”. Sullivan además acentúa que: “El género de consenso... ha de ser uno que permanezca y persevere firme”. Ofrece dos ejemplos: el poligenismo y los anticonceptivos. Por un tiempo era posible reconocer un consenso en la condena del poligenismo, particularmente en los años entre el Vaticano I y la Humani generis, pero este consenso no “perseveró” entre los teólogos después del Vaticano II. De manera parecida, el consenso, respecto a la enseñanza de la Iglesia sobre los anticonceptivos, se hizo añicos en los años siguientes a la Humanae vitae. En ambos casos, se deshizo una unanimidad a la vista de nuevos desarrollos o nuevas estructuras interpretativas. Podemos ampliar este juicio a las enseñanzas sobre la ordenación de las mujeres y el carácter moral de los actos homosexuales; ambos han sido el sujeto de considerable reflexión teológica con nuevos contextos interpretativos. Es difícil pretender el consenso, respecto a estas enseñanzas, como uno que “persevera y permanece firme”.
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El segundo criterio que ofrece Sullivan viene sugerido por el canon 750 del CDC de 1983. Este canon se refiere a aquellas enseñanzas que se han de creer con “fe divina y católica”, propuestas por solemne definición o enseñadas por el magisterio universal ordinario y “que se manifiesta por el asentimiento común de los fieles de Cristo bajo la guía del sagrado magisterio”. En esta cláusula, añadida al canon 1323 §1 del anterior CDC, se encuentra una referencia a la noción eclesiológica de “la recepción de la enseñanza de la iglesia” por parte de los fieles. Es otro camino para verificar que una enseñanza ha sido propuesta infaliblemente por el magisterio universal ordinario.
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Los criterios de Sullivan para la verificación del ejercicio del magisterio universal ordinario, han sido objeto de algunas críticas. Lawrence Welch le ha acusado de introducir condiciones sine qua non para el ejercicio de este magisterio. Después de analizar el argumento del consenso de los teólogos, particularmente la mención de Pío IX, Welch escribe:“No hay ninguna razón para creer que el Papa, que insiste en que los teólogos se han de someter a las decisiones doctrinales de las Congregaciones Romanas, en el bien entendido que esto es no sólo un signo de, sino una condición para enseñanzas definitivas, cuya ausencia pondría en duda que el magisterio ordinario ha enseñado una doctrina definitivamente. Un signo es una cosa y otra, una condición. Sullivan parece asumir que signo y condición significan lo mismo.” Sin embargo, en ninguna parte Sullivan afirma que cualquiera de los dos criterios sea condición necesaria para el ejercicio del magisterio universal ordinario. Al contrario, reconoce que hay una importante distinción entre la instancia fáctica de una enseñanza del episcopado universal, para ser tenida como definitiva por los fieles, y la verificación de que ha sido propuesta como tal. Es posible que una doctrina haya sido enseñada por el magisterio universal ordinario sin que el hecho sea aceptado en un momento determinado.
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Por esto es crucial la referencia al canon 749 § 3: “Ninguna doctrina se ha de entender como definida infaliblemente a no ser que conste manifiestamente”. Este canon no se refiere a las condiciones para el ejercicio de la infalibilidad (como lo hizo Pastor aeternus con respecto a la infalibilidad papal) sino a la necesaria verificación de que el ejercicio de la infalibilidad se ha dado de hecho. Sullivan concede que el canon se refiere a los dogmas definidos. Sin embargo, defiende que es teológicamente justificable extender el ámbito a los dogmas no-definidos. El argumento principal de Sullivan se basa en las consecuencias, para los fieles, al negar un dogma.
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Germain Grisez también ha criticado la posición de Sullivan en algunos puntos. Primero, la cuestión del canon 749 § 3. Para Grisez este canon se refiere estrictamente a la formulación de una proposición dogmática. Dado que sólo las definiciones solemnes tienen formulaciones específicas, este canon no se podría aplicar a las enseñanzas dogmáticas no-definidas. Curiosamente Grises, en el caso que está argumentando de los anticonceptivos, escribe que: “a la vista del silencio, hasta ahora, de prácticamente todos los obispos, sobre la infalibilidad de la enseñanza, así como la ausencia de consenso entre los teólogos, la mayoría de los fieles, que carecen de una formación teológica, serán incapaces de ver que esta enseñanza ha sido propuesta infaliblemente.”
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Grisez parece aceptar la ampliación del canon 749 § 3, al menos para los fieles. Sin embargo, insiste en que la falta de consenso no tiene el mismo sentido para los teólogos. “Psicológicamente, no hay duda, es tranquilizante encontrar el propio parecer avalado por muchos colegas. Metodológicamente, sin embargo, en el mejor de los casos, proporciona un signo de desconfianza, de que la verdad puede mentir.” El consenso de los teólogos es para “establecer claramente” que ha sido enseñada infaliblemente por el magisterio universal ordinario, no que sea verdadera. El consenso de los teólogos parece tan importante para los teólogos como para el resto de los fieles.
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Welch concede, contra Grisez, la aplicación que hace Sullivan del canon, pero mantiene que el canon se refiere sólo “establecer claramente” que una definición solemne tiene las condiciones para el ejercicio de la infalibilidad, por el Papa o por el concilio. “El canon 749 § 3 no se puede aplicar, de una manera directa, a dogmas no-definidos, porque no tienen la formulación ni el contexto de los dogmas definidos.” Con todo, Welch admite “que cuando los teólogos intentan identificar dogmas no definidos, deben tomarse el trabajo de inquirir en qué medida el Papa y los obispos estaban de acuerdo en que una doctrina se debe mantener definitivamente”. Precisamente por esto, Sullivan apela a la importancia de investigar el consenso teológico.
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El problema de la verificación surge siempre que se recurre al magisterio universal ordinario en asuntos controvertidos. Cuando el recurso al magisterio universal ordinario atañe a afirmaciones mantenidas por mucho tiempo, del género de las creencias bautismales (por ejemplo, la comunión de los santos o la resurrección de la carne), el problema de la verificación raramente entra en juego. Por esto, en el presente pontificado, Evangelium vitae es el que menos críticas ha recibido. Los teólogos moralistas dudosamente desearán clarificación respecto al ámbito y a la aplicación de las tres condenas de esta encíclica. Sin embargo, la prohibición de la ordenación de las mujeres y los actos homosexuales intrínsecamente malos, han levantado cuestiones significativas, porque muchos estudiosos creen que estas enseñanzas se deben reconsiderar hoy, a la luz de nuevos marcos interpretativos. Hace unos diez años sugerí que “frente a la controversia, la determinación autoritativa de cualquier enseñanza no definida solemnemente sólo se puede mantener provisionalmente... Cuando surgen serias cuestiones contra una enseñanza de la Iglesia, no se puede esperar que el recurso al magisterio universal ordinario resuelva la cuestión.” A esto, Welch objetó: “Supongamos, por ejemplo, que en algún momento, en el futuro, la resurrección de la carne fuera una doctrina controvertida, como lo fue en los primeros siglos, ¿nos justificaríamos diciendo que su carácter definitivo e infalible era sólo provisional, porque se había vuelto controvertido? La controversia, o la falta de ella, no ayudan para determinar el carácter de una doctrina enseñada por el magisterio universal ordinario.”
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Mi respuesta, provocativa sin embargo, al caso hipotético, es sí. Hay diferentes maneras de resolver el desacuerdo. Primera: un estudio, bien fundamentado, de la unanimidad diacrónica y sincrónica del episcopado respecto a la resurrección de la carne. La unanimidad diacrónica sería una demostración del testimonio de esta enseñanza a través de los siglos; mientras que la unanimidad sincrónica, en el momento presente, se puede compulsar mediante una consulta explícita y pública de todo el colegio episcopal. Otra alternativa, con acreditados antecedentes en nuestra tradición, sería un ejercicio del magisterio extraordinario mediante una sentencia solemne, o bien del Papa, o bien, preferible para mayor seguridad, de un concilio ecuménico. En el pasado, la definición solemne de un dogma ocurría, generalmente, como resultado de una enseñanza que había sido impugnada. Por ejemplo, la presencia real de Cristo en la Eucaristía, ante una serie de discusiones y con los desafíos de algunos Reformadores, llegó finalmente a su solemne definición en el Concilio de Trento.
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La confirmación papal como medio de verificación
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Brian Ferme está de acuerdo en que la consulta de los obispos, el consenso de los teólogos y el asentimiento de los fieles tienen valor como fuentes de verificación. Con todo, defiende que “se ha pasado por alto el criterio más importante, es decir, la actuación de la Cabeza del Colegio”. El Papa puede ejercer su propio magisterio ordinario para confirmar la enseñanza de los obispos. Hemos visto esta confirmación papal, implícitamente en Ordinatio sacerdotalis y, explícitamente, en Evangelium vitae. Como observa Hermann Pottmeyer: “De hecho es muy concebible que una declaración papal pueda representar el punto final de un intensivo intercambio entre el Papa y el episcopado: un intercambio en el que cada obispo tuvo la oportunidad de dar a conocer su punto de vista. Porque, en el ejercicio de su responsabilidad como maestro, un obispo no puede ser reemplazado ni por el colegio de cardenales ni por los presidentes de las conferencias episcopales. Este intercambio se puede realizar de manera que la existencia de un consenso sincrónico resulte evidente a los fieles”.
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Peter Hünermann piensa algo parecido cuando propone un nuevo paradigma para el ejercicio de la autoridad docente papal. El Papa actúa a manera de “notario público”, dando fe formalmente. Con este ejercicio “notarial” el papa no impondría una nueva enseñanza, sino que pondría el “sello” a lo que se ha suscitado en la conciencia de la Iglesia. La efectividad de este ministerio dependería de su carácter manifiesto de confirmación, no de una determinación autónoma. Se supone que un tal acto confirmativo sería consecuencia, por ejemplo, de una consulta directa de los obispos. Esta clase de consulta se encuentra en Evangelium vitae. El Papa explícitamente manifiesta su consulta por medio de una carta personal dirigida a cada uno de los obispos. Alternativamente debería existir la certeza de un consenso diacrónico constante en la tradición, conforme la enseñanza ha sido propuesta consistentemente por los obispos como definitiva.
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Este acto de enseñanza papal tendría el mérito de llamar la atención respecto a un consenso dentro de la tradición, y entre los obispos en el momento presente, cuyo significado quizás no había sido suficientemente reconocido. Las dificultades surgen, sin embargo, cuando un acto de confirmación papal se utiliza para resolver dudas respecto al carácter definitivo de una enseñanza. Ferme sostiene que “si hay duda sobre si una doctrina se ha propuesto infaliblemente por el magisterio universal ordinario de la Iglesia, en el sentido del canon 749 § 2, la Cabeza del Colegio puede declarar que este es el caso”. Esto podría ser verdad si la duda existe sólo en algún individuo que, quizás, nunca ha tenido motivo para considerar el carácter autoritativo de una enseñanza. No será apropiado cuando hay serias dudas, entre los teólogos, de que una enseñanza se haya propuesto como tal por los obispos. La confirmación papal puede ayudar, pero no puede sustituir el que una enseñanza no haya sido consistentemente mantenida en la tradición, o que no sea ofrecida como definitiva, ahora y aquí, por el colegio de los obispos. Para adoptar la imagen ofrecida por Hünermann, un notario pone el sello a un documento, como garantía de que contiene lo que han testimoniado. Sin embargo, el notario va más allá de su autoridad cuando pone su sello frente a dudas sobre la autenticidad del contenido del documento.
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La raíz de la diferencia, entre la confirmación papal concebida por Pottmeyer / Hünermann y la de Ferme, se refleja en la exposición que hace Ferme de los dos primeros párrafos del canon 740. Dice que se dirigen a “dos sujetos de infalibilidad”: el Papa, en el primer párrafo; y el colegio de los obispos, en el segundo. Esta interpretación, por común que haya podido ser en ciertos manuales neo-escolásticos, representa una defectuosa perspectiva eclesiológica. Porque el Papa, como obispo de Roma, es la cabeza del colegio de los obispos. Él y el colegio no se han de concebir como dos entidades y dos sujetos distintos. Pottmeyer concede la legitimidad de un acto papal de confirmación, porque reconoce el papel del Papa, como cabeza del colegio, para resumir y dar expresión explícita al sentido del colegio. Ferme da un valor autónomo a la confirmación papal de la enseñanza episcopal, independientemente de ninguna manifestación directa de la enseñanza de los obispos. Insiste en que el Papa no tiene obligación de someter los obispos a votación. Basta que “en un deliberado discernimiento de la fe de la Iglesia, el Papa declare esta fe”. Dado que esta confirmación papal no es, como admite Ferme, un ejercicio infalible, los fieles pueden retirar el asentimiento a la determinación del Papa si, después de reflexión y estudio en la oración, no ven la conexión entre la confirmación papal y la enseñanza episcopal.
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Finalmente, esta práctica de confirmación papal tiene el riesgo de oscurecer lo que Bernard Sesboüé refiere como la fundamental “asimetría”, mantenida intencionadamente en la enseñanza de ambos Vaticanos, I y II. Hay dos maneras de ejercer el magisterio extraordinario (sentencia solemne de un concilio ecuménico o del Papa enseñando ex cathedra) pero sólo una en el ejercicio del magisterio universal ordinario, la enseñanza de todo el colegio disperso por el mundo. La palabra “universal” se añadió a este pasaje, en Dei Filius, para remarcar que el ejercicio del magisterio ordinario, que Pío IX pensó en Tuas libenter, no era un ejercicio del magisterio papal ordinario. El énfasis en el papel de la confirmación papal tiene el riesgo de transformar el magisterio papal ordinario en magisterio universal ordinario.
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CONCLUSIÓN

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En la primitiva Iglesia, los obispos proclamaban el kerygma apostólico en la confianza de que estaban unidos con sus hermanos obispos en la proclamación de una misma fe en Jesucristo. Esta predicación y enseñanza diaria era la manera “ordinaria” por la que los obispos ejercían su autoridad como predicadores y maestros. Sólo cuando surgía una amenaza, contraria a la fe recibida, se consideraba necesario “definir” la fe de una manera más solemne, por medio de concilios y, eventualmente, por una solemne sentencia papal. En los años que han pasado desde el Concilio Vaticano II, esta intuición básica, de la enseñanza común de los obispos se ha transformado en un medio para dirimir materias controvertidas. Ha emergido una tendencia perturbadora, en la cual el carácter autoritativo, sobre materias discutidas, se ha reforzado por el recurso a esta “tercera modalidad” del ejercicio de la infalibilidad. El frecuente recurso a la infalibilidad del magisterio universal ordinario, impide la reflexión de la comunidad cristiana sobre cuestiones que se encuentran en nuevos contextos significativos y, por consiguiente, no son susceptibles de determinaciones “definitivas”. El ejercicio del magisterio universal ordinario ha cambiado de manera significativa. Sólo recuperando la visión eclesiológica más antigua, de consenso universal de las iglesias y de sus obispos, se pueden superar estas problemáticas características.
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Tradujo y condensó: CARLES PORTABELLA
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[Texto em *.pdf, aqui.]

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Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Albino O M Soares (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 09:33

É quando nos julgamos infalíveis que mais falhamos.
"presunção e água benta cada uma toma a que quer".

*=?.0

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 10:14

Citação:
Albino
«É quando nos julgamos infalíveis que mais falhamos.»

Esta frase é falível ou infalível?

Alef

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: s7v7n (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 10:19

Ahaha LOL! Agora tiveste piada :P Bem caçado!

"Ama e faz o que quiseres" - Santo Agostinho

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Albino O M Soares (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 12:01

Alef,
Trata-se de um adágio, um aviso, com as limitações habituais.
Penso sim é que um homem intelectualmente honesto nunca aceitaria, por uma questão de humildade, ser proclamado infalível, muito menos face à história de graves burricadas (sem ofensa para o animal) que os papas foram debitando. O cristianismo já tem questões sensíveis suficientes na sua constituição que o tornam problemático face à razão. Pessoalmente acredito que a Fé deve ser a extensão da razão e não a sua negação. Se bem que um pouco de fantasia não seja propriamente um mal, se não for usada para queimar pessoas.

*=?.0

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 12:22

Mas, Albino, terás tu lido tudo o que por aqui se escreveu? Que a infalibilidade não é uma prerrogativa meramente pessoal, que a infalibilidade papal tem um campo bastante restrito e que não se confunde infalibilidade com «impecabilidade»? Etc...?

Quanto à relação fé-razão, não existe negação da razão no Cristianismo. Muito pelo contrário. A negação da razão é o fideísmo, condenado pelo Concílio Vaticano I.

A «Fides et Ratio» trata desta questão da relação entre fé e razão. Aqui mesmo, neste fórum há um tópico sobre o assunto: «Fé e razão». Vou chamá-lo de novo à primeira página.

Alef



Editado 1 vezes. Última edição em 29/05/2007 13:33 por Alef.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Cassima (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 14:44

Estive agora a ler o documento de D. Estêvão Tavares Bettencourt. Gostei bastante! Surgiram-me, contudo, algumas dúvidas que deixo aqui.

Antes de mais, quais são os dogmas da Igreja Católica? A lista que encontrei aqui está completa e correcta?


Sobre o documento de D. Estêvão, aí vai.

a) Relativamente à questão da Infabilidade do Papa, diz que:

Citação:
"Não há, porém, trâmite prescrito para o pronunciamento do Pontífice. Não se exige, portanto, que o Santo Padre, antes de se definir, consulte algum concílio, pois este requisito suporia que o concílio possa exercer influência restritiva sobre a autoridade papal ou esteja acima do Papa no governo da Santa Igreja[3]."

Isto parece significar que o papa pode pronunciar-se sem se apoiar no conselho dos bispos e cardeais e que o pronunciamento, mesmo não sendo particular - ou seja da pessoa concreta que exerce o papado - não deixa de ser individual. O que é que eu estou a ver mal aqui?


b) No ponto 3) D. Estêvão Tavares Bettencourt diz:

Citação:
"Em 1302, a bula Unam Sanctam do Papa Bonifácio VIII é tida como portadora de definição dogmática em sua parte final, onde o Pontífice "declara, afirma, define e pronuncia (declaramus, dicimus, definimus et pronuntiamus)" que toda criatura humana está sujeita ao Romano Pontífice; cf. DS 875."

e acrescenta:
Citação:
"Esta sentença há de ser entendida no seu respectivo quadro histórico."

Termina, com uma definição que não me parece ter sido a original.

Isto significa o quê? Que tem de ser revista? Que pode estar errada? Se uma verdade da fé depende do contexto histórico, como é que a justificamos agora?


c) Também no ponto 6), se escreve:

Citação:
"É semipelagiano dizer que Cristo morreu ou derramou o seu sangue por todos os homens sem exceção"

Isto faz lembrar a discussão do tópico "Por muitos" ou "por todos"? ("Pro multis" ou "pro omnibus"?). Ora, na missa diz-se que Cristo morreu por todos os homens. Então é heresia uma coisa que se diz na missa? Esta pôs-me confusa...


d) D. Estevão diz no ponto 10)

Citação:
"Em 1794, a Constituição Auctorem Fidei de Pio VI visava a 85 teses heréticas promulgadas em 1786 pelo Sínodo de Pistoia (Toscana); cf. DS 2600-2700"

Uma das teses era a da missa em vernáculo, como temos hoje! Isto foi considerado heresia. Então como se justifica a adopção da missa em vernáculo no Concílio do Vaticano II, sem anular, pelo menos parte, desta decisão?


Um abraço

Cassima

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: Epafras (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 18:16

Algumas coisas que de momento me ocorrem dizer:

1) Uma pergunta. Todos os católicos aqui do forum subscrevem exactamente esta lista de declarações infalíveis de Dom Estêvão ou alguém pensa que ela peca por excesso ou por defeito, quanto ao número de declarações infalíveis do Pontífice Romano?

2) Necessidade de um trabalho acurado para discernir os ensinamentos infalíveis. Sustenta-se que a infalibilidade é importantíssima mas é preciso todo um trabalho de investigação avançado para estabelecer quais ensinamentos papais são deveras infalíveis. O que leva a pensar que a maioria dos católicos ignoram quais os ensinamentos pontifícios devem ser tidos por infalíveis e quais não. Poderá haver muitos ou poucos, mas se não sabem quais e quantos são, de que serve a infalibilidade papal?

3) Lista falível de ensinamentos infalíveis. Como não há uma lista infalível de declarações infalíveis do Papa, qualquer lista feita por eruditos ou teólogos privados é falível, uma vez que é discernida por homens falíveis, e portanto pode ser questionada a qualquer altura. Assim sendo, um católico não pode saber exacta e infalivelmente quais ensinamentos papais são infalíveis e, por conseguinte, a infalibilidade papal torna-se tão inútil como um pára-quedas num submarino.

4) A importância e utilidade desta doutrina ao longo dos séculos. Dando como exacta a lista das definições pontifícias de Dom Estêvão (excepto os primeiros dois documentos porque a história não é como a pinta o Dom Estêvão) pode-se analisar a importância e utilidade que este magistério extraordinário do Papa tem supostamente tido ao longo dos séculos para a Igreja de Cristo. Serviu para Bonifácio VIII definir infalivelmente a doutrina segundo a qual a submissão ao Papa é uma condição indespensável para a salvação e fora da fé católica ninguém pode salvar-se (é caso para perguntar ao Dom Estêvão como fica então o ensinado pelo Vaticano II sobre o ecumenismo? Será que também rejeitou Vaticano II?), serviu para Bento XII definir infalivelmente que, logo após a morte corporal, as almas totalmente puras são admitidas à contemplação da essência de Deus face a face, serviu para Leão X condenar infalivelmente 41 proposições de Lutero como heréticas, serviu para condenar infalivelmente mais umas quantas proposições heréticas, serviu para condenar infalivelmente 101 afirmações do livro Réflexions morales de Pascásio Quesnel, serviu para definir o dogma da Imaculada Conceição de Maria e Assunção de Maria ao céu (coisas que manifestamente a Igreja não creu desde sempre), e pronto, é caso para perguntar o que seria da Igreja de Cristo sem este magistério extraordinário do Romano Pontífice. O uso restringido nega a importância que lhe querem atribuir.

5) Diz o Dom Estêvão «uma definição papal nunca é imposição brusca ou repentina de alguma sentença. As definições representam geralmente o termo final de um processo lento, durante o qual uma verdade contida no depósito tradicional da Revelação vai aflorando plenamente à consciência da hierarquia sacerdotal e dos fiéis em geral.»

E digo eu: Se para definir uma doutrina o papa deve esperar que toda a Igreja creia nela, tal definição ex cathedra é inútil.

6) Infalibilidade da Igreja e infalibilidade do Papa. Para quem ainda não percebeu, é uma clara subversão do espírito e da letra do texto do Vaticano I dizer que a infalibilidade do Papa funda-se na infalibilidade da Igreja, quando o texto diz exactamente o contrário. Com efeito, diz-se que a infalibilidade da Igreja descansa precisamente na infalibilidade do "sucessor de Pedro." Toda a declaração sustenta esta posição: É no Papa que descansa a infabilidade da Igreja, e não ao revés. E para que não ficasse dúvidas, a definição foi bem rematada: "As definições do Romano Pontífice são irreformáveis por si mesmas e não pelo consentimento da Igreja."

Epafras



Editado 1 vezes. Última edição em 29/05/2007 18:22 por Epafras.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: firefox (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 20:35

Estou ainda devendo uma resposta à pergunta que me foi colocada pelo Tilleul: - pergunto, onde acaba o desejo de um papa e começa um dogma? Nos dois dogmas Marianos que já por vezes citei onde está essa fronteira?. E aproveito para escrever depois do muito pertinente post da Cassima - ainda acabo fã dessa menina! :)

Gostei muito do segundo texto trazido pelo Alef, de autoria do Richard R. Gaillardetz. Apesar de todo respeito que devo ao Dom Estevão B., e do reconhecimento da sua enorme erudição, há sempre alguma coisa de conservadora no seu discurso, o que me cria algumas resistências sem necessidade. Sobre o assunto da infalibilidade, gostaria de repetir o que já escrevi antes e, em seguida, destacar alguns pontos adicionais - alguns encontram-se no texto do Richard R. Gaillardetz, mas já estavam comigo antes de lê-lo. Reafirmo a seguir o modo como entendo a questão da infalibilidade papal dentro da doutrina católica, e quem quiser pode considerar como se fosse um tipo de profissão de fé:

(1) Entendo que, para um ensino papal ser considerado infalível, cinco pré-requisitos são necessários:
a) o tema do pronunciamento deve ser algum ensinamento sobre fé ou moral;
b) o ensinamento deve ser dirigido para toda a igreja universal;
c) deve expressar um entendimento da igreja e não somente um entendimento pessoal do papa;
d) o papa deve falar na pessoa do sucessor de Pedro, que fala como porta-voz da igreja;
e) o ensinamento deve estar em consonância com as Escrituras e com a Tradição apostólica.

(2) Entendo que, declarada uma decisão do papa como "irreformável" ou "infalível", isso NÃO significa dizer que ela nunca nunca possa ser melhorada, esclarecida, expandida, desenvolvida ou estabelecida em uma nova perspectiva. A adjetivação de um ensinamento como infalível quer expressar que se trata de uma verdade mais intimamente ligada com toda a doutrina cristã, e é esse aspecto basilar que lhe confere algum caráter "irreformável". Contudo, nossa percepção da verdade ainda não é plena, "vemos como que por um espelho", então, quando cresce a nossa compreensão, deve ser novamente esclarecido o significado da proposição "irreformável" ou "infalível".

(3) Entendo que um "dogma" é um ponto de luz e não uma cerca de arame farpado! Os dogmas são um presente e não um fardo, servem para orientar a reflexão e a caminhada da igreja.

(4) Sobre as questões de ortodoxia e ortopraxia, sobre o que se deve crer para ser considerado católico e livre de heresia, há uma declaração excelente no Credo Apostólico! O canon católico define a heresia como "a obstinada negação, depois de receber o batismo, de uma verdade que se deve crer com fé divina e católica". Considerações:
a) parece-me que uma dúvida sincera não pode ser considerada "obstinada negação".
b) parece-me que as "verdades que se devem crer" não incluem os ensinamentos do magistério ordinário, que mudam de acordo com épocas e lugares, e não constituem dogmas católicos.
c) parece-me, contudo, que, se não existir algum motivo grave ou algum impedimento de consciência, todo católico deve respeitar os pastores da igreja, para não pecar contra a unidade.


Tilleul, no meu caso, depois de refletir para procurar compreender o significado dos ensinamentos nos dois dogmas marianos, Imaculada Conceição e Assunção, cheguei ao que segue:

a) Sinceramente acredito que um católico deveria antes procurar acolher que rechaçar o que vem da sua igreja, então me perguntei se não seriam verdades ligadas com a doutrina católica e importantes para a vida de todos os fiéis. Pressupus que sim, que não eram apenas "curiosidades do além" sobre a pessoa de Maria, e se eram propostos como dogmas teriam que ter algum ensinamento importante para os fiéis, para o entendimento de Cristo ou do relacionamento com Ele;

b) o conteúdo dos dogmas: o dogma da imaculada conceição (definido em 1854) declarou que, pela graça de Deus e pelos méritos de Cristo, Maria foi preservada livre do pecado original; o dogma da assunção (definido em 1950) declarou que "após a sua vida na terra", Maria foi assunta "em corpo e alma" na glória do céu.

Reflexão e consequências:

c) os dois casos ocorreram antes do Vaticano II, o que levou depois o concílio a produzir um rico ensinamento teológico sistemático sobre os santos e sobre Maria. Entendo que os dois dogmas esclarecem o papel de Maria e dos santos na igreja de Cristo, é dado conhecido da tradição apostólica que a pessoa de Maria tipifica a igreja: Cristo renasce a cada dia no seio da igreja como nasceu um dia no seio de Maria.

d) no passado, dentro de um modelo de igreja fortemente jurídica, a veneração aos santos e à mãe do Rei assumia, grosso modo, a forma de um modelo patrono-solicitador, e o fiel se cercava da amizade de intercessores agradáveis a Deus. O modelo proposto no Vaticano II rompeu com esse quadro para destacar o papel da comunhão e da solidariedade entre os fiéis que trabalham, oram e amam, juntos! Todos somos companheiros de Cristo!

e) "Nós esperamos porque existem santos!" (Rahner, "All Saint", Theological Investigations 29). A graça vitoriosa de Deus venceu na pessoa dos santos que surgem como garantia da fidelidade divina e promessa do futuro para todos que depositam sua confiança em Deus.

f) Maria não está mais perto de nós do que Jesus! Não há, na verdade, distância alguma entre o fiel discípulo e o Cristo, pq a vida de Cristo habita dentro dele: "Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim" (Gl 2,20) Então, a o amor que tem um cristão pela mãe de Deus é de amizade e gratidão, de solidariedade e comunhão, pq: "Há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, um homem, Cristo Jesus" (1Tm 2,5)

g) o que ensina a Assunção é, portanto, o que acontecerá com todo o fiel discípulo. Maria personifica o estado de glória que já têm todos aqueles que, como ela, morreram em Cristo. Todos nós, se morrermos em Cristo, um dia "dormiremos" e seremos assuntos ao céu em corpo e alma.

h) já a festa da imaculada conceição testemunha que o influxo da graça de Deus na vida de uma pessoa começa desde o início da existência e antes mesmo que ela venha à luz. Assim, diz respeito tb à "eleição" e ao convite da graça para o seguimento e a construção do Reino.

Paz e Bem.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: firefox (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 20:56

Citação:
Epafras
2) ... a maioria dos católicos ignoram quais os ensinamentos pontifícios devem ser tidos por infalíveis e quais não. Poderá haver muitos ou poucos, mas se não sabem quais e quantos são, de que serve a infalibilidade papal?
3) ... um católico não pode saber exacta e infalivelmente quais ensinamentos papais são infalíveis e, por conseguinte, a infalibilidade papal torna-se tão inútil como um pára-quedas num submarino.

Um breve exame do seu texto é suficiente para mostrar que toda a sua crítica está centrada em um critério utilitarista da fé. Afinal, pergunta vc, se existem todas as dificuldades que aventou, então qual a utilidade da doutrina da infalibilidade papal?

Minha resposta: Nenhuma! Não existe utilidade nenhuma! A fé não se mede por critérios utilitaristas. Vc não perguntou isso, mas acrescento tb: não existe nenhuma utilidade em ser cristão, isso é completamente inútil. Estamos em pé de igualdade nesse mundo com os budistas e com os ateus; budistas e ateus podem ter uma vida de amor ao próximo assim como qualquer cristão, e acredito que podem ser salvos da mesma forma que um cristão. O amor de Deus é para todos e o sol nasce e se põe para justos e injustos. Espantoso, vc ainda não sabia isso?

Citação:
Epafras
4) A importância e utilidade desta doutrina ao longo dos séculos. ...pode-se analisar a importância e utilidade que este magistério extraordinário do Papa tem ...é caso para perguntar o que seria da Igreja de Cristo sem este magistério extraordinário do Romano Pontífice. O uso restringido nega a importância que lhe querem atribuir.

Note bem: essa importância toda a qual vc faz referência foi dada somente por vc mesmo (!), que insiste em adotar uma interpretação maximalista da doutrina contra tudo e contra todos aqui. Até agora os seus comentários é que tem insistido nisso, todos os católicos aqui concordaram, de um modo ou de outro, que a interpretação maximalista é errada!

Citação:
Epafras
5) Diz o Dom Estêvão «uma definição papal nunca é imposição brusca ou repentina de alguma sentença. As definições representam geralmente o termo final de um processo lento, durante o qual uma verdade contida no depósito tradicional da Revelação vai aflorando plenamente à consciência da hierarquia sacerdotal e dos fiéis em geral.»

E digo eu: Se para definir uma doutrina o papa deve esperar que toda a Igreja creia nela, tal definição ex cathedra é inútil.

Brilhante! Um dia vc chega lá! rs



Editado 1 vezes. Última edição em 29/05/2007 21:00 por firefox.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: firefox (IP registado)
Data: 29 de May de 2007 21:13

A infalibilidade papal e os dinossauros:

Discordo, muito respeitosamente, da afirmação do Hans Küng de que a investigação moderna demonstrou o erro da doutrina da infalibilidade. Se a doutrina da infalibilidade puder ser entendida do modo como expressei não vejo como possa ter erro nela.

O papa João Paulo II, apesar da santidade que lhe conferia a sua pureza de intenção, a qual não pretendo questionar, era, em assuntos de hierarquia eclesiástica, centralizador e autoritário. Ele tentou se valer do privilégio papal de modo autoritário para decretar uma "verdade infalível", mas essa vai seguindo dia-a-dia rumo à falência.

Do mesmo modo como olhamos hoje para trás e lemos com pena ou indignação as declarações sobre a existência do limbo para as crianças não batizadas (apesar de todo respeito que devemos a Sto Agostinho); do mesmo modo, no futuro imagino que vão olhar para trás e ler com pena ou indignação as declarações do papa JP2 sobre a ordenação de mulheres - e tanto mais ridícula ainda parecerá a sua tentativa de forçar a sua opinião pessoal. O fato é que o papa JP2 se pronunciou à revelia dos teólogos e dos fiéis, pois não havia terreno firme em que basear uma declaração de infalibilidade. Apesar da insistência aborrecida do papa, praticamente ninguém acolheu seu pronunciamento como infalível, e o exemplo da carta apostólica Ordinatio sacerdotalis ficou para a história como a primeira demostração de que um papa não pode se arvorar em soberano da verdade contra a comunidade dos teólogos, dos bispos e dos fiéis que, todos juntos, e não somente a pessoa do papa, formam a igreja. Nenhum papa é "dono" da igreja! Chega quase a ser cômico o quadro: um papa reclamando que fez um pronunciamento infalível e a comunidade da igreja debatendo e dizendo que não, que naquele caso ele não falou como papa. Coisas da igreja católica!

O pontificado de JP2 em mais de um sentido representou um gradual afastamento do espírito do Vaticano II. Ao governar a igreja com mão de ferro, o papa JP2 mostrou que era muito diferente daquele confiante e paternal, alguns diriam "fraco", papa João XXIII. Esquecem-se, é claro, da "fraqueza" de Jesus.

O Vaticano, sob o governo do papa JP2, com o auxílio do xerife Ratzinger, instituiu uma censura férrea contra a liberdade dos católicos. Se os primeiros 10 anos do pontificado de JP2 foram um tempo rico para a igreja, um tempo de notáveis avanços na área social; os outros 10 anos que se seguiram depois, qdo o "inimigo comunista" já havia sido nocauteado na Polônia, foram um tempo de míngua. O papa JP2, já sem um inimigo de fora para combater, começou a procurar inimigos dentro da própria igreja. Entendam como quiserem.

"Más serias son las dificultades surgidas por la posibilidad de un consenso coaccionado virtualmente por la directiva papal. La prohibición del Vaticano de discutir libremente, entre los obispos, una determinada materia, puede ser prudente en ciertas circunstancias. Sin embargo, cuando esta prohibición se ha de imponer, es inevitable que la unanimidad episcopal aparezca como poco más que una anuencia a la directiva del Vaticano.
.
Es posible concebir un proceso que muestre un genuino consenso episcopal. En la vida de la primitiva Iglesia, la interacción colegial se manifestaba de numerosas maneras: participación en sínodos regionales, distribución de cartas circulares, participación compartida en la ordenación de obispos, enviar y recibir “cartas de recomendación,” etc. Estas múltiples interacciones alimentaban una enseñanza común de todo el colegio, confirmada por el respaldo de la comunión episcopal. De ahí, la gravedad del cisma eclesial. El cisma aislaba a una iglesia de la amplia communio ecclesiarum y la privaba del testimonio de las otras iglesias. Hoy existen oportunidades alternativas para construir la enseñanza común de los obispos: la colegialidad manifestada en las conferencias episcopales, los sínodos episcopales, incluso la posibilidad (por desgracia tan poco utilizada) de concilios plenarios y provinciales, etc. El potencial de estas instituciones ha sido severamente comprometido por una atmósfera, creada por el Vaticano, en la cual las agendas sinodales son cuidadosamente controladas, se obstaculiza el tratamiento de temas controvertidos y se emplean rigurosas comprobaciones para el nombramiento episcopal. Se dice que los obispos no están para manifestar públicamente su desacuerdo con la enseñanza papal. Una tal atmósfera hace dudoso todo recurso a la unanimidad episcopal, cuando es evidente un amplio desacuerdo teológico y los obispos, en privado, admiten sus reservas. "


-------------

Vejo com tristeza uma fuga de muitos fiéis desorientados para aquele antigo modelo medieval de igreja. Esse rebanho amedrontado sente-se mal com a liberdade "perigosa" e quer retornar para a "segurança" do tempo em que não precisavam discernir, que tudo que tinham que fazer era obeceder a alguma ordem superior da hierarquia, fazer algum jejum, dar algumas esmolas e frequentar alguma celebração em latim. Eles têm saudade das cebolas. Não entenderam nada da novidade do Vaticano II. Dizem que foi um concílio pastoral que não trouxe nenhum dogma; e nem sequer entenderam que o apego às doutrinas definitivas, definições, ordens e dogmas faz parte de um passado e de um modelo medieval de igreja, um modelo ultrapassado que pouco tem a ver com a proposta de Cristo apresentada no evangelho.

Eu reclamo sim, mas amo a igreja :P



Editado 2 vezes. Última edição em 29/05/2007 21:22 por firefox.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: catolicapraticante (IP registado)
Data: 30 de May de 2007 07:59

Mais uma vez, excelentes os contributos neste tópico.

Duas observações Do Firefox que achei muito interessantes:

"
Citação:
Firefox
Entendo que, declarada uma decisão do papa como "irreformável" ou "infalível", isso NÃO significa dizer que ela nunca nunca possa ser melhorada, esclarecida, expandida, desenvolvida ou estabelecida em uma nova perspectiva. A adjetivação de um ensinamento como infalível quer expressar que se trata de uma verdade mais intimamente ligada com toda a doutrina cristã, e é esse aspecto basilar que lhe confere algum caráter "irreformável". Contudo, nossa percepção da verdade ainda não é plena, "vemos como que por um espelho", então, quando cresce a nossa compreensão, deve ser novamente esclarecido o significado da proposição "irreformável" ou "infalível".

Citação:
Firefox
(3) Entendo que um "dogma" é um ponto de luz e não uma cerca de arame farpado! Os dogmas são um presente e não um fardo, servem para orientar a reflexão e a caminhada da igreja. "

católica praticante



Editado 1 vezes. Última edição em 30/05/2007 08:00 por catolicapraticante.

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 30 de May de 2007 09:59

Respondendo à pergunta do Epafras, do que conheço a lista dos doze pronunciamentos "ex cathedra" está completa.

Nessa parte, concordo com D. Estevão.

João (JMA)

Re: Infalibilidade papal e definições "ex cathedra"
Escrito por: camilo (IP registado)
Data: 30 de May de 2007 10:35

Creio que a dúvida do Epafras é esclarecido pelo paragrafo:

Há casos, porém, em que o documento pontifício é redigido de tal modo que a simples análise dos termos não permite aos teólogos dizer se estão diante de alguma definição "ex cathedra" ou não. Em tais circunstâncias, será lícito julgar que não se trata de sentença obrigatoriamente imposta à fé dos cristãos, pois ensina a Moral: "Non est imponenda obligatio de qua certo non constat. - Não se deve impor obrigação de que não conste com certeza".


Quanto aos dogmas vejo-os como luzes, candeeiros, num caminho enevoado ao anoitecer. Não vemos com clareza o caminho, a luz dos sol já não nos chega com força para percebermos bem o caminho, para podermos dispensar as luzes que nos chegam dos candeeiros. Mesmo os candeeiros não são bem perceptiveis.
No entanto sabemos que estão ali, ajudam-nos a perceber os contornos do caminho e da paisagem e a chegar à meta.

Quanto à disciplinação de João Paulo II acho que foi muito saudavel e necessária. A seguir ao Vaticano II alguns consideraram que agora era preciso reconstruir tudo de novo, tudo podia ser colocado em causa e reconstruido de acordo com as suas fantasias. Obviamente muitos desses devaneios eram contrarios à doutrina cristã e foi necessário discernir entre o que era aceitavel e podia ser apresentado aos fieis como aceitavel e o que não era aceitavel. Claro que quem tinha um apego orgulhoso às suas fantasias protestou e passou até a combater a igreja. Nada de novo.
Pode até ser que uma ou outra ideia dos teologos que João Paulo II afastou venha a ser considerada aceitavel mas no geral o arrumar de casa de João Paulo II foi bastante bem feito.

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