Alegada «decoberta» da sepultura de Cristo retoma polémicas sobre Madalena e a ressurreição
NÃO É ESTE TÚMULO QUE VAI SEPULTAR A NOSSA FÉ
1. Nada melhor que aproveitar uma predisposição para lançar uma suspeição.
A época nem sequer foi escolhida ao acaso. A Quaresma e a Páscoa criam sempre uma predisposição mais forte para as temáticas de cariz religioso.
Sucede que esta predisposição pode ser satisfeita de muitos modos. Hoje, consome-se de tudo, sem critério. E já se sabe que a suspeita encontra sempre uma audiência ávida, sôfrega, quase descontrolada.
Nesta época, há milhões de pessoas que reafirmam que Alguém deu a vida e voltou à vida. Mistério? Sem dúvida. Por isso é que esse Alguém é confessado como sendo de condição divina.
As multidões movimentam-se, os cenários das terras alteram-se sobretudo na Semana Santa. Há, portanto, uma predisposição que acaba por envolver mesmo os que não partilham o mesmo credo. Daí que pôr em causa sirva também muitos objectivos.
2. Há quem não acredite que Jesus ressuscitou. Aliás, já no início houve quem não acreditasse. Pelo que não admira que, de quando em vez, ressurjam putativas descobertas do túmulo e dos ossos de Cristo!
Uma rápida pesquisa pela net permite deparar, por exemplo, com um inopinado leilão dos…ossos de Jesus! Um usuário que dá pelo nome de Padre Judas pôs à venta as supostas ossadas por quatro milhões de reais!
O vendedor revelava que os ossos foram encontrados por um antepassado seu no ano 224, num baú com a inscrição «ossos de Jesus Cristo, filho de Maria e José»! Passando de geração em geração, chegaram às mãos do Padre Judas, que se dispôs a vendê-los — «com muito pesar»! — por estar em dificuldades financeiras.
Na semana passada, foi o realizador de Titanic, James Cameron, que proclamou ter encontrado o túmulo de Jesus ao lado do de Maria Madalena, de quem teria tido um filho! (É difícil não pensar numa associação com o enredo do Código da Vinci!).
A finalidade era promover um documentário sobre este mesmo assunto: O túmulo perdido de Jesus. Com base numas pesquisas efectuadas desde 1980, houve quem chegasse à conclusão de que o referido lugar abrigou os restos de Jesus, Maria Madalena, um filho de ambos chamado Judas, Maria, a mãe do profeta, e um Matias que estaria relacionado com a família!
3. A pergunta que o estimado leitor terá feito foi, certamente, a mesma que me passou pela cabeça: onde estão as provas?
É que, como é sabido, existe, em Jerusalém, a chamada Igreja do Santo Sepulcro, muito visitada especialmente nesta altura.
Sofrendo diversas configurações, a primeira terá começado em 326 por ordem do Imperador Constantino. Foi erigida num santuário romano do século II que, segundo uma tradição local, tinha sido construído sobre o lugar onde Jesus fora crucificado e sepultado. Quando os edifícios romanos foram demolidos, foram descobertas vários túmulos na rocha. Um deles foi identificada como sendo o de José de Arimateia.
Qual é a legitimidade para dizer que o túmulo de Jesus não é este, mas outro? O facto de surgirem nomes como Jesus, Maria ou Judas nada garante. Estes nomes eram muito frequentes em Israel.
De entre as 900 covas encontradas num raio de quatro quilómetros na cidade velha de Jerusalém, o nome de Jesus (ou Yeshua) aparece 71 vezes! Alguém vai dizer que se referem todos a Jesus Cristo?
Não admira, por isso, que o arqueólogo israelita Dr. Amos Kloner já tenha dito que este túmulo é «de uma família judaica próspera». Segundo ele, «não há provas que respaldem as afirmações de que ali foi enterrado Jesus».
Tratar-se-á de uma sepultura judaica para enterros. «Quanto aos nomes que aparecem nela, não passa de uma coincidência. Não temos uma prova científica de que seja o túmulo de Jesus e dos membros da Sua família».
4. Em suma, o que este documentário mostra é a sepultura de uma família judaica com nomes semelhantes aos que conhecemos do Evangelho.
Nada mais pode ser dito. Em nome da verdade.
Alguma razão para alarme?
Só há razões para a serenidade. Não é este túmulo que vai sepultar a nossa fé!
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padrejoaoantonio.blogs.sapo.pt]