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"Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: APRENDIZ DO GRANDE ARQUITECTO (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 09:58

Caríssimos Irmãos unidos na Grande Fraternidade Universal,
Caros Irmãos Católicos do "Forum Paróquias",

Antes de me expulsarem, censurarem, boicotarem, ou excomungarem, peço-vos que leiam somente estas duas prévias considerações:

a) Lembro que o Concílio Vaticano II (Magna reunião do Alto Clero católico no século passado) disse acerca do ATEÍSMO: " O ateísmo, encerra em si aspectos positivos, fruto de um profundo e sincero humanismo"

b) Lembro também as ponderadas afirmações de um dos intervenientes destes Foruns, o "Alef" que repetidamente tem afirmado que é defensor da intervenção neste Forum de pessoas não-católicas.

Assim, suportado por estas duas pertinentes e tolerantes observações, e antes de ser trucidado pelos católicos mais radicais, mais ortodoxos, mais "fanatizados", (sem querer ofender ninguém, mas "que los hay, los hay...") dou início a este tópico pertinente, desafiador e interessante, de forma a que de forma rigorosa e isenta de acusação MÚTUA se procure possíveis "pontes de diálogo".

Com se sabe, o ateísmo, sempre existiu desde o início da Humanidade. Vários foram os filósofos da Grécia Antiga que o defenderam.
Apesar das ferozes perseguições da Igreja na Idade Média, persistiu.
Cresceu com o Iluminismo.
Cresceu no século XIX com o materialismo cientifico. Transformou-sse no Existencialismo de Sartre no séc. XX.

Hoje, na nossa sociedade contemporanea e apesar de ser tema TABU em muitas das àreas teológicas, e visto como INIMIGO, é uma força crescente no mundo Ocidental.

Temos uma Europa que em toda a sua milenar História, nunca teve tantos a afirmarem o seu ateísmo como presentemente.

O meu desafio ao lançar este tópico ousado, é lançar a questão a todos sobre qual é o PAPEL do ATEÍSMO na nossa sociedade?

É um desafio?

É um sinal de "fracasso" das Igrejas institucionais?

É outra forma de espiritualidade? (como alguns afirmam?)

É sinal de bem-estar, de progresso, de uma sociedade que já vive "sem Deus"?

Espero pelas vossas tolerantes e responsáveis respostas.


Um abraço a todos do

APRENDIZ DO GRANDE ARQUITECTO

"A PERFEIÇÃO NÃO EXISTE, o que existe é a sua eterna procura"



Afonso Costa

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Albino O M Soares (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 16:45

O ateísmo tem múltiplas causas- uma delas foi o terramoto de Lisboa de 1755. Mas convem reparar que os romanos consideravam os cristãos como ateus. Para quem chega ao ponto de se interrogar sobre o sentido e o significado da existência é um grande desafio ser ateu, se bem que crer longe dos Dez Mandamentos, do Mandamento Novo, da Regra de Ouro, das Bem-Aventuranças e da oração do Pai-Nosso seja manifestamente pouco.



*=?.0

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: APRENDIZ DO GRANDE ARQUITECTO (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 16:50

Ó caro Albino Soares,

Deixa-me te dizer que dúvido que o Terramoto de Lisboa de 1755 foi uma causa (directa) para o ateísmo. Mas que naquele dia de "Todos os Santos" de 1755, muitos deixaram de Crer Nele, ai issso não dúvido!...

Aliás, a grande maioria dos mortos desse dia, estavam precisamente nas Igrejas lisboetas, repletas de fiéis...

Mas as razões que levam ao ateísmo hoje em dia nada tem a ver com o Terramoto de 1755.

Depois conto-te!

Um abraço sincero do,

O APRENDIZ DO GRANDE ARQUITECTO


"A PERFEIÇÃO não existe, o que existe é a sua eterna procura"



Afonso Costa

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 17:50

Já conhecia causas para o ateísmo, mas o terramoto de 1755 é, no mínimo, original.

São capazes de explicar este conceito? Estou curioso.



João (JMA)

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 20:04

O ateísmo é um tema deveras interessante. Para já, fica uma primeira ideia: o ateísmo é um deafio para as religiões, mas é-o também para si mesmo.

O ateísmo (sobretudo na sua versão mais materialista) é filosoficamente insustentável, porque toma um ponto de vista metafísico (inconscientemente) para negar uma metafísica. Para se poder afirmar que não há Deus é preciso ter a perspectiva (no sentido "visual") de um deus/Deus que abarque toda a realidade. Ora, isso é incompatível com os próprios princípios ateus...

No fundo, há que ter uma certa "dose de fé" para afirmar que Deus não existe. A menos que se tenha a limitada perspectiva de Gagarin que disse mais ou menos o seguinte: "Andei pelo espaço e não encontrei Deus em lado nenhum".

Alef

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Albino O M Soares (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 20:09

JMA,
De uma leitura cuja referência me escapa, lembro-me que o terramoto de 1755 gerou uma onda de "indignação" dentro e fora das fronteiras. Em geral o mal no mundo é apresentado por alguns como argumento contra a existência de Deus ou como prova da inutilidade da Fé. Eu, por exemplo, ouvi falar de uma família numerosa, de crentes fervorosos. Aconteceu que o pai faleceu precocemente e a mãe alguns anos depois suicidou-se... E ainda hoje me interrogo sobre o real sentido de tudo isto.



*=?.0

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 21:24

Mais umas notas dispersas...

A própria noção de ateísmo é problemática, pois pode ser entendida em muitos sentidos. Num certo sentido, é possível dizer que o budismo é uma forma de ateísmo, pois no budismo não existe a ideia de um Deus criador do universo.

Em relação ao terramoto de 1755, não sei se se pode falar dele como causa (adicional) do ateísmo, mas a verdade é que foi um acontecimento de enormes consequências no debate do tempo, sobretudo entre teístas e deístas. Basta ver que Kant escreveu sobre o assunto e Voltaire também. O problema então não era tanto o da existência de Deus (embora também se pusesse), mas sobretudo o problema de Deus como Providência. A enormidade do desastre de Lisboa foi um elemento que em muitos reforçou o deísmo: postula-se a existência de Deus como um princípio inteligente necessário, mas incapaz de agir no universo; ou seja, existe um "Deus" mas não é providente. De resto, para o espírito da época, de grande entusiasmo com as descobertas newtonianas, as leis da natureza eram de tal forma importantes que se Deus interviesse, violaria as próprias leis que havia criado. Isto liga-se a um outro problema da época, o dos milagres. Deus não poderia fazer milagres, pois, nesse caso, estaria a violar as próprias leis da natureza.

Confesso que tenho bastante interesse pela questão do ateísmo, embora ainda não tenha tido muito tempo para estudar a questão com maior profundidade. A meu ver, o Albino toca a grande questão que une crentes e ateus, o problema do sentido da vida. Karl Rahner debruçou-me sobre o assunto e disse uma vez que sentia sempre a ameaça ou a tentação do ateísmo. Creio que isso acontece um pouco com todos. Talvez S. Tomé possa ser o grande patrono de todos nós. A questão do sentido da vida é a grande questão a que cada um tem que responder em primeira pessoa. Embarcar numa religião só por um "Maria-vai-com-as-outras" ou num ateísmo de tipo "deixa-me-gozar-antes-que-seja-tarde" é uma forma de não responder ao problema, isso, sim, pode ser um "ópio do povo". A forma como Pascal afronta o problema e a sua resposta da necessidade da "aposta" continua fecunda.

Alef

PS.: Caro "Aprendiz": tens tomado algumas atitudes claramente desafiadoras, além de um certo gongorismo de forma que é desnecessário. Talvez te surpreenda que o espírito que pareceste veicular no início não correspondeu às tuas expectativas. Não precisas de insinuar desafios para que te expulsem para "teres razão". Creio que não é necessário nada disto. Põe os "floreados" de parte (saudações e despedidadas desmesuradas e ironias forçadas) e não tenhas medo de escrever aquilo que realmente pensas, com lealdade. Terás então interlocutores interessados em discutir os problemas que levantas. Seria mau para todos se gastássemos tanto esforço para mera perda de tempo. Creio que este tópico é muito importante e até agora ainda não te "comprometeste" em nada. Que pensas realmente do problema? Como o vives? Ou não preferes pensar? Venha algo da tua própria veia!

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 02 de June de 2004 23:32

Bom, caros Albino e Alef, desconhecia essa consequência do terramoto. É isto que eu acho muito interessante neste Fórum: estamos sempre a prender.

Quanto ao tópico em si, a frase é: "Graças a Deus que sou ateu", e o seu significado tem a ver com a já referida "pastoral do terror" do final do sec XIX, inícios do sec XX.

Era um agradecimento a Deus por ter feito alguém tão conforme à Verdade que, face à imagem mitológica de Deus que era veiculada por alguns sectores, não reconhecer tal imagem como Deus e como tal declarar-se ateu.

É uma anedota que nos deve fazer reflectir incessantemente na imagem de Deus que criamos: um Deus cuja essência não seja o amor (ou a caridade como aparece na Escritura) é pouco mais que um ídolo. Pura mitologia.



João (JMA)

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Padre João Luis (IP registado)
Data: 03 de June de 2004 01:44

saliento o que diz o Alef. Ninguem aqui excomunga, nem expulsa quando há seriedade no que se faz. E confesso que tenho gostado da evolução do Aprendiz neste forum.
O problema do ateismo é interessante na sociedade em que vivemos, porque ele é fruto da mesma sociedade.
Outro dia a falar com uma rapariga dizia-me que deixou de acreditar em Deus, porque há muitas injustiças no mundo na Igreja etc. Como se Deus tivesse culpa.
Não caio na tentação de grande explicações teologicas e filosoficas. Já as tive, a pratica pastoral mostra-me outras coisas.
Durante séculos, a Igreja não formou convenientemente os seus fieis. uma fé as vezes supersticiosa, ritualista, sem grandes bases, e que ao minimo problema - as vezes abandonados - abandonam tudo, porque a tentação de o fazer é grande. Tudo perde o sentido.
O excessivo individualismo e desejo de bem estar, leva a que Deus deixe de estar no primeiro lugar e caia para o fim das prioridades. Daí a deixar de acreditar está um passo.
Quanto mais vou falando com as pessoas mais entendo que muitos são falsos ateus. Querem acreditar, querem algo a que se agarrar... mas tem medo. Não se querem comprometer.

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: APRENDIZ DO GRANDE ARQUITECTO (IP registado)
Data: 03 de June de 2004 14:36

Caro Pe. João Luís e Alef,

Obrigado pela vossas observações a meu respeito, mas devo-lhes dizer que julgo não ter feito nenhuma "evolução" (como refere o Pe. João) no forum. Sempre disse da mesma forma o que tenho de dizer. Se antes dizia algo mais "apimentado" era somente para verificar se de facto havia por aqui "católicos a sério" ou meros católicos "circunstanciais".

No entanto achava que este forum precisava de temas mais "fractuantes" e penso que os próprios católicos (anfitriões destes foruns, não me esqueço disso!) também não deviam ter MEDO de enfrentar esse tipo de temas. Daí ter criado tópicos como "Galeria de Horrores do Cristianismo"; "A (nova) Concordata é válida?"; "Ecumenismo: solução ou ilusão" ou este onde agora estamos.

Repare, não se trata objectivamente de "ofender" ninguém, mas talvez "testar" a capacidade de tolerância e de capacidade de discussão de temas, que podem ser vistos como "hostis" entre os católicos deste forum! Nada mais!

Eu, é que tenho de dizer, que noto "evoluções" da vossa parte, como agora, já começam a discutir estes temas! O que, cordialmente, vos dou os meus parabéns!


Passada esta "introdução", devo dizer que o "ateísmo", é na minha maneira de ver as coisas, é o grande desafio da Evangelização (cristã, neste caso!). O fim último da Evagelização deve ser levar a "Luz onde não haja Luz", como dizia o famoso S. Francisco Assis.
Converter alguém deve ser, para um cristão uma meta formidável.
Pena é que nem sempre essa "evangelização" tenha sido coerente. Durante muito tempo, certamente que me apoiarão, essa "evangelização foi do tipo "bem-prega-frei-tomás-faz-com-ele-diz-não-faças-o-que-ele-faz"!

E daí tenha suscitado em muitos espíritos, confrontados com INCOERÊNCIAS flagrantes por parte dos "evangelizadores", uma desconfiança, onde a Mensagem não tenha passado, e até, inversamente se criou o espírito adverso.
Alguma parte de um ateísmo popular advém daqui. Uma Incoerente ou mísera "evangelização".


Um abraço fraterno e igualitário do vosso,

APRENDIZ DO GRANDE ARQUITECTO

"A PERFEIÇÃO (talvez) NÃO EXISTA, o que existe é a sua eterna procura"



Afonso Costa

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Padre João Luis (IP registado)
Data: 03 de June de 2004 22:53

Meu caro amigo, sou capaz de enfrentar esses e outros temas, mais fraturantes. Alem do curso de Teologia, sou licenciado em História, e conheço a história da Igreja. No tema lançado por si, não lhe respondi pela violencia com que abordava o tema. Como violencia gera sempre violencia, achei por bem não tocar no assunto. Agora, e de forma desapaixonada, posso referir alguns pontos que são importantes. Há muito que a Igreja deixou para traz a ideia de que é uma sociedade perfeita. A Igreja é composta por pessoas, os pecados da Igreja são os meus pecados, são os dos filhos da Igreja. Por eles peço sempre perdão ao Bom Deus, porque antes dos homens os detestarem, Deus detestou-os primeiro. Que a igreja errou muitas vezes, sim certamente. Que errou deliberadamente com o intuito de fazer mal, isso discordo. Pensou certamente fazer o bem - a salvação das almas. Mais que salvar os corpos, pensou na salvação das almas. Assim se compreende as cruzadas, a inquisição etc - o desejo de que abandonassem o erro e não se perdessem por causa dele.
O Metodo, tantas vezes injusto da tortura. Injusto e mau, hoje para nós no sec XXI tão marcado pelos direitos do homem. Nos Sec X-XV nada disso era importante. Fazia parte das tecnicas da altura. Lembro o celebre caso das Bruxas de Salem nos Estados Unidos do sec XVII em que foram queimadas por bruxaria por protestantes.....Tais práticas não eram propriedade da Igreja Católica. Era comum na altura. Que hoje os achemos infamantes é verdade, na época não era assim. E a igreja está sempre inserida num tempo e num espaço, sendo ela Divina mas tambem humana, não podemos deixar de ter em conta os condicionalismos culturais.
Depois, há muita má informação divulgada. Por exemplo, em Portugal a inquisição foi pedida por D. João II, reiterado os pedidos incessantes por D. Manuel I. Sempre negada por Roma. Não havendo uma justiça civil eficaz, a Inquisição colmatava essa falta. Um tribunal obediente ao rei. Alem de que em nenhum país a Inquisição teve poderes para aplicar qualquer tipo de pena que não eclesiástica. Competia ao Rei aplicar as penas. A Inquisição chega a Portugal pela mão de D. João III com o compromisso do Inquisidor mor ser o Cardeal-Infante D. Henrique, seu irmão, conhecido pela sua piedade. A inquisição em Portugal acabou por servir os interesses regios - como o papado sempre suspeitou - para afastar os indesejáveis e forma de centralizar quer o poder regio, quer como forma do Erário regio enriquecer.
A Igreja é mãe e todas as mães tem os seus defeitos, mas não deixamos de as amar por causa disso.
Espero ter ajudado em algo.
Um abraço fraterno em Cristo Salvador

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 04 de June de 2004 04:59

Mais umas notas...

Aprendiz, dizes que «o "ateísmo", é [...] é o grande desafio da Evangelização» e falas depois do problema da (falta de) coerência dos evangelizadores.

Em relação ao primeiro problema, vejo o ateísmo como um grande problema, mas encaro com mais preocupação o chamado indiferentismo. Uma pessoa que se diga ateia é quase sempre uma pessoa aberta à discussão. Tomar a decisão de afirmar que Deus não existe exige alguma coragem e as suas questões são questões muito válidas para um crente. Há uns anos foi premiada e publicada (pela Comissão da Celebração do Jubileu de Roma) uma peça de teatro curiosa, que infelizmente não tenho comigo: um diálogo entre Santa Teresa do Menino Jesus (Thérèse de Lisieux) e Nietzsche.

Quanto a um indiferente, não há muito a fazer. ;-) Não põe o problema, não quer saber. Diante do indiferentismo, sobretudo do indiferentismo de barriga e bolso cheios, não há argumentos, nem anúncio...

Em todo o caso, a Evangelização não é, a meu ver, mera questão de debate de ideias. O que acaba por ter um peso decisivo é sempre o coração.

Quanto ao ateísmo, há ainda a registar algo importante, que o Padre João já referiu. Muitos que se dizem ateus não são propriamente “a-teus” no sentido de negarem Deus, mas negam determinadas imagens de Deus. E a verdade é que muitos ateus contestam algumas imagens de Deus com toda a razão, pois são imagens idolátricas. E nisto podem ser de grande ajuda aos crentes, que muitas vezes acreditam não tanto em Deus, mas numa certa imagem de Deus que lhes convém. A fé é essa grande aventura em que ateus e crentes navegam nas mesma águas, mesmo que o barco possa ser diferente.

Quanto ao problema da coerência de vida (ou falta dela) por parte dos evangelizadores, este é um problema real, mas deve ser também ele tratado com atenção. Por um lado, é verdade que é um contra-testemunho quase suicida. Por outro lado, os Evangelizadores não se anunciam a si mesmos (felizmente!). Sei que isto não satisfaz totalmente o problema, mas é um dado que deve ter sido em conta. O nosso confronto final é com Jesus Cristo e não com aquele(a) que O anuncia. Também é verdade que alguns evangelizadores centram o anúncio em si mesmos e isso é mau. É o que acontece em certos movimentos com um líder carismático ou até entre alguns padres “populares”, que não ajudam as pessoas a crescer e essas só vão à missa se for com o Padre X (um mero exemplo).

Sim, é verdade que «alguma parte do ateísmo popular vem das incoerências flagrantes por parte dos evangelizadores», mas isso deveu-se também ao facto de os mesmos se terem tomado como exemplares ou modelos. De qualquer modo, se há que ser crítico em relação a esses estereótipos, há que notar também o que nos move quando criticamos as incoerências alheias. Creio que nada nos atrai tanto na crítica como as incongruências (a começar pelos fóruns!) e isso passa-se particularmente quando se trata das incongruências de vida. Mas, mesmo repetindo-me, há que ver que temos telhados de vidro e que é mais fácil criticar que manter uma visão mais benevolente. Se eu faço as coisas com boa vontade e com isso desculpo os meus erros, não devo fazer o mesmo em relação aos outros?

De qualquer forma, concordo basicamente com o que dizes. A grande riqueza de uma pessoa está na coerência. Curiosamente, parece-me que é uma das primeiras coisas que as crianças notam nos pais: a sua (in)coerência de vida. Há muitas formas de evangelizar e os riscos da incongruência espreitam em toda a parte. E, como já disse numa outra mensagem, quando apontamos um dedo a alguém, temos três dedos apontados para nós!

Alef

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Fabiano/Brasil (IP registado)
Data: 04 de June de 2004 19:24

Acho que a forma mais intrigante de ateismo é o prático. Rezar com se existisse um Deus e viver como se ele não existisse. É alem de contraditório doloroso, já que encontramos, hoje em dia, muitos a agir assim.

Tais pessoas, se indagadas diriam: "Acredito em Deus" (seja la quem for esse), mas mesmo assim aem como se ele não existisse. É muito intrigante, parece que Deus está tão longe de nossas ações que pouco nos preocupamos com a concordancia entre a nossa fé e a nossa prática.

Como responderiamos a este fenomeno? O que dizer dele?

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Alef (IP registado)
Data: 09 de June de 2004 07:17

Caro Fabiano:

Colocas um tema muito importante. A questão do “ateísmo prático” é deveras importante e creio que merece uma reflexão séria. Dizes que acontece a pessoas «rezar com se existisse um Deus e viver como se ele não existisse». Muito bem! Vamos adiante: por que razão tal acontece?

A meu ver, tal acontece porque existe uma péssima “cultura” de oração entre muitos cristãos, em particular entre muitos católicos. De outra forma: porque a maior parte da nossa vida de oração não é verdadeira. A ver se me explico com algum exemplo.

No que toca à oração, vejo que um grande esforço dos “pregadores” vai no sentido de tentar “recuperar” aquilo a que poderemos chamar de alguma forma os “símbolos em perigo de extinção” (passe o exagero), sobretudo o terço e outras formas devocionais. Acontece que hoje a maior parte das pessoas se sentem muito pouco motivadas para rezar o terço, por muitas e diversas razões, uma das quais se chama televisão. ;-) Mas enquanto seria lógico que se alterasse a forma de falar da oração, em muitas paróquias a única forma de oração de que se fala é o terço, umas novenas e pouco mais.

Embora haja algumas pessoas (sobretudo mais velhas) que encontraram no terço e outras devoções formas genuínas de oração, outras (sobretudo as mais novas) puseram essa oração de parte. Outras ainda rezam o terço de vez em quando mais por obrigação ou descargo de consciência que propriamente por “amor”. Umas e outras carecem de uma oração que seja “adequada”, que unifique as suas vidas. As primeiras confundiram o terço com toda e qualquer oração e, deixando o terço, deixaram a oração; as segundas vivem uma certa esquizofrenia prática (a oração é encarada como um frete), vivem uma vida de compartimentos estanques onde a oração e a vida não têm comunicação entre si. Aqui encontra o ateísmo prático um terreno bastante propício.

Perguntavas como responder a este fenómeno. Parece-me que há que investir na formação no campo da oração. Há uma enorme ignorância no que diz respeito à oração, às diferentes formas, escolas de espiritualidade; desperdiçam-se tesouros imensos de uma tradição cristã riquíssima, por não haver quem mostre algo mais que a fórmula das devoções.

Muitas pessoas pensam que a única alternativa na sua vida é rezar o terço ou não rezar nada, e, como o terço “não lhes diz nada”, deixam de rezar. Deita-se fora o bebé com água de o lavar! Mas a quantas destas pessoas lhes são dadas a conhecer outras formas de oração, sejam elas a “Lectio Divina”, a oração de tipo inaciano ou outra? Quantas paróquias oferecem aos paroquianos a possibilidade real de se fazerem retiros onde as pessoas possam praticar outras formas de oração, incluindo formas não verbais? Porque insistimos numa oração de tipo exclusivamente mecânico ou cerebral?

A oração não é um caminho fácil, mas é um grande caminho e resposta ao fim do tal ateísmo prático. Muitas pessoas até rezam uma quantas orações, mas nunca tiveram a oportunidade de fazer uma experiência de Deus mais profunda, em parte porque em muitas paróquias se vive em estado de gestão ou de mera manutenção de certas práticas devocionais.

Há que apostar na formação ao nível da oração, dar às pessoas a possibilidade de experimentarem um estilo de oração que se adeque melhor às suas vidas, que as unifique, que permita levar a vida à oração (pelo discernimento) e a oração à vida, sem compartimentos estanques. Para o cristão “tout ce qui arrive est adorable”.

Quem fizer uma verdadeira experiência de Deus não viverá tal ateísmo prático, mas normalmente não há experiência de Deus sem oração. E oração pode ser, mas não tem que ser o terço. Mais importante que os métodos é o encontro com Aquele que é o centro de TODA a nossa vida.

Alef

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Fabiano/Brasil (IP registado)
Data: 09 de June de 2004 18:17

Quanto a oração, não pode haver caminho para ela sem PIEDADE, que é dom do Espírito Santo, ou seja, há que haver uma abertura nova para o Espírito Santo que proporciomnará um modo novo de rezar (até mesmo o terço) . Quero lembrar as Confissões de Santo Agostinho, best-seller do Doutor de Hipona, quando ele abre falando da pequenes do homem e que, não obstante essa pequenes, Deus insita no homem um desejo de orar (rezar, elevar preces, como quiserem chamar, já que tudo é a mesma coisa, já que vem da mesma raiz).

Com isso, quero dizer que estamos esquecendo aquele que nos veio fazer relembrar os ensinamentos do próprio Cristo. Ninguem poderia dizer que Jesus é o Senhor se não fosse pela ação deste Espírito que, procedendo do amor do Pai e do Filho, é para nós modo mais eficaz de descobrir o amor.

Alef aponta, no texto anterior, para uma crise de fé, eu aponto para uma crise moral, já que não agimos bem.o caminho para reconduzir o homem a Deus é descobrir na MORAL o AMOR de forma a retirar da compreenção da moral, a idéia mofa e embolorada de MORALISMO que tanto nos é motivo de ogeriza. Uma moral que liberte e não uma que escravise.

Creio que o ateismo prático tem sua fonte na descredibilidade do mundo em muitos cristãos e no binomio lucro- prazer que tanto seduz e afasta o homem de Deus.

Na criação , Deus dá todas as coisas criadas ao homem para que administre, bem fazendo e bem agindo (estética e moral), contudo, a degradação do conceito de pecado acabou por fazer-nos banalizar a moral e a estética nos jogando na corrupção e na falta de confiança/credibilidade mútua. O ateísmo prático parte de uma perspectiva de (falta de) moral por isso deve ser tratada com o remédio de uma MORAL AMOR que seja abertura para encontrar na lei, no bem fazer e no bem agir, uma porta para a transcendencia.

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Chris Luz BR (IP registado)
Data: 17 de June de 2004 02:54

Irmaozinho, nunca vi ninquém com tanta fé como você...e se diz ATEU???
Graças a DEUS????



Cris

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Chris Luz BR (IP registado)
Data: 17 de June de 2004 20:04

Aprendiz do grande arquiteto

Você e o mundo tem razão das atrocidades que fizemos em nome de Cristo Jesus... realmente não estávamos sob a orientação do Espírito Santo naqueles anos "escuros"...porém se observares bem Nosso Senhor , Ele
sempre chama seus servos para reacender a luz ...
Nestas épocas de anemia espiritual , Ele colocou na linha de frente seus servos São Francisco de Assis, Santa Tereza Dávila, São joão da Cruz , e outros ,na Igreja Inquisitora unida as monarquias terrenas.... Ele sempre convoca seus Santos para Restaurar sua Igreja , até o final dos tempos....
Obs: Nosso Santo Papa já pediu perdão ao mundo, já reconheceu nosso pecado, já nos "confessamos", entende???



Cris

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: JMA (IP registado)
Data: 10 de September de 2007 13:05

Um artigo do Tilleul sobre este tema, que levantou alguma polémica.

João (JMA)

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Lena (IP registado)
Data: 12 de September de 2007 09:15

Sei que tenho andado caladinha, mas não resisto a comentar este assunto, até porque o mesmo toca-me particularmente.

Sempre assumi a minha posição ateísta sem qualquer tipo de complexo anti-isto-ou-aquilo e não posso concordar com o meu caro amigo Tilleul quando ele afirma que " Um ateu tem uma fé não divina, num sentido de não existência de um criador."

Talvez seja uma questão meramente semântica mas nunca entendi esta tendência para afirmar que os ateus também têm fé. É assim tão difícil considerar a possibilidade de, simplesmente, não se acreditar?

É frequente dizer-se que os ateus têm fé na ciência. Este tipo de afirmação é muitas vezes utilizada como pura provocação... tipo pirraça infantil. "ora toma, dizes que não tens fé, mas acreditas na ciência!" Quase dá para ver um sorriso de triunfo nos lábios de quem escreve.

Meus amigos, não se crê na ciência do mesmo modo que se crê numa divindade. Se há quem o faça azar dele, porque simplesmente não entende o modo como a ciência se constrói. A ciência é mais dúvida que certeza. Sem dúvida, sem incerteza, sem questionamento, sem cepticismo a ciência simplesmente não seria ciência.
O facto de assumirmos o conhecimento actual como o mais próximo da realidade, ao ponto de se afirmar coisas como "está provado cientificamente", não garante que esse conhecimento seja infalível, imaculadamente verdadeiro e inquebrável. E isto é simplesmente fantástico! (Pelo menos para mim.)

Por acaso o advogado que defende um réu, tem de ter fé no seu cliente? Com base nos dados que possui ele "acredita" no cliente e elabora a sua linha de actuação. Os dados mudam e ele adapta, de acordo com um objectivo. O que é que isto tem de fé? Nada!
Ele tem de justificar a sua actuação, mostrar que é válida senão perde o caso.
E na fé, tal é exigido? Obviamente que não. A fé não se justifica, tem-se ou não se tem. E defendo que muitas das guerrilhas estúpidas que se vêem por aí parariam, de tão ridículas que são, se algo tão básico fosse entendido por todos. Todos, ateus e crentes.

Não gosto de sites ateístas, nunca gostei. Sempre senti neles uma soberba irritante. Por isso passo com agrado ao lado de todos eles.
Mas meus caros, se alguns ateus são uns chatos de merda, muitos crentes não ficam atrás. No fundo a porcaria é a mesma, a triste necessidade humana de justificar tudo aquilo em que acredita... ou não. A necessidade de se sentir certo! Quando o importante é sentirmos que somos coerentes!!!

Vcs nem imaginam o que isto me "aborrece", para ser suave nas palavras pois na realidade uma distribuição de sopapos era mais bem agradável.

Quanto a ser anti-clerical.... e anti-ICAR
Desculpem mas.... qual é o espanto?!?
Por acaso a Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR é mais fácil de escrever) não é aquela que ainda mais influencia a nossa sociedade? Então não entendo a admiração por ser ela a mais visada nas críticas. Não estou a dizer com isto que toda a crítica é justa, mas esperavam que fosse intocável?!? Vamos ser realistas...
E o que é esta Igreja em termos práticos? Uma instituição humana e como tal criticável e com podres como qualquer outra.

Aviso à navegação: criticar a instituição não constitui agressão à fé de ninguém. Criticar a Santa Sé enquanto organização humana com objectivos claramente políticos não é praticar a intolerância religiosa. Muitos gostariam que fosse e agem como se de tal se tratasse, mas vamos ser sinceros, quem confunde o cu com as calças é que depois reclama. Mais uma vez o chapéu serve a ateus e crentes...

No fundo o que se vive é uma enorme falta de respeito de ambas as partes.
O ateu fundamentalista que se acha mais esperto e esclarecido e sente aquela necessidade de reafirmar a toda a hora que todo o crente é burro dependente de uma droga chamada religião. E o crente fundamentalista que vê em todo o ateu um inimigo preste a arrastar as pobres ovelhinhas para a má vida do materialismo.
De facto o extremismo sempre foi a via mais fácil, ser seguro de si e não ter medo de ouvir e dialogar com quem pensa diferente não é para todos.

Isto já vai longo demais... gostaria também de falar da questão da leitura literal, mas fica para segundas núpcias.

Quem eu conheci e admirava já cá não anda, pelos vistos morreu. Em breve serei eu. Melhor assim.

Re: "Sou Ateu, Graças a Deus!"
Escrito por: Lena (IP registado)
Data: 12 de September de 2007 09:37

Só mais uma coisinha....

Como ateia não vejo nenhum fiel seguidor de uma religião como meu inimigo, nem me sinto inimiga de nenhum. Só não gosto que me tente converter ou impor o seu sistema de valores á sociedade em que vivo. Assim como nunca irei tentar demover alguém do seu sistema de crenças.
Defendo com garras e dentes uma sociedade plural em que todos os sistemas tenham espaço e possam coexistir em liberdade.

As regalias que a Igreja Católica ainda vai tendo na nossa sociedade deviam ser extensíveis a todas as outras denominações ou então cortadas. Num estado laico não faz sentido, diria mesmo que é injusto, privilegiar uma em relação às outras.
E isto devia passar pelo apoio ou não das instituições, acordos que envolvam verbas e pagamento de impostos.
Desculpem mas não vejo justificativa para num debate público televisivo apenas terem como convidados religiosos elementos da igreja católica. Ponham também lá judeus, hindus, muçulmanos, TJs, espíritas (com estes garanto-vos q eu n ia ver o programa mas enfim...), etc Assim é que seria correcto.

Quem eu conheci e admirava já cá não anda, pelos vistos morreu. Em breve serei eu. Melhor assim.

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