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Inteligência Espiritual
 

Cartas Pastorais


No conjunto de Cartas de São Paulo, as que são dirigidas a Timóteo e a Tito formam um grupo à parte que se distingue pela forma e pelo conteúdo e que, desde o séc. XVIII são designadas por CARTAS PASTORAIS. Mas já o Cânon de Muratori chamava a atenção para o fundamento desse título, ao afirmar que elas "têm um carácter sagrado porque foram escritas para honra da Igreja católica e para a organização da disciplina eclesiástica". Timóteo e Tito são dois dos mais fiéis colaboradores do Apóstolo, e nestas Cartas são visadas as qualidades dos pastores, a natureza e a extensão das suas funções.
Estas e a Carta a Filémon são as únicas dirigidas a pessoas singulares. As três têm o mesmo estilo e o mesmo vocabulário, denunciam os mesmos erros e supõem as mesmas condições de tempo e de lugar.

AUTOR, DATA E CONTEXTO Do exposto, resulta ser hoje muito contestada a atribuição tradicional destas Cartas a Paulo.
Mas há quem continue a defender a sua autenticidade paulina, justificando as divergências com a idade avançada do Apóstolo e os problemas novos que teria de enfrentar: o velho missionário, depois da projectada viagem a Espanha (Rm 15,24), teria voltado às cidades gregas para regressar de novo, preso, a Roma, de acordo com um itinerário reconstituído a partir destas Cartas e da Carta de Clemente Romano; teria escrito, na Macedónia, a 1ª Carta a Timóteo, estando este em Éfeso (1 Tm 1,3), e a Carta a Tito, quando este estava em Creta (Tt 1,5), e já em Roma (2 Tm 1,8.16-17), a 2ª a Timóteo, depois de ter passado por Tróade (4,13) e Mileto (4,20).
Também há quem fale de interpolação tardia em escritos mais breves do Apóstolo, de fragmentos biográficos, doutrinais ou cultuais, que terão dado a estas Cartas a sua forma actual. Há ainda os que sugerem a hipótese de um secretário-redactor, com grande liberdade de acção, de que Paulo se teria servido e a quem deveriam ser atribuídos o vocabulário e o estilo, bem como os ensinamentos teológico-pastorais diferentes.
Finalmente, há os que pensam, porventura com mais probabilidade, que um discípulo, nos finais do séc. I, sob o nome e patrocínio do Apóstolo, se esforçou por fazer uma actualização da sua mensagem, para esclarecer as situações novas das comunidades cristãs. Pertencendo aos círculos paulinos, retomou os seus princípios, com sensibilidade diferente e noutro ambiente cultural. Este artifício de pseudo-epigrafia era conhecido do mundo antigo e da tradição bíblica e então considerado perfeitamente legítimo. Esta é a opinião actual da maioria dos exegetas.

GÉNERO LITERÁRIO O género literário não é o habitual das Cartas de Paulo: falta-lhes originalidade e criatividade, acumulam-se fórmulas litúrgicas e hinos doxológicos, repetem-se fragmentos de catequese, catálogos de virtudes e de vícios, normas de tipo institucional, que mais parecem uma colectânea. Concretamente, 2 Tm pertence ao género dos "discursos de adeus", muito em voga no judaísmo, e constitui uma espécie de testamento espiritual.
ESTILO Também o estilo não é o de Paulo: mais lento e monótono, sem a força e a riqueza exuberante que lhe são características, de feição paternalista e moralizadora, menos conciso e mais redundante. Do mesmo modo, o vocabulário é diferente: num total de 902 palavras, 305 não se encontram nos outros escritos paulinos. E, se muitas delas podem ser atribuídas à novidade dos temas tratados e outras são termos comuns, ainda restam umas quarenta que resistem a uma triagem baseada nestes critérios.

CARACTERÍSTICAS COMUNS Até ao séc. XIX, com uma ou outra excepção, a tradição sempre considerou Paulo como autor das três Cartas Pastorais. Actualmente, a crítica, ao confrontá-las com os outros escritos paulinos, descobriu sérios motivos para pôr em dúvida a sua autenticidade.
Encontram-se aqui as principais afirmações teológicas de Paulo: a salvação pela graça (Tt 3,7), mediante a fé (1 Tm 1,16; 2 Tm 3,15) e não pelas obras (2 Tm 1,9; Tt 3,5); a manifestação da bondade misericordiosa de Deus em Jesus Cristo (1 Tm 1,12-17), que, pelo Baptismo, como "banho de novo nascimento", nos deu a sua graça no Espírito Santo (Tt 3,5). Aparecem igualmente as habituais exortações aos escravos (1 Tm 6,1-2; Tt 2,9-10), a recomendação de orações pelas autoridades políticas (1 Tm 2,2; Tt 3,1) e o valor do sofrimento do Apóstolo para benefício dos fiéis (2 Tm 2,10).
Mas notam-se também variações e diferenças de perspectiva: a fé (1 Tm 4,1; 6,21), "a sã doutrina" a conservar (1 Tm 1,20; 2 Tm 4,3), "o depósito da fé" a guardar (1 Tm 6,20); em vez da vida no Espírito, insiste-se na necessidade das "boas obras" (1 Tm 2,10; 5,10.25); o amor já não é apresentado como a virtude por excelência, mas como uma virtude entre outras (1 Tm 4,12); raras são também as referências ao Espírito Santo, embora se lhe atribua a eficácia do Baptismo.
O autor quer prevenir das tendências heréticas em voga, mas difíceis de caracterizar. Parece tratar-se de especulações de matriz judaizante sobre a Lei, "genealogias", "fábulas judaicas" e sobre o puro e o impuro (1 Tm 1,4; 4,7; Tt 1,10.14), onde poderá descobrir-se o gérmen do dualismo gnóstico, como no caso da interdição dos alimentos e do matrimónio (1 Tm 4,3-5; Tt 1,15). Os que defendem estas doutrinas são falsos mestres, que se gloriam de possuir um conhecimento particular de Deus (Tt 1,16), uma espécie de pseudociência (1 Tm 6,20), em contraste com o "conhecimento da verdade" que se obtém pela sã doutrina (1 Tm 2,4).
Multiplicam-se as referências à organização das comunidades, com uma estrutura e desenvolvimento mais próprios de uma época posterior à de Paulo. Acentua-se a distinção entre os diversos ministérios, fala-se do "carisma" transmitido pela "imposição das mãos" (1 Tm 4,14), enquanto os outros fenómenos proféticos e carismáticos passam a segundo plano. Estamos, talvez, numa linha de evolução para o episcopado monárquico, que as Cartas de Santo Inácio de Antioquia testemunham.
 

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